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TRATADO DESCRIPT1V0 DO BRASIL

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OBRA DE

GABRIEL SOARES DE SOUSA


Senhor de engenho da Bahia, n'ella residente dezesete annos seu vereador da Cmara, etc.

Edio castigada pelo estudo e e x a m e de m u i tos c d i c e s :manu.scriptos e x i s t e n t e s n o B r a s i l , e m JPortugal, H e s p a n i a e F r a n a . e a c c r e s . c e n t a d a d e a l g u n s c o n u n e n t a r i o s lbra p o r F r a n c i s c o Adolplio de V a m b a g e n . , Segunda Edio mais correea e accrescenlada comnm addilamento

RIO DE JANEIRO
TYPOGRAPHIA DE JOO IGNACIO DA SILVA

81 Rua da Assembla. 81 1879

AO

iISTOMCO DO BRASIL

SENHORES.

Sabeis como a presente obra de Gabriel Soares, talvez a mais admirvel de quantas em portugnez produziu o sculo quinhentisla, prestou valiosos auxlios aos escriptos do padre Cazal e dos contemporneos Southey, Martius e enis, que d'ella fazem meno cora elogios no equvocos, , Sabeis tambm como as Reflexes criticas que sobre essa obra escrevi, foram as primicias que offereci s ,1|tras, por intermdio da pademia das Sciencias de Lisboa que se dignou, ao acolhel-as no corpo de suas mpaorias, contar-me nos do seu grmio. Sabeis como aquella obra corria espria, pseudonyma e corrompida

no titulo e na data, quando as Reflexes criticas lhe" restituiram genuinidade de doutrina e legitimidade de autor e de titulo, e lhe fixaram a verdadeira idade. Sabereis, finalmente, como nada tenho poupado para restaurar a obra, que por si constitue um monumento levantado pelo colono Gabriel Soares civilisao, colonisao, letras e sciencias do Brasil em 1587. Essa restaurao dei-a por emquanto por acabada; e desde que o Sr. Ferdinand Denis a inculcau ao publico europeu, com expresses to lisongeiras para um de vossos consocios, creio que, devemos corresponder a ellas provando nossos bons desejos, embora a realidade do trabalho no v talvez corresponder expectativa do illustre escriptor francez quando disse : Ce beau livre, a t 1'objet d'une.. (permitti-me, Senhores, calar o epitheto com que me quiz favorecer)., dissertation de M. Adolfo de Varnhagen. Le... crivain que nons venons de nommer a soumis les divers manuscrits de Gabriel Soares un srieux examen, i\ a vu mme celui de Paris, et il est le seul qui puisse donner aujourd'hui une dition correcte de cet admirable trait, si prcieux pour 1'empiro du Brsil. Sem me desvanecer com as expresses lisongeiras que acabo de transcrever do benevolo e elegante escriptor, no deixo de me reconhecer um tanto habilitado a fazer-vos a proposta que hoje vos fao de imprimirdes o cdice que vos offreo. Pio ha duvida, Senhores* que foi o desejo de ver

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o exemplar da Bibliotheca de Paris o que mais me levou a essa capital do mundo litterario em 1847. No ha duvida que, alm d'esle cdice, tive eu occasio de examinar uns vinte mais. Vi trs na Bibliotheca Eborense, mais trs na Portuense e outros na das Necessidades em Lisboa. Vi mais dois exemplares existentes em Madrid : outro mais que pertenceu ao convento da congregao das Misses e trs da Academia de Lisboa, um dos quaes serviu para o prelo, outro se guarda no seu archivo, e o terceiro na livraria conventual de Jesus, igualmente vi trs copias de menos valor que ha no Rio de Janeiro (ma das quaes chegou a estar licenciada para a impresso); a avulsa da colleco de Pinheiro na Torre do Tombo, e uma que em Neuwied' me mostrou o velho prncipe Maximiliano, a quem na Bahia fora dada de presente. Em Inglaterra deve seguramente existir, pelo menos, o cdice que possuiu Southey; nias foram inteis as buscas que ahi fiz aps elle, e no Museu Britnico nem se quer encontrei noticia de algum exemplar. Nenhum d'aquelles cdices porm , a meu ver, o original; e baldados foram todos meus esforos para descobrir este, seguindo as indicaes de Nicolo Antnio, de Barbosa, de Leon Pinelo e de seu addicionador Barcia. Na Bibliotheca de Christovo de Moura, hoje existente em Valencia e pertencente ao Prncipe Pio, posso assegurar-vos que no existe lle, pois que,

graas bondosa amizade d,'este cavalheiro,me foi per-

Vill

mittido deserganar-me por roeu prprio exame. A livraria do conde de Villa-Umbrosa guarda-se incommunicavel na ilha de Malhorca, e no ha probabilidade de que quando n'ella se ache ainda o cdice que menciona Barcia, possa elle ser o original. A do conde de Vimieiro foi consumida pelas chammas, as quaes pde muito bem ser que devorassem os quadernos originaes do punho do nosso colono. Graas porm s muitas copias que nos restam a uma-das de vora sobretudo, creio poder dar no exemplar que vos offereo o monumento de Gabriel Soares, to correcto quanto se poderia esperar sem o original, em quanto o trabalho de outros e a discusso no o aperfeioem ainda mais, como ter de succeder. Acerca do autor talvez que o tempo far descobrir na Bahia mais noticias. Era filho de Portugal, passou Bahia em 1570, fez-se senhor de engenho e proprietrio de roas e fazendas em um sitio entre o Jguaribe e o Jequiri. Voltando Pennsula dirigiu-se a Madrid, onde estava no I o de Maro de 1587, em que offertou seu livro a Ghristvo de Moura por meio da seguinte carta: Obrigado de minha curiosidade fiz, por espao de 17 annos que residi no Estado do Brasil, muitas lembranas por escripto do que me pareceu digno de notar, as quaes tirei a limpo n^esla corte em este quaderno emquanto a dilao de meus requerimentos me deu para isso lugar; ao que me dispuz entendendo convir ao

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servio de El-Rei Nosso Senhor, e compadecendo-me da pouca noticia que n'estes reinos se tem das grandezas eestranhezas d'esta provnca,no queanteparei algumas vezes, movido do conhecimento de mim mesmo, e entendendo que as obras que se escrevem tem mais valor que o da reputao dos autores d'ellas. Como minha teno no fi escrever historia que deleitasse com estylo e boa linguagem, no espero tirar louvor d'esta escriptura e breve relao (em que se contm o que pude alcanar da cosmographia e descripo d'este Estado), que a V. S. offereo ; e me far merc aeita'1-a, como est merecendo a vontade com que a offereo: passando pelos desconcertos d'ella, pois' a confiana d'isso me fez suave o trabalho e tempo que em a escrever gastei: de cuja substancia se podem fazer muitas lembranas S. M. para que folgue de as ter d'este seu Estado, a que V S. faa dar a valia que lhe devida; para que os moradores d'elle roguem a Nosso Senhor guarde a mui illustre pessoa de V. S. e lhe accrescente a vida por muitos annos. Em Madrid o I o de Maro de 1587. Gabriel Soares de Souza. Para melhor intelligencia das doutrinas do livro acompanho esta copiados commentos'que vo no fim. Preferi este systema ao das notas marginaes inferiores, que talvez seriam para o leitor de mais commodidad ; porque no quiz interromper com a minha mesquinha prosa essas paginas venerandas de um escriptor quinhentista. Abstive-me tambm da tarefa, alis enfadoxiv 2

nhapara o leitor, de acompanhar o texto eotia variantes que tenho por no legitimas. Esta obra, doze annos depois, j existia em Portugal ou por copia ou em original; e em 1599 a cita e copia Pedro de Mariz na segunda edio de seus. Dilogos. Mais tarde copiou d'ella Fr. Vicente de Salvador, e por .conseguinteo seu confrade Fr. Antnio Jaboato. Simo de Vasconcellos aproveitou do capitulo 40 da I a parte as suas Noticias 51 a 55, e do capitulo 70 a Noticia 66. Assim, se vs o resolverdes, vai finalmente correr mundo, de um modo condigno, a obra de um escriptor de nota. Apezar dos grandes dotes do autor, que o escripto descobre, apezar de ser a obra tida em conta, como justificam as muitas copias que d'ella se tiraram, mais de dois sculos correram sem que houvesse quem se decidisse a imprimil-a na integra. As mesmas copias por desgraa foram to mal tiradas que d'isso proveio que o nome do autor ficasse esgarrado, o titulo se trocasse e at na data se cmmettessem enganos! Peza-nos ver nos tristes azares d'este livro mais um desgraado exemplo das injustias ou antes das infelicidades humanas. Se esta obra se houvesse impresso pouco depois de escripta, estaria hoje to popular o nome de Soares como o de Barros. O nosso autor singelo, quasi primitivo no estylo, mas era grande observador, e, ao ler o seu livro, vos custa a descobrir se elle, com estudos regulares, seria melhor geographo que historiador, melhor botnico que corographo, melhor etlmographo que zologo.

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Em 1825 realisou a tarefa da primeira edio completa a Academia de Lisboa; mas o cdice de que teve de valer-se foi infelizmente pouco fiel, e o revisor no entendido na nomenclatura das cousas da nossa terra. Ainda assim muito devemos a essa primeira edio: ella deu publicamente importncia ao trabalho de Soares* e sem ella no teramos tido occasio de fazer sobre a obra os estudos que hoje nos fornecem a edio que proponho, a qual, mais que a mim, a deveis corporao vossa co-irm, a Academia Real das Scienciasde Lisboa. Madrid, I o de Maro de 1851.

F. A. de Varnhagen.

ADDITAMENTO
Algumas noticias biographicas a cerca de Gabriel Soares de Sousa, tiradas da 2. a edio da Historia Geral do Brasil, do editor Visconde de'Torto Seguro. Os primeiros cuidados de D. Francisco de Sousa, logo que chegou Bahia,foram os de dar cumprimento e execuo s ordens recebidas, para que auxiliasse eficazmente a Gabriel Soares, na sua projectada expedio actual provncia de Minas, subindo pelo Paraguass at as suas cabeceiras, e passando depois d'estas s vertentes do Rio de S. Francisco, segundo um roteiro, que, conforme dissemos, uns sele annos antes, recebera, deixado por seu irmo Joo Coelho de Sousa, o qual, depois de haver percorrido os sertes durante trez annos, e de haver n'elles- descoberto metaes preciosos, e, segundo parece, at j diamantes, ao fallecer, quando regressava de taes descobrimentos, nas cabeceiras do rio Paraguass, lhe mandara entregar a sua derrota por um portador de confiana. Era Gabriel Soares nascido em Portugal, talvez na prpria cidade de Lisboa, onde tinha duas irms. Em 1567, passava Monomotapa, acompanhando a Francisco Barreto, quando, arribando Bahia, preferiu ficar n'esta cidade, onde foi medrando; chegando a fazerse at senhor de um grande-engenho cie assucar no rio

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Jequiri. Por morte de seu irmo Joo Coelho, de quem j tratamos, ,herdeiro do seu itinerrio do descobrimento de varias minas nos sertes, resolveu passar Europa, a requerer concesses e privilgios; mas houve taldilao no despacho de seus requerimentos, que tendo partido d Bahia em fins de Agosto de 1584, s depois de meados de Dezembro de 1590 foi despachado. N'esse intervallo, talvez com objecto de recommendar-se. offereceu, no 1. de Maro de 1587, a D. Christovo de Moura, estadista influente no governo, o precioso escripto a cerca do Brasil de que j demos noticia. As concesses obtidas pelo mesmo Soares reduziram-se: A uma carta regia ao governador do Brasil, afim de que fossem postos s suas ordens duzentos ndios frecheiros; e a mais oito alvars, todos da mesma data dispondo: Que o mesmo Gabriel Soares de Sousa, capito, mr e governador da conquista e descobrimento do Rio de S. Francisco, teria o direito de nomear, por seu fallecimento, um successor que gozaria dos mesmos ttulos e poder. Em ter faculdade de prover todos os officios da justia e da fazenda no seu districto. Em lhe ser concedido, para quatro cunhados e dois primos, que com elle iriam, o habito de Christo, com 50 rs., e no fim da. jornada, o foro de fidalgo e moradia* para os mesmos; e mais dois hbitos para os capites que o acompanhassem.

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Em poder conceder o foro de cavalleiros fidalgos at cem pessoas dos do seu squito. Em poder fazer promessas de mais recompensas aosque se distinguissem. Em lhe sr facultado o tirar das prises, para levar comsigo, os condemnados a degredo que escolhesse^, sendo de officios mechanicos, mineiros, etc. Em ser a estes contado, como tempo do degredo, o da expedio. Finalmente, cm ficar au torisado, se quizesse, a proseguir os descobrimentos ainda mais alm do Rio de S. Francisco; e por conseguinte at dos prprios terrenos das actuaes provncias de Goyaz e Matto Grosso, se l chegasse. Os alvars, mandados passar por Estevo da Gama,foram escriptos por Joo da Gama, ambos mui provavelmente ainda aparentados com o famoso' descobridor da ndia, Vasco da Gama. Depois de chegar Lisboa, para se embarcar, obteve o mesmo Soares mais duas graas, em 27 de Janeiro immediato; a saber uma ordem para n'esse porto se lh dar embarcao, e mantimento ordinrio s pessoas que com elle iam, e outra para o governador do Brasil lhe dar cincoenta quintaes de algodo em caroo, do que houvesse pertencente Fazenda, afim de se fazerem armas, para os que o deviam acompanhar nova conquista. Auxiliado com tantos favores, partiu afinalde Lisboa o novo capito mr e governador Gabriel Soares de

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Sousa, ha urca flamenga denominada Grifo-Dourado,


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em 7 de abril de 1591, conduzindo comsigo uns tresents e sessenta homens, incluindo quatro religiosos carmelitas, um dos quaes, Fr. Hieronymo de Canavezes, veiu at a ser depois provincial. O projecto de Soares era chegar s cabeceiras do Rio de S. Francisco, onde se deviam encontrar as minas, de que nos lugares de que levava nota pelo roteiro de seu irmo, dava conta o mesmo roteiro; e cuja existncia veiu a confirmar-se no seguinte sculo ; pois essas minas se achavam evidentemente no distr-icto da provncia, que, pelas que depois n'ella se descobriram, se ficou chamando de Minas, como sabemos. Infelizmente, o seu completo descobrimento e explorao, por conseguinte o principo da colonisao n'esse districto, ainda ento teve de ficar aprasado, em vir* tude dossuccessivos mallogrosque acompanharam a dita expedio de Gabriel Soares, incluindo a sua prpria morte, succedida proximamente na paragem onde tivera lugar a de seu irmo, e a de um indio por nome Aracy (o sol) que lhe servia de guia. O principio do mallogro da expedio procedeu de haver em meados de Junho, naufragado a urca onde vinham todos, em Vazabarris; onde, graas recente colonisao por Christovo de Barros, no cahiram yicti mas dos ndios. Salvando-se a maior parte da tripolao, passou o mesmo Soares Bahia, onde refeito com os auxlios que

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lhe deu D. Francisco de Sousa, emprehendeu a expedio, indo primeiro s suas terras, onde acabou de prover-se de carnes e farinhas, e logo varou at metter-se no conhecido Boqueiro, por onde forosamente devia entrar para seguir caminho, subindo com o rio Parafuass pela margem direita. Seguiu sempre subindo at o arrayal, mais ou menos encostado margem direita do mesmo rio at uma paragem, em que, com parte da gente que levava, deixou assentado um,arrayal; por ventura a prprio chamado de Joo Amaro; pois tinha oiem de ir deixando no caminho pequenas povoaes, ou arrayaes fortificados, de 50 em 50 lguas, proximamente. No caminho, at esse arrayal, lhe adoeceram muitos homens de sezes, eperdeu muitos animaes mordidos dos morcegos; pragas estas que deviam ser mui nocivas, quando os sertan<ejos tiveram mais tarde que abandonar este caminho, cortando do Boqueiro ao arrayal de Joo Amaro, pela chamada Travessia, terreno sem pastos e quasi sem gua. P'esse primeiro arrayal, proseguiram, sempre pela margem direita do Paraguass acima, no sem grandes trabalhos para evitar ciladas dos gentios, a abrir picadas, e juntar os animaes, que se estraviavam, e as wezes de todo se perdiam, j mordidos das cobras, j comidos pelos tigres; e finalmente pelos obstculos oferecidos pelo prprio rio, que ladeavam.; i O qual, com suas suftas cheias, ,deixava muitas vezes os expediciomarios ilhados, e na necessidade de esperarem qme as
acuas ltiai\assp,m.

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Por fim, chegaram s primeiras grandes vertentes que vem do S. O.; e tomaram por uma d'ellas, comeando a subida da serra, no longe, ao parecer, da actual fovoao de Santa Isabel do Paraguass.Pata trans^ pr a dita serra, gastaram alguns dias, cobertos de>he* voeiros, com bastante frio, no havendo por ahi lenha para se aquecerem, nem pasto para os animaes, que j estavam mui .dizimados, de nada lhe servindo muito salitre que tinham 4 vista. Aqui comearam todos a esmorecer ; e como perfaziam j cincoenta lguas desde O arrayal anterior, decidiu-se Gabriel Soares a fundar o segundo; mas logo canado dos trabalhos, adoeceu, e falleceu pouco depois. , Sbstituiu-o immecliatamente no mando o mestre de campo Julio da Costa; o qual, vendo-se privado do guia indio Aracy, por ventura esmoreceu. Retirou-se com todos os da expedio para uma paragem mais sadia, ed'ahi.escreveu ao governador, narrando-lhe o suc'ceddo, e pedindo-lhe novas ordens. Resolveu ento este mandar regressar toda expedio, e apoderando-se de todos os roteiros, premeditou j ento vir a recolher d'ella os fructos, como particular, apenas largasse o governo. E' o que devemos.concluir, em vista do que de_ pois praticou, vindo a requerer e obter os mesmos privilgios e concesses outorgados a Soares, e ainda outros mais. O grande interesse que nos merece Gabriel Soares como chefe d'essa expedio, embora mallograda, e ainda mais como um dos primeiros escriptores acerca do Brasil em todos os ramos, e com especialidade das noli-

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cias ethnographicas dos ndios, nos induzem a incluir aqui as clusulas principaes do seu testamento, que deixou na Bahia, feito em 10 do Agosto de 1584, antes de embarcar-se para Europa, a requerer. Depois do cabealho, e de mais seis itens, encommendando-se Virgem e a vrios santos prosegue: D'onde quer que eu fallecer, me enterraro no habito de S. Bento, havendo mosteiro de sua ordem, onde me enterraro ; e no havendo maneira d'este habito, e havendo mosteiro de S. Francisco, me enterraro no seu habito, e os religiosos de ambas estas ordens me acompanharo, e a cada um daro de esmola cinco mil reis e pelo habito dez cruzados. Se Deus fr servido, que eu fallea n'esta cidade e capitania, meu corpo ser enterrado em S. Bento da dita cidade, na capella-mr, onde se me por uma campa com um letreiro que diga AQUI JAZ UM PECO A DOR o qual estar no meio de um escudo que se lavrar na dita campa; e sendo Deus servido de me levar no mar ou em Hespanha, todavia se por na dita capella mr a dita campa com o dito letreiro em a qual sepultura se enterrar minha mulher Anna de Argollo. Acompanhar o meu corpo se fallecenn'esta cidade, o cabido, a quem se dar a esmola costumada, e os padres de S .Bento levaro de offerta um porco e seis ai mudes de vinho .e_ci.gQ_cru,y.ado_s. Acompanhar-me-ho dois pobres cada um com sua tocha ou cirios nas mos, e daro de aluguel con- . fraria d'oncle forem, um cruzado de cada uma, e a cada.

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No dobraro sinos por mim, e somente se faro os signaes que se fazem por ara pobre quando morre. Deixo casa da santa misericrdia (Testa cidade, quarenta mil reis de esmola, para se dourar o retbulo, e para missas (?) cinco mil reis. Deixo confraria do SS. Sacramento cinco mil reis e de Nossa Senhora do Rosrio dois mureis. Far-me-ho no mosteiro de S. Bento, quer fallea n'esta capitania, quer em outra qualquer parte, trs ofcios de nove lies, em trs dias afio; tanto que eu fallecer,, ou se souber a certeza de minha morte, em cada officiose dar de offerta um porco e cinco alqueires de farinha, e no, me faro pompa nenhuma , somente me poro ura panno preto no cho, com dois bancos cobertos de preto, e em cada um cinco velas accesas. Em cada officio Testes me diro cinco missas rezadas, honra das cinco chagas de Nosso Senhor Jesus Chrislo, com seus responsos sobre a sepultura. Nos outros dias seguintes, me diro em trs dias afios cada dia cinco missas rezadas; as primeiras cinco honra dos gozos de Nossa Senhora, e a outro dia as outras cinco honra dos cinco mysterios gloriosos da Madre de Deus, conforme a contemplao do Rosrio, e no outro dia as outras cinco honra dos cinco passos dolorosos da Madre de Deus. Me diro na mesma casa, acabados os officios alraz cento e cincoenta missas rezadas e quinze cantadas, e as cantadas daro de oferta a cada uma sua gallinha e canada de vinho, e umas e outras sahiram com seu res~

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ponso sobre a minha sepultura, as missas se reparti ro pela maneira segaWite: Nos primeiros cinco dias se diro, em cada dia, dez missas rezadas e uma cantada, como acima fica dito, honra dos prazeres que se contemplam; n rosrio de Nossa Senhora. Nos outros cinco dias logo seguintes, se diro em cada dia outras dez missas rezadas e uma cantada, honra dos cinco mysterios dolorosos d Virgem Nossa Senhora. Nos outros cinco dias seguintes, se diro em cada dia outras dez missas rezadas e uma cantada honra dos cincos mysterios gloriosos da Virgem Madre de Deus. E se no houver padres no dito mosteiro, que bastem para dizerem estas missas juntas, humildemente peo ao padre bbade que ordene com os padres do collegio ou da S, com que se possam dizer estas missas, como tenho declarado, porque tenho confiana na Madre de Deus que, no cabo rTestas missas, sahir minha alma d > o purgatrio. Como se acabar de dizer estas missas, como tenho declarado, ao outro dia seguinte, se me diga um officio de nove lies, como os que acima lenho declarado. Mando que se digam pela alma de meu pai e mi cincoenta' missas rezadas, as quaes se diro como se acabarem as que acima tenho declarado. Mando que se tomar de minha fazenda a valia de quinhentos cruzados, que se repartiro por cinco moas pobres, cem cruzados por cada uma para ajuda de seus

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casamentos, o que repartir o padre abbade, cominforformao do provedor da santa misericrdia. , , ,., En tenho duas irms viuvas; uma se chama D. Margarida de Sousa e outra Maria Velha, ambas mora-, drasem Lisboa, e no lenho herdeiro forado, e daro a uma d'ellas de minha fazenda, do rendimento (Telia vinte mil reis a cada uma; e fallecendo alguma d'el]as ou sendo j fallecida, daro a que ficou viva, cada anuo quareuta mil reis em sua vida to somente, os quaes lhe mandaro por lettra Lisboa, de maneira que lhe seja paga a dita quantia. Declaro que tenho um livro das contas que tenho com s pessoas a quem devo, pelo qual se far conta, com as pessoas a quem estou em obrigao, ao p de cujo titulo fica assignado por mim, ao qual livro sedar inteiro credito, porque, pelas declaraes d elle, deixo desencarregada minha conscincia. N'este mesmo livro de minha razo tenho escriplo o que tenho, de meu, assim de fazenda de raiz, como escravos, bois de carros e guas, e outros moveis, ndios I forros; e n^Uelenho em lembrana os encargos era que estou, assim s pessoas que me servem e serviro, como outras pessoas, ao qual sedar outrosim inteiro credi. to; por que o fizs afim de concertar minha conscincia; f o que no posso tratar nem esmiunsar n'este testamento ! pelas mudanas que o tempo faz, e eu no sabor qual \ ha de Ser a derradeira hora que,meu Senhor ha de chamar me, para a qual no achei melhor remdio que

^ este,

\ . i c.

XXIIf

Depois do meu falleimento se ordenar oinventario de minha fazenda, ese far conta do que devo, e se por em ordem de se pagarem as minhas dividas, para o que se vendero os moveis de casa, bois e guas, <e assucar que se achar; epara o que restar se concertaro meus lestamenteiros com os credores, para se pagarem pelos rendimentos de minha fazenda, sedMsso forem contentes, o que se ha de negociar, de maneira^ que;a minha alma no pene na outra vida; por isso, e no querendo elles esperar, cm tal caso se arrendar o engenho de antemo ou se vendero as; novidades d'elle;e quando isto no bastar, se vendero as terraaque tenho no Jequiri,. que com as guas e fazenda valem muito, por serem muitas e boas : em tudo faro meus lestamenteiros, de maneira, que eu fique desencarregado. Declaro por meus testa menteiros ao Rev. padre Fr. Antnio Ventura e minha mulher; Anna de Argollq, para que ambos faam cumprir este meu testamento como se n'elle contm'; e sendo caso que ella, ou por no poder estar presente na cidade, ou por suas indisposies no possa audir a fazer cumprir este meu,;testamento, que tudo o feito pelo Rev. padre somente fica valioso. E porque o tempo faz grandes mudanas, que cpm ellas ha viver e morrer, e ausentar, no podendo pir algum licito impedimento cumprir o Rev. padre este meu testamento, digo que em tal caso seja meu testamenleiro, o Rev. padre que lhe^suceder no cargo de abbade do dito mosteiro de S.'Bento: mas ainda que o

xxr? fiev. pdre Pr. wtosno Ventara ?o seja abbade, sempre quero que elle seja meu testamemteir. Como Nosso Senhor nufoiservido *que eu tivesse filhos de minha mulher, nem outros alguns, nem sobrinhos, filhos de meus irmos, nem herdeiros forados a quem pertena minha fazenda, e porque no herdei de meus pais, nem de meus avs, e adquiri por minha industria e trabalho, e por ventura alguns encargos de WBsciencia que ora no sei declarar, digo e declaro por meu hereiro de toda minha fazenda ao mosteiro de S. Beno da 'cMade do Salvador, Bahia de todos os Santos, comconiloqueeu e minha mulher Anna de Argollo os enterremos ambos na dita capella mr, que ora e falecendo antes que se faa a capella mr da igreja nova, passaro a nossa ossada dita capella mr da igreja nova, onde estar a minha sepultura, com a campa o mero da capella, com o letreiro (!) que atraz fica eclarado. 'Sero oWigaoso anbade e religiosos que ora so, ao'diante forem, me dizerem cada dia uma missa rezada por minha alma, para emquarto o mundo durar, mm seu responso sobre a sepultura; e cada anno, pela semana m tantos, um officioe nove lies. E seedo caso que Deus se sirva de m levar para isinomar ou em Hespanha, d'onde meus ossos no podem ser trazlos a este mosteiro, digo que, sem embargo Usso, se mepotfhaesta sepultura na capella mr,
1) "Acha-se com effeit na capella mr uma campa com a inseripeo.

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d'elle, pa-a lembrana de se; me dizer o responso sobre ellae para se enterrar minha mulher to somente. Declaro que os chos, que tenho n'esta cidade, que houve de Antnio de ffonceca, de Anna de Paiva, de Pedro Fernandes e de Br az Affonso, e a terra que tenho vallada no caminho da Villa-Velha, da banda do mar e
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da outra banda que foi de Antnio de Oliveira, queria que ficasse tudo a meu quinho, por tudo ser mui necessrio para o mosteiro, onde podem fazer muitas terecenas ao longo do mar para alugar, e pelo caminho acima muitos foros de casas, e muitas casas ao longo da estrada, que tudo feio tempo adiante, viro a render muito para o convento. E porque hei este testamento por acabado, pelo qual dou por revogado todos os que tenho feito antes d'este, e este s quero que valha, porque esta a minha derradeira vontade, o qual fiz por minha mo e assignado por mimGabriel Soares de Sousa. (2) Como produco litteraria, a obra de Soares seguramente o escripto mais producto do prprio exame, observao e pensar, e at diremos mais encyclopedico da litteratura portugueza n^sse peiiodo. Nos assumptos de que trata, apenas fora precedido uns dez annos pela obra (3) muito mais lacnica, mas que lhe serviu
2) A approvao d'este testamento foi feito em 21 de Agosto de 1584, e a abertura em 10 de Julho de 1592. 3) "Historia da provncia Santa Cruz a que vulgarmente chamamos Brazil; feilapor Pero d Magalhes de Gandavo,,: etc. anno 1576. ' Ach-se reimpressa no Tom. 21 da Rev. do Inst.

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de estimulo, do grammatico Pero de Magalhes de Gandav, autor que publicou o primeiro livro em portuguez acerca do Brasil, e que ainda mais estimamos> por haver sido amigo de Cames, e por haver, por assim dizer, posto em contado com o nosso paiz, o grande poeta, quando este escreveu em verso a epstola offerecendo-a a D. Leoniz Pereira, antigo governador deMalaca. A breve historia sua que illustrasse A terra Santa Cruz pouco sabida (4). Nos Lusadas apenas Cames se lembrou do Brasil escrevendo uma vez este nome, e outra o de Santa Cruz (5); nunca o de America. Seja embora rude, primitivo e pouco castigado o estylo de Soares, confessamos que ainda hoje nos encanta o seu modo de dizer ;e ao comparar as descripes com a realidade, quasi nos abysmmos ante a profunda, observao que no canava,. nem se distrahia variando de assumpto. Como corographo, o mesmo seguir o roteiro de Soares, que o de Pimentel ou de Roussin ; em topographia ningum melhor do que elle se occupou da Bahia; eomo phytologo faltam-lhe naturalmente os princpios da sciencia botnica; mas Dioscorides ou Plnio no explicam melhor as plantas do velho mundo,
4) Cames ; Ded. da obra de Gandavo. 5) '' De Santa Cruz o nome lhe poreis". Cam3es X, 140; Veia J tambm 11,45 ; V, 4 ; Vil, 14 : X, 63 e 139.

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que Soares as do novo, que desejava fazer conhecidas. A obra contempornea que o jesuta Jos de Acosta publicou em Sevilla em 1590, com o titulo de Historia Natural e Moral das ndias, e que tanta celebridade chegou a adquirir, bem que pela frma e assumptos se possa comparar de Soares, -lhe muilo inferior quanto originalidade e copia de doutrina. O mesmo dizemos das de Francisco Lopez de Gomara, e de Gonalo Fernandez de Oviedo. O grande Azara, com o talento natural que todos lhe reconhecem, no tratou instinctivamente, no fim do sculo passado da zoologia auslro-americana melhor que o seu predecessor portuguez; e n'uma ethnographia geral dos povos brbaros, nenhumas paginas podero ter mais cabida pelo que respeita ao Brasil, que as que nos legou o senhor de engenho das visinhanas do Jequiri. Causa pasmo como a alteno de um s homem poude occupar-se em tantas cousas que juntas se vm raramente,- como as que se contm na sua obra, que trata a um tempo, em relao ao Brasil, de geographia, de historia, de topographia, de hydrographia, de agricultura entretropica, de horticultura brasileira, de matria medica indgena, das madeiras de construco e de marcenaria, da zoologia em todos os seus ramos, de economia administrativa e at de mineralogia! (6)
6) A primeira edio comeou-se na typographia do Arco do Cego in-fol; mas no s concluiu ,nem se ekpz ao publico :.realisu-se a publicao pela primeira vez nas Memrias da Academia de Lisboa em lS25, no t.lll das de Ultramar: os primeiros 29 capitulos se deram de novo luz pelo MS. da Bib. R. de Paris,Jornal " O Ptrio

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Pouco depois de haver o Brasil passado ao domnio do rei de lespanha, avisava propheticamente ao governo da metrpole o dito Gabriel Soares. Vivem os moradores to atemorisados, que esto sempre com o fato entrouxadopara se recolherem para o matto. como fazem com a vista de qualquer no grande; temendo serem corsrios : cuja affronta S. M. deve manda acudir com muita brevidade , pois ha perigo na tardana, o que no convm que haja ; /porque, se os estrangeiros se apoderarem d'esta terra, |cuslar muito lanal-osfra d'ella,pelo grande apparelho que tm para n'ella se fortificarem ; com o que se inquietar toda aHespanha, ecustar a vida de mui tos capites e soldados, e muitos milhes do ouro em armadas, e no apparelho d'ellas, ao que agora se pde atalhar, acudindo-lhe com presteza devida.

taJrastlevrp^Vms, 1830. porm a edio mais correcta 6 a do Kio de Janeiro em 18ol,com os commenlarios que lhe juntou o A da presente historia, quando primeiro secretario do Instituto. Soares partiu para a Europa em 1584 (Carla de Christ. de Barros d 1584) n^ap^ovS^LVl?1161110
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PRIMEIRA PARTE

ROTEIRO GERAL
* COM LARGAS INFORMAES I)E TOPA A COSTA DO BRASIL

PROEMIO Como todas as cousas tem fim, convm que tenham principio, e como o de minha preteno manifestar a grandeza, fertilidade e outras grandes partes que tem a Bahia de todos os Santos e o demais Estado do Brasil, do que se os Reis passados tanto se descuidaram ; a El-Rei Nosso Senhor convm, e ao bem do seu servio, que lhe mostre, por estas lembranas, os grandes merecimentos d'este seu Estado, as qualidades e estranhezas d'elle, etc. ; para que lhe ponha os olhos bafeje com seu poder ; o qualse engrandea e estenda a felicidade, com que se engrandeceram todos os Estados que reinam debaixo da sua proteco ; porque est muito desamparado depois que ElRei D. Joo III passou d'esta vida para a eterna, o qual o principiou com tanto zelo, que para o engrandecer metteu n'isfcO tanto cabedal, como notrio, o qual se vivera mais dez annos, deixara n'elle edificadas muitas cidades, villas e fortalezas mui populosas, o que se no effeituau depois do seu fallecimento, antes se arruinaram algumas povoaes que em seu tempo se fizeram. Em reparo e accrescentamento estar bem empregado todo o cuidado que Sua Magestade mandar ter d'este novo reino ; pois est capaz para se edificar n'elle um grande imprio, o qual com pouca despeza d'estes reinos se far to soberano,

que seja um dos Estados do mundo, porque ter de costa mais de mil lguas, como se ver por este Tratado no tocante cosmographia d'elle, cuja terra quasi toda muito frtil, mui sadia, fresca e lavada de bons ares, e regada de frescas e.frias guas. Pela qual costa tem muitos, mui seguros e grandes portos, para n'elles entrarem grandes armadas com muita facilidade; para as quaes tem mais quantidade de madeira que nenhuma parte do mundo, e outros muitos apparelhos para se poderem fazer. esta provincia mui abastada de mantimentos de muita substancia e menos trabalhosos que os de Hespanha. Do-se n'ella muitas carnes assim naturaes d'ella, como das de Portugal, e maravilhosos pescados ; onde se do melhores algodes que em outra parte sabida, e muitos assucares to bons como na ilha da Madeira. Tem 'muito po de que se fazem as tintas. Em algumas partes d'elle se d trigo, cevada, e vinho muito bom,, e em todas todos os fructos e sementes de Hespanha, do que haver muita qualidade, se Sua Magestade mandar prover n'isso com muita instncia, e no descobrimento dos metaes que n'esta terra ha-; porque lhe no falta ferro, ao, cobre, ouro, esmeralda, crystal e muito salitre, e em cuja costa sahe do mar todos os annos muito bom mbar ; e de todas estas e outras podiam vir todos os annos a estes reinos em tanta abastana, que se escusem os que vem a elles dos estrangeiros, o que se pde facilitar sem Sua Magestade metter mais cabedal n'este Estado que o rendimento d'elle nos primeiros annos ; com o que o pde mandar fortificar e prover do necessrio a sua defenso ; o qual est hoje em tamanho perigo, que se n'isso ahirem os corsrios, com mui pequena armada se senhorear d1 esta provincia, por razo de no estarem as povoaes d'ella fortificadas, nem terem ordem com que possam resistir a qualquer affronta que se offerecer ; do que vivem os moradores d'ella to atemorisados, que esto sempre com o fato entrouxado para se recolherem para o matto, como fazem com a vista de. qualquer no grande, temendo-se serem corsrios; a cuja affron-

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ta Sua Magestade deve mandar acudir com muita brevidade ; pois ha perigo na tardana, o que no convm que haja ; porque se os estrangeiros se apoderarem d'esta terra custar muito lanal-os fora d'ella, pelo grande apparelho que tem para n'ella se fortificarem, com o que se inquietar toda Hespanha, e custar a vida de muitos capites e soldados, e muitos milhes de. ouro em armadas e no apparelho d'ellas, ao que agora se pde atalhar acudindo-lhe c o * a presteza devida. No se cr que Sua Magestade no tenha a isto por falta de providencia, pois lhe sobeja para as maiores emprezas do mundo; mas de informao do sobredito, que lhe no tem dado quem d'isso tem obrigao. E como a eu tambm tenho de seu leal vassallo, satisfao da minha parte com o que se contm n'este Memorial, que ordenei pela maneira seguinte.
CAPITULO i.

Em que se declara quem foram o s primeiros descobridores da provincia do Brasil, e como est arrumada. A provincia do Brasil est situada alm da linha equinocial da parte do sul, debaixo da qual comea ella a correr junto do rio que se diz das Amazonas ; onde se principia o norte da linha da demarcao e repartio ; e vai correndo esta linha pelo serto d'esta provincia at 45 gros, pouco mais ou menos. Esta terra s descobriu aos 25 dias do mez de Abril de 1500 annos por Pedro Alvares Cabral, que n'este tempo ia por capito-mr para a ndia por mandado de El-Rei D. Manoel, em cujo nome tomou posse d'esta provincia, onde gra a capitania do Porto Seguro, no lugar onde j esteve a villa de Santa Cruz, que assim se chamou por se aqui arvorar uma muito, grande, por mandado de Pedro Alvares Cabral, ao p da qual mandou dizer, em seu dia, a 3 de Maio, uma slemne missa com muita festa, pelo qual. respeito se cb.ama a villa do mesmo nome, e a provincia muitos annos foi nomeada

por de Santa Cruz e de muitos Nova Lusitnia : e para solemnidade d'esta posse plantou este capito no mesmo lugar um padro com as armas de Portugal, dos que trazia para o descobrimento da ndia, para onde levava sua derrota. A estas partes foi depois mandado por S. A. Gonalo Coelho com trs caravelas de armada, para que descobrisse esta costa, com as quaes andou por ellas.muitos mezes buscando-lhe os portos e rios, em muitos dos quaes entrou, e assentou marcos dos que para este descobrimento levava ; no que passou grandes trabalhos pela pouca experincia e informao que se at ento, tinha de como a costa corria, e do curso dos ventos com que se navegava. E recolhendo-se Gonalo Coelho Com perda de dois navios, com as informaes que pde alcanar, as veio dar a El-Rei D. Joo o III, que j n'este tempo reinava, o qual logo ordenou outra armada de caravelas que mandou a estas conquistas, a qual entregou a Christovo Jacques, fidalgo da sua casa que n'ella foi por capito-mr, o .qual foi continuando no descobrimento d'esta costa, e trabalhou um bom pedao sobre aclarar a navegao d'ella, e plantou em muitas partes padres que para isso levava. Contestando com a obrigao do seu regimento, e andando correndo a costa foi dar coma bocca da Bahia, a v que pz o nome de Todos os. Santos, pela qual entrou dentro, e andou especulando por ella todos os seus recncavos, em um dos quaes, a que chamam o rio do Paraguass, achou duas nos francezas que estavam ancoradas resgatando com o gentio, com as quaes se pz as bombardas, e as metteu no fundo ; com o que se satisfez, e recolheu-se para o reino, onde deu suas informaes a S. A., que com ellas, e com as primeiras e outras que lhe tinha dado Pedro Lopes de Sousa, que por esta costa tambm tinha andado com outra armada, ordenou de fazer povoar esta provincia, e repartir a terra d'ella por capites e pessoas que se offei-eceram a metter n'isso todo ocabed l de suas fazendas, do que faremos particular meno em seu lugar.

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CAPITULO I I .

Em que se declara- a repartio que. fizeram os Reis Catholicos de Castella com El-Rei D. Joo II de Portugal. Para se ficar bem entendendo aonde demora, e se estende o Estado do Brasil, convm que em summa declaremos como se avieram os Reis na repartio de suas conquistas, o que.se fez por esta maneira. Os Reis Catholicos de Castella, D. Fernando e D. Isabel, sua mulher, tinham comeado de, entender no descobrimento das ndias ccidntaes e algumas ilhas, e porque esperavam de iit este descobrimento em tanto crescimento como foi, por, atalharem as differenas que sobre isso se podiam offerecer, concertaram-se com El-Rei D. Jt>o o III de Portugal se fizesse uma repartio liquida, para cada um mandar conquistar para sua parte livremente, sem escrupulo^de se prejudicarem. E accordados os reis d'esta maneira deram conta d'este concerto ao Papa, que alm de approvar, o louvou muito. E como tiveram o consentimento de Sua Santidade,ordenaram a repartio d'esta concordncia, fazendo baliza na ilha das do Cabo Verde, de barlavento mais occidental, que se entende a de ' Santo Ant, e contando d"ella 21 gros e meio equinocciaes de dezesete lguas e meia cada gro, e lanada d'aqui uma linha meridiana de norte sul, que ficassem as terras e ilhas que estavam por descobrir para a parte do oriente, da coroa de Portugal; e lanada esta linha mental como est declarado, fica o Estado do Brasil da dita coroa, o qual se comea alm da ponta do Rio das Amazonas da banda do oeste, pela terra dos Caribas, d'ondese principia o norte d'esta provincia, e indo correndo esta linha plo serto1 d'ella ao sul parte o Brasil e conquistas d'elle alm da bahia de S. Mathias, por 45 gros pouco mais ou menos, distantes da linha equinocial,e altura do polo antarctico, e por esta conta temde costa mil e cincoenta lguas, como pelas cartas se pde ver segundo a opinio de Pedro Nunes, que n'esta arte atinou melhor que todos os do seu tempo.

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CAPITULO III.

Em que se declara o principio d'onde comea a correr a costa, do Estado do Brasil Mostra-se claramente, segundo o que se contm n'eate capitulo atraz, que se comea a costa do Brasil alm de Rio das Amazonas da banda de oeste pela terra que se diz dosCaribas do rio de Vicente Pinson. D'este rio de Vicente Pinson ponta do Rio das Amazonas, a que chamam o Cabo Corso, so quinze lguas, a qual ponta est debaixo da linha equinocial; d'esta ponta do rio outra ponta da banda de leste so trinta e seis lguas. E ao mar doze lguas da bocca d'este rio esto ilhas, as quaes demoram em altura de um tero de gr da banda do sul. Est#as ilhas se mostram na carta mais chegadas terra, o que erro manifesto. N'estas ilhas ha bons portos para surgirem navios, mas para bem ho se de buscar de baixamar, nordeste-sudoeste, porque n'esta conjunco se descobre melhor o canal. A este rio chama o gentio Mar doce por ser um dos maiores do mundo, o qual muito povoado de gentio domstico e bem acondicionado,e segundo a informao que se d'este rio tem, vem do serto mais de mil lguas at o mar ; pelo qual ha muitas' ilhas grandes e pequenas quasi todas povoadas de gentio de differentes naes e costumes, e muito d'elle costuma pelejar com- setas hervadas. Mas toda a gente que por estas ilhas vive, anda despida ao modo do mais gentio do Brasil e usam dos mesmos mantimentos e muita parte dos seus costumes.; e na boca d'este rio, e por elle acima algumas lguas, com parte da costa da banda de leste, povoado de Tapuias, gente branda e mais tratavel e domestica que o mais gentio que ha na costpt da Brasil, de cujos costumes diremos adiante em seu lugar.

CAPITULO IV.

Em que se do em summa algumas informaes que se tem d'este Rio das-Amazonas Como no ha cousa que se encubra aos homens que '^ uerem commetter grandes emprezas, no pde estar encoberto este rio do mar doce ou das Amazonas ao capito Francisco de Arelhana que, andando na conquista do Peru" em companhia do governador Francisco" Pissarro, e indo por seu mandado com certa gente de cavallo descobrindo a terra, entrou por ella dentro tanto espao que se achou perto do nascimento d'este rio. E vendo-o caudaloso, fez junto d'elle embarcaes, segundo!o costume d'aquellas partes, em as quaes se embarcou com a gente que trazia e se veio' por este rio abaixo, em o qual se houveram de perder por levar grande fria e correnteza, e com muito trabalho tornou a tomar porto em povoado; na qual jornada teve muitos encontros de guerra com o gentio e com um grande exercito de mulheres que com elle pelejaram com arcos e fiexas, d'onde o rio tomou o nome das Amazonas. Livrando-se este capito d'este perigo e dos mais por onde passou, veiu tanto por este rio abaixo at que chegou mar ; e, d'elle foi ter uma ilha que se chama a Margarita, d'onde se passou Hespanha.. Dando suas informaes ao Imperador Carlos V que est em gloria, lhe ordenou uma armada de quatro nos para commetter esta empreza, em a qual partiu do porto de S. Lucar com sua mulher para ir povoar a bocca d'este rio, eo ir conquistando por elle acima, o que no houve effeito por na mesma bocca d'este rio fallecer este capito de sua doena, d'onde sua mulher se tornou com a mesma armada.para Hespanha. N'este tempo pouco mais ou menos andava correndo a costa do Brasil em uma caravela como aventureiro Luiz de Mello, filho do alcaide-mr de Elvas, o qual, querendo passar a Pernambuco, desgarrou com o tempo e as agus por esta costa abaixo, e vindo correndo a ribeira, entrou no rio d Maranho, e n'este das Amazonas, de cuja grandeza se contentou muito ; e tomou

lingua do gentio de cuja fertilidade ficou satisfeito, e muito mais das , grandes informaes que na ilha da Margarita lhe deram alguns soldados, que alli achou, que ficaram da companhia do capito Francisco de AreIhana, os quaes facilitaram a Luiz de Mello a navegao d'este rio, e que com pouco cabedal e trabalho adquirisse por elle acima muito ouro e prata. Do que movido Luiz de Mello, se veiu Hespanha e alcanou licena de El-Rei D. Joo III de Portugal para armar sua custa e commetter esta empreza, para o qne se fez prestes na cidade de Lisboa ; e partiu do porto d'ella com trs nos e duas caravelas, cm as qqas se perdeu nos baixos do Maranho, com a maior parte da gente que levava ; e elle com algumas pessoas escaparam nos bateis e uma. caravela em que foi ter s Antilhas. E depois d'este fidalgo ser em Portugal, se passou , ndia, onde acabou valorosos feitos : e vindo-se para o reino muito rico e com teno de tornar a commetter esta jornada acabou no caminho em a no S. Francisco, que desappareceu sem at hoje se saber novas d'elle.
CAPITULO v .

Que declara a costa da ponta do Rio das Amazonas at o do Maranho Aponta de leste do Rio das Amazonas est em um gro da banda do sul ; d'esta ponta ao rio da Lama ha 35 lguas, a qual est em altura de um gro e trs quartos; e ainda que este rio se chame da Lama, podem entrar por elle dentro, e estarem muito seguras de todo o tempo, nos de 200 toneis, o qual rio entra pela terra dentro muitas lguas. D'este rio ponta dos baixos so nove lguas, a qual est na mesma altura de um gro e 3/4. N'esta ponta ha abrigada para os barcos da costa poderem ancorar. Da ponta dos baixos ponta do rio do Maranho so dez lguas, onde chega a Serra Escalvada, e entre ponta e ponta tem a costa algumas abrigadas, onde podem ancorar .navios da costa : a qual ponta est em dois gros da banda do sul.

At aqui se corre a costa noroeste-sueste e toma da quarta de leste-oeste ; e d'esta ponta do rio a outra ponta so 17 lguas, a qual. est em altura de dois gros e trs quartos. Tem este rio do Maranho na bocca, entre ponta e ponta d'ellas pra dentro, uma ilha que se chama das Vaccas, que ser de trs lguas, onde esteve Ayres da Cunha quando se perdeu com sua armada n'estes baixos ; e aqui n'esta ilha estiveram tambm os filhos de Joo de Barros e a tiveram povoado, quando tambm se perderam nos baixos d'este rio; ondte fizeram pazes com o gentio Tapuia, que tem povoado parte d'esta costa, e por este rio acima; onde mandavam resgatar mantimentos e outras cousas para remdio, de sua mantena. Por este rio entrou um Bastio Marinho, piloto da costa, com um caravelo e foi por elle acima algumas vinte lguas, onde achou muitas ilhas cheias de arvoredo e a terra d'ellas alcantilada com soffrivel fundo ; e muitos braos em que entram muitos rios que se mettem n'este : o qual afnrmou ser toda a terra fresca, cheia de arvoredo e povoado de gentio, e as ilhas tambm. N'este rio entra o de Pindar que vem de muito longe. Para se entrar n'este rio do Maranho, vindo do mar em fora, ha de se chegar bem terra da banda de leste por fugir dos baixos e do aparcellado ; equem 'entrar por entre,ella e a ilha entra seguro. Quem houver de ir d'este rio do Maranho para o da Lama ou para o das Amazonas ha de se lanar por fora dos baixos com a sonda na mo, e no v por menos de doze braas.; porque esta costa at aqui dez lguas ao mar, vasa e enche n'ella a mar.muito depressa, e em. conjunco de lua tem grandes macaros ; mas para bem no se ha de commetter o canal de nenhum d'estes rios seno de baixa-mar na costa, o que se pode saber pela lua, o que convm que seja, pelos grandes perigos que n'esta .entrada se offerecem, assim de macaros, como por espraiar e esparcelar o mar oito e dez lguas da terra; pelo que forado chegar-se terra de baixa-mar, pois ento se descobre o canal mui bem; e n'este rio do Maranho no podem entrar por este respeito navios grandes,

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CAPITULO VI.

Em que se declara a costa do Rio dp Maranho ate o Rio Grande, traz fica dito como a ponta de sueste do rio do Maranho, que se chama esparcelada est em dois gros e 3/4. D'esta ponta bahia dos Santos so treze lguas, a qual est na mesma altura, e esta. bahia muito suja e tem alguns ilhos ; mas tambm entram n'ella muitos navios da costa, onde tem surgidouro e ba abrigada e maneira para se fazer aguada n'ella. D'esta bahia dos Santos ao rio M Joo de Lisboa so quatro lguas, o qual est. na mesma altura ; onde tambm entram caraveles por terem n'elle grande abrigada. Do rio de Joo de Lisboa bahia dos Reis so nove lguas; a qual est em dois gros. N'esta bahia esto algumas ilhas alagadas da mar de guas vivas por entre as quaes entram caraveles e surgem vontade. D'esta bahia ao Rio do Meio so 17 lguas, o qual est na mesma altura de dois gros, onde tambm entram caraveles. Entre este e a bahia dos Reis entra outro rio que se chama do Parcel, onde tambm os navios da costa tem boa colheita, D'este Rio do Meio bahia do Anno Bom so 11 lguas, a qual costa est na mesma altura de. dois gros, aonde entram navios' da costa e tem muito ba colheita, a qual bahia tem um grande baixo ; no meio e dentro n'ella se vm metter no mar o Rio Grande, dos Tapuias, e se navega um grande espao pela terra dentro e vem de muito longe ; o qual se chama dos Tapuias por elles virem por elle abaixo em canoas a mariscar ao mar d'esta bahia, da qual bahia da Coroa so 10 lguas ; e est na mesma altura onde entram e surgem caraveles da costa. Da bahia da Coroa at o Rio Grande so trs lguas, onde comearemos o capitulo que segue. E corre-se a costa at aqui lste-oeste,

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CAPITULO VII.

Em que se declara a costa do Rio Grande at ode Jagarwe Como fica dito, o Rio Grande est em dois gros da parte do sul, o qual vem muito longe e traz muita gua, por se metterem n'elle muitos rios: e segundo a informao do gentio nasce de uma lag.a em que se affirma acharem-se muitas prolas. Perdendo-se, haver dezeseis annos, um navio nos baixos do Maranho, da gente que escapou d' elle que veiu por terra, affirmou um Nicolo de Rezende, d'esta companhia, que a terra toda ao longo do mar at este Rio Grande era escalvada a mr parte d'ella, e outra cheia de palmares bravos, e que achara uma lagoa muito grande, que seria de 20 lguas pouco mais ou menos , e que ao longo d'ella era a terra fresca e coberta de arvoredo ; e que mais adiante achara outra muito maior a que no vira o fim, mas que a terra que visinhava com ella era fresca e escalvada, e que em uma e em outra havia grandes pescarias,de que se aproveitavam os Tapuias, que viviam por esta costa at este Rio Grande : dos quaes disse que recebera com os mais companheiros bom tratamento. Por este Rio Grande entram navios da costa e tem n'elle boa colheita, o qual se navega com barcos algumas lguas. D'este Rio Grande ao dos Negros so sete lguas, o qual est em altura de dois gros e um quarto ; e do Rio dos Negros s Barreiras Vermelhas so seis lguas, que esto na mesma altura ; e em uma parte e outra tem os navios da costa surgidouro e abrigada. Das Barreiras' Vermelhas Ponta dos Fumos so qWtro lguas, a qual est em dois gros e 1/3. D'esta ponta ao Rio da Cruz so sete lguas e est em dois gros e meio em que tambm tem colheita os navios da costa. Affirma o gentio que naces este rio de uma lagoa, ou de junto d'ella, onde tambm se criam prolas, e chama-se este Rio da Cruz, porque se mettem ,n'elle perto do mar dois riachos, em direito um do outro, com que fica a gua em cruz. D'este ri ao do Parcel so oito lguas, o qual est em dois gros e meio: e faz-se na boca d'este rio uma bahia toda esparcellala.

12 Do Rio do Parcel enseada do Macorive so onze lguas, e est na mesma altura, a qual enseada muito grande e ao longo d'ella navegam navios da costa; mas dentro em toda tem bom surgidoro e abrigo ; e no Rio das Ostras, que fica entre esta enseada e a do Parcel, o tem tambm. Da enseada do Macorive ao Monte de Li so quinze lguas e est em altura de dois gros e dois teros, onde ha porto e abrigada para os navios da costa ; e entre este porto e a enseada de Macorive tem os mesmos navios surgidoro e abrigada no no porto que se diz dos parceis. Do Monte de Li ao Rio Joaguarive so dez lguas, o qual est em dois gros e 3/4, e junto da barra d'este rio se mette outro n'elle, que se chama o Rio Grande, que extremo entre os Tapuias e s Pitigoares. N'este rio entram navios de honesto porte at onde se corre a costa leste-oeste; a terra d'aqui at o Maranho quasi toda escalvada; e quem quizer navegar por ella e entrar em qualquer porto dos nomeados, ha de entrar n'este rio de Jagoarive por entre os baixos e"a terra,porque tudo at o Maranho defronte da costa so baixos,e pde navegar sempre por entre elles e a terra,por fundo de trs braas e duase meia,achando tudo limpo, e quanto se chegar mais terra se achar mais fundo. N'esta boca do Jagoarive estfima enseada onde navios de todo o porte podem ancorar e estar seguros.
CAPITULO VIII.

Em que se declara a costa do rio de Jagoarive at o cabo d,e 8. Roque Do rio de Jagoarive de que s trata acima at bahia dos Arrecifes so oito lguas, a qual demora em altura de trs gros. N'esta bahia se descobrem de baixa-mar muitas fontes de gua doce muito boa, onde bebem os peixes bois, de que ahi ha muitos, que se matam arpoando-os, assim o gentio Pitigoar, que aqui vinha, como os caraveles da costa, que por aqui passam desgarrados, onde acham bom surgidoro e abrigada. D'esta bahia ao rio S. Miguel so sete lguas, a qual est em altura de trs gros e 2/3, em a qual os navios da costa surgem por acharem n'ella boa abrigada. D'esta

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baliiar ao, Rio Grande so quatro lguas, o qual est em altura d'e. quatro gros. Este rio tem duas pontas sahidas ao mar,, e entre,-uma e outra ha uma ilhota, que lhe faz duas barras, pelas quaes entram navios da costa. Defronte d'este rio se comeam os baixos de S. Roque, e d'este RiO; Grande ao Cabo de S. Roque so dez lguas, o qual est em altura de quatro gros e um seismo: entre este cabo e a :ponta do Rio.Grande se faz de uma ponta 4 outra uma grande bahia, cuja terra boa e cheiaf *e mato, em cuja ribeira ao longo do mar se acha muito sal feito. Defronte d'esta bahia esto os baixos de S. Roque, os quaes arrebentam em trs ordens, e entrase n'esta bahia por cinco canaes que vem ter ao canal que est entre um arrecife e outro, pelos quaes se acha fundo de. duas, trs, quatro, e cinco braas, por onde entram os navios da costa vontade.
CAPITULO IX.

Em qu se declara, a costa do Caba de 8. Roque at o porto dos Bzios. Do-Cabo de S. Roque ponta de Goaripari so seis lguas, a qual est em quatro gros e 1/4, onde a costa limpa e a terra escalvada, de pouco arvoredo e sem gentio. De Goaripari enseada da Itapitanga so sete lguas, a qual est em quatro gros e 1/4 ; da ponta d'est-a",enseada ponta de Goaripari so tudo arrecifes, e entro elles ,e a terra entram nos francezas e surgem n'esta enseada vontade, sobre a qual est um grande mdo de ara ; a' terra por aqui ao longo1 do mar est despovoada.do gentio por; ser estril e fraca. Da Itapitanga .ao.Rio Pequeno, a que os indios.chamam Baquipe, so oito lguas, a qual est,em cinco gros e um seismo. rjeste rio entram chalupas francezas a resgatar com o gentio e carregar do-po ,de. tinta, as quaes so das nos que se recolhem na enseada de Itapitanga. Andando os filhos de Joo de Barros correndo esta costa,, depois que se perderam, lhes mataram n'este lugar os Pitiguares com favor dos francezes, induzidos d'elles, muitos homens. D,'este Rio Pequeno ao out.ro,Rio Grande
TOMO x i v 6

14 so trs lguas, o qual est em altura d ctoco; gros 1/4 ; n'este Rio Grande podem entrar muitos navios d todo o porte, porque tem a barra funda de dezoito at seis braas, e entra-se n'elle como pelo arrecife de Pernambuco, por ser da mesma feio. Tem este rio m baixo entrada da banda do norte, onde corre gua muito vasante e tem dentro algumas ilhas de mangues, pelo qual vo barcos por elle acima quinze ou vinte lguas e vem ;de muito longe. Esta terra do Rio Grande muito soffrivel para este rio se haver de povoar, em o; qual s mettem muitas ribeiras em que se podem fazer engenhos de assucar pelo serto. N'este rio h muito po de tinta, onde os francezes o vo carregar muitas vezes. Do Rio Grande ao porto dos Bzios so dez lguas, e est em altura.de cinco gros e 2/3 : entre este porto e o rio esto uns lenes de ara como os de Tapoam junto dar' Bahia de todos os Santos. N'esteRio Grande achou Diogo Paes de Pernambuco, lingua do gentio, um castelhano entre os Pitiguares, com os beios furados como elles, entre os quaes andava havia muito tempo, o qual s& embarcou em uma no.para Frana, porque servia de lingua dos francezes entre o gentio nos seus resgates. N'este porto dos Bzios. entram caraveles da- costa/em,.um riacho que n'este lugar se vem.metter no mar.
CAPITULO x

Em que se declara a terra e costa do porto dos Bzios at a Bahia da Traio, e como Joo de Barros mandou povoar a sua capitania. Do porto dos Bzios Itacoatigara so nove lguas, e este rio se chama d'este nome por estar em uma ponta d'elle uma pedra de feio de pipa como ilha, a que o gentio por este respeito pz este nome, que quer dizer ponta da pipa ; mas o prprio nome do rio Garatui, o qual est em altura de seis gros. Entre esta ponta e porto dos Bzios est a enseada ' de Tabatinga, onde tambm ha surgidoro e abrigada para navios em que detraz da ponta costumavam ancorar nos francezas e fazer sua carga de po da tinta. De Itacoatigara ao r

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deGaramatai so duas lguas, o qual est em seis gros esforados ; de Goaramatai ao rio de Caramative so duas eguas, o qual est em seis gros e 1/4, e entre um e oiuitro rio est a enseada Aratipicaba, onde dos arrecifes ara dentro entram nos francezas e fazem sua carga. V D'este porto para baixo, pouco mais ou menos, se estende a capitania de Joo de Barros, feitor que foi da casada ndia, a quem El-Rei D. Joo III de Portugal fez merc de cincoenta lguas de costa partindo com a cafitania de Pe.ro Lopes de Sousa, de Tamarac. Desejoso Joo de Barros de se aproveitar d'esta merc, fez sua custa uma armada de navios em que embarcou muitos moradores Com todo o necessrio para se poder povoar esta sua capitania, e em a qual mandou dois filhos seus que partiram com ella, e proseguindo logo sua viagem em busca da costa do Brasil, foram tomar terra junto do rio do Maranho, em cujos baixos se perderam. D'este naufrgio escapou muita gente com a qual os filhos de Joo de Barros se recolheram em uma ilha que .est na boca d'este rio do Maranho, aonde passaram muitos trabalhos, por se no poderem communicar d'esta ilha com os moradores da capitania de Pernambuco e ;das mais capitanias, os quaes, depois de gastarem alguns annos, despovoaram e se vieram para este reino. N'esta armada, e em outros navios que Joo de Barros depois mandou por sua conta em soceorro de seus filhos, gastou muita somma de mil cruzados, sem d'esta despeza lhe remltar nenhum proveito, como fica dito a traz. Tambm, lhe mataram os Pitiguares muita gente aonde se chama o Rio Pequeno.
CAPITULO XI

Em que se declara a costa da Bahia da Traio at a Parhyba. Do-rio de Camaratibe at Bahia da Traio so duas lguas, a qual est em seis gros e 1/3, onde ancoram nos francezas e entram ; dos arrecifes para dentro. Chama-se esta bahia pelo gentio Pitiguar Acajutibiro, e os portuguezes, da Traio, por com ella matarem uns poucos de castelhanos e portuguezes que n'esta costa

16 se perderam. N'esta bahia fazem cada anno os francezes muito po de tinta e carregam d'elle muitas nos. D'esta Bahia da Traio ao rio Magoape so trs lguas, o qual est em seis gros e meio. Do rio de Magoape ao da Parahyba so cinco lguas, o qual est em seis gros e trs quartos; a este rio chamam: na carta de marear, de S. Domingos, ondeientram nos de'duzentos toneis, e no rio de Magoape* entram caravelas d costa; mas o rio deS. Domingos se navega muito pela terra dentro, de onde elle vem de bem longe. Tem este rio um ilheo da boca para dentro que lhe faz duas barras, e pela que est da banda do norte entram caraveles: qe navegam por entre 'a terra e os arrecifes t Tamarac, e pela outra barra entram as nos grandes; e porque entravam cada anno n'este rio nos francezas a carregar o po da tinta; com que abatia o que ia para o reino das mais capitanias por conta dos portuguezes; e porque o gentio Pitiguar'andava mui levantado contra os moradores da capitania de Tamarac e Pernambuco, com o favor dos francezes, com os quaes fizeram n'estas capitanias grandes damnos, queimando engenhos e outras muitas fazendas, em que mataram muitos homens brancos e escravos; assentou Sua Magestade de o mandar povoar e fortificar, para o que mandou a isso Fructuoso Barbosa com muitos moradores, o que se comeou a fazer com- mui grande alvoroo dos moradores d'estas duas1 capitanias, foi Deus servido que lhe succedesse mal com lhe matarem os Pitiguar es (em cuja companhia andavam muitos francezes), trinta e seis homens e alguns escravos em uma cilada, com o, qual suCcesso se descontentaram muito os moradores de Pernambuco ; e se desavieram com Fructuoso Barbosa, de feio que se tornaram para suas casas, e elle ficou impossibilitado para poder pr em effeito o que lhe era, encommendado, o que se depois effectuou com o favor e ajuda que para isso deu Diogo Flores de Baldez, general da armada que foi ao estreito de Magalhes.

CAPITULO XII

Ernque se trata de como setornou a commetUtf a povo* " '-' ao do rio da Parahyba. Na Bahia de todos os Santos soube o general Diogo Flores, vindo ahi do, estreito, de Magalhes com seis nos que lhe ficaram da armada que levou, como os moradores de Pernambuco e Tamarac pediam mufto afincadamente ao governador Manoel Telles Barreto, que, ento era do Estado do Brasil, que os fosse soccorrer contra o gentio Pitiguar que os ia destruindo, com o favor e ajuda dos francezes, os quaes tinham n'este rio da Parahyba , quatro navios para carregar do po da tinta : e, posto este negocio em conselho, se assentou que/ governador n'aquela conjunco no ra bem que shisse da Bahia, pois no havia mais de seis';mezs,que era ella qhegad, onde tinha por prover em grandes negcios convenientes o servio de Deus e de El-Ri e do bem commum, mas que, pois n'a queilporto estava o'generalDiogo Flores, com aquella armada., Diogo Vaz da Veiga com. duas nos portugezas da armada em. que do reino fora o governador, das qjas vinha,por capito pra o,reino, que um capito e -outrp fsseni fazer este socorro, indo por cabea principal capito Diogo Flores de Baldez, o qual, chegou a Pernambuco com armada toda junta, com que. veiu o ouvidor geral Marfim Leito"e o provedor mrMartira parvalh para'em Pernambuco, a favorecerem com gente e mntimentos, como o fizeram, a qual gente, foi por terra e o general por mar com esta armada, com a qual ancorou fora da barra, e no entrou dentro com mais que com a sua^ fragata e 'uma no ds de Diogo Vaz da Veiga, de q era capito Pedro Corra de Lacerda, em a qual o mesmo Diogo Vaz ia,e com todos os bateis das outras nos. Em os francezes vendo esta armada puzeram fogo s suas nos e lanaram-se com o gentio, com o qual fizeram mostras de quererem impedir a desembarcao, o que lhe no serviu de nada, que o general desembarcou a p enxuto sem lh'o poderem impedir, e chegou a gente de Pernambuco e Tamarac por terra com muitos

18 escravos, e todos juntos ordenaram um forte de terra e faxina onde se recolheram, no qual Diogo Flores deixou cento e tantos homens dos seus soldados com um capito para os caudilhar.que se chamava Francisco Castrejon que se amassou to mal com Fructuoso Barbosa, no o querendo conhecer por governador, que foi forado deixal-o n'este forte s e ir-separa Pernambuco, de onde se queixou.' Sua Magestade para qe provesse sobre o caso, como lhe parecesse mais seu servio. E sendo ousente Fructuoso Barbosa, veiu o gentio por algumas Vezes affrontar este forte e pl-o em cerco, o qual soffru mal o capito Francisco Castrejon, e, apertado dos trabalhos, desamparou este forte e o largou aos contrrios, passando-se por terra capitania de Tamarac que d'ahi dezeito lguas, e pelo caminho lhe matou o gentio alguma gente que lhe ficou atraz, como foram mulheres e outra gente fraca, mas, sabendo os moradores de Pernambuco este destroo, se ajuntaram e tornaram a este rio da Parahyba, com Fructuoso Barbosa, e se tornaram a apoderar d'este forte, o qual Sua Magestade tem agora soccorrido com gente, munies e mantimentos necessrios, a quem se ajuntou uma alda de gentio Tupinamb, que s apartou dos Pitiguares, e . se veiu viver borda da gua, para ajudar a favorecer, este forte. Este rio da Parahyba mui necessrio fortificar-se, uma por tirar esta ladroeira dos francezes'd'elle, . outra pr se povoar, pois a terra capaz para isso, onde se podem fazer muitos engenhos de assucar. E poVoado este rio, como convm, ficam seguros os engenhos da capitania de Tamarac e alguns da de Pernambuco, que no lavram com temor dos Pitiguares, e outros s tornaro a reformar, que elles,queimavam .destruirm. Dos quaes Pitiguares bem que faamos este capitulo, que se segue, antes que saiamos do seu limite..

c-PifE1 xnt tt r&l da mae costumes do gentf Prtijguar No bem que passemos j do rio da Parahyba, onde se acaba 0 limite por phde reside o gentio Pitiguar, que tanto mal tem feito aos moradores das Capitanias de Pernambuco Tamarac, e gente dos navios que t perderam pela costa da Parahyba at o rio-d Maranho. Este geriti senhra. esta costa do Rio Grande at o da Parahyba, onde se confinaram antigamente com outro gentio, que chamam os Cayts, que so seus contrrios, e se faziam Crtilissima guerra uns aos outros, e se fazem ainda agora pela banda do serto onde agora vivem os Gayts, e pela banda do Rio Grande so fronteiros dos Tapuias, que gente mais domestica, com quem esto s vezes de guerra s vezes de paz, e se ajudam uns aos outros contra os Tbajrs', que visirihm' com elles- pela parte do'serto. Costumam estes Pitiguares no perdoarem a nenhum dos contrrios que captivam, porque os matam e comem logo. Este gentio de m estatura^ baeos de cr, como todo o Outro gentio; no deixam crescer nenhns cabellos no corpo seno os da cabea, porque em elles nascendo os arrancam logo ; faliam a lingua dos Tupinambs e Gayts; tm os mesmos costumes e gntilidades, o que declaramos ao diante no titulo dos Tupinambs. Este gentio muito bellicoso, guerreiro e atraioado, e amigo dos francezes, > quem faz; sempre boa companhia, industriado d'elles inimigo dos-portuguezes. So grandes lavradores ds seus mantimentos', de que esto sempre mui providos j e so caadores bons e taes! flecheirs; que no erram flechada que atirem. So grandes pescadores -de1 linha, assim no mar como nos rios de gua doce. Cantam, bailam, comem bebem pela ordem dos Tupinambs,* ondei se declarar miudment sua vide costmes^ que quasi o geral de todo o gentio da costa do Brasill

CAPITULO XIV.

Em que:, se declara acostaro rio da Parahyba. atfla"rc, e quem foi o seu primeiro capito ' "Do rio daParahyba,, que se diz .tambm o -riQ-de S. Dor mingos, ao rio de Jagoaripe, so duas lguas, em o qual entram barcos.Do rio de Jagoaripe ao da Aramama so duas lguas, o qual est em altura de sete gros, onde :entram caravee$.,dos, que navegam entre a - t e r r a e o arrecife. D'este rio < ao da Abionabiaj so duasdeguas,,i. cuja terra alagadia quasi toda, e entre um rio e outro ancoravam os tempos passados nps francezas, e.d'aqui entravam para dentro. D'este. rio ao da Capivarimirim so seis lguas,, o qual est ;em altura de seis gros e meio, cuja terra toda ch. De, Capivarimirim. a Tamarac so seis lguas, e est em sete gros e 1/3. Tamarac uma ilha de duas lguas onde est a cabea d'esta capitania e a vill de Nossa Senhora da Conceio. Do redor d'esta ilha entram no salgado cinco ribeiras em trs das quaes esto trs engendos ; onde se fizeram mais, se no ,fqram os Pitiguares, que vem correndo a terra-, ,,pqr. cima e assolando tudo. At aqui,, como j fica dito,, tem o rio de Tamarac umas barreiras verme-r lhas na ponta,da: barra; e quem houver deentrarpor ella, dentro .ponhrse nordeste sudoeste com as barreirasse entrar a ; barra vontade,, e d'ahi para dentro' o rio ensinar por onde ho de, ir. Por esta barra, entram; navios de cem topeis,, e mais, a qual, fica da banda do sul da ilha,, e a outra, barra da banda do norte se entra ao suste,, pela-,qual se servem! caraveles da costa. De Tamarac ao rio, de Igaru so duas,lguas, aonde se extrema esta capitania da de Pernambuco ; d'esta capitania fez El-Rei D. Joo, II de Portugal merc a Pero Lopes de Sousa,.que foi. um fidalgo muito honrado, o qiial, sendo mancebq, andou, por esta eosta'cont armada': ; sua. custa, em, pessoa foi povoar esta capitania com moradores que pra isso levou do porto de Lisboa de: onde partiu ; no que gastou alguns annos e muitos mil cruzados com muitos trabalhos e perigos, em que se viu assim no mar pelejando com algumas nos francezas que encontrava (do que os francezes nunca sahiram bem),

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como em terra em brigas que com elles teve'de mistura com?os Pitiguar es, de quem foi por vezes cercado e offendido, at que os fez affastar d'esta ilha de Tamarac e vesinhana d'ella : e esta capitania no tem de costa mais de vinte e cinco ou trinta lguas, por Pero Lopes de Sousa no tomar as cincoenta lguas de costa que lhe fez merc S. A. todas juntas, mas tomou aqui a metade e a outra demazia junto capitania de S. V i cente, onde chamam Santo Amaro.
\ CAPITULO XV.

Que declara a costa do rio de, Igaru at Pernambuco A villa de Cosmos est junto ao rio de Igaruc que marco entre a capitania de Tamarac e a de Pernambuco; a qual villa ser de duzentos visinhos pouco mais ao menos, em cujo termo ha trs engenhos de assucar muito bons. Do rio de Igaru ao porto da vila de Olinda so quatro lguas, a qual est em altura de oito gros. N'este porto de 01inda.se entra pela boca de um arrecife, de pedra ao susudoste e.depois norte sul, e, entrando para dentro ao longo do arrecife, fica o Rio Morto pelo qual entram at acima navios de cem toneis at duzentos, tomam meia carga em cima e acabam de carregar onde chamam o Poo, defronte da boca do arrecife, onde convm que os navios estejam bem amarrados, porque trabalham aqui muito por andar n'este porto sempre o mar de levadio ; por esta boca entra o salgado pela terra dentro uma lgua, ao p da villa; e defronte do surgidoro dos navios faz este rio outra volta deixando no meio uma ponta de ara onde est uma ermida do Corpo Santo. N'este lugar vivem alguns pescadores e officiaes da ribeira, e esto alguns armazns em que os mercadores agasalham os assucares e outras mercadorias ; e d'esta ponta da ara da banda de dentro se navega este rio at o varadouro, que est ao p da villa, com caraveles e barcos, e do varadouro pra cima se navega com barcos de navios obra do meia lgua, onde se faz aguada fresca para as nos da ribeira que vem do
TOMO XIV 7

engenho de Jeronymo de Albuquerque : tambm se mettem n'este rio outras ribeiras por onde vo os. barcos dos navios a. buscar-; os assucares aos paos, onde os trazem encaixados e em,carros : este esteiro e limite cio arrecife . muito: farto de peixe de redes que por aqui pescam e do marisco : perto de uma lgua da boca d este arrecife est outro boqueiro, que chamam a Barreta, por onde podem entrar barcos pequenos, estando, o mar bonanoso: d'esta Barreta, por diante corre este arrecife ao longo da terra duas lguas, e entre ella e elle se navega com barcos pequenos quem vem do mar em fora, e quem puzer os olhos na terra em que est situada esta villa, parecer-lhe-ha que o Cabo de Santo Agostinho por ser muito semeli ante a elle.
CAPITULO XVI. , ,

Do, tamanho da-villa de Olinda e da grandeza de. seu termo, quem foi o primeiro, povo.ador d'ella A villa de Olinda^ cabea da capitania de Pernambuco, a, qualpovou. Duarte Coelho, que foi um fidalgo, de cujo -esforo e cavallaria escusaremos, tratar, aqui em particular, por no,escurecer o muito que.d'elle dizem os livros da ndia, de cujos feitos esto cheios. Depois que Duarte Coelho veiu,da ndia a Portugal a .buscar., satisfao de seus: servios, pediu a-S. A. que lhe fizesse, merc de uma capitania n'esta costa, que logo lhe concedeu, abalisando-h'a da boca.,do Rio, de-S.,, Francisco, da;banda do noroeste e correndo d'ella pela costa,, cincoenta lguas contra Tamarac que se acabam no rio de Igaru, como- j fica dito ; e como a este valoroso, capito sobravam sempre espiri.tos para commetter grandes, feitos, no he faltaram para vir em pessoa povoar e conquistar esta sua capitania, onde veiu com uma frota de navios que armou sua custa, em a qual trouxe sua mulher e filhos e muitos, parentes de ambos, e outros moradores com a qual tomou este porto que se diz de Pernambuco, por uma pedra que junto d'elle est furada no mar, que quer dizer pela lingua do gentio, mar furado. Chegando Duarte Coelho a este porto desembarcou n'elle e fortificou-se,- onde agora est a villa

23 em um alto livre de padrastos, da melhor maneira que foi possivel, onde fez uma torre de pedra ecl, que ainda agora est na praa da villa, onde muitos annos teve grandes trabalhos de guerra com o gentio e francezes que em sua companhia andavam, dos ques foi cercado muitas vezes, mal ferido e mui apertado ,onde lhe mataram muita gente ; mas elle com a constncia de seu esforo no desistiu nunca da sua preteno ; e no to smente'se defendeu valorosamente, mas offendeu e resistiu aos inimigos, de maneira que, os fez affastar da povoao e despejar as terras visinhas aos moradores d'ellas, de onde depois seu filho, do, mesmo nome, lhe fez guerra, maltratando e captiyando n'este :genfio, que o que se chama Cayt, que o fez despejar a costa toda, como esta o hoje em dia, e affastar,mais de cincoenta lguas pelo serto. N'estes trabalhos gastou Duarte o velho muitos mil cruza-, dos que adquiriu na ndia, a.qual despeza foi bem empregada, pois d'ella resultou ter hoje seu filho Jorge de, Albuquerque Coelho, dez mil cruzados cie renda, que tanto lhe importa a sua redizima e, dizima do pescado, e os foros que lhe pagam os engenhos, dqs quaes esto feitos em Pernambuco cincoenta, que,fazem tanto ass/uar que,esto os dizimos d'elles arrendados em dezenove mil cruzados cada anno. Esta villa de Olinda ter setecentos visinhos pouco mais ou menos, mas tem muitos mais no seu termq, porque em cada .um d'estes engenhos vivem, vinte e trinta visinhos, fora os que vivem nas roas afastados d'elles, que muita gente; de maneira que, quando fr necessrio ajuntar-se esta gente com armas, pr-se-ho,em campo mais de,trs, mil homens de peleja, cm os moradores, da villa de Cosmos, entre os quaes haver quatrocentos homens, de cavallo. Esta gente.pde trazer de suas fazendas quatro ou cinco mil escravos de(Guin e muitos, cio gentio da terra. to poderosa esja capitania que, ha < n'ella mais de cem homens que tem de mil at, cinco mil cruzados de renda/ e alguns .de oito, dez mil cruzados. D'esta terra ganiram muitos homens ricos. para estes reinos que foram ella muito, pobres, com os quaes entram cada anno d'esta capitania quarenta e cincoenta . navios carregados de "assucar e po-brazil, o qual' o mais fino que se acha em toda a costa ; e importa tanto

24 este po S. Magestade, que o tem agora novamente arrendado por tempo de dez annos por vinte mil cruzados cada anno. E parece que ser to rica o to poderosa, d'onde sahem tantos provimento para estes reinos, que se devia de ter mais conta com a fortificao d'ela, e no consentir que esteja arriscada a um corsrio a saquear e destruir, o que se pde atalhar com pouca despeza e menos trabalho.
CAPITULO XVII

Em que se declara a terra e costa que ha do porto de Olinda at o Gabo de Santo Agostinho. Do porto de Olinda ponta de Pero Cavarim so quatro lguas. Da ponta de Pero Cavarim ao rio de Jaboato uma lgua, em o qual entram barcos. Do rio de Jaboato ao Cabo de Santo Agostinho so quatro lguas. o qual cabo est em oito gros e meio. Aasocairo (Teste cabo da banda do norte podem surgir nos grandes quando cumprir, ondo tem boa abrigada. Do Cabo at Pernambuco corre-se a costa norte sul. Quem vem do mar em fora, para conhecer este cabo de Santo Agostinho, ver por cima d'elle uma serra sellada, que boa conhecena ; porque por aquella parte no ha outra serra da sua altura e feio, a qual est quasi leste oeste com o cabo, e toma uma quarta de nordeste sudoeste. E para quem vem ao longo da costa bota o Cabo fora com pouco mato e em manchas ; e ver-lheho que tem da banda do sul, cinco lguas afastado d'elle, a Ilha de Santo Aleixo, que baixa e pequena. At este Cabo a terra povoada de engenhos de assucar, e por junto d'elle passa um rio que se diz do Cabo (onde tambm esto alguns), o qual sahe ao mar duas lguas do Cabo, e mistura-se ao entrar do salgado com o rio de Ipojuca, que est duas lguas da banda do sul; n'este rio entram e sahem caraveles do servio dos engenhos, que esto nos mesmos rios, onde s recolhem com tempo barcos da costa..

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CAPITULO XVIII

Em

que se declara a costa do Gabo e rio do Ipojuca ate o Rio de 8. Francisco.

J fica dito como se mette'0 rio de Ipojuca com o do Cabo ao entrar no salgado, agora digamos como d'elle ao porto das Gallinhas so duas lguas. A terra que ha entre este porto e o rio de Ipojuca toda alagada. N'este porto e rio das Gallinhas entram barcos da costa. Do rio das Gallinhas ilha de Santo Aleixo uma lgua, em a qual ha surgidoro e abrigo para as nos, e est afastada da terra firme uma lgua ; da ilha de Santo Aleixo ao rio de Maracape so seis lguas ; onde entram caraveles, o qual tem uns ilhos na bocc. De Maracape ao Rio Formoso so duas lguas, o qual tem um arrecife ao mar defronte de si, que tem um boqueiro por onde entram navios da costa, o qual est em nove gros, cuja terra escalvada mas- bem provida de caa. Do Rio Formoso ao de Una so trs lguas, o qual tem. na boca uma ilha de mangues da banda do norte, a qual se alaga com a mar, e mais adiante chegadas terra tem sete ilhetas de mato. N'este rio Una ao porto das Pedras so quatro lguas, o qual est em nove gros e meio. Entre este e o rio Una se faz uma enseada muito grande, onde podem surgir e barlaventear nos que nadem em fundo de cinco at sete braas, porque tanto tem de fundo. E Corre-se a costa do Cabo de Santo Agostinho^ at este porto das Pedras nornordste susudeste. D'este porto ao rio Camaragipe so trs lguas, cuja fronteira de um banco de arrecifes que tem algumas abertas por onde entram barcos da costa, e ficam seguros de todo o tempo entre os arrecifes e a terra. N'este' rio de Camaragipe entram navios de honesto porte, e na ponta da barra d'elle da banda do sul tem umas barreiras vermelhas, cuja terra ao longo do mar escalvada at o rio de Santo Antnio Merim, que est d'elle duas lguas, onde tambm entram caraveles da costa. Do rio de Santo Antnio Merim ao Porto Velho dos Francezes so trs lguas, onde elles costu-

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mam a ancorar com as suas nos e resgatar com o gentio. Do Porto Velho dos Francezes ao rio de S.Miguel so quatro lguas, que est em dez gros, em o qual entram navios da costa, e entre um e outro entra no mar o rio da Alagoa , onde tambm entram caraveles, o qual se diz da Alagoa; por nascer de uma que est afastada da costa, ao qual rio chamam os indios o porto Jarago. Do rio. de S. Miguel ao Porto Novo dos Francezes so duas lguas, defronte do qual fazem os arrecifes que (vo correndo a costa), uma aberta por onde os francezes costumam a entrar com suas nos, e ancoravam entre o arrecife e a terra por ter fundo para isso, onde estavam mui seguros, e d'aqui faziam seu resgate com o gentio. Do Porto Novo dos Francezes ao de Sapetiba uma lgua, do qual ao rio de Currurupe so trs lguas, em o qual entram navios da costa, cuja terra ao longe do mar fraca, mas para . dentro duas lguas arresoada. D'este rio do Currurupe, at o Rio de S. Francisco so seis lguas. Da ponta da barra Currurupe, contra o Rio de S. Francisco se vai armando uma enseada de duas lguas, em a qual bem chegado terra esto os 'arrecifes; de D. Rodrigo, onde tambm se chama o Porto dos Francezes, por se elles costumarem recolher aqui com suas nos abrigada d'esta enseada, e iam por entre os arrecifes e a terra, com suas lanchas, tomar-Carga do po cia tinta no rio de Currurupe. Aqui se perdeu o bispo do Brasil D. Pedro Fernandes Sardinha com sua no vinda da Bahia para Lisboa, em a qual vinha Antnio Cardoso de Barros, provedor mr, que fora do Brasil, e dois conegos e, duas mulheres honradas e casadas, muitos homens nobres e outra muita gente, que seriam mais de cem-pessoas brancas, afora escravos, a qual escapou toda d'este naufrgio, mas no do gentio Cayt, que n'este tempo senhoreava esta costa da bocca cVeste Rio de S.Francisco, at o da Parahyba : depois que estes Cayts roubaram. este bispo e toda esta gente de quanto salvaram, os despiram, e amarraram a bom recado, e pouco a pouco os_ foram matando e comendo, sem escapar mais que dois indios da Bahia com um portuguez que sabia a

27 lingua, filho do meirinho da correio. Aterra que ha por cima d'esta enseada at perto do Rio de S. Francisco toda alagadia, cuja gua se ajunta toda em uma ribeira, que se d'ella faz, a qual vai entrar no Rio de S. Francisco duas lguas da barra para cima ; corre-se a costa do Rio de S. Francisco at o porto das Pedras nornord.este susudoeste, e toma da quarta de norte. sul.
* CAPITULO XIX.

Que trata de quem so estes Cayts, que foram moradores na costa de Pernambuco. Parece que no bem que passemos adiante do Rio de S. Francisco sem dizermos que gentio este Cayt, que tanto mal tem feito aos portuguezes n'esta costa, o que agora cabe dizer d'elles. Este gentio nos primeiros annos da conquista d'este estado do Brasil senhoreou d'esta costa da boca do Rio de S. Francisco at o .rio Parahyba, onde sempre teve guerra cruel com os Pitiguares, e se matavam e comiam uns aos outros em vingana de seus dios, para execuo da qual entravam muitas vezes pela terra dos Pitiguares e lhes faziam muito damno. Da banda do Rio de S. Francisco guerreavam estes Pitiguares em suas embarcaes com os Tupinambs, que viviam da outra parte do rio, em cuja teria entravam a fazer seus saltos, onde captivavam muitos, que comiam sem lhes perdoar. > As embarcaes, de que este gentio usava, eram de uma palha comprida como a das esteiras de taba, que fazem em Santarm, a que elles chamam periper, a qual palha fazem em molhos muito apertados com umas varas como vime, a que elles chamam timbs, que so muito brandas e rijas, e com estes molhos atados em umas varas grossas faziam uma feio de embarcaes, em que cabiam dez a doze indios, que se remavam muito bem, e n'ellas . guerreavam com os Tupinambs n'este Rio de S. Francisco, e se faziam uns a outros muito damno. E aconteceu por muitas

vezes fazerem os Gayts d'esta palha tamanhas embarcaes, que vinham n-ellas ao longo da costa fazer seus saltos aos Tupinambs junto da Bahia, que so cincoenta lguas. Pela parte do serto, confinava este gentio com os Tapuias e Tupinas, e se faziam_ cruis guerras, para cujas aldas ordinariamente havia fronteiros, que as corriam e salteavam. E quando os Cayt, matavam, ou captivavam alguns contrrios d'estesy tinham-no por mr honra, que no quando faziam outro tanto aos Pitiguares nem aos Tupinambs, Este gentio da mesma cr baa, e tem a vida e costumes dos Pitiguares, e a mesma lingua que em tudo como a dos Tupinambs, em cujo titulo se dir muito de suas geritilidades. So estes Gayts mui bellicosos e guerreiros, mas mui atraioados e sem nenhuma f nem verdade, o qual fez os damnos, que fica declarado, gente da no do bispo, a Duarte Coelho, e a muitos navios e caraveles, que se perderam n'esta costa, dos quaes no escapou pessoa nenhuma, que no matassem e comessem, cujos damnos Deus no permittiu, que durassem mais tempo; mas ordenou de os destruir d'esta maneira. Confederaram-se os Tupinambs seus visinhos com os Tupinas pelo serto, e ajuhtaram-se uns com os outros pela banda de cima, d'onde os Tapuias tambm apertavam estesCayts, e deram-lhe nas costas, e de tal feio os apertaram, que os fizeram descer todos para baixo, junto do mar, onde os acabaram de desbaratar ; e os que no puderam fugir para a serra do Aquetiba no escaparam de mortos ou 'captivos. D'estes captivos iam comendo os vencedores quando queriam fazer suas festas, e venderam d'elles aos moradores de Pernambuco e aos da Bahia infinidade de escravos a troco de qualquer cousa, ao que io ordinariamente caraveles de resgate, e todos vinham carregados d'esta gente, a qual Duarte Coelho de Albuquerque por sua parte acabou de desbaratar. E d'esta maneira se consumiu este gentio, do qual no ha agora seno o que se lanou muito pela terra dentro, ou se misturou com seus contrrios sendo seus escravos, ou se aliaram por ordem de seus casamentos.

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Por natureza so estes Gaites grandes msicos e amigos de bailar, so grandes pescadores de linha e nadadores, tambm so mui cruis uns para os outros para se venderem, o pai aos filhos, os irmos e parentes unr aos outros ; e de maneh a so cruis, que aconteceu o anno de 1571 no Rio de S. Francisco estando n'elle algumas embarcaes da Bahia resgatando com este gentio. em uma de um Rodrigo Martins, estava^n alguns escravos resgatados, em que entrava uma india Gaite, a qual enfadada de lhe chorar uma criana sua filha a lanou no rio, onde andou de baixo para' cima um pedao sem se afogar, at que de outra embarcao se lanou um indio a nado, por mandado de seu senhor que a foi tirar; onde a baptizaram e. durou depois alguns dias. E como no titulo dos Tupinambs se conta por extenso a vida e costumes, que toca mr parte do gentio que'vive na*costa do Brasil, temos que basta o que est dito at agora dos Gaites.
CAPITULO x x

Que trata da grandeza do Rio de 8. Francisco e seu nascimento. Muito havia que dizer do Rio de S. Francisco, se lhe coubera fazel-o n'este lugar, do qual se no pode escrever aqui o que se deve dizer d'elie, porque ser escurecer tudo o que temos dito, e no se pode cumprir com o que est dito e promettido, que tratar toda a costa em geral, e em particular da Bahia de Todos os Santos, a quem necessrio satisfazer com o devido. E este rio contente-se por ora de se dizer d'elle em somma o que fr possvel n'este capitulo, para com brevidade chegarmos a quem est esperando por toda a costa. Est o Rio de S. Francisco em altura de dez gros e um quarto, a qual tem na bocca da barra duas lguas de largo, por onde entra a mar com o salgado para cima duas lguas somente, e d'aqui para cima gua doce, que a mar faz recuar outras duas lguas, no havendo gua do monte. A este rio chama o gentio o Par,

30 o qual mui nomeado entre todas as naes, das quaes foi sempre muito povoado, e tiveram uns com outras sobre os sitios grandes guerras, por ser a terra muito frtil pelas suas ribeiras, e por acharem n'elle grandes pescarias. , , Ao longo d'este rio vivem agora alguns Gaites,^ de uma banda, e, da outra vivem Tupinambs; mais acima vivem os Tapuias de differentes castas, Tupinas, Am,oipiras, Ubirjras e Amazonas; e almd'ellas, vive outro gentio (no tratando dos que ommunicam com os portuguezes), que se atavia com jias de ouro, de que ha certas informaes. Este gentio se affirma viver vista da Alagoa Grande, to^afamada e desejada de descobrir, da qual este rio nasce. E to requestado este rio d todo o gentio, por ser muito farto de pescado e caa, e por a terra d'elle ser muito frtil como j fica dito: onde se do mui bem toda a sorte de mantimentos naturaes da terra. ~ Quem navega por esta oosta conhece este rio quatro e. cinco lguas ao mar por as aguagens, que d'elle sahem furiosas e barrentas. Navega-se este rio com caraveles at a cachoeira, que estar da,barra vinte lguas, pouco mais ou menos, at ondetemmuitas ilhas, que o fazem espraiar muito mais que na barra, por onde entram navios de cincoenta toneis pelo canal do sudoeste, que mais fundo que o. do nordeste. Da barra d'este rio at primeira cachoeira ha mais de 300 ilhas; no inverno no traz este rio gua do monte, como os outros, nem corre muito; e no vero cresce de dez at quinze palmos. E comea a vir esta aguado monte, d e > Outubro por diante at Janeiro, que fora do vero nestas partes; e n'este tempo se alagam a mr parte d'estas ilhas, pelo que no criam nenhum arvoredo nem mais que canas bravas de qu se fazem flechas. Por cima d'esta cachoeira, que de pedra viva, tambm se pde navegar este rio em barcos, se se l fizerem, at o sumidouro, que pde estar da cachoeira oitenta ou noventa lguas, por onde tambm tem muitas ilhas. Este sumidouro se entende no lugar, onde este rio sahe de debaixo da terra, por onde vem escondido dez ou doze lguas, no cabo das quaes arrebenta at onde se

- 31 pde navegar, e faz seu caminho at o mar. Por cima 'este sumidouro est a terra cheia de mato, sem se sentir que vai o rio por baixo, e d'este sumidouro para cima se pde tambm navegar em barcos; se os fizerem l: os indios se servem por elle em canoas, que para isso fazem. Est capaz este rio para se perto da barra d'elle fazer uma povoao valente de uma banda, e da outra para segurana dos navios da costa, e dos que o tempo alli faz chegar, onde se perdem muitas vezes^e podem os moradores, que n'elle vivem, fazer grandes fazendas e engenhos at a cachoeira, em derredor da qual ha muito po-brasil, que com pouco trabalho se pde carregar. Depois que este Estado se descobriu por ordem dos reis passados, se trabalhou muito por se acabar de descobrir este rio, por todo o gentio que n'elle viveu, e por elle andou affirmar que pelo seu serto avia serras de ouro e prata; conta da qual informao se fizeram muitas entradas de todas as capitanias sem poder ningum chegar ao cabo; com este desengano e sobre esta preteno veiu Duarte Coelho a Portugal da sua capitania de Pernambuco a primeira vez, e da segunda tambm teve desenho; mas desconcertou-se. com S. A. pelo no fartar das honras que pedia. E sendo governador d'este Estado Luiz de Brito de Almeida mandou entrar por este rio acima a um Bastio Alvares, que se dizia do Porto Seguro, o qual trabalhou por descobrir quanto poude, no que gastou quatro annos e um grande pedao da Fazenda d'El-Rei, sem poder chegar ao sumidouro, e por derradeiro veiu acabar com quinze ou vinte homens entre o gentio Tupinamb, cujas mos foram mortos ; o que lhe aconteceu por no ter cabedal de gente para se fazer temer, .e por querer fazer - esta jornada contra gua; o que no aconteceu a Joo Coelho de Sousa, porque chegou acima do sumidouro mais de cem lguas, como se ver do roteiro que se fez da sua jornada. A' boca da barra d'este rio corta o salgado a terra da banda do sudoeste, e faz ficar aquella ponta de ara e mato em ilha, que ser de trs lguas de comprido. E quando este rio enche com gua do monte no entra o salgado com a mar por elle acima,

mas at barra gua doce, e traz nveste tempo grande correnteza.


CAPITULO XXI

Em que se declara a costa do Rio de S. at o de Sergipe.

Francisco

Do Rio de S. Francisco ao de Guaratiba so duas lguas, em o qual entram barcos da costa, e tem este rio na boca uma ilha, que a que vem da ponta da barra do Rio de S. Francisco: este rio se navega pela_ terra dentro trs lguas, e faz um brao na entrada junto do arrecife, por onde entra o salgado at entrar no Rio de S. Francisco uma lgua da barra, por onde vo barcos de um rio ao outro, o qual brao faz a ilha declarada. Do rio de Guaratiba sete lguas est um riacho.a que chamam de Aguaboa, pelo ella ser, o qual, como chega perto do salgado, faz uma volta ao longo d'elle, fazendo uma lingua de terra estreita entre elle e o mar; de uma lgua de comprido, e no cabo d'esta lgua se metteo mar: entre um rio e outro tudo praia de ara, onde se chama a enseada de Vazabarris, qual tem diante de si tudo arrecifes de pedra, com alguns boqueires para barcos pequenos, por onde podem entrar com bonana. D'esse riacho de Aguaboa a uma lgua est o rio de Ubirapatiba, por cuja barra podem entrar barcos e caraveles da costa com a proa ao lesnoroeste. A este rio vem o gentio Tupinamb mariscar, por achar por aquelles arrecifes muitos polvos, lagostins e caranguejos ;ea pescar linha, onde matam muito peixe, o qual se navega pela terra dentro mais de trs lguas. D'este rio Ubirapatiba a sete lguas est o rio de Seregipe em, altura de onze gros e dois teros, por cuja barra com bateis diante costumavam entrar os francezes com suas nos do porte de cem toneis para baixo, mas no tomavam dentro mais que meia carga, e fora da barra acabavam de carregar com suas lanchas, em que acabavam ' de acarretar o po que alli resgatavam com os Tupinambs, onde tambm resgatavam com os mesmos algodo e pimenta da terra. Tem este rio duas lguas por elle acima a terra fraca, mas d'ahi avante muito boa

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para se poder povoar, onde convm muito que se faa uma povoao, assim para atalhar que no entrem alli francezes, como por segurar aquella costa do gentio que vive por este rio acima, o qual todos os annos faz muito damno, assim nos barcos, que entram n'ella e no Rio Real no inverno com tempo, como em homens, que commettem este caminho para Pernambuco fugindo justia, e nos que pelo mesmo respeito fogem de Pernambuco para a Bahia; os quaes de maravilha escapam que os/no matem e comam. Tem este rio de Seregipe na barra de baixamar trs braas, e dentro cinco e seis braas, cuja barra se entra lessueste e oesnoroeste, e quem quer entrar pelo boqueiro do baixio vai com a proa ao norte; e como est dentro a loesnoroeste va demandar a ponta do sul, e d'ella para dentro se vai ao norte; e quem vem de mar em fora ver por cima d'este rio um monte mais alto que os outros, d feio de um ovo, que est afastado da barra algumas seis lguas, pelo qual a terra bem conhecida.- A este monte chamam os indios Manhana, que quer dizer entre elles espia, por se ver de todas as partes de muito longe. E corre-se a costa d'este rio ao de S-' Francisco nornordeste susudoeste.
CAPITULO XXII

Em qne se declara a costa do rio Seregipe at o Rio Real. D'este rio de Seregipe, de que acima dissemos, a quatro lguas est outro rio, que se diz do Cotigipe, cujaboca de meia lgua; no meio do qual tem uma ilha em que tem umas moitas verdes, a qual ilha faz duas barras a este rio ;pela do sul podem entrar navios de oitenta toneis, porque no mais debaixo tem de fundo duas braas de baixamar, e mais para dentro tem cinco ,braas; pela barra do norte entram caraveles da costa. Tem este rio boca da barra uns bancos de ara que botam meia lgua ao mar. Por este rio se navega trs lguas, que tantas entra a mar por elle acima, o qual muito farto de peixe e marisco, cuja terra soffrivel para se poder povoar, e no serto d'ella tem grandes matas de po-brasil.

34 D'este rio de Cotigipe ao rio de Pereira, a que outros^ chamam de Cannafistula, so quatro lguas. Do qual at Seregipe faz a terra outra enseada, a que tambm chamam de Vazabarris, no. seio da qual est o rio de Cotigipe, de que j falamos, a que muitos chamam do nome da; enseada. Do rio de Pereira duas lguas est a ponta do Rio Real, d'onde m corre a costa at Seregipe, nornordeste susudoeste,
CAPITULO XXIII

Que trata do Rio Real e seus merecimentos: ':'^QB Parece que quem tem tamanho nome como o Rio Real, que deve de ter merecimentos capazes d'elle, os quaes convm que venhamf a terreiro, para que cheguem noticia de todos. E comecemos na altura, em que est, que so doze gros escaos : s ,a barra d'este rio ter de ponta a ponta meia lgua, em a qual tem dois canaes, por onde entram navios da costa de quarenta toneladas, e pela barra do sudoeste podem entrar navios de sesenta toneis, estando com as balizas necessrias, porque tem dois mares em flor : da barra para dentro. tem o rio muito fundo, onde se faz uma bahia de mais de uma lgua onde os navios tm grande abrigada com todos tempos, em a qual ha grandes pescarias de peixe boi, e de toda a outra sorte de pescado, e tem muito marisco. Entra a mar por este rio acima seis ou sete lguas, e divide-se em trs ou quatro esteiros onde se vm metter outras ribeiras de gua doce. At onde chega o salgado, a terra fraca e pouca d'ella servir de mais que de criaes de gado : mas d'onde se acaba a mar para cima a t e r r a muito boa e capaz para dar todas as novidades, do que lhe prantarem, em a qual se podem -fazer engenhos de assucar, por se darem n'ella as canas muito bem. Pelo serto d'este rio ha muito po-brasil, que com pouco trabalho todo pde vir ao mar, para se poder carregar para estes reinos. E para que esta costa esteia segura do gentio, e os francezes desenganados de no poderem vir resgatar com elle entre a Bahia e Pernam-

35 buco, convm ao servio de S. Magestade, que mande , povoar e fortificar este rio, o que s pde fazer com pouca, despeza de sua Fazenda, do que j El-Rei D. Sebastio, que est em gloria, foi informado; e mandou mui afincadamente a Luiz de Brito, que n'este tempo governava este Estadq, que ordenasse com muita brevidade como se povoasse este rio, no que elle metteu todo o cabedal, mandando a isso Garcia d'Avila, que um dos principaes moradores da Bahia, com muitos homerfS das ilhas e da terra, para que assentassem uma povoao onde parecesse melhor; o que fez pelo rio acima trs lguas, onde o mesmo governador foi em pessoa com a fora da gente que havia na Bahia, quando foi dar guerra ao gentio cUaquella parte, o qual passou por esta nova povoao, de cujo* sitio elle e toda a companhia se descontentaram : e com razo; porque estava longe do mar, para se valerem da fartura d'elle, e longe da terra boa, que lhe pudesse responder com as novidades costumadas. D'onde se afastaram por temerem o gentio que por alli vivia; ao qual Luiz de Brito deu tal castigo n'aquelle tempo, como se no deu n'aquellas partes, por que mandou destruir os mais valorosos e maiores dos corsrios capites tUaquelle gentio, que nunca houve n'aquella costa, sem lhe custar a vida a mais que a dois escravos, os quaes principaes do gentio foram mortos, e os seus que escaparam com vida ficaram captivos. E quando se o governador recolheu, se despovoou este principio de povoao, sem se tornar mais a bulir n'isto; por se entender ser necessrio fazer-se uma casa forte custa de S. A., a qual Luiz de Brito no ordenou por ser chegado o cabo de seu tempo, e succeder-lhe Loureno da Veiga, que no buliu n'este negocio pelos respeitos, que. no so sabidos, para se aqui declararem.

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CAPITULO XCIV

Em que se declara a- terra que ha do Rio Real, at o rio de Itapocur. Do Rio Real ao de Itapocur so quatro lguas, sem de um rio a outro haver na costa por onde entre um barquinho, por tudo serem arrecifes ao longo da costa, cuja terra ao longo d'ella muita fraca, que no serve se no para criaes de gado. A boca d'este rio muito suja de pedras, mas podem-se quebrar umas pontas de baixamar de guas vivas, com que lhe fique canal aberto, para poderem por elle entrar caraveles da' costa de meia gua cheia por diante. Da boca' d'este rio pra dentro faz-se uma maneira de bahia, onde de baixamar podem nadar nos de duzentos toneis: entra a mar por este rio acima cinco lguas ou seis, as quaes se podem navegar com barcos ; e onde se mistura o salgado com gua doce para cima dez ou doze lguas se pde tmbem navegar com barquinhos pequenos; e por aqui acima a terra muito boa para se poder povoar, porque d muito bem todos os mantimentos, que lhe plantam, e dar muito bons cannaviaes de assucar, porque quando Luiz de Brito foi dar guerra ao gentio do Rio Real, se acharam pelas roas (Testes indios, que viviam ao longo d'este rio, mui grossas e mui formosas cannas de assucar, pelo que povoando-se este rio, se podem fazer n'elle muitos engenhos de assucar, porque tem ribeiras que se n'elle mettem muito acommodadas .para isto; n'est.e mesmo tempo se achou entre este rio e o Real, cincoenta ou sessenta lguas pelo serto, uma lagoa de quinhentas braas de comprido e cem de largo, pouco mais ou menos, cuja gua mais salgada que a do mar, a qual alagoa estava cercada de um campo todo cheio de perrexil muito mais vioso que o que nasce ao longo do mar, e tocado por fora nos beios era to salgado como se lhe dera o rocio do mar; n'este mesmo campo afastado d'esta alagoa quinhentas ou sescentas braas estava outra alagoa, ambas em um andar, cuja gua era muito doce, e o peixe que ambas tinham era da mesma sorte, e em ambas havia muitos porcos d'agua, dos quaes os gentios

37 matou muita quantidade d'elles. Este rio perto do mar muito farto de pescado e marisco, e para cima de peixe de gua doce, e pela terra ao longo d'elle tem muita caa de toda a sorte, o qual no vero traz mais gua que o Mndego, e est em doze gros: cujo nascimento para a banda -do loeste mais de cem lguas do mar, e est povoado do gentio Tupinamb.
CAPITULO x x v

Em que se declara a terra, que ha do Itapocur at Tatuapar. v Do rio Itapocur a Tatuapar so oito ou nove lguas, cuja terra ao longo, do mar muito fresca e baixa, e no serve se no para criao de gado," mas duas lguas pela terra dentro soffrivel para mantimentos, pela qual atravessam cinco rios e outras muitas ribeiras, que" vm sahir ao mar n'estas oito lguas; de que no ha que tratar, por se metterem no mar por cima dos arrecifes sem fazerem barra por onde possa andar um barquinho; porque toda esta costa do Rio Real at Tatuapar ao longo do mar cheia de arrecifes de pedra, que se espraiam' muito, por onde no . possivel lanarse gente em terra, nem chegar nenhum barco se no for no Itapocur, como fica dito. Tatuapar uma enseada, onde se mette um riacho d'este nome, em o qual entram caraveles da costa com preamar: n'esta enseada tm os navios muito boa abrigada e surgidoro, de que se aproveitam os que andam pela costa. Aqui tem Garcia d'vila, que um dos principaes e mais ricos moradores da cidade do Salvador, uma povoao com grandes edifcios de casas de sua viVnda, e uma igreja de Nossa Senhora, mui ornada, toda de abobada, em a qual tem um capello que lhe ministra os Sacramentos.. Este Garcia d'vila tem toda sua fazenda em criaes de vaccas e guas, e ter alguns dez curraes por esta terra adiante: e os padres da companhia tem n'este direito uma alda de indios forros Tupinambs, a qual se chama de Santo Antnio, onde haver mais de trezenTOMO xiv 9

38 tos homens de peleja; e perto d'esta aldea tem os padres trs curraes de vaccas, que grangeam, os quaes tem na alda uma formosa igreja de Santo Antnio, e um recolhimento onde esto sempre m padre de missa e um irmo, que doutrinam estes indios na nossa santa f catholica, no que os padres trabalham todo o possvel; mas por demais, porque este gentio to brbaro, que at hoje no-ha nenhum que viva como christo, tanto que se apartam da conversao dos padres oito dias. Esta enseada de Tatuapar)est em. altura de doze gros esforados, e corre-se a costa d'aqui at o Rio Real nornordeste susudoeste.
CAPITULO XXVI

Em que se declara a terra e costa de Tatuapar o rio de Joanne.

at

De Tatuapor ao rio Jacoipe so quatro lguas, as quaes ao longo do mar, esto occupadas cm curraes de gado, por serem de. terra baixa e fraca; os quaes curraes so de Garcia d'vila e de outras pessoas chegadas sua casa. De Tatuapar at este rio no ha onde possa entrar um barco seno n'este rio de Jacoipe e aqui com bonana ainda, com trabalho; mas atraz uma lgua, onde se chama o porto, de Braz Affonso, onde os arrecifes, que vm de Tatuapar, fazem uma aberta, podem entrar caraveles, e do arrecife para dentro ficam seguros com todo tempo. Este rio de Jacoipe se passa de baixamar acima da barra uma lgua a vo, ao longo do qual tem o mesmo Garcia d'vila um curral de vaccas. D'este rio de Jacoipe at o rio de Joanne so cinco lguas, at onde so tudo arrecifes, sem haver onde possa entrar um barco, seno onde chamam o porto de Arambepe onde os arrecifes fazem outra aberta, por onde com bonana podem entrar barcos, e ficarem dentro dos arrecifes seguros. De Jacoipe a Arambepe so duas lguas oxide se perdeu a no Santa-Clara, que ia para a ndia, estando sobre amarra, e foi tanto o tempo que sobreveiu, que a fez ir cacea, que foiforado cortarem-lhe o mastro grande,

39 o que no bastou para se remediar, e os officiaes da ho desconfiados da salvao, sendo meia noite deram vella do traquete para ancorarem em terra e salvarem as vidas ; o que lhe succedeu pelo contrario ; porque sendo esta costa toda limpa, afastada dos arrecifes, foram varar por cima de uma lage, no se sabendo outra de Pernambuco at a Bahia, a qual lage est um tiro de falco ao mar dos arrecifes, onde se esta no fez em pedaos, e morreram n'este naufrgio passair'e-de trezentos homens, com'Luiz de Alter de Andrade, que ia por capito. Toda esta terra at o rio de Joanne, trs lguas do mar para o serto, est povoada de curraes de vaccas de pessoas diversas ; e n'esta comarca, trs lguas do mar, tem os padres da companhia duas aldas de indios forros Tupinambs, e de outras naes, em as quaes tero# setecentos homens de peleja pelo menos; os quaes os padres doutrinam, como fica dito, da alda cie Santo Antnio. Esfoutras se dizem, uma de Santo Espirito, e a outra de S. Joo ; onde tm grandes igrejas da mesma advocao recolhimento para os padres, que n'ellas rezidem e para outros que muitas vezes se l vo recrear. E sombra e circuito d'estas aldas tm quatro ou cinco curraes de vaccas ou mais, que grangeam, de que se ajudam a sustentar. Por onde estas aldas esto a terra boa, onde se do todos os mantimentosda terra muito bem, por ser muito fresca com muitas ribeiras de gua; n'este limite lana o mar fora todos os annos muito mbar pelo inverno, que estes indios vo-buscar, o qual do aos padres. E corre-se esta costa de Tatuapar at este rio de Joaane.nornordeste susudoeste.
CAPITULO XXVII

Em que se declara a costa do rio de Joanne at a Bahia. O rio do Joanne traz tanta gua, quando se mette no mar, como o Zezere quando se mette no Tejo, o qual entra no mar por cima dos arrecifes, onde espraia muito, o qual se passa de mar vazia a vo por junto da barra; mas no pde entrar por ella nenhuma jangada por ser

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tudo pedra viva, e de preamar no tem sobre si trs palmos de gua, a qual anda alli sempre mui levantada, Este rio est em altura de doze gros e dois teros. D'este rio at Tapoam so trs lguas, cuja terra baixa e fraca, c no serve ao longo do mar mais que para gado; e at quatro lguas pela terra dentro est este limite e a terra d'elle occupada com curraes de vaccas. Esta Tterra e outra tanta alm do rio de Joanne do concelho da cidade do Salvador, A Tapoam uma ponta sabida ao mar, com uma pedra no cabo cercada d'elle,,a que o gentio chama d'este nome, que quer dizer pedra baixa': defronte d'esta ponta, em um alto, est uma fazenda de Sebastio Luiz, com hermida de S. Francisco. Esta ponta a que na carta de merear se chama os Lenes de Ara, por onde se conhece a entrada da Bahia ; e para o serto, duas lguas est uma grossa fazenda de Garcia d'AviIa com outra hermida de S.. Francisco mui concertada e limpa. D'esta ponta de Tapoam duas lguas est o rio Vermelho, que uma ribeira assim chamada que se aqui vem metter n mar,, at onde so tudo arrecifes cerrados sem entrada nenhuma. N'este rio Vermelho pde desembarcar gente com. bonana, e estarem barcos da costa ancorados n'esta bocca d'elle,no sendo travessia na costa nem ventos mareiros: at aqui est toda a terra ao longo do mar occupada com criaes de gado vaccum. E pela terra dentro duas lguas, temos padres da companhia uma grossa fazenda com dois ' curraes de vaccas, em a qual tm umas casas de refrigerio, onde se vo rei crear e convalescer das enfermidades, eTTlnOolgar |22I5S2^ e s ; onu tem um jardim muito fresco, com 'um formos^Tahqne de gua, e uma hermida muito concertada, onde os padres, quando l esto, dizem missa. D'este rio Vermelho at a ponta do Padro .uma lgua, e corre-se a costa do rio - de Joanne ponta do Padro nornordeste sudoeste.
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CAP7TUL0, XXVI1
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Em que se declara como Francisco Pereira Goutinho foi povoar a Bahia de Todos os Santos e os trabalhos que n'isso teve Quem quizer saber quem foi Francisco Pereira Coutinho, la os livros da Indi,'esabel-o-ha;e vero seu grande valqr e hericos feitos dignos de differente descano do* que teve na conquista do Brasil, onde lho coube por sorte a capitania da Bahia de Todos os Santos, de que lhe El-Rei D. Joo III, de gloriosa memria fez merc, pela primeira vez, da terra que ha da ponta do Padro at o Rio de S. Francisco ao longo do mar, e para o serto de. toda a terra que couber na demarcao d'este Estado, e lhe fez merc da terra da Bahia com seus recncavos. E como este esforado capito tinha animo incansvel, no receou de ir povoar a sua capitania em pessoa, e fez se prestes com muitos moradores casados e outros solteiros, que embarcou em uma armada, que fez sua custa, com a qual partiu do porto de Lisboa. E com bom vento fez a sua viagem at entrar na Bahia e desembarcou da ponta do Padro d'ella para dentro, e fortificou-se, onde agora chamam a Villa Velha ; em o qual sitio fez uma povoao e fortaleza sobre o mar, onde esteve de paz como gentio os primeiros annos, no qual tempo os moradores fizeram suas roas e lavouras. D'esta povoao para dentro fizeram uns homens poderosos, que com elle foram, dois engenhos de assucar, que depois foram queimados pelo gentio, que se alevantou, e destruiu todas as roas e fazendas, pelas quaes mataram muitos homens, e nos engenhos quando deram n'elles. Pz. este alevantamento a Francisco Pereira em grande aperto ; porque lhe cercaram a villa e fortaleza, tomando-lhe a gua e mais mantimentos, os quaes n'este tempo lhe vinham por mar da capitania dos ilheos, os quaes iam buscar da villa as embarcaes, com grande risco dos cercados,, que estiveram n'stes trabalhos, ora cercados, ora com tregoas sete ou oito annos, nos quaes passaram grandes fomes, doenas e mil infortnios, a quem este gentio Tupinamb matava gente cada dia com o que se ia apo-

42 quentando muito : onde mataram um seu filho bastardo,, e alguns parentes e outros homens de nome, com o que a gente, que estava com Francisco Pereira, desesperada de poder resistir tantos annos tamanha e to apertada guerra, se determinou com elle apertando-o que ordenasse de os pr em salvo, antes que se acabasse de consumir em poder de inimigos to cruis, que ainda no acabavam de matar .um homem, quando o espedaavam e comiam.! E vendo este capito sua gente, que j era mui pouca, to determinada, ordenou de a pr em salvo e passou-se por mar com ella em uns caraveles que tinha, para a capitania dos Ilheos : do que se espantou o gentio muito, e arrependido da ruim visinhana que lhe tinha feito, movido tambm de seu interesse, vendo, que como se foram os portuguezes lhe ia faltando os resgates, que lhes elles davam a troco de mantimentos, ordenaram de mandar chamar Francisco Pereira mandando-lhe prometter toda a.paz e boa amizade, o qual recado foi d'elle festejado, e embrcou-se logo com alguma gente em um caravelo que tinha, e outro em que vinha Diogo Alvares, de alcunha o Caramur, grande lingua do gentio, e partiu-se para Bahia, e querendo entrar pela barra dentro, lhesobreveiu muito vento e tormentoso, que o lanou sobre os baixos da ilha de Taparica, onde dou costa; salvou-se a gente toda d'este naufrgio, mas no das mos dos Tupinambs, que viviam n'esta ilha, os quaes se ajuntaram, e traio mataram a Francisco Pereira e a gente do seu caravelo., do que escapou Diogo Alvares com os seus, com boa linguagem. D'esta maneira acabou s mos dos Tupinambs o esforado cavalleiro Francisco Pereira Coutinho, cujo esforo no poderam render os Rumes e Malabares da ndia, e foi rendido d'estes brbaros; o qual no somente gastou a vida n'esta preteno, mas quanto em muitos annos ganhou na ndia com tantas lanadas e espmgardadas, e o que tinha em Portugal, com o que deixou sua mulher e filhos postos no hospital.

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CAPITULO XXIX

Em que se torna a correr a costa e explicar a terra d'ella da ponta do Padro at o rio de Camam No tratamos da, Bahia-mais particularmente por ora, porque lhe no cabe n'este lugar dizer mais, para no seu se dizer o promettido ; pois sua conta se fez outro, memorial, de que pegaremos como acabarmos de cor-* rr a costa,e far-lhe-hemos seuofficioda melhor maneira que soubermos. E tornando aponta do Padro d'ella, que est em altura de treze gros esforados: dizemos que d'esta ponta do morro de S. Paulo na ilha de Tinhar so nove ou dez lguas, a qual ponta est em treze gros e meio, e corre-se com a ponta do Padro nordeste sudoeste. Faz esta-ilha de Tinhar da banda sul um morro escalvado, que se diz de S. Paulo, a cuja abrigada ancoram nos de todo o porte, e quem quizer entrar d'esta ponta para dentro pde ir. bem chegado ao morro, e achar fundo de cinco e seis braas. N'esta ilha de Tinhar . junto do morro esteve a primeira povoao da capitania dos Ilhos, d'onde despovoaram logo por no contentar a terra aos primeiros povoadores, a qual ilha est to chegada terra firme que no.mais estreito no ha mais canal que de um tiro de espingarda de terra , terra. . De Tinhar ilha de Boipeba so quatro lguas; esta ilha possuem os padres da companhia do collegio da Bahia, a qual e a de Tinhar esto povoadas de portuguezes, que despejaram a terra firme com medo dos Aymors, que 1 lhe destruram as fazendas e mataram muitos escravos. De Boipeba ao rio de Camam so trs lguas, o qual est em quatorze gros. Tem este rio de Camam uma bocca grande e n'ella uma ilha pequena perto da poma: da banda do norte, o tem bom canal para poderem entrar n'elle nos grandes, as quaes ho de entrar chegadas ponta da banda do sul, onde tem seis e sete. braas de fundo. Da barra d'este rio para dentro tem uma formosa bahia com muitas

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ribeiras que se n'ella mettem, onde se podem fazer muitos engenhos. Este rio muito grande e notvel, e vem de muito longe, o qual se navega do salgado para cima cinco ou seis lguas at cachoeira, que lhe impede no se navegar muitas lguas-, porque pelo serto se pde navegar; porque traz sempre muita gua: cuja terra com dez lguas de costa possuem os padres da companhia por lhe fazer d'ella doao Mem de S; os quaes padres a comearam a povoar, e alguns outros moradores;, mas todos despejaram por mandado dos Aymors que lhes deram tal trato, que os fez passar d'alli para as ilhas de Boipeba e Tinhar. E corre-se a costa d'esta ilha a Camam norte sul pouco mais ou menos.
CAPITULO XXX

Em que se declara a terra qne ha do rio de Camam at os Ilhos Este ri de Camam est em altura de quatorze gros; e d'elle ao das Contas so seis lguas, cuja costa se corre norte sul. Tem este rio das Contas, a que os indios chamam Jussiape, para conhecer quem vem de mar em fora, sobre a bocca uns campinhos descobertos do matto, e ao m a r ' uma pedra como ilho que est na mesma bocca, pela qual entram navios do honesto porte, porque tem fundo e canal para isso bem chegado esta Pedra. Este rio vem de muito longe, e traz mais- gua sempre que o Tejo, o qual se navega da barra para dentro sete ou oito lguas at cachoeira, e d'ella para cima se pde tambm navegar, por ter fundo para isso. E muito farto de pescado e marisco de muita caa, cuja terra grossa e boa, e tem muitas, ribeiras pra engenhos que se vm nietter n'este rio (os quaes se deixam de fazer por respeito dos Aymors, pelo que no est povoado) o qual est em quatorze gros e um quarto. D'este rio das Contas duas lguas est outro rio que se chama Amemoo, e d'elle uroa lgua est outro rio que se chama Japarape,

45 ~ os quaes se passam a vo ao longo do mar, que tambm esto despovoados. De Japarap ao rio de Taipe so trs lguas; este rio de Taipe vem de muito longe, em o qual se mettem muitas ribeiras que o fazem caudaloso, cujo nascimento de uma lagoa que tem em si duas ilhas. Da lagoa para baixo e perto do mar tem outra ilha e um engenho mui possante de Luiz Alvares de Espenha, junto do qual engenho est uma lagoa grande de gua doce em que se tomar muitas arraias e outro peixe do mar e muitos peixes bois, cousa que faz grande espanto, por se no achar peixe do mar em nenhumas alagoas. De Taipe ao rio de S. Jorge, que ' o dos Ilhos, so duas lguas, a qual terra toda boa, e est muito d'ella aproveitada com engenhos de assucar, ainda que esto mui apertados com esta praga dos Aymors; e para se conhecer a barra dos Ilhos, ha se de vir correndo a costa vista da praia para se poderem ver os ilhos, porque so pequenos, e trs; e entre a terra e o ilho grande ha bom surgidoro, e os navios que houverem de entrar no rio vo paio canal que est norte sul como o ilho grande onde os navios, esto ^seguros com todo o tempo, e tambm esto sombra do ilho grande. Este rio tem alguns braos que se navegam com caraveles e barcas para servio dos engenhos que tem ; cuja terra muito frtil e grossa e de muita caa; e o rio tem grandes pescarias e muito marisco, o qual est em altura de quinze gros escassos, e corre-se a costa d'elle ao Rio das Contas, norte sul.
CAPITULO XXXI

Em que se contm como se comeou de povoar a capita-' nia dos Ilhos por ordem de Jorge de Figueiredo Corra. Quando el-rei D. Joo 3- repartiu parte da terra da costa do Brasil em capitanias, fez merc de uma d'ellas, cpm cincoenta lguas de costa, a Jorge de Figueiredo Corra, escrivo da sua Fazenda; a qual se Comea da ponta da Bahia do Salvador da banda
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do sul, que se entende da ilha de Tinhar (como est julgado por sentena que sobre este caso deu Mem de S sendo governador, e Braz Fragoso sendo ouvidor geral e provedor mr do Brasil) e vai correndo ao longo da,costa cincoenta lguas. E como Jorge de Figueiredo por respeito de seu cargo no podia ir povoar esta capitania em pessoa, ordenou de o mandar fazer por outrem, para o que fez prestes custa de sua fazenda uma frota de navios com muitos moradores providos do necessrio para a nova povoao. E mandou por seu logo-tenente a um castelhano muito esforado, experimentado e prudente, que se chamava Francisco Romeiro: o qual partiu do porto de Lisboa com sua frota, e fez sua viagem para esta costa do Brasil, e foi ancorar e desembarcar no porto de Tinhar, e comeou a povoar em cima do morro de S. Paulo, do qual sitio se no satisfez. E como foi bem visto e descoberto do rio dos Ilhos, que assim se chama pelos que tem defronte da barra, d'onde a capitania tomou nome, se passou com toda a gente para este rio, onde se fortificou e assentou a villa de S. Jorge, onde agora est, em a qual nos primeiros annos teve muitos trabalhos de guerra com o gentio ; mas como eram Tupiniquins, gente melhor acondicionada que o outro gentio, fez pazes com elles, e fez-lhe tal companhia que com seu favor foi a capitania em grande crescimento, onde homens ricos de Lisboa mandaram fazer engenhos d assucar, com que se a terra ennobreceu muito ; a qual capitania Jeronymo de Alarco, filho segundo de Jorge de Figueiredo, com licena de S. A. vendeu a Lucas Giraldes, que n'ella metteu grande cabedal com que a engrandeceu, de maneira que veiu a ter oito ou nove engenhos.. Mas deu n'esta terra esta praga dos Aymors de feio, que no ha ahi j mais que seis engenhos, e estes no fazem assucar, nem ha morador que ouse plantar cannas, porque em indo os escravos ou homens ao campo no escapam a estes alarves, com medo dos quaes foge a gente dos Ilhos para a Bahia, e tem a terra quasi despovoada, a qual se despovoar de todo, se S. Magestade com muita instncia lhe no valer. Esta villa foi muito. abastada e rica, e teve quatrocentos ou quinhentos visi-

- 4 7 nhos; em, a qual "est um mosteiro dos padres da companhia, e outro que se agora comea, de S. Bento, e no temnenhuma fortificao nem modo para se defender de quem a quizer afrontar.
CAPITULO XXXII

Em que se declara quem so os Aymors, e costumes.

sua vida

Parece razo que no-passemos avante sem declarar que gentio este a quem chamam Aymors, que'tanto damno tm feito esta capitania ds Ilhos, segundo fica dito, cuja costa era povoada dos Tupiniquins, os quaes a despovoaram com medo d'estes brutos, e se foram viver ao serto ; dos quaes Tupiniquins no ha j n'esta capitania seno duas aldas, que esto junto dos engenhos de Henrique Luiz, as quaes tm j muito pouca gente. Descendem estes Aymors de outros gentios a que chamam Tapuias, dos quaes nos tempos d'atrs se ausentaram certos casaes, e foram-se para umas serras mui speras fugindo a um desbarate em que os, puzeram seus contrrios, onde residiram muitos annos sem verem outra gente ; e os que d'estes descenderam, vieram a perder a linguagem, e, fizeram outra nova que se no entende de nenhuma outra nao do gentio de todo este Estado do Brasil. E so estes Aymors to selvagens que dos outros brbaros, so havidos por mais que brbaros, e alguns se tomaram j vivos em Porto Seguro e nos Ilhos, que se deixaram morrer de bravos sem quererem comer. Comeou este gentio a sahir ao mar no rio das Caravelas junto de Porto Seguro, e corre estes matos e praias at o rio de Camam, e d'ahi veiu a dar assaltos perto de Tinhar, e no descem praia seno quando vm dar assaltos. Este gentio tem a cr do outro, mas so de maiores corpos e mais robustos,e forosos; no tm barbas nem mais cabellos no corpo que os da cabea, porque os arrancam todos; pelejam com arcos e flechas muito grandes, e so tamanhos frecheiros, que no erram nunca tiro; so mui ligeiros maravilha e

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grandes corredores. No vivem estes brbaros em aldas, nem casas, como o outro gentio, nem ha quem lh'as visse nem saiba, nem desse com ellas pelos matos at hoje ; andam sempre de uma para a outra pelos campos e matos, dormem no cho sobre folhas ; e se lhes chove arrimam-se ao p de uma arvore, onde engenham as folhas por cima, quanto os cobre, assentando-se em ccoras; e no se lhe achou at agora outro rasto de gazalhado. No costumam estes alarv.es fazer roas, nem plantar alguns mantimentos ; mantm-se dos fructos silvestres e da caa que matam,-a qual comem crua Ou mal assada, quando tem fogo; machos e fmeas todos andam tosquiados, e tosquiam-se com umas cannas que cortam muito ; a sua falia rouca da voz, a qual arrancam da garganta com muita fora, e no se poder escrever, como vascono. Vivem estes brbaros de saltear toda a sorte de gentio que encontram, e nunca se viram juntos mais que vinte at trinta frecheiros; no pelejam com, ningum de rosto a rosto ; toda a sua briga atraioada, do assaltos pelas roas e caminhos por onde andam, esperando o outro gentio e toda a sorte de creatra em ciladas detraz das arvores cada um per si, d'onde no erram tiro, e todas-as flechas,empregam, e se lhe fazem rosto logo fogem cada um para sua parte; mas como vm agente desmandada, fazem parada e buscam aonde.fiquem escondidos, at que passem os que seguem e do-lhe nas costas, empregando suas flechadas vontade. Estes brbaros no sabem nadar, e qualquer rio que se no passa a vo basta para defenso d'elles; mas para o passarem vo buscar o vo muitas lguas pelo rio acima. Comem estes selvagens carne humana por mantimento, o que no tem o outro gentio que a no come seno por vingana de suas brigas e antigidade de seus dios. A capitania de Porto Seguro e a dos Ilhos, esto destruidas quasi despovoadas com o temor d'estes brbaros, cujos engenhos no lavram assucar por lhe terem morto todos os escravos e gente d'elles, e a das mais. fazendas, e os que escaparam das suas mos lhe tomaram tamanho medo, que em se dizendo Aymors despejam as fazendas, e cada um trabalha por se pr em salvo, o que tambm fazem os homens brancos, dos quaes tm morto estes, alarves de

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vinte e. cinco annos a esta parte, que esta praga persegue estas duas capitanias, mais de trezentos homens portuguezes e de trs mil escravos. Costumm-se ordinariamente cartearem-se os moradores da Bahia com os dos Ilhos, e atravessavam os homens este caminho ao longo da praia, como lhe eonvinha, sem haver perigo nenhum, o que estes Aymors vieram a sentir, e determinaram-se de virem vigiar estas praias e esperar a gente que por ellas passava, onde tem mortos, e com estes muitos homens e muitos mais escravos ; e so estes salteadores tamanhos corredores, que lhes no escapava ningum por ps, salvo os que se lhe mettiam no mar, onde se elles no atrevem a entrar : mas andam-nos esperando que saiam terra at noite que se recolhem; pelo que este caminho est vedado, e no.atravessa ningum por elle se no com muito risco de sua pessoa ; e se seno busca algum remdio para destrurem estes alarves elles destruiro as fazendas da Bahia, para onde vo caminhando de seu vagar. E como elles so to esquivos inimigos de todo o gnero humano, no foi possvel saber mais de sua vida e costumes, e o que est dito pde bastar por ora : e tornemos a pegar da costa comeando dos Ilhos por diante.
CAPITULO XXXIII

Em que se declara a costa do rio dos Ilhos at o Rio Grande. Para satisfazermos com o promettido convm que digamos que terra corre do rio de S Jorge dos Ilhos por diante, cio qual. duas lguas est o rio Cururupe. D'este rio a cinco lguas est outro rio que se chama Patipe, e em nenhum d'elles podem entrar barcos, por no terem,barra para isso, cuja costa de praia e limpa, e a terra por dentro baixa ao longo do m,ar- D'este rio ao Rio Grande so sete lguas, o qual est em quinze gros e meio, e tem na boca trs moitas de mato que do mar parecem ilhas, por onde muito bom de conhecer. Na. ponta da barra da banda do norte da parte de fora tem bom abrigo para ancorarem navios da costa, os

50 quaes entram n'este rio se querem ; em cujo canal na barra tem duas braas, depois uma, e d'ahi por diante trs, quatro e cinco braas. Este rio se navega pr elle acima em barcos oito ou dez lguas ; n'este rio ser uma povoao muito proveitosa por ser muito grande e ter grandes pescarias e muito marisco e caa, cuja terra muito boa, onde se daro todos os mantimentos que lhe plantarem; e corre-se a costa d'este Rio Grande ao dos Ilhos norte sul. Este rio vem de muito longe e traz sempre muita gua e grande correnteza, pelo qual vieram abaixo alguns homens dos que foram serra das Esmeraldas com Antnio Dias Adorno, os quaes vieram em suas embarcaes a que chamam Canoas, que so de um po, que tem a casca muito dura e o mais muito mole, o qual cavacam com qualquer ferramenta, de maneira que lhe deitam todo o miolo fora, e fica somente a casca; e ha d'estas arvores algumas tamanhas, que fazem d'ellas canoas que levam de vinte pessoas para cima. Sebastio Fernandes Tourinho, morador em Porto Seguro, com certos companheiros entrou pelo serto, onde andou alguns mezes ventura sem saber por onde caminhava, e metteu-se tanto pela terra dentro, que se achou em direito do Rio de Janeiro, o que souberam pela altura do sol, que este Sebastio; Fernandes sabia muito bem tomar, e por conhecerem 'a serra dos rgos, que cahe sobre o Rio d,e Janeiro; e chegando ao campo grande acharam alagas, e riachos, que se mettiam n'este Rio Grande : e indo com rosto ao noroeste, deram em algumas serras de pedras, por onde caminharam obra de trinta lguas, e tornando a leste alguns dias deram em uma alda de Tupiniquins junto de um rio, que se chama Razo-Aguipe;' e foram por elle abaixo com o rosto ao norte vinte e oito dias em canoas; em as quaes andaram oitenta lguas. Este rio tem grande- correnteza, e entram n'elle dois rios, um da banda do leste, e outro da banda do loeste, com'os quaes se vem metter este rio Razo-Agipe no Rio Grande E depois que entraram n'elle navegaram nas suas canoas por elle abaixo vinte e quatro dias, em os quaes chegaram ao mar, vindo sempre com a proa ao loeste. E fa-

Si -

zendesta gente sua viagem, achou no serto d*este rio no mais largo d'elle, que ser em meio caminho do mar, vinte ilhas afastadas umas das outras uma lgua, duas e trs e mais; e acharam quarenta lguas de barra, pouco mais ou menos um sumidouro, que vai por baixo da terra mais de uma lgua, quando no vero, que no inverno traz tanta gua, que alaga tudo. Do sumidouro para cima tem este rio grande fundo, e a partes tem poos que tm seis e sete braas, por ond# se pde navegar em grandes embarcaes : equasi toda a terra de longo d'elle muito boa.
|, CAPITDLO XXXIV

Em que se declara a costa do Rio Grande at, o de Santa Cruz. Do Rio Grande ao seu Brao so duas lguas, pelo qual Brao entram caraveles, que por elle vo entrar no mesmo Rio Grande, meia lgua da barra para cima. Do Brao do Rio Grande ao rio Boiquisape so trs lguas, e do Boiquisape ponta dos baixos de Santo Antnio so quatro lguas, e da ponta de Santo Antnio ao seu rio meia lgua : do rio de Santo Antnio ao , de Sernanbiti.be so duas lguas ; e d'este rio de Santo Antnio e da sua ponta at o rio de Sernanbitibe esto uns baixos com canal entre elles e a costa, por onde entram barcos pequenos pela ponta de Santo Antnio ; e mais ao mar ficam uns arrecifes do mesmo tamanho com canal entre uns e outros. E defronte do rio de Santo Antnio tm estes arrecifes do mar um boqueiro, por onde pde entrar uma no e ir ancorar pelo canal, que se faz entre um arrecife e o outro, onde estar seguro; no mesmo arrecife do mar est outro boqueiro, por onde. podem entrar caraveles da costa defronte do rio de Sernanbitibe, pelo qual se pde ir buscar o porto. Do rio de Sernanbitibe ao de Santa Cruz so duas lguas, onde esteve um engenho de assucar. N'este porto de Santa Cruz entram nos da ndia de todo o porte, as quaes entram com a proa a loeste, ,e surgem em uma ensea-

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da como concha, onde esto muito seguras de todo o tempo. Este rio de Santa Cruz est em dezeseis gros e meio, e corre-se a costa do Rio Grande at esta de Santa Cruz nordeste sudoeste, o que se ha de fazer afastado da1 terra duas lguas por amor dos baixos. N'este porto de Santa Cruz esteve Pedro Alvares Cabral, quando.-ia para a ndia, e descobriu esta terra,-e aqui tomou posse d'ella, onde esteve a villa de Santa Cruz, .a qual terra estava povoada ento de Ttupiniquins, que senhoreavam esta costa do rio Camam at$ o de Cricar, de cuja vida e feitos diremos ao diante. Esta villa de Santa Cruz se despovoou d'onde esteve, e a passaram para junto do rio de Sernanbitibe, pela terra ser mais sadia e accommodada para - os moradores viverem. CAPITULO xxxv Em que se declara a costa e terra d'ella do rio de Santa,Cruz at o Porto Seguro, Do rio de Santa Cruz ao de Itacumirim meia lgua: onde esteve o engenho de Joo da Rocha. Do rio de. Itacumirim ao de Porto. Seguro meia lgua ; e entre :.um e outro est um riacho, que se diz de S. Francisco junto das barreiras vermelhas. Defronte do rio de Itacumirim at o de Santa Cruz vai uma ordem de arrecifes, que tem quatro boqueires, por onde entram barcos pequenos ; e faz outra ordem de arrecifes baixos mais ao mar, que se comeam defronte do engenho de Joo da Rocha, e por entre uns arrecifes, e os outros a barra do Porto Seguro, por onde entram navios de sessenta toneis ; e se navio grande, toma meia carga em Porto, Seguro, e vai acabar de carregar em Santa Cruz. Porto Seguro est em dezeseis gros e dois teros, e quem vem de mar em "fora v com boa vigia por amor dos baixos. E para conhecer bem a terra, olhe para ao p da villa, que est em um alto, e ver umas barreiras vermelhas, que bom alvo, ou baliza, para por. elle a conhecer. Entra-se esse rio leste oeste

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com a proa n'estas barreiras vermelhas t entrar dentro do arrecife; e como estiver dentro v com a proa ao sul, e ficar dentro do rio. Da outra ban da dos baixos e contra o sul est outra barra, por onde entram navios do mesmo porte : quem entrar por esta barra, como estiver dentro d'ella, descobrir um riacho, que se diz de S. Francisco; e como o descobrir v andando para dentro at chegar ao porto. De Porto Seguro villa de Santo Amaro uma lgua, onde* est um pico mui alto em que est a hermida de Nossa Senhora d'Ajuda, que fz muitos milagres. De Santo Amaro ao Rio de Tororam uma lgua, onde est um engenho, que foi de Manoel Rodrigues Magalhes, e junto a este engenho uma povoao, que se diz de S. Tiago do Alto, em o qual rio entr-m caraveles, D'este Rio de Tororam ao de Manip so duas lguas, e antes de chegarem a elle esto as barreiras vermelhas, que parecem, a quem vem do mar, rochas de pedras. Do Rio de Maniape ao de Urubuguape uma lgua, onde est o engenho de Gonalo Pires. Do Rio de Urubuguape ao Rio do Frade uma lgua, onde entram barcos, e chama-se do Frade, por se n'elle afogar um nos tempos atraz. Do Rio do Frade o de Juhuacema so duas lguas, onde esteve uma villa que se despovoou o annp de 1564, pela grande guerra que tihha'os moradores d'ella com os Aymors. N'este lugar esteve um engenho, onde chamam a ponta de Crrumbabo CAPITULO xxxvi Em que se declara, quem povoou a capital do Porta Seguro, No , bem que passemos mais avante, sem declararmos cuja esta capitania do Porto Seguro, e quem foi o povoador d'ella ; da qual fez El-Rei D! Joo III de Portugal merc a Pedro de Campos Tourinho, que foi um, cavalleiro natural da villa de Vianna da foz de Lima, homem nobre, esforado, prudente, e muito visto na ai'te do marear ; cuja doao foi de cincoenta lguas de costa, como as mais que ficam declaradas, T O M O xiv 11

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t>ara Pedro do Campo poder povoar esta capitania vendeu toda sua fazenda, e ordenou sua custa uma frota de navios, que fez prestes, em a qual se embarcou com sua mulher Ignez Fernandes Pinto e filhos, e muitos moradores casados, seus parentes e amigos, e outra muita gente, com a qual se partiu do porto de Vianna. E com bom tempo foi demandar a terra do Brasil, e foi- tomar porto no rio de Porto Seguro onde desembarcou com sua , gente, e se fortificou no mesmo lugar, onde agora est a villa cabea d'esta capitania, a qual om tempo de Pedro do Campo floresceu, e fi mui povoada de gente; o qual edificou mais a villa de Santa Cruz, e a de Santo Amaro, de que j falamos; e em seu tempo se ordenaram alguns engenhos de assucar, no que teve nos primeiros anns muito trabalho com a guerra, que lhe fez o gentio Tupiniquim, que vivia n'aquella terra, o qual lh'a fez to cruel, que o teve cercado por muitas vezes, e posto em grande aperto com o que lhe mataram muita gente ; mas como assentaram pazes, ficou o gentio quieto, e d'ahi por diante ajudou aos moradores fazer suas roas, e fazendas, a troco do resgate, que por isso lhe davam. Por morte de Pedro do Campo ficou esta capitania mal governada com seu filho Ferno do C. Tourinho; e apoz elle durou pouco, e se comeou logo a desbaratar ; a qual herdou uma filha de Pedro do Campo, que se chamou Leonor do Campo que nunca casou. Esta Leonor do Campo com licena d'El-Rei vendeu esta capitania a D. Joo de Alencastro, primeiro duque de' Aveiro, por cem mil ris de juro, o qual a favoreceu muito com gente e capito que a governasse, e com navios que ella todos os annos mandava, e com mercadorias : onde mandou fazer sua custa engenho de assucar, e provocou outras pessoas de Lisboa a que fizessem outros engenhos, em cujo tempo os padres da companhia edificaram na villa de Porto Seguro um mosteiro, onde residem sempre dez ou doze religiosos, que governam ainda agora algumas aldas de Tupiniquins christos, que esto n'est.a capitania; em a qual houve em tempo do duque sete ou oito engenhos de assucar,

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onde se lavrava- cada anno muito, que se trazia a este reino, e muito po de tinta; de que na terra ha muito. N'esta capitania se no deu nunca gado vaccum por respeito de certa herva, que lhe faz cmaras, de que vem a morrer; mas d-se outra criao de egoas, jumentos, e cabras muito bem : e de jumentos ha tanta quantidade na terra, que andam bravos pelo mato em bandos, e fazem nojo s novidades; os quaes, ficaram no campo dos moradores, que d'esta capitania se passa-* rm para as outras, fugindo dos Aymors, em qual tem feito tamanha destruio, que no tem j mais que um engenho que faa assucar, por terem mortos todos os escravos dos outros e muitos portuguezes; pelo que esto despovoados, e postos por terra, e a villa de Santo Amaro e a de Santa Cruz quasi despovoadas de todo; e a villa de Porto Seguro est mais damnificada, e falta de moradores, em a, qual se do as cannas de assucar muito bem ; e muitas uvas, figos, roms, e todas as fructas de espinho, onde a gua de flor -finissima, e se leva. a' Bahia a vender por tal. Esta capitania parte com a dos Ilhos pelo Rio Grande pouco mais ou menos, e pela outra parte com a do Espirito Santo, de Vasco Fernandes Coutinho para onde imos caminhando. . -, CAPITULO xxxvn Em que se declara a Urra, e costa do Porto Seguro^ at o Rio das Caravelas. Da villa de Porto Seguro aponta Coruruiubaboso oito lguas, cuja costa se corre norte sul:-esta ponta baixa, e de areia, a qual apparece no cabo do arrecife, e demora ao noroeste, e est em altura de clezesete gros e um quarto. Este arrecife perigoso e corre afastado cia terra lgua e meia. Da ponta de Cururumbabo ao cabo das barreiras brancas so seis lguas, at onde corre este arrecife, que comea da ponta de Cururumbabo, porque at o cabo d'estas barreiras brancas se corre esta costa por aqui, afastado da terra legu e meia. Do cabo das barreiras brancas ao Rio

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Caravelas sb cinco ou seis lguas, em o qual caminho ha alguns baixos, que arrebentam em frol, de que se' h.o de guardar com boa vigia os que por aqui passarem. Defronte de Jucur est uma rodella d baixos, que no arrebentam, que necessrio que sejam bem vigiados: e corre-se ,a costa de Cururumbabo at o rio das Caravelas norte sul, o qual est em dezoito gros. Tem' este rio na boca uma ilha de uma lgua, que lhe faz duas barras, a qual est povoada com fazendas, criaes de vaccas, que se do n'ella muito bem. Por este rio acima entram caraveles da costa, mas tem na boca da. barra muitas cabeas ruins, pelo qual entra mar trs ou quatro lguas, que se navegam p.m barcos. A terra por este rio acima muito boa, em que se do todos os mantimentos, que lhe plantam, muito bem, e pde-se fazer aqui uma povoao, onde os moradores d'ella estaro muitp providos de pescado e mariscos, e muita caa, que por toda aquella terra, ha, Este rio vem de muito longe, e pelo serto povoado do gentio bem acondicionado, que no faz mal aos homens brancos, que vo por elle acima para o serto. Aqui n'este rio foi desembarcar Antnio Dias Adorno com a gente que trouxe da Bahia, quanclo por mandado do governador Luiz de Brito de Almeida foi ao serto no descobrimento das esmeraldas, e foi por este rio acima com cento e cincoenta homens, e quatrocentos ndios de paz e escravos, e todos foram bem tratados e recebidos dos gentios, acharam pelo serto d'este rio das Caravelas.
CAPITULO

XXXVIII

Em .que. se declara a terra que ha do rio das Caravelas at Cricar. Do rio das Caravelas at o rio de Peruipe so trs lguas, , as quaes se navegam pelo canal indo correndo a costa. N'este rio entram caraveles da costa, junto da qual a terr^ faz uma ponta grossa ao mar de

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grande arvoredo, e toda a mais terra baixa, Do direito d'sta ponta se comeam os Abrolhos e seus baixos ; mas entre os baixos e a terra ha fundo de seis e se'te braas uma lgua ao mar somente, por onde vai o canal. . D'este rio Per uipe ao de Mocuripe so cinco lguas, o qual tem na boca uma barreira branca como lenol, por onde bom de conhecer ; o qual est dezoito gros e meio. Por este rio Mocuripe entram caraveles dap costa vontade, e ha mar por elle acima muito grande espao, cuja terra boa e para se fazer conta d'ella para se povoar ; porque ha n'ella grandes pescarias, muito marisco e caa. D'este rio de Mocuripe ao de Cricar so dez lguas, e corre-se a costa do rio das Caravelas at Cricar norte sul, e toma da quarta nordeste sudoeste; o qual rio Mocuripe est em dezoito gros e trs quartos; pelo qual entram navios de honesto porto, e muito capaz para se poder povoar, por a terra ser muito boa e de muita caa, e o rio de muito pescado e marisco, onde se podem fazer engenhos de assucar, por se metterem n'elle muitas ribeiras d3 gua, boas para elles. Este rio vem da muito longe, e navega-se quatro ou cinco lguas por elle acima; o qual tem na barra, da banda do sul quatro abertas, uma lgua, e mais uma da outra, as quaes esto na terra firme por cima da costa, que baixa e sem arvoredo, e de campinas. E quem vem do mar em fora parecem-lhe estas abertas bocas de rios, por onde a terra bpa de conhecer. At aqui senhorearam a costa os Tupiniquins, de quem ,bem que" digamos n'este capitulo que se segue antes que' cheguemos terra dos Goaitacazes. CAPITULO xxxix Em que se declara quem so os Tupiniquins e sua vida e costumes. J fica dito como o gentio Tupiniquim senhoreou e possuiu a terra da costa do Brasil, ao longo do mar, do rio de Camam at o rio de ricar, o qual tem agora

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despovoado toda esta comarca fugindo dos Tupinambs seus contrrios, que os apertaram por uma banda, e os Aymors que os ofiendiam por outra: pelo que se afastaram do-mar, e fugindo ao mo tratamento que lhes alguns homens brancos faziam por serem pouco tememtes a Deus. Pelo que no vivem agora junto do mar mais que os christos de que j fizemos meno. Com este gentio tiveram os primeiros povoadores das capitanias dos Ilhos e Porto Seguro e dos do Esprito. Santo, ns primeiros annos, grandes guerras e trabalhos, de quem receberam muitos damnos; mas pelo tempo adiante vieram a fazer pazes, que se cumpriram e guardaram bem de parte a parte, e de ento para agora foram os Tupiniquins muito fieis e verdadeiros ao portuguezes. Este gentio e os Tupinas descendem, todos de um tronco, e no se tm por contrrios verdadeiros, ainda que muitas vezes tivessem differenas e guerras, os quaes Tupinas lhe ficavam nas. cabeceiras pela banda do serto, com quem a maior parte dos Tupiniquins agora esto mistu-rados; Este gentio da mesma cr baa e estatura- que o outro gentio de que falamos, o qual tem a linguagem, vida e costumes e gentilidades dos Tupinambs, ainda que so. seus contrrios, em cujo titulo se declarar mui particularmente tudo o que se pde alcanar. E ainda que so contrrios os Tupiniquins dos Tupinambs, no ha entre elles na lingua e costumes mais diferena, da que tm os moradores de Lisboa dos da Beira ; mas este gentio mais domstico, e verdadeiro que todo outro da costa-d'este Estado. E' gente de grande trabalho e servio, e sempre nas guerras ajudaram aos portuguezes, contra os Aymors, Tapuias e Tamoios, como ainda hoje fazem esses poucos .que se deixaram ficar junto do mar e das nossas povoaes,- com quem visinham muito bem, os quaes so grandes pescadores de linha, caadores e marinheiros; so valentes homens, caam, pescam, cantam, bailam, como os Tupinambs, enas cousas ,de guerra so mui industriosos, e homens para muito, de quem se faz muita conta a seu modo entre o gentio.

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CAPITULO XL

Em que se declara a costa de Cricar.at o Rio Doce, e do que se descobriu por elle acima, epelo Aceci. Do rio de Cricar at o Rio Doce so dezesete lguas, ,as quaes se correm pela costa norte sul; o qual Rio Doce est em altura de dezenove gros. A terra d'este rio ao longo do mar baixa e afastada da .costa ; por ella dentro tem arrumada uma serra, que parece a quem vem do mar em fora, que a mesma costa. A boca d'este rio esparcelada bem uma lgua e meia ao mar; mas tem seu canal, por onde entram navios de quarenta toneis, o qual rio se navega pela terra dentro algumas lguas, cuja terra ao longo do rio por alli acima muito boa, que d todos os mantimentos' acostumados muito bem, onde se daro muito bons cannaviaes de assucar, se os plantarem, e .se podem fazer alguns engenhos, por ter ribeiras mui accommodadas a elles. Este Rio Doce vem de muito longe e corre at o mar quasi leste oeste, pelo qual Sebastio Fernandes Tourinho, de quem falamos, fez uma entrada navegando por elle acima, at onde o ajudou a mar, com certos companheiros, e entrando por um brao acima, que se chama Mandi, onde desembarcou, caminhou por terra obra de vinte lguas com o rosto a les-sudoeste, e foi dar com uma lagoa, a que o gentio chama boca do mar, por ser muito grande e funda, da qual nasce um rio que se mette n'este Rio Doce, e leva muita gua. Esta lagoa cresce s vezes tanto, que faz grande enchente n'este Rio Doce. D'esta lagoa corre este rio a leste, e d'ella a quarenta lguas tem uma cachoeira ; e andando esta gente ao longo d'este rio, que sahe da lagoa mais de trinta lguas, se detiveram alli alguns dias; tornando a caminhar andaram quarenta dias com, o rosto a loeste: e no cabo d'elles chegaram, aonde se mette este rio no Doce, e andaram n'estes quarenta dias setenta lguas pouco mais ou menos. E como esta gente chegou a este Rio Doce, e o acharam to possante, fizeram n' elle canoas de casca, em que se embarcaram, e foram for alli acima, at onde1 se mette n'este rio outro-

-* 6o * * a que chamam ceci, pelo qual entraram e foram quatro lguas, e no cabo d'ellas desembarcaram e foram por terra com o rosto ao noroeste onze dias, e atravessaram o Aceci, e andaram cincoenta lguas, ao longo d'elle da banda ao sul trinta lguas. Aqu i achou esta gente umas pedreiras, umas pedras vrdongas, e,tomam do azul, que tem que parece turquescoas, e affirmou o gentio aqui visinho, que no cimo d'est monte se tiravam pedras muito azus, e que havia outras que segundo sua informao tem ouro muito descoberto.' E quando esta gente passou o Aceci a derradeira vez, d'alli cinco ou seis lguas da banda do norte achou Sebastio Fernandes uma pedreira de esmeraldas e outra de safiras, as quaes esto ao p de uma serra cheia de arvoredo do tamanho de uma lgua, e quando esta gente ia do mar por este Rio Doce acima sessenta o* setehta lguas da barra acharam umas serras ao longo dp Rio de Arvoredo, equasi todas de pedra, em que tambm acharam pedras verdes ;e inAo, mais acima quatro ou cinco lguas da banda do sul est outra serra, em que affirma o gentio haver pedras verdes e vermelhas to compridas como1 dedos, e outras azues todas mui resplandecentes. D'esta serra para a banda de leste pouco mais de uma lgua est uma serra, que quasi toda de crystal muito fino, a qual cria em si muitas esmeraldas, e outras pedras azues. Com estas informaes que Sebastio Fernandes deu a Luiz de Brito, sendo governador, mandou Antnio Dias Adorno, como ja fica dito atraz, o qual achou ao p d'esta serra d banda do norte as esmeraldas, e da de leste as safiras;. Umas e outras nascem no crystal, d'onde trouxeram muitas e algumas muito grandes, mas todas b -lixas; mas presume-se, que debaixo da terra as deve de haver finas, porque^ estas estavam flor da terra. E n muitas partes achou esta gente pedras desacostumadas de grande peso, que affirmam terem ouro e prata, do que no trouxeram amostras, por no poderem trazer mais que as primeiras e, com trabalho : a qual gente se tornou para o mar pelo Rio Grande abaixo, como j fica dito. E Antnio Dias Adorno, quando foi estas pedras? se

61 recolheu por terra atravessando pelos Tupinas e por entre os Tupinambs, e com uns e outros teve grandes encontros, e com muito trabalho e risco de sua pessoa chegou Bahia e fazenda de Gabriel Soares de Sousa.
CAPITULO XLI

Em que se declara a costa do Rio Doce at o do.. Espirito Santo. Do Rio Doce ao dos Reis Magos so oito lguas ; e faz a terra de um rio ao outro uma enseada grande: o qual rio est em dezenove gros e meio, e corre-se a costa de um. a outro nordeste sudoeste. Na boca d'este rio dos Reis Magos esto trs ilhas redondas, por onde bom de conhecer; em o qual entram navios da costa, cuja terra muito frtil, e boa para se poder povoar; onde se podem fazer alguns engenhos de assur car, por ter ribeiras que n'elle se mettem, mui accommodadas para isso. Navega-se n'pste rio da barra para dentro quatro ou cinco lguas, em o qual ha grandes pescarias muito marisco.; e no tempo que estava povoado de gentio, havia n'elle muitos mantimentos que aqui iam resgatar os moradores do Espirito Santo, o que causava grande fertilidade. Da terra dos Reis Magos ao rio das Barreiras so oito lguas, do qual se faz pouca conta; do rio das Barreiras ponta do Tubaro so quatro lguas, sobre o qual est a serra do Mestre lvaro; da ponta do Tubaro ponta do morro de Joo Moreno so duas lguas, onde est a villa de Nossa Senhora da Victoria: entre uma ponta e outra est o rio do Espirito Santo; o qual tem defronte da barra meia lgua ao mar uma lagoa, de que se ho de guardar. Em direito d'esta ponta da banda do. norte, duas lguas pela terra dentro, est a serra do Mestre lvaro, que grande e redonda, a qual est afastada das outras serras: esta serra apparece, a quem vem do mar em fora, muito longe, que por onde se conhece a barra: esta barra faz uma enseada grande, a qual tem umas ilhas dentro, e entra-se nordeste sudoeste. A primeira ilha*, que est
TOMO xiv 12

62nyesta barra, se chama" de D. Jorge, e mais para dentro est outra, que se diz de Valentim Nunes. D'esta ilha para a Villa Velha esto quatro penedos grandes descobertos : e mais para cima est a ilha de, Anna Vaz: mais avante est o ilho da Viuva; e no cabo d'esta bahia fica a ilha de Duarte de Lemos, o.ncle est assentada a villa do Espirito Santo, a qual se edificou no tempo da guerra pelos Guaitacazes, qe apertaram muito com os povoadores da Villa Velha. Defronte da villa do Espirito Santo, da banda da Villa Velha est um penedo mui alto a-pique sobre o rio, ao p do qual se no acha fundo: capaz este penedo para se edificar sobre elle uma fortaleza, o que se pde fazer com pouca despeza, da qual se pde defender este rio ao poder do mundo todo. Este rio do Espirito Santo est em altura de vinte gros e um tero.
CAPITULO XLII

Em que. se declara como El-Rei fez merc da capitania do Espirito Santo a Vasco Fernandes Coutinho, e como elle a foi povoar em pessoa. Razo tinha Vasco Fernandes Coutinho de se contentar com os grandes e hericos feitos que tinha com as armas acabado nas partes da ndia, onde nos primeirostempos de sua conquista se achou, no que gastou o melhor de sua idade; passando-se para estes reinos em busca do galardo de seus trabalhos, pediu em satisfao d'elles a S. A. licena para entrar em outros maiores, pedindo -que lhe fizesse merc de uma capitania na costa do Brasil, porque a queria ir povoar, e conquistar o serto d'ella, a cujo requerimento El~Rei D. Joo III de Portugal satisfez, fazendo-lhe merc de cincoenta lguas de terra ao longo da costa no dito Estado, com toda a terra para o serto, que coubesse na sua demarcao, comeando onde acabasse Pedro de Campo, capito de Porto Seguro. Contente este fidalgo com a merc que pediu, para satisfazer grandeza de seus pensamentos, ordenou sua custa uma frota de navios, mui provida de moradores e das munies de guerra ne-^

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cessaras, com tudo o que mais convnha esta empreza,' em a qual se embarcaram, entre fidalgos e criados d'elRei, sessenta pessoas, entre as quaes foi, D. Jorge de Menezes, o de Maluco, e D. Simo de Ca-stello Branco, que por mandado de S. A. iam cumprir suas penitencias estas partes. Embarcado este valoroso capito, com sua gente na frota que estava prestes, partiu do porto de Lisboa com bom tempo, e fez sua viagem para o Brasil, onde chegou a salvamento sua capitania; em a qual desembarcou e povoou a villa de Nossa Senhora da Victoria, a que agora chamam a Villa Velha, onde se logo fortificou, a qual em breve tempo se fez uma nobre villa para aquellas partes. De redor d'esta villa se fizeram logo quatro, engenhos de assucar mui bem providos e acabados, os quaes comearam de lavrar assucar, como tiveram canas para isso, que se na terra deram muito bem. N'estes primeiros tempos teve Vasco Fernandes Coutinho algumas escaramuas com o gentio seu vizinho, com o qual se houve de feio que, entendendo estes indios que no podiam ficar bem do partido, se afastaram da vizinhana do mar por aquella parte, por escusarem brigas que da vizinhana se seguiam. A este gentio chamam Guaytacazes,, de quem diremos adiante. Como Vasco Fernandes viu o gentio quieto, e a sua capitania tanto avante, e em termos de florescer de bem em melhor, ordenou de vir para Portugal a se fazer prestes do necessrio (para ir conquistando a terra pelo serto at descobrir ouro e prata) e a outros negcios que lhe onvinham; e concertando suas cousas, como relevava, se partiu, e deixou a D. Jorge de Menezes para em sua ausncia a governar; ao qual os Tupiniquins, de uma banda e os Guaytacazes, da outra fizeram tp Crua guerra que lhe queimaram os engenhos e muitas fazendas, o desbarataram e mataram s flexadas; o que tambm fizeram depois a D. Simo de Castello Branco, que lhe succedeu na capitania, e a outra muita gente; e puzerm a villa em cerco e em tal aperto que, no podendo os moradores d'ella resistir ao poder do gentio, a despovoaram de todo e se passaram ilha de Duarte de Lemos, onde ainda esto; a qual ilha se afasta da terra firme um tiro de bero.

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Esta villa se povoou de novo com o titulo do Espirito Santo, e muitos dos moradores, no se havendo alli por seguros do gentio, se passaram outras capitanias. E tornando-se Vasco Fernandes para a sua capitania, vendo-a to desbaratada, trabalhou todo o possvel por formar satisfao d'este gentio, o que no foi em sua mo, por estar impossibilitado de gente e munies de guerra, e o gentio mui soberbo com as victorias que tinha alcanado; antes viveu muitos annos afrontado d'elle n'aquella ilha, onde a seu requerimento o mandou soccorrer Mem de S, que n'aquelle tempo governava este Estado; o qual ordenou na Bahia - uma armada bem fornecida de gente e armas, que er de navios da costa mareaveis, da qual mandou por capito a seu filho Ferno de S, que com ella foi entrar no rio de Cricar, onde ajuntou com elle a gente do Espirito Santo, que lhe Vasco Fernandes Coutinho mandou; e, sendo a gente toda junta, desembarcou Ferno de S em terra, e deu sobre o gentio de maneira, que o pz logo em desbarate nos primeiros encontros, o qual gentio se reformou e ajuntou logo, e apertou com F( rn de S, de maneira que o fez recolher para o'mar ; o que fez com tamanha desordem dos seus, que, antes de poder chegar s embarcaes, mataram a Ferno de S, com muita da sua gente ao embarcar; mas j agora esta capitania est reformada com duas villas, em uma das quaes est um mosteiro dos padres da companhia, e tem seus engenhos de assucar e outras muitas fazendas. No povoar d'esta capitania gastou Vasco Fernandes Coutinho muitos mil cruzados que adquiriu na ndia, e todo o patrimnio que tinha, em Portugal, que todo para isso vendeu, o qual acabou n'ella to pobremente, que chegou a darem-lhe de comer por amor de Deus, e no sei se teve um lenol seu, em que o amortalhassem. E seu filho do mesmo nome vive hoje na mesma capitania to necessitado que no tem mais de seu que, o titulo de capito e governador d'ella.

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CAPITULO XLIII

.Em que se pai declarando a costa do Espirito Santo, at o cabo de 8, Thom, Do rio do Espirito Santo ao Goarapari so oito lguas; e faz-se entre um e outro rio uma enseada. Chegado a este rio de Goarapari esto as serras, que dizem de Poroco, e corre-se a costa do morro de Joo Moreno at , este rio norte sul; e defronte do morro de Joo Moreno est a Ilha Escalvada. Do rio de Goarapari ponta de Leritibi so sete lguas; e corre-se a costa nordeste sudueste, cuja terra muido alta: esta ponta tem, da banda do norte, trs ilhas, obra de duas lguas ao mar e a primeira est meia lgua da terra firme, as quaes tem bom surgidoro ; e esto estas ilhas defronte do rio Goarapari. A terra d'este rio at Leritibe muito grossa e boa para povoar como a melhor do Brasil, a qual foi povoada dos Guaytaazes. Esta ponta de Leritibe tem um arrecife ao mar, que boja bem uma lgua e meia, a qual ponta de terra baixa, ao longo do mar. De Leritibe at Tapemerim so quatro ou cinco lguas, cuja costa se corre nordeste sudoeste, a qual est em vinte .gros e trs quartos. De Tapemerim a Manag so cinco lguas, a qual est em vinte e um gros: de Manag ao rio de Parahyba so cinco lguas, e correse a costa nordeste sudoeste, e toma da quarta ao norse sul; o qual rio de Parahyba est em vinte um gro e dois teros. Este rio de Parahyba tem barra e fundo por onde entram navios de honesto porte, o qual se pde tornar a povoar, por derredor d'elle e ao longo do mar. Da Parahyba ao cabo de S. Thom so sete lguas, cuja costa se corre nordeste sudoeste, o qual cabo est em vinte e dois gros. Pelo nome d'este cabo o tomou a capitania tembem de S. Thom, at onde corre o limite dos, Guaytaazes, de quem diremos em seu lugar.

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CAPITULO XL1V

Em que se trata de como Pedro de, Ges foi povoar a sua capitania de Parahyba ou de 8. Thom. Pedro de Ges foi um fidalgo muito honrado, cavalleiro e experimentado, o qual andou na costa do Brasil com Pedro Lopes de Sousa, e se perdeu com elle no Rio da. Prata; e pela affei que tomou d'este tempo terra do Brasil, pediu a el-Rei D. Joo, quando repartiu as capitanias, que lhe fizesse merc, de uma, da qual S. A. lhe fez merc, dando-lhe trinta lguas de terra ao longo da costa, que se comeariam, onde se acabava a capitania de Vasco Fernandes Coutinho, e d'ahi at onde acaba Marfim Affonso de Sousa; e que, no as havendo entre uma capitania e outra, que lhe dava somente o que houvesse, o que no passaria dos baixos dos Pargos. Da qual capitania foi tomar posse em uma frota de navios, que sua custa para isso fez, que proveu de moradores, armas e o mais necessrio para tal empreza : com a qual frota se partiu do porto de Lisboa, e fez sua viagem com prospero tempo, e foi tomar terra e porto na sua capitania, e desembarcou, no rio Parahyba, onde se fortificou,, e fez uma povoao em que esteve pacificamente os primeiros dois annos, com os gentios Guaytaazes seus visinhos, com quem teve depois guerra cinco ou seis annos, dos quaes se defendeu com muito trabalho e risco de sua pessoa, por lhe armarem cada dia mil traies,fazendo pazes,qe lhe logo' quebravam; com o que lhe foram matando muita gente, assim n'estas traies como em cercos, que lhe puzeram mui prolongados; com o que padeceu cruis fomes, o que no podendo os moradores soffrer, apertaram com Pedro de Ges rijamente, que a despovoasse, no que elle se determinou obrigado d'stes requerimentos , e das necessidades em que o tinham posto os trabalhos, e ver-que no era soccorrido do reino como devera. E vendo-se j sem remdio, foi forado a despejar a terra, e passar-se com toda a gente para a capitania do Espirito Santo, onde estava a esse tempo Vasco Fernandes Coutinho, que lhe mandou para isso algumas embarcaes. E como Pedro

67 de Ges teve embarcao, se tornou para estes reinos mui desbaratado: dos quaes voltou a"ir ao Brasil por capito-mr do mar com Thom de Sousa, que n'este Estado foi o primeiro governador geral; com quem aju dou a povoar e fortificar a.cidade, do Salvador na Bahia de todos os Santos. N'esta povoao que Pedro de Ges fez na sua capitania gastou toda sua fazenda que tinha no reino, e muitos mil cruzados de. Marfim Ferreira, que o favo-; receu muito com preteno de fazerem por conta da companhia grandes engenhos, o que no houve effeito pelos respeitos declarados n'este capitulo.
CAPITULO XLV

Em que se diz quem so os Guaytaazes , sua vida e costumes. Pois que temos declarado quasi toda a costa que senhoreavam' os Guaytaazes, no bem que nos despidamos d'ella, passando por elles, pois temos dito parte dos damnos que fizeram aos povoadores do Espirito Santo e aos da Parahyba, os quaes antigamente partiam pela costa do mar da,banda do sul com os Tamoyos, e de norte com os Papanazes, que viviam entre elles e os Tupiniquins, e como eram seus contrrios,, vieram a ter com elles to cruel guerra que os fizeram despejar a ribeira do mar, e irem-se para o serto ; com o que ficaram senhores da costa, at confinar com os Tupiniquins, cujos contrrios tambm so, e se matam e comem uns aos outros: entre os quaes estava por marco o rio de Cricar. Este gentio foi o que fez despovoar a Pedro de Ges, e que deu tantos trabalhos a Vasco Fernandes Coutinho. Este gentio tem a cr mais branca que os que dissemos atraz, e tem diflerente linguagem ; muito brbaro ; o qual no grangea muita lavoura de mantimentos ; plantam somente legumes, de que se mantm, e a caa que matam s flexadas, porque so grandes flexeiros. No costuma esta gente pelejar no mato, mas em campo descoberto, nem so muito amigos de comer carne humana,

68 como o gentio atraz: no dormem em-, redes, mas no cho com folhas debaixo de si. Costumavam estes bar^ baros, por no terem outro remdio, andarem no mar nadando, esperando os tubares com um po muito agudo na mo, e em remettendo o tubaro a elles, lhe davam com o po, que lhe mettiam pela garganta com tanta fora que o afogavam e matavam, e o traziam terra, no para o comerem, para o que se no punham em tamanho perigo, seno para' lhes tirar os : dentes, para os engastarem nas- pontas das flexas. Tem esse gentio muita parte dos costumes dos Tupinambs, assim no cantar, no bailar, tinger-se de genir papo, na feio do cabello da cabea, e no arrancar os mais cabellos do corpo, e outras gentilidades muitas, que, por escusar prolixidade, as guardamos para se dizerem uma s vez.
CAPITULO

XLVI

Em que se declara em summa quem so os zes e seus costumes.

Papana-

Parece conveniente este lugar para se brevemente dizer quem so os Papanazes, de quem atraz fizemos meno, e porque passmos o limite de sua vivenda nos tempos antigos, no bem que os guardemos para mais longe. Este -gentio, como fica dito, viveu ao longo do mar entre a capitania de Porto Seguro e a. do Espirito Santo, d'onde foi lanado pelos Tupiniquins seus contrrios, e pelos Guaytaazes, que tambm o eram e so hoje seus inimigos, e uns e outros lhe fizeram to cruel guerra, que os fizeram sahir para o serto, onde agora tm sua vivenda, cuja linguagem entende os Tupiniquins e Guaytaazes,, ainda que mal. Este gentio dorme no cho sobre folhas, como os Guaytaazes, tambm se no occupa em grandes lavouras; mantm-se estes selvagens de caa e peixe do rio, que matam ; os quaes so grandes flexeiros e pelejam com arcos e flexas, andam ns como o mais gentio, no consentem cabellos nenhum no corpo seno os da cabea, pin-

69 tam-se e enfeitam-se com pennas de cores dos pssaros ; cantam e bailam ; tm muita gentilidades, das que usam os Tupinambs; mas entre si tm um costume que no to brbaro como todos os outros que todo o gentio costuma,, que , se um indio d'estes mata outro da mesma gerao em alguma briga, ou por desastre, so obrigados os parentes do matador a entregal-o aos parentes do morto, que logo o afogam e o enterram, estando uns e outros presentes, e1 to- dos n'este ajuntamento fazem grande pranto, comendo e bebendo todos juntos por muitos dia^, e assim ficam todos amigos : e sendo caso que o matador fuja, de maneira que os parentes o no possam tomar, lhe tomam um filho ou filha, se o tem, ou irmo, e se no tem um nem outro, entregam pelo matador o parente mais chegado, ao qual no matam ; mas fica captivo do mais prximo parente do morto, e coai isso! ficam todos contentes e amigos como o eram. antes do acontecimento do morto.
CAPITULO XLVII

Em, que se torna o- dizer de como corre a costa do Cabo de S. Thom at o Cabo Frio. Do Cabo de S. Thom Ilha de Santa Anna so oito lguas, e corre-se a costa nordeste sudoeste. A, terra firme d'esta costa muito frtil e boi. Esta ilha de Santa Anna fica em vinte e dois gros e um tero, a qual est afastada da terra firme duas lguas para o mar, e tem dois ilhos junto de si. E quem vem do mar em fora parece-lhe tudo uma cousa. Tem esta ilha da banda da costa bom surgidoro e abrigada por ser limpo tudo, onde tem de fundo cinco e seis'"braas : e na terra firme defronte da ilha tem boa aguada, e na mesma ilha ha boa gua de uma lagoa. Por aqui no ha de que guardar seno do que virem sobre a gua. I" E quem vem do mar em fora para saber se est ! tanto avante como esta ilha, olhe para a terra firme, e ver no meio das serras um pico, que parece frade
TOMO XIV 13

70 com capello sobre as costas, o qual demora a loeste noroeste, e podem os navios entrar por qualquer das bandas dajlha como lhe mais servir o vento, e ancorar defronte entre ella e a terra firme. Da ilha de Santa Anna Bahia do Salvador so trs lguas, e d'esta bahia Bahia Formosa so sete, lguas ; da Bahia Formosa ao Cabo Frio so duas lguas. E corre-se a costa norte sul. At esta Bahia Formosa, corriam os Guaytaazes no seu tempo, mas vivem j mais afastados do mar, pelo que no ha que arrecear para se povoar qualquer parte d'esta - costa d Espirito Santo at o Cabo Frio.
CAPITULO XLVIII

Em

qu se explicam os recncavos do Cabo Frio.

O Cabo Frio est em vinte e trs gros; o qual parece, a quem vem. do mar em fora, ilha redonda com uma forcada no meio, porque a terra, que est entre o Cabp e as serras, muito baixa, e quando.se vem chegando a elle, apparece uma rocha com riscos brancos, por onde muito bom de conhecer. E ainda que, pelo que se julga do mar, a terra do Cabo parece ilha, e o no seja, por onde o parece, na verdade o Cabo ilha; porque o' corta o mar por onde se no enxerga de fora; mas de maneira que pde passar um navio por entre elle e a terra firme vontade. E tem um baixon'este canal bem no meio, de duas braas de fundo ; o mais alto, que basta para passar uma no. Perto- do Cabo esto umas ilhas, no meio das quaes limpo e bom o porto para surgirem nos de todo porte, e no ha seno guardar do que virem. Duas lguas do Cabo da banda do norte,, est a Bahia Formosa, e defronte d'ella ficam as ilhas, e entre esta bahia e as ilhas ha bom surgidoro No fim d'esta bahia para o norte est a Casa de Pedra, perto da qual est um rio pequeno, que tem de fora bom surgidoro, e de dez at quinze braas de fundo, afastado um pouco de uma ilha que est na boca da bahia. E perto d'esta ilha alto para ancorar nos, mas perigoso; porque

71 se Venta sudoeste e oeste, faz aqui damno no primeiro impeto, porque vem com muita fria como trovoada de Guin, a qual trovoada de vento secco e claro. Costumavam os francezes entrar por este rio pequeno a carregar po brasil, que traziam para 'as nos que estavam surtas na bahia ao abrigo das ilhas. Por esta. bahia entra a mar muito pela terra dentro, que , muito baixa, onde de 20 de Janeiro at todo o Fevereiro se coalha a gua muito depressa, e sem haver marinhas, tiram os indios o sal coalhado e duro, muito alvo, s mos cheias, de baixo da gua, chegando-lhe sempre a mar, sem ficar nunca em secco.
CAPITULO XLIX

Em que se declara a terra que ha do Cabo Frio at o Rio de Janeiro. Do Cabo .Frio ao Rio de Janeiro so dezoito lguas, que se repartem d'esta maneira: do Cabo Frio ao rio de Saorema so oito lguas ; de Sacorema s ilhas de Maric so quatro lguas, e de Maric ao Rio de Janeiro so seis lguas, cuja costa se corre leste oeste: o qual Rio est em vinte e trs gros, e tem sobre si umas serras mui altas que s vm de muito longe lindo do mar em fora, a que chamam QS rgos, e uma d'estas serras parece do mar gvea de no, por onde se conhece a terra bem. Este Rio tem de boca de ponta ponta, perto de meia lgua, e na de lessudoeste tem um pico de pedra muito alto e mui a pique sobre a barra. Na outra ponta tem outro padrasto, mas no t- alto nem to spero, e de um ao outro se defender a barra valorosamente. No meio d'esta barra, entre ponta e ponta, creou a natureza uma lagea de cincoenta braas de comprido e vinte e cinco de largo, onde se pde fazer uma fortaleza, que seja uma das melhores do mundo, o que se far com pouca despeza, com o que se defender, este Rio a todo o poder que o quizer entrar; porque o fundo da barra por junto d'esta lagea a tiro de espingarda d'ella, e forado as nos que quizerem entrar den-

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tro ho de ir falia d'ella, e no lhe ficar outro padrasto mais que o do pico de pedra, d'onde lhe podem' chegar com artilharia grossa; mas este pico to spero que parece impossvel poder-se levar artilharia grossa acima, e segurando-se este pico ficar a fortaleza da lagea inexpugnvel. E uma cousa e outra se pde fortificar com pouca despeza, pela muita.pedra que para isso tem ao longo do mar, bem defronte, assim para cantaria como para alvenaria, e grande apparelho para se fazer muita cal de ostras, cie que n'este Rio ha infinidade.
CAPITULO L

Em que se declara- a entrada do Rio de Janeiro as ilhas que tem 'defronte.

Defronte da barra do Rio de Janeiro, ao sul d'ella quatro ou cinco legas, esto duas ilhas baixas, e ao noroeste d'ellas est um porto de ara bem chegado terra, onde ha abrigada do vento sul, sueste, leste e noroeste, e como fr outro vento convm fugir na volta de leste ou do norte, que serve para quem vem para o reino; e quem houver de ancorar aqui, pclese chegar terra , at quatro ou cinco braas de fundo para ficar bem; e quem houver de entrar no Rio, dando-lhe o vento lugar, entre pela banda do leste, e sendo o vento oeste, v pela barra de oeste pelo meio do canal, que est entre a ponta de Cara de Co e a lagea; mas a. barra de leste melhor por ser mais larga: e por cada uma d'ellas tem fundo oito at doze braas at ilha da Viragalham': e quanto mais forem a loeste, tanto menos fundo acharo, depois que passarem a ilha, e para a banda de leste acharo mais fundo em- passando a ilha de Viragalham, que se chama assim, por ser este o. nome do capito francez, que esteve com uma fortaleza n'esta ilha, que a que Mem de S tomou e arrazou. Defronte da barra d'este Rio, ao mar d'ella,. est uma ilha, a que chamam ilha Redonda; a afastado d'ella para a banda de leste est outra ilha, a que

73 chamam a ilha Raza: e defronte d'esta ilha e a ponta da lagoa esto trs-ilhas nomeio, e chegando terra est outro ilhote, a que chamam Jeribtuba, em derredor da qual esto quatro ilhotes.
CAPITULO L I

Em que particularmente se explica a bahia do. Rio de Janeiro da ponta do Po de Assucar para dentro. E' tamanha cousa o Rio de Janeiro da boca para dentro, que nos obriga a gastar o tempo em o declarar n'este lugar, para que se veja como capaz de se fazer mais vconta d'elle do que se faz. E comecemos do Po de Assucar, que est da banda de fora da barra, que um pico de pedra mui alto, da feio do nome que tem, do qual ponta da barra que se diz de Cara de Co ha pouco espao ; e a terra, que fica entre esta ponta e o Po de Assucar, baixa e ch; e virandose d'sta ponta para dentro da barra se chama Cidade Velha, onde se elia fundou primeiro. Aqui se faz uma enseada, em que podem surgir navios, se quizerem, porque o fundo de vasa, e tem cinco, seis, e t sete braas. Esta enseada se chama de Francisco Velho, por ter aqui sua vivenda e grangearia, a qual afeioada em compasso at outra ponta adiante que se chama da Carioca, junto da qual entra uma ribeira, que se chama do mesmo nome, d'onde bebe a cidade. Da ponta da Cara de Co cidade pde ser meia lgua : esta ponte de Cara de Co fica quasi em padrasto da lagea, mas no muito grande por ella no ser muito alta. A cidade se chama S. Sebastio, a qual edificou Mem de S em um alto, em unia ponta de terra que est defronte da ilha de Viragalham; a qual est lanada d'este alto por uma ladeira abaixo : e tem em cima no alto um nobre, mosteiro e collegio de padres da companhia, a ao p d'ella est uma estncia com artilharia para uma banda e para outra, um modo de fortaleza em uma ponta, que defende o _ porto, mas no a barra por l no chegar bem a artilharia.

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Ao p d'esta cidade defronte da ponta do arrecife d'ella tem bom surgidoro, que tem de fundo cinco e seis braas, eV, chegando-se mais terra . tem trs e quatro braas, onde os navios tem abrigo para os ventos geraes do inverno, que so sul e susoeste. E quem quizer ir para dentro ha de passar por' um banco, que tem de preamar at vinte palmos de gua: e passando este banco virando para detraz da- ponta da cidade acharo bom fundo, onde .os navios esto seguros do todo tempo, por terra fazer aqui' uma enseada. E quando os navios quizerem sahir d'este porto carregados, ho de botar fora por entre a ilha e a ponta da terra firme pela banda do norte, e ho de rodear a ilha em redondo para tornarem a surgir defronte da cidade, e surgirem junto da ilha de Viragalham entre ella e a cidade : no qual lugar acharo de fundo trs braas, e trs emeia : onde tem porto morto ; e defronte d'este porto o desembarcadouro da cidade, onde se diz as casas de Manoel de Brito.
CAPITULO LII

Em que se explica a terra da bahia do Rio de Janeiro 'da ponta cia cidade para dentro at tornar barra. Na ponta d'esta cidade e ancoradouro dos navios, que est detraz da-cidade, est uma ilheta, que se diz a da madeira, por se tirar d'ella muita; a qual serve aos navios, que_ aqui se recolhem de concertar as vellas. E d'esta ponta a uma. lgua est outra ponta, fazendo a terra em meio uma enseada, onde est o porto que se diz de Martim Affonso, onde entra n'esta bahia um riacho, que se diz Yabubiracica:- defronte d'este porto de Martim Affonso esto espalhados seis ilhos de arvoredo. E d'esta ponta por diante se torna a terra a recolher, maneira de enseada, e d'alli a meia lgua faz outra ponta e antes d'ella entra outro riacho no salgado, que se chama Unhauma ; e ponta se chama Brao pequeno. D'esta ponta que se diz Brao pequeno por diante foge a terra para traz muito, onde se faz

75 ui esteiro, por onde entra a ma,r trs lguas; e fica a terra na boca d'este esteiro de ponta a ponta, um tiro de bero : d'onde comea a.terra a fazer outra enseada, que de ponta a ponta so duas lguas, a qual terra alta at ponta. Defronte d'esta enseada est a ilha de Salvador Corra, que se chama Parnpic, que tem trs lguas de comprido, e uma de largo, em a qual est um engenho de assucar, que lavra com bois, que elle fez. Atravessando esta ilha por mar cidade s duas lguas, a qual ilha tem de redor de si oito ou nove ilhas, que do po brasil, Do cabo d'esta enseada grande, e da ponta da terra, alta, se faz outra enseada apertada na boca, em a qual se mette um rio, que nasce o p da serra dos rgos, que est cinco lguas pela terra dentro, o qual se chama Magipe e mais adiante lgua e meia entra outro riacho n'esta bahia que se chama Sururuy. D'este rio Sururuy a duas lguas entra outro n'esta bahia, que se chama Macuc, que se navega pela terra dentro quatro lguas, em o qual se mette outro rio, que se chama dos Guaytaazes, que vem de muito longe. Defronte do rio de Macuc est uma ilha, que se chama Caiaib, e d'esta ilha a uma est outra, que se chama Pacata; e d'esta Salvador Corra lgua ' e meia: e esto estas ilhas todas trs em direito leste oeste umas das outras. E d'esta ilha Pacata direito ao sul esto seis ilhos, e para o sueste esto cinco em duas carreiras. Da ponta do rio Macuc para a banda de leste'se recolhe a terra e' faz uma enseada at outra ponta da terra sahida, ao mar, em que entra um riacho, que se chama Baxindiba, e da ponta d'este riacho de Macuc lgua e meia. Defronte de Baxindiba, est outra ilha, cheia de arvoredo ; de Baxindiba se torna a afastar a terra para dentro fazendo outra enseada, com muitos mangues no meio, em a qual se mette outro rio, que se diz Suauna, e haver de ponta a ponta duas lguas. E no meio bem em direito das pontas est outra ilha cheia de arvoredo, e a outra ponta d'esta enseada se diz Mutungabo Da ponta de Mutumgabo se esconde a terra para dentro bem dois teros de lgua, onde se mette um rio, que se chama Po Doce, e faz uma,

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volta tornando a terra a sahir para fora bem, meia lgua, onde faz outra ponta, que se chama Urumar. D'esta ponta de Matungabo uma lgua, e bem em direito d'estas pontas, em meio d'esta enseada, est outra ilha de arvoredo. D'esta ponta de Mutungab.o de Mucuc so quatro lguas;, da ponta de Urumar a -dois teros de lgua est outra ponta, l onde se comeam as barreiras vermelhas, que ficam defronte da cidade, onde bate o mar da bahia: e defronte d'esta ponta para o norte est uma ilha, que se diz de Joo Fernandes, diante da qual est outra mais pequena. Das barreiras vermelhas se vai afeioando a terra ao longo da gua como cabea de cajado, onde se faz uma enseada, que se chama de Piratininga, e a ponta e, lingua de terra d'alla vem quasi em direito de Viragalham. a qual ponta se ch,ama de Lery, e o cotovello d'esta lingua de terra faz uma ponta defronte da de Cara de Co que fica em padrasto sobre a lagea da barra, na qual ponta est outra laga, que o salgado aparta de terra qualquer cousa, a qual fica ao p do pico do padrasto, que est sobre a barra. Entram por esta barra do Rio de Janeiro nos de todo o porte, as quaes podem estar n'este rio seguras, como fica dito ; de maneira, que ter esta bahia do Rio de Janeiro em redondo da ponta de Cara de Co, andando por dentro at o mar, outra ponta da lagea vinte lguas pouco mais ou menos que se navega em barcos, e pelo mais largo haver de terra a terra seis lguas.
CAPITULO LIII

Que trata como o governador Mem de S foi ao Rio de Janeiro. No bem que passemos avante sem primeiro se dar conta d.a muita, que os annos passados se teve com o Rio de Janeiro. E como El-Rei D. Joo III, de Portugal, fosse informado como os francezes tinham feito n'este Rio uma fortaleza na ilha de Viragalham, que foi o capito que n'ella residia, que se assim, chama-

77 -~ va, mandou a D. Duarte da Costa que n'este tempo era governador d'este Estado, que D. Duarte fez com muita diligencia, e avisou d'isso a S. A. a tempo, que tinha eleito para governador geral d'este Estado a Mem de S a quem encommendou particularmente, que trabalhasse por pr esta ladroeira fora d'este Rio. E fallecendo El-Rei h'este conflicto, succedendo no governo a Rainha D. Catharina, sua mulher, que est em gloria, sabendo da vontade de S. A. escreveu ao mesmo Mem de S, que com a brevidade possvel fosse a este Rio lanasse os francezes d'elle, ao que obedecendo o governador fez prestes a armada, que do reino para isso lhe fora, de que ia por capito mr Bartholomeu de Vasconcellos ; qual ajuntou outros navios de ElRei, que na Bahia havia, e dez ou doze caraveles; e feita a frota prestes, mandou embarcar n'ella as armas e munies de guerra e os mantimentos necessrios, em a qual se embarcou a mr parte da gente nobre da Bahia, e os homens de armas, que se puderam juntar, com muitos escravos e indios forros. E indo o governador com esta armada correndo a costa, de todas as capitanias levou gente que por sua vontade o quizeram acompanhar n'esta empreza, e, seguindo sua viagem, chegou ao Rio de Janeiro com toda a armada junta, onde o vieram ajudar muitos mora^ dores de S. Vicente. E foi recebido da fortaleza de Viragalham, que n\este tempo era ido Frana, com muitas bombardadas, o que no foi bastante para Mem de S deixar de se chegar fortaleza com os navios de maior porte a varejar com artilharia grossa; e com os navios pequenos mandou ' desembarcar a gente em uma ponta da ilha, onde mandou assestar artilharia, d'onde bateram a fortaleza rijamente. E como os francezes se viram apertados despejaram o castello e fortaleza uma noite; e lanaram-se na terra firme com o gentio Tamoyo, que os favorecia muito ; e entrada, a fortaleza, mandou o governador recolher a artilharia e munies de guerra, que n'ella havia; mandou-a desfazer e arrazar por terra, e avisou logo do succedido a Rainha em uma no franceza, que n'este Rio tomou, e como houte mono se recolheu,
TOMO xiv 14

'78 o governador para a Bahia (visitando as capitanias todas) aonde chegou a salvamento. Mas no alcanou esta victoria tanto a seu salvo, que lhe no custasse primeiro a vida de muitos portuguezes e indios Tupirnambs que lhe os francezes mataram s bombardadas e espingardadas; mas como a Rainha soube d'esta victoria, e entendendo quanto convinha coroa de Portugal povoar-se e fortificar-se o Rio de Janeiro, estranhou muito a Mem de S o rrazar a fortaleza, que tomou aos francezes, e no deixar gente n'ella, que a guardasse e defendesse, para se povoar este Rio (o que elle no fez por no ter gente que bastasse para poder defender esta fortaleza); e que logo se fizesse prestes e fosse povoar este Rio, e o fortificasse edifiV cando n'elle uma cidade que se chamasse de S. Sebastio : e para que isto pudesse fazer com mais facilidade, lhe mandou uma armada de trs galees, de que ia por capito mr Christovam de Barros, com a qual, e com dois navios de El-Rei que andavam na costa, e outros seis caraveles, se partiu o governador da Bahia com muitos moradores d'ella que levavam muitos escravos comsigo, e partiu-se para o Rio de Janeiro, onde lhe succedeu o que n'este capitulo se segue.
CAPITULO LIV

Que trata de como Mem de S foi povoar o Rio de Janeiro. Partindo Mem de S para o Rio de Janeiro foi visif tando a capitania dos Ilhos, Porto Seguro e a do Espirito Santo, das quaes levou muitos moradores, que como aventureiros os foram acompanhando com seus escravos n'esta jornada ; e como chegou ao Rio de Janeiro viu que lhe havia custar mais do que cuir dava, como lhe custou; porque o achou fortificado dos francezes na terra firme, onde tinham feito cercas mui grandes e fortes de madeira, com seus baluar^tes e artilharia, que lhes umas nos que alli foram carregar de po deixaram, com muitas espingardas.

79 .Nestas cercas estavam recolhidos com os francezes os indios Tamoios, que estavam j to adestrados d'elles, que pelejavam muito bem com suas espingardas, para o que no lhe faltava plvora nem o necessrio, por de tudo estarem bem providos das nos acima ditas. Desembarcando o governador em terra, tiveram os 'portuguezes grandes escaramuas com os francezes e Tamoyos; mas uns e outros se recolheram contra sua vontade para as suas cercas, que logo foram cercadas e postas em grande aperto; mas primeiro que fossem entradas custou a vida a Estacio de S, sobrinho do governador, e a Gaspar Barbosa, pessoa de muito principal estima, e a outros muitos homens e escravos, com tudo foram s cercas entradas e muitos dos contrrios mortos e os- mais daptivos. E como Os Tamoyos no tiveram entre si francezes, se recolheram pela terra dentro, d'onde vinham muitas vezes fazer seus saltos, do que nunca sahirah bem. E como Mem de S viu que tinha lanado os inimigos da porta, Ordenou de fortificar este Rio, fazendo-lhe uma estncia ao longo d'gua para defender a barra, a qual depois reedificou Christovam de Barros, sendo capito d'este Rio; e assentou a cidade, que murou com muros de taipas com suas torres, em qti pz artilharia necessria; onde edificou algumas igrejas com sua casa de Misericrdia e hospital, e um mosteiro de padres da companhia, que agora collegio, em que os padres ensinam latim; para o que lhe faz S. A. merc cada nno de dois mil cruzados. E acabada de fortificar e povoar essa. cidade, ordenou o governador de se ^tornar para a Bahia, deixando n'ella por capito a seu sobrinho Salvador Corra de S com muitos moradores e : officiaes de justia e de fazenda convenientes ao servio d'El-Rei e ao bem da terra: o qual Salvador Corra defendeu esta cidade alguns annos mui valorosamente, fazendo guerra ao gentio, de que alcanou grandes victorias, e dos francezes, que do Cabo Frio os vinham ajudar e favorecer; aos quaes foi tomar dentro no Cabo Frio uma no que passava de duzentos toneis, com canoas que levou do Rio de Janeiro, com as quaes a abalroou e tomou fora de armas. A esta cidade mandou depois El-Rei D. Sebastio por

80 capito e governador Christovam de Barros, que a accrescentou. fazendo n'ella em seu tempo muitos servios S. A., que se' no podem particularisar em to pequeno espao.
CAPITULO LV

Em que se trata de como foi governador do Rio de Janeiro Antnio Salema. Informado El-Rei D. Sebastio, que gloria haja, do Rio de Janeiro, e do muito para que estava disposto, ordenou de partir este Estado do Brasil em duas governanas, e deu uma d'ellas- ao Dr. Antnio Salema, que estava, na capitania de Pernambuco por mandado de S. A. com alada, a qual repartio se estendia da capitania de Porto Seguro at S. Vicente. Esta repartio se fez no anno de 1572: comeava no limite em que partem as duas capitanias dos Ilhos e do Porto Seguro, e d'alli tudo para o sul; e a outra do dito limite at tudo ,que ha para.o norte, deu a Luiz de Brito de Almeida. E era cabea d'esta governana a cidade de S. Sebastio do Rio de Janeiro, onde o governador assistiu; e comeou um engenho, que lhe S. A. mandou fazer, para o que lhe mandou dar quatro mil cruzados, o qual se no acabou; sendo mui necessrio para os moradores fazerem suas casas, e para, a terra ir em grande crescimento. No tempo que Antnio Salema governou o Rio de Janeiro, iam cada anno nos francezas resgatar com o gentio ao Cabo Frio, onde ancoravam com suas nos na bahia que atraz fica declarado, e carregavam de po de tinta sua vontade; e vendo Antnio Salema tamanho desaforo, determinou de tirar essa ladroeira d'esse lugar, e fez-se prestes para ir fazer guerra ao gentio de Cabo Frio, para o que ajuntou quatrocentos homens brancos e setecentos indios, com os quaes, por conselho de Christovam de Barros, foram ambos em pessoa ao Cabo Frio, que est dezoito lguas do Rio, onde acharam os Tamoyos, com cercas muito fortes recolhidos n'ellas com alguns francezes dentro,

81 onde uns e os outros se defenderam valorosamente s espingardadas e flechadas: e no podendo os francezes soffrer o aperto em que estavam, se lanaram com o governador, que lhes desse a vida, com que os Tamoyos foram entrados, e mortos infinitos;, e captivos oito ou dez mil almas. E com esta victoria, que os portuguezes alcanaram, ficaram os Tamoyos to atemorisados, que despejaram a ribeira do mar, e se foram para o serto; pelo que no tornaram mais nos francezas a Cabo Frio a resgatar. E porque d'este successo fez Antnio Salema um' tratado, havemos por escusado tratar mais d'este caso n'este capitulo.
CAPITULO LVI

Em que se conclue com o Ro de Janeiro com a tornada de Salvador Corra a elle. Vendo El-Rei D. Sebastio, que haja gloria, o pouco de que lhe servira dividir o Estado do Brasil em duas governanas, assentou de o tornar a ajuntar, como d' antes andava, e de mandar por capito e governador ao Rio de Janeiro somente a Salvador Corra de S, e que viessem as appellaes Bahia, como d'antes era; onde o dito Salvador Corra foi e est hoje em dia, onde tem feito muitos servios a S. Magestade, do modo como procede na governana e defenso d' esta cidade, e no fazer da guerra ao gentio, de que tem alcanado grandes victorias, e tambm serviu a S. Magestade em palejar com trs nos francezas, que queriam entrar pela barra do Rio de Janeiro; o que lhe defendeu s bombardadas, e no quiz consentir que communicassem com a gente da terra, por se dizer trazerem cartas do Senhor D. Antouio., E foi esta cidade em tanto crescimento em seu tempo, que pela engrandecer ordenou de fazer um engenho de assucar na sua ilha, que faz muito assucar; e favoreceu a Christovam de Barros para mandar fazer outro, que tambm est moente e corrente, com os quaes esta cidade est muito avante, e com um formoso collegio dos padres da companhia, cujas obras3 Salvador Corra

82 ajudou e favoreceu muito. N'este Rio de Janeiro se podem fazer muitos, engenhos por ter terra? e guas para isso, em o qual se do as vaccas muito bem, e todo o gado de Hespanha: onde se d trigo, cevada, vinho, marmelos, roms, figos e todas as fructas de espinho ; e muito farto de pescado e marisco, e de todos os mantimentos que se do na costa do Brasil: onde ha, muito po do Brasil, e, muito bom.
CAPITULO LVII

Em que se declara a costa do Rio de Janeiro S. Vicente.

at

Da ponta de Cara de Co do Rio de Janeiro ponta do rio de Marambaya sonove lguas, onde se faz uma enseada : e defronte d'esta enseada est uma ilha de arvoredo, que se chama a Ilha Grande, a qual faz de cada banda duas barras com a terra, firme ; porque tem em cada boca um penedo no meio, que lhe faz duas abertas, e navega-se por entre esta ilha e a terra firme com navios grandes, e nos de todo o porte. Ao mar d'esta ilha est um ilheo, que se chama de Jorge Grego. Est Ilha Grande est em vinte e trs gros, a qual tem sete ou oito lguas de comprido, cuja terra muito boa, toda cheia de arvoredo, com guas boas para engenhos. Quem vem do mar em fora parece-lhe esta ilha cabo de terra firme, por estar chegada ferra. ^ Esta ilha se deu de sesmaria a um desembargador que fallecido, e no a povoou, sendo ella tanto para se fazer muita conta d'ella ; na qual ha muito bom porto para surgirem navios. Defronte d'esta ilha na ponta d'ella da banda de loeste est a Angra cios Reis; e corre-se esta ilha leste oeste: -e quem navegar por entre ella e a terra firme no tem que recear ; porque tudo limpo e sem baixo nenhum. Da ponta da Ilha Grande ao morro cb Caru so nove lguas, o qual morro est em vinte e trs. gros e um quarto e tem um ilheo na ponta, e entre ella 'e a Ilha Grande, na enseada junto terra firme, tem duas ou

83 trs ilhotas de arvoredo. Do mrr de Caru ilha das Couves so quatro lguas, a qual est chegada a t e r r a . : da ilha das Couves ao porto s Porcos so duas lguas, o qual porto muito bom, e tem defronte uma ilha d mesmo nome. Do porto dos Porcos ilha de S. Sebastio , so cinco lguas, a qual est em vinte e quatro gros,e tem cinco ou seis lguas de comprido, cuja terra boa para se poder povoar. E para boa navegao ha de se navegar entre esta ilha e a terra firme, mas acostar antes banda da ilha, por ter mais fundo. Ao sudoeste d'esta ilha est outra, ilha, que se chama dos Alcatrazes, a qual tem trs picos de pedra, e um d'elles muito mais comprido que os outros. Por dentro d'esta ilha de S. Sebastio d'al a trs lguas ao sudoeste d'ella esto duas ilhetas: uma se. diz da Victoria, e a outra dos Bzios. Da ilha de S.Sebastio ao Monte do Trigo so quatro lguas; do Monte do Trigo barra de S. Vicente so quatro lguas. E corre-se esta. costa. da Ilha Grande at S. Vicente lsnordeste e oessudoeste.
CAPITULO LVIl

Em que se declara quem o gentio Tamoyo de que tanto fallmcs. Ainda que parea ser j fora do seu lugar tratar aqui do gentio Tamoyo, no lhe cabia outro, por a costa da terra que elles senhoraram passar alm do Rio de Janeiro at Angra .dos Reis;.pelo que se no podia dizer d'elles- em outra parte mais accommodada. Estes Tamoyos ao tempo que os portuguezes descobriram esta provincia do Brasil senhoreavam a costa d'elle desde o rio do cabo, de S. Thom at a Angra dos Reis; do qual limite foram lanados para o serto, onde agora vivem. Este gentio grande de corpo e mui robusto, so valentes homens e mui bellicosos^ e contrrios de todo o gentio seno dos Tupinambs, de quem se fazem parentes, cuja fll se parece muito uma com a outra, e tem as mesmas gentilidar

84 des, vida e costumes, e so amigos1 uns dos outros. So estes Tamoyos mui inimigos dos Guaitacazes, de quem j falamos, cm quem partem, segundo j fica dito, e cada dia se matam e comem uns aos outros. Por esfoutra parte de S. Vicente partem com os Goaynazes, com quem tambm tm continua .guerra, sem se perdoarem. Pelejam estes indios. com arcos e flechas, no que so muito destros, e. grandes caa dores e pescadores de linha, e grandes mergulhadores, e flecha matam tambm muito peixe, de que se aproveitavam quando no tinham anzoes. As suas casas so mais fortes que a dos Tupinambs e do outro gentio, e tm as suas aldas mui fortificadas com grandes cercas de madeira. So havidos estes Tamoyos por grandes msicos e bailadores entre todo o gentio; os quaes so grandes cbmponedores de cantigas d improviso; pelo que so muito estimados do gentio, por onde quer que vo. Trazem cs beios furados e n'elles umas pontas de osso compridas com uma cabea como prego em que mettem esta ponta, e para que no caia a tal cabea lhe fica de dentro do beio por onde a mettem. Costumam mais em suas festas enfeitarem-se com capas e carapuas de pennas de cores de pssaros. Com este gentio tiveram grande entrada os' francezes, de quem foram bem recebidos no Cabo Frio e no Rio de Janeiro, onde os deixaram fortificar e viver at que o governador Mem de S os foi lanar fora; e depois Antnio Salema no Cabo Frio. N'estes dois rios costumavam os francezes resgatar cada anno muitos mil quintaes de po brasil, aonde carregavam d'elle muitas nos que traziam para Frana.
APIUL L I !

Em qu se declara a barra e pvaes' d capitania de S. Vicente. Est o rio e barra de S. Vicente em altura de vinte e quatro gros e meio, o qual rio tem a boca grande e muito aberta onde se diz a barra de Estevam da Costa. E quem vem do mar em fora para conhecer

- 8 5 a barra, ver sobre ella uma ilha com um hioni, da feio de moela de gallinha, com trs mamilhes. Por esta barra entram nos de todo o porte, as quaes ficam dentro do rio mui seguras de todo o tempo; pelo qual entra a mar cercando a terra de maneira que fica em ilha muito chegada terra firme, e faz este brao do rio muitas voltas. Na ponta d'esta barra, da banda de leste, est a villa de Nossa Senhora da Conceio; e d'esta ponta outra, que se diz de Estevam da Costa, se estende a barra de S. Vicente, e entrando por este rio acima est a terra toda povoada de uma banda e da outra de fazendas mui frescas; e antes que cheguem Villa esto os engenhos dos Esquertes de Fraudes e o de Jos Adorno; e no rio est uma ilheta alm da qual mo direita est a villa de S. Vicente, que cabea d'esta capitania. Pelo serto d'esta capitania nove lguas est a villa de S. Paulo, onde geralmente se diz O Campo, em a qual villa est um mosteiro dos padres da companhia, e de redor d'ella quatro ou cinco lguas esto quatro aldas- de indios forros christos, que os padres doutrinam; e servem-se d'esta villa para o mar pelo esteiro do Ramalho. Tem esta villa mais dois ou trs engenhos de assucar na ilha e terra firme ; mas todos fazem pouco assucar por no irem l navios que o tragam. E aparta-se esta capitaui de S, Vicente, de Martim Affonso de Sousa com a de S. Amaro de seu irmo Pedro Lopes, pelo esteiro 'da villa de Santos, d'onde se comea a capitania da villa de S. Amaro.
CAPITULO LX

Em que se declara cuja a capitania de S.

Vicente.

Parece que necessrio, antes de passar mais adiante, declarar cuja a capitania de S. Vicente, e quem foi o povoador d'ella, da qual fez El-Rei D. Joo III de Portugal merc a Martim; Affonso de Sousa, cuja fidalguia e esforo to notrio- a todos, que escusado bulir n'este lugar n'isso, e s que d'elle.no sabemTOMO x i v 1*>

m
muito vejam os livros, da ndia e vero os feitos maravilhosos que, n'ella, acabou, sondo capito-mr do mar e depois, governador. Sendo este fidalgo mancebo, desejoso, de-commetter grandes emprezas, aceitou esta capitania cp,m cincoenta lguas da osta, como as de'que j fizemos meno, a q'ual determinou de ir povoar em pes,soa, para o ,qu fez prestes uma froia de navios, que proveu de mantimentos e munies de guerra como , onvinha; em a qual embarcou muitos moradores casados que o acompanharam; com,os quaes se partiu do porto de Lisboa, d'onde comeou a fazer sua viagem, e. com prospero tempo chegou esta provincia do Brasil, e no cabo da sua capitania tomou porto no rio que se agora chama de S. Vicente, onde se fortificou e assentou, a primeira villa, que se diz do mesmo nome do rio que fez cabea da capitania. E esta villa foi povoada de muita e honrada gente que n'esta armada .foi, a qual assentou em uma ilha, cTonde lanou os Goaynazes, que o gentio que a possua e senhoreava aquella costa at contestarem com os Tamoyos; a qual villa floresceu muito n'estes primeiros annos; por ella ser a ; primeira em que se fez assucar na costa do Brasil, ;d'onde : se as outras capitanias proveram de cannas de assucar para plantarem^ e de vaccas, para .criarem, e inda agora floresce e tem em si um honrado mosteiro de padres da companhia, e alguns engenhos de assucar, como fica dito. Com o gentio teve Martim Affonso pouco trabalho, por ser pouco bellicoso e fcil de contentar, e como fez pazes com eile, e acabou de fortificar a villa de S. Vicente e a da Conceio, se embarcou em certos navios que tinha, e foi correndo a costa descobrindo-a, e os rios, d'ella at chegar ao Rio da Prata, pelo qual navegou muitos, dias com muito trabalho,- aonde perdeu alguns dos navios pelos baixos do mesmo Rio, em que se lhe afogou, alguma gente, d'onde se tornou a recolher para a capitania que acabou de fortificar como pde. E deixando n'ella quem a governasse e defendesse, se veiu para Portugal, chamado de S. Alteza, que se houve por servido d'elle n'aquellas partes, e o mandou para as da ndia. E depois de a governar se veiu para estes reinos

8 7

que iambem ajudou-a governar com El-Ri D.Joo, que o fez do seu conselho d'Estado; e o mesmo., fez reinando El-Rei D. Sebastio, no tempo que governava a Rainha D. Catharina sua av e depois o cardeal D. Henrique, para o que tinha todas as partes convenientes. N'estes felices annos de Martim Affonso favoreceu muito esta sua capitania com -navios e gente que a elle mandava, e deu ordem com que mercadores poderosos fossem- e mandassem a ella fazer engenhos, de assucar e grandes fazendas, como tem at hoje em dia, do que j fizemos meno. Tem este Rio de S. Vicente grande :Commoclidade para se fortificar e defender, ao que necessrio acudir com brevidade, por ser mui importante esta fortificao ao servio de S. Magestade, -porque, se se apoderarem d'ella os inimigos, sero mos de lanar fora, pelo commodo que tm na mesma terra, para se fortificarem n'ella, e defenderem de quem os quizer lanar fora. Por morte de Martim Affonso herdou esta capitania seu filho primognito Pero Lopes de Sousa, por cujo fallecimento a herdou seu filho Lopo de Sousa.
CAPITULO 'LXI

Em que se declara a capitania de Santo e quem povoou

Amaro,

Est to mstica a capitania de S. Vicente com a-de Santo Amaro, que, se no foram de. dois irmos, amaaram-se muito mal os moradores d'ellas, as quaes iremos dividindo como podermos. Indo pelo Rio ,de S. Vicente acima, antes que cheguem ilha que n'elle est, mo direita d'elle, est a boca do esteiro e porto da villa de Santos,por onde entra a mar, cercando esta terra -at se ajuntar com esfoutro esteiro de S. Vicente ; e entrando por este esteiro de Santos, mo esquerda d'elle est situada a villa. do mesmo nome, a .qual fica tambm em ilha cercada, de gua toda, que se navega com barcos, e lhe- d jurisdico da capitania de Santo Amaro; e tornando ponta de

88 EsteVam da Costa que est na boca da barra de S. Vicente, d'ella a trs lguas ao longo da costa, est a villa de Santo Amaro, junto da qual est o engenho de Francisco de Barros. De Santo Amaro fez Pero Lopes de Sousa, cabea d'esta capitania. D'esta villa de Santo Amaro ' barra de Britioga so duas lguas ; onde est um forte com artilharia e ;bombardeiros, que se chama de S. Filippe. Por esta barra entra a mar cercando esta terra at se ajuntar com o esteiro de Santos, por onde fica Santo Amaro tambm em ilha, e da ponta onde est esta fortaleza, esto no rio duas ilhetas. Defronte da fortaleza de S. Filippe faz uma ponta muito chegada a esfoutra, onde est outra torre com bombardeiros e artilharia, que se diz de S. Thiago, e por entre uma e outra podem entrar nos grandes por ter fundo para isso, se d'estas fortalezas lh'o no impedirem ; e passando d'estas torres pelo esteiro acima, da banda da terra firme esto os rios seguintes, que esto povoados com engenhos e outras fazendas, os quaes se vm metter aqui no salgado : Rio dos Lagartos, o Pirqu, o de S. Joo, o de S. Miguel, o da Trindade, o das Cobras, o do engenho de Paulo de Proenya, o Rio dos Frades, onde est o engenho de Domingos Leito, que j da capitania de S. Vicente, o de Santo Amaro, o do engenho, de Antnio do Valle, o de Manoel( de Oliveira, concluindo marco entre a capitania de S. Vicente e a de Santo Amaro o esteiro de Santos. Atraz fica dito como Pero Lopes cie Sousa no quiz. tomar as cincoenta lguas de costa de que lhe El-Rei fez merc todas juntas, e de que tomou metade em Tamarac e a outra em Santo Amaro, de que agora tratamos. Esta scapitinia foi povoar em pessoa este fidalgo, e fez para o poder fazer uma frota de navios em que se embarcou com muitos moradores, com os quaes partiu' do porto de Lisboa e se foi provincia do Brasil, por onde levava sua derrota, e foi tomar porto no de S. Vicente, d'onde se negociou e fez as povoaes e fortalezas acima ditas, no que passou grandes trabalhos e gastou muitos mil cruzados, a qual agora possue uma sua neta, por no ficar d'elle herdeiro varo a quem ella Q Q m a de Tamarac houvesse de vir.

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CAPITULO LXII

Em que se declara parte da fertilidade S. Vicente

da terra de

N'estas capitanias de S. Vicente e Santo Amaro so os ares frios e temperados como em Hespanha, cuja terra mui sadia e de fresca e delgadas guas, em as quaes se d o assucar muito bem, e se d trigo e cevada, do que se no usa na terra por os mantimentos d'ella serem muito bons- e facilissimos de. grangear, de que os moradores so mui abastados e de muito pescado e marisco, onde se do tamanhas ostras que tm a casca maior que um palmo, e algumas muito faanhosas. Do trigo usam somente para fazerem hstias e alguns mimos. Tem esta capitania muita caa de porcos e veados, e outras muitas alimarias e aves, e criam-se aqui tantos porcos e tamanhos, que os esfolam para fazerem botas, e couros de cadeiras, o que acham os moradores d'estas capitanias mais proveitosos e melhor que.de couro das vaccas, de que n'eatas capitanias ha muita quantidade por se na terra darem melhor que na Hespanha, onde as carnes so muito gordas e gostosas, e fazem vantajem s das outras capitanias, por a terra ser mais fria. Do-se n'esta terra todas as frutas de espinho que tem Hespanha, s quaes a formiga no faz nojo, nem a outra cousa, por se no criar na terra como nas outras capitanias ; do-se n'estas capitanias uvas, figos, roms, mas, e marmelos em muita quantidade, e os moradores da villa de S. Paulo tm j muitas vinhas; e ha homens n'ella que colhem j duas pipas de vinho por anno, e por causa das plantas -muito verde, e para se no avinagrr lhe do uma fervura no fogo ; e tambm ha j n'esta terra algumas oliveiras que do fruto, e muitas rosas, e os marmelos so tantos, que os fazem de conseiva, e tanta marmelada que a levam a vender por as outras capitanias. E no ha duvida se no que ha n'estas capita nias outra fruta melhor que prata, o que se ,no acaba de descobrir, por no ir terra quem a saiba tirar das minas e fundir.

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CAPITULO LXIII

Que trata

de quem so os Goaynazes, e de seus costumes

J fica dito como os Tamoyos so fronteiros de outro gentio, que se hamani os Goaynazes, os quaes tm sua demarcao ao longo da costa por Angra dos Reis, e d'ahi at o rio de ananea, cnde ficam visinhando com outra casta de gentios, que se chama os Carijs. Estes Goaynazes tm continuamente guerra com os Ta-, vfioyos de uma banda, e com os Carijs da outra, e matam-se uns aos outros cruelmente ;, no so os Goaynazes maliciosos, nem refalsados, antes simples e bem acondicionados, e fa.cilimos de crer em qualquer cousa. gente de pouco trabalho, muito mollar, no usam entre si lavoura, vivem de caa que matam e peixe que tomam nos rios, e das frutas silvestres que o mato d; so grandes"flexeiros e inimigos de carne humana.. No matam aos que captivam, mas aceixam-nos por seus escravos; se encontram com gente branca, no fazem nenhum damno, antes boa companhia, e quem acerta de ter algum escravo Goayn no espera d'elle nenhum servio, porque gente folgas de natureza e no sabe trabalhar. No costuma este gentio fazer guerra a seus contrrios fora dos seus limites, nem os vo buscar nas suas vivendas, porque no sabem pelejar entre o mato, se, no no campo, aonde vivem, e se,defendem com seus arcos e flexas dos Tamoyos, quando lhe vem fazer guerra, com quem pelejam no campo mui valentemente e s flexadas, as quaes sabem empregar to bem como os seus contrrios. No vive este gentio em aldas com casas arrumadas, como os Tamoyos seus visinhos; mas em covas pelo, campo debaixo do cho,. onde tm fogo de noite e de clia, e fazem suas camas de rama e pelles de alimarias que matam. A linguagem d'este gentio differente da de seus visinhos, mas entendem-se com os Carijs; so na cr e proporo do corpo como os Tamoyos, etm ; muitas gentilidades, como o mais gentio da costa.

91
CAPITULO

LXIV

Em qu se declara a costa do rio do Santo at Cananea

Amaro

Atraz fica dito como se divide a capitania de S. Vicente da de Santo Amaro pelo esteiro de Santos, e como a villa do Santo Amaro cabea d'esta capitania, da qual o rio da Cananea so vinte e cinco lguas ou trinta, antes da qual se acaba a capitania de Santo Amaro, e corre-se esta costa de Santo Amaro at a Cananea nordeste sudoeste, e toma da quarta cio leste oeste, a qual terra toda boa para se poder aproveitar, -e tem muitos riachos, que se vm metter no mar, entre os quaes um que est onze lguas, antes que cheguem Cananea, a qual faz na boca uma enseada, que tem uma ilha junto ao rio, que se diz a ilha Branca. Este rio da Cananea est em vinfe e cinco gros meios, em o qual rio entram, navios da costa, e se navega por elle acima algumas lguas, e mui capazjpara se poder povoar, e para se fazer .muita conta d'elle, por ser muito abastado de pescado e marisco, e por ter muita caa, cuja terra muito frtil, em a qual se do muitos mantimentos dos naturaes, e se dar tudo que lhe plantarem, e toda a criao de gado que lhe lanarem, por ter grande commodo para isso. Tem o rio da Cananea n . bdca uma abra grande, no meio da qual bem defronte do rio tem uma ilha, e n'esta abra est grande porto .e abrigada para os navios, onde podem estar seguras nos de todo o porte, porque tem fundo para isso.
CAPITULO LXV

Em qu s declara a cosia d Caftn at o Rio de S. Francisco Do rio da. Cananea at o cabo do Padro so cinco lguas, junto do qual est uma iheta chegada terra chama-se este cabo do Padro, por aqui se assentar um pelos primeiros decobridores d'esta costa. Do cabo

92 do Padro ao rio de Santo Antnio so oito leguasj o qual est em vinte gros esforados e dois teros. N'este rio entram barcos da costa vontade. Do rio de Santo Antnio ao Alagado so cinco lguas, e entre um e outra est uma ilheta chegada terra, Do rio Alagado ao de S. Francisco so cinco lguas, o qual est em vinte seis gros e dois teros, e tem na boca trs ilhos. N'este rio entram navios da costa, onde esto seguros de todo o tempo: chama-se este,Rio de S. Francisco, porque afrmam os povoadores da capitania de S. Vicente,' que se informaram do gentio, d'onde vinha este rio, que entra no mar d'esta cosia, e que lhe affirmaram ser um brao do Par, a que os portuguezes chamam de. S. Francisco, que o que j dissemos, o que no parece possvel, segundo o lugar onde se vai metter no mar to distante d'este. Por este rio entra a mar muito, por onde se na?ega com barcos, em o quai se mettem muitas ribeiras, Este rio tem grandes pescarias e muito marisco, e a terra ao longo tem muita caa, e grande commodo pare se poder povoar, por ser muito frtil, e dar tudo o que lhe' plantarem. A terra d'este rio alta e fragosa e povoada de gentio Carij. Corre-se esta costa da Cananea at o rio de S. Francisco nordeste sudoeste, e todas estas ilhas que esto por ella, as qup, esto boca do Rio de S. Francisco, tem bom porto e surgidoro para "os navios ancorarem.
CAPITULO LXVI

Em qu s declara a costa do Rio de S. Francisco at a de Jumirim ou Itapucur Do Rio de S. Franeisco ao dos Dragos so cinco lguas, pelo qua' entram caraveles, e tem na boca trs ilhos. Do rio dos Dragos bahia das Seis Ilhas so cinco lguas; d'esta. bahia ao rio Itapucur so quatro lguas, o qual est em vinte e oito gros escassos ; e corre-se a costa do Itapucur at o Rio. de

93 S. Francisco noite sul. Este rio acima dito, a que outros chamam Jumirim, tem a boca grande e ao mar d'elle trs ilhotas, pela qual entram caraveles : e corre-se por elle acima leste oeste, pelo qual entra a mar muito, onde ha boas pescarias e muito marisco. A"terra d'este rio alta e fragosa, e tem mais arvoredos que a terra atraz, especialmente guas vertentes ao mar. A terra do serto de campinas, como a de Hespanha, e uma e outra muito frtil e abastada de caa e muito acommodada para se poder povoar, porque se navega muito espao por ella acima. Este rio est povoado de Carijs contrrios dos Goayanazese que falamos. J estes Carijs esto de paz com os portuguezes, que vivem na capitania de S. Vicente e Santo Amaro, os quaes vm por mar resgatar com elles n'este rio, onde se contratam, sem entre uns e outros haver desavena alguma.
CAPITULO LXVII

Em que se declara a terra que ha de Itapucur at o Rio dos Patos Do rio de Itapucur at o Rio dos Patos so quatro lguas, o qual est em vinte e oito gros. Este rio muito grande, cuja boca se serra com a ilha de Santa Catharina, por onde entram os navios da costa, e a mar muito espao, por onde se navega. Mettem-se n'este rio muitas ribeiras, que vm do serto ; o qual muito acommodado $ara se poder povoar, por a terra ser muito frtil para tudo que lhe plantarem, a qual tem muita caa de veados, de porcos e de muitas aves, e o rio mui provido de marisco, e tem grandes pescarias at onde possuem a terra os Carijs; e d'aqui por diante a vivenda dos Tapuias, e est por marco entre uns e outros este Rio dos Patos. . A'boca d'este -ido est situada a ilha de Santa Catharina, que vai fazendo abrigo terra at junto de Itapucur, que fica a maneira de enseada. Tem esta ilha de'comprido oito lguas, e corre-se norte sul, a qual da banda do mar no tem nenhum surgidoro, salvo
. TOMO xiv 16

94 um ilho, que est na ponta do sul, e outro que tem na ponta do norte; a qual ilha coberta de grande arvoredo, e tem muitas ribeiras d'agua dentro e tem grande commodidade para se poder povoar, por ser a terra grossa muito boa e ter grandes portos, em que podem estar seguras de todo o tempo muitas nos. Mostra esta "ilha uma bahia grande, que vai por detraz, entre ella a terra firme, onde ha grande surgidoro. e abrigada para nos de todo porte; n'esta enseada que se faz da ilha para terra firme esto muitas ilhetas: est esta boca e ponta da'ilha da banda do norte em vinte oito gros de altura.
CAPITULO LXVIII

Em que se declara parte dos costumes dos Carijs Atraz fica dito como os Carijs so contrrios dos Goayanazes, e como se matam uns aos outros; agora cabe aqui dizer d'elles o que se pode alcanar e saber de sua vida e costumes. Este gentio possua; esta costa d'este rio da Cananea onde parte com os Goayanazes; em a qual se fazem uns aos outros mui continua e cruel guerra, pelejando com arcos e flexas, que os Carijs sabem to bem manear como seus visinhos contrrios. Este gentio domstico, pouco bellicoso, de boa razo; segundo seu costume, no come carne humana, nem mata homens brancos que com elles vo resgatar, sustentam-se de caa e peixe que matam, e de suas lavouras qu fazem, onde plantam mandiocae legumes como os Tamoyos e Tupiniquins, Vivem estes indios em casas bem cobertas e tapadas com cascas de arvores, por amor do frio que ha n'aquellas partes. Esta gente de bom corpo, cuja linguagem differente da de seus visinhcs, fazem suas brigas com os contrrios em campo descoberto, especialmente com os Goayanazes com quem tm suas entradas de guerra: e como os desbaratados se acolhem ao mato se tm por seguros,, porque nem uns nem outros sabem pelejar-por entre elle. Costuma este gentio no inverno danar sobre si umas pelles da caa qe matam, uma por di-

95 ante, outra por detraz ; tm mais muitas gentilidades, manhas e costumes, como os Tupinambs, em cujo titulo se contam mui particularmente.
CAPITULO LX1X

Em que se declara a costa do Rio dos Patos at o da Alagoa Do Rio dos Patos ao rio de D., Rodrigo so oito lguas ; e corre-se a costa norte sul, at onde a terra algum tanto alta, o qual porto est em vinte e oito gros e um quarto. Este porto est no cabo da ilha de Santa Catharina, o qual est em uma bahia que a terra faz para dentro, onde ha grande abrigada e surgidoro, para os navios estarem seguros de todos os ventos, tirado o nordeste-que cursa no vero e venta igual, com o qual se no encrespa o mar. Do porto de D. Rodrigo ao porto e rio da lagoa so treze lguas, o qual nome tomou por o porto ser uma calheta grande e redonda e fechada na boca que parece a lagoa, onde tambm entram navios da costa o esto mui seguros. Do Rio dos Patos at aqui esta terra vista cio mar sem mato, mas est vestida de herva verde, como a de Hespanha, onde se do muito bem todos os fructos que lhe plantam; em a qual se dar maravilhosamente a criao das vaccas e todo o mais gado que lhe lanarem; por ser a terra fria e ter muitas guas para o gado beber. Esta terra possuda dos Tapuias, ainda que vivem algum tanto afastados do mar por ser a terra desabrigada dos ventos : mas o porto de D. Rodrigo sufficiente para se poder povoar, pela fertilidade da terra e pela commodidacle que tem ao longo do mar de pescarias e muito marisco, e por a terra ter muita caa. E o porto, da Alagoa, com que conclumos este capitulo, tem um ilho junto cia boca da barra.

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CAPITULO LXX

Em que se declara a costa do porto da Alagoa at o rio de Martim Affonso Do porto da Alagoa ao porto e rio de Martim Affonso so vinte e duas lguas, as quaes se correm pela costa nordeste sudoeste e toma da quarta de norte sul. Este rio est em trinta gros e um quarto ; e chama-se de Martim Affonso por elle o descobrir quando anduu correndo esta costa de S. Vicente at o Rio da Prata. Este rio tem muito bom porto de fora para navios grandes e dentro para os da costa, cuja terra baixa e da qualidade da de traz. Tem este rio duas lguas ao mar uma ilha aonde ha htm porto e abrigada para surgirem navios de todo o porte ; entra a mar por este rio muito, aonde ha muito marisco, cuja terra de campinas que esto sempre cheias de herva verde com algumas reboleiras de mato, onde se dar tudo o que lhe plantarem, e se criar todo o. gado que lhe lanarem ; por ser terra fria, e ter muitas guas de alagoas e ribeiras para o gado poder beber, pelo que este rio se pde povoar, onde os moradores que n'elle viverem estaro mui descanados, o qual povoado de Tapuias como a mais terra atraz. Entre o porto da Alagoa e o de Martim Affonso est o porto que se diz de Santa Maria e o que se diz da Terra Alta, e em m e outro podem surgir os caraveles da co--ta.
CAPITULO LXXI

Em que se declara a costa do rio de Martim at o porto de S. Pedro

Affor,so

Do rio de Martim Affonso bahia, dos arrecifes so dez lguas, e da bahia ao rio do porto de S. Pedro so quinze lguas, o qual rio est em altura de trinta e um gro e meio ; cuja co-ta se corre nordeste sudoeste ; da banda do sudoeste d'este porto de S. Pedro se faz uma ponta de ara, que boja ao mar bem lgua e meia. N'este porto ha um bom surgidoro e abrigada

97 para os navios entrarem seguros sobre amarra, em qual se vem metter no salgado um rio de gua doce. Esta terra muito baixa e no se v de mar em fora seno de muito perto, e toda de campos coberta de herva, verde, muito boa para mantena de criao de gado vaccum e de toda a sorte, por onde ha muitas lagoas e ribeiras de gua para o gado beber. E tem esta terra algumas reboleiras de mato vista jimas das outras, onde ha muita caa de veados e porcos que andam em bandos, e muitas outras alimarias e aves, e ao longo da costa ha grandes pescarias e stios acommodados para povoaes com seus portos, onde entram caraveles, em a qual terra se daro todos os fructos que lhe plantaram, assim naturaes como de Hespanha : e dos mantimentos de terra se aproveita o gentio Tapuia, em ,suas roas e lavouras, que fazem- afastadas do mar trs ou quatro lguas, por estarem l mais abrigados dos vento? do mar, que cursam no inverno, onde ao longo d'elle no tem nenhum abrigo, e porque lhe fica a lenha muito longe.
CAPITULO LXXII

Em que se conta como corre a costa do rio de S. Pedro at o cabo de Santa,: Maria Do p'>rto de S. Pedro ao cabo de Santa Maria so quarenta e duas lguas, as quaes se correm pela costa nordeste sudoeste, o qual est em trinta e quatro gros; e tem da banda do sueste, duas lguas ao mar, trs ilhos altos que se dizem os Castilhps, entre os quaes e a terra firme ha ba abrigada e surgidoro para nos de todo o porte. Toda esta terra baixa sem arvoredo, mas cheia de herva verde em todo o anno, e ha partes que tem algumas reboleiras de mato ; a herva d'estes campos muito boa para criaes de gado de toda sorte, onde se dar muito bem por ser a terra muito temperada no inverno, e no vero lavada de bons ares frescos e sadios, pela qual ha muitas guas frescas para os gados beberem assim de

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lagoas como de ribeiras, onde se daro todos Ps fructos de Hespanha muito bem, como em S. Vicente, e pelo Rio da -Prata acima nas povoaes dos castelhanos, onde se d tanto trigo, que aconteceu o anno de 83 vir ao Rio de Janeiro uma das nos em que passou D. Alonso, Vizorei da provincia de Chile, que desembarcou em Buenos-Ayres, a qual carregou n'este porte de trigo, que se vendeu no Rio de Janeiro a trs reales a fanega, o qual se dar muito bem do Rio de Janeiro por diante, d'onde se pde prover toda a costa do Brasil. Esta costa desde o Rio dos Patos at a boca do Rio da Prata povoada de Tapuias, gente domestica e bem acondicionada, que no come carne humana, nem faz mal gente branca que os communica, como soos moradores da capitania de S. Vicente, que vo emcaraveles resgatar por esta costa com este gentio, alguns escravos, cera da terra, porcos, galinhas e outras cousas, com quem no tem nunca desavena ; e porque a terra muito rasa e descoberta aos ventos, e no tem matos nem abrigadas, no vivem estes Tapuias ao longo do mar, e tm suas povoaes afastada-; para o serto ao abrigo da terra, e vQm pescar e mariscar pela costa. No tratamos aqui da vida e costumes d'este genti-% porque se declara ao diante no titulo dos Tapuias, que vivem no serto, da Bahia, e ainda que vivam to afastados d'estes, so todo uns e tm qasi uma vida e costumes.
CAPITULO LXXIII

Em que se declara a costa do cabo de Santa at a boca do Rio da Prata

Maria

Do cabo de Santa Maria ilha dos Lob)s so quinze, lguas, cuja costa se corre nornorde.ste, simuloeste a qual'est em trinta e quatro gros e dois teros, cuja terra firme faz defronto da ilha a maneira de p mta. Entre esta ponta e a ilha ha boa abrigada e porto para navios.

99 D'esta ponta se vai recolhendo a terra para dentro at outra ponta, que est outra ilha, que se diz das Flores, que est lgua e meia afastada d'esta ponta, que se chama do Arrecife, pelo haver d'ahi para dentro at o Monte de Santo Ovdio, est na boca de um rio, que se vem metter aqui no salgado. D'esta ponta, da ilha dos Lobos, que est na boca do Rio da Prata, outra banda do rio, que se diz a ponta de Santo Antnio, so trinta e quatro lguas. $ Est o meio. da boca cio Rio da Prata em trinta e cinco gros e dois teros ; e ao mar quarenta lguas, bem em direito d'esta boca do Rio est um ilho, cercado de baixos de redor d'elle obra de duas lguas,* onde se chama os Baixos de Castelhanos, porque aqui se perdeu uma no sua, o qual ilho est na mesma altura de trinta e cinco gros e dois teros. A terra junto da boca d'este rio da qualidade da outra terra do cabo de Santa Maria, onde se dar tambm grandemente o gado vaccum e tudo o mais que lhe lanarem. D'este Rio da Prata, nem de sua grandeza no temos que dizer n'este lugar, porque to nomeado que se no pde tratar d'ello sem grandes informaes, do muito que se pde dizer dos seus recncavos, ilha, rios que- se n'elle mettem, fertilidade da terra e povoaes que por elle acima tm feito os castelhanos, que encaparam da armada que se nelle perdeu ha muitos annos, os quaes se casaram com as ndias da terra, de que nasceram grande multido de mestios que agora tem povoado muitos lugares, o qual Rio da Prata povoado muitas lguas por elle acima dos Tapuias atraz declarados.
CAPITULO LXXIV

Ifm que se declara a terra e costa da ponta do Rio da Prata da banda do sul at alm- da bahia de 8. Mathias A ponta do Rio da Prata que se diz de Santo Antnio, que, est da banda do sul, demora em trinta e seis gros e meio, defronte da qual so baixos uma

100 lgua ao mar. Da ponta de Santo Antnio ao Cabo Branco so vinte e duas lguas e fica-lhe em meio uma enseada, que se diz de Santa Apolonia, a qual cheia de baixos, e toda a costa de ponta a ponta uma e duas lguas ao mar so tudo baixos Este Cabo Branco est em trinta e s e t e gros e dois teros, e.corre-se a costa nornordeste susudoeste. Do Cabo Branco ao Cabo das Correntes so vinte e cinco lguas, e fica entre um cabo e o outro a Angra , das Aras, ao mar , da qual sete ou oito lguas so tudo baixos. Este Cabo est em trinta e nove gros, cuja co-da se corro nornordeste susudoeste. Do Cabo das Correntes ao Cabo Aparcellado so oitenta e seis lguas, e corre-se a costa de ponta a ponta lesnordeste oessudoeste, o qual Cabo Aparcellado est em quarenta e um gros, cuja costa cheia de baixos, e a partes os tem cinco e seis lguas ao mar; toda de ara, e a terra muito baixa, por onde se mettem alguns esteiros no salgado, onde se pde recolher caraveles da costa, que so navios de uma s coberta que andam em seis e -sete palmos de gua, d'este Cabo Aparcellado se torna a recolher a terra para denti o leste oe;4e, at a ponta da bahia de S. Mathias, que est na mesma altura de quarenta e um gros, que sero vinte e sete lguas, e da ponta Aparcellada a quatro lguas, em uma enseada que faz a terra, est uma .ilheta, e na ponta d'esta enseada da banda de loeste est outra ilha uma lgua do mar. Da ponta.da bahia de S. Mathias at a ponta de terra do Marco sd trinta e oito lguas, Cuja costa se corre norte sul, a qual toda aparcellada, e antes de chegai^ esta ponta do Marco est .outra ilha. A terra aqui baixa e pouco proveitosa. N'esta ponta do Marco se acaba a demarcao da coroa de Portugal 1 n'esta costa do Brasil, que est. em quarenta e quatro gros pouco mais ou menos, segundo a opinio do Dr. Pedro Nunes, cosmographo d'El-Rei D. Sebastio, que est em gloria, que n'esta arte foi em seu tempo o maior homem de Hespanha.

SEGUNDA PAUTE

M E M O R I A L E DECLAKAJAO
DAS GRANDEZAS DA BAHIA DE TODOS OS SANTOS, DE SUA FERTILIDADE E DAS NOTVEIS PARTES QUE TEM

CAPITULO

Atraz fica dito, passando pela Bahia de Todos os Santos, que se no sofiria n'aquelle lugar tratar-se das grandezas d'ella, pois n|o cabiam alli; o que se faria ao diante mui largamente, depois que se acabasse de correr costa com que temos j concludo. Da qual podemos agora tratar e explicar o que se d'ella no sabe para que venham noticia de todos os eccultos "d'est illustre terra, por cujos merecimentos deve de ser mais estimada e reverenciada do que agora , ao que queremos 'satisfazer com singelo estilo pois o no tefios grave, mas fundado tudo na verdade. Gomo El-Rei D.Joo III de Portugal soube ;da morte de Francisco Pereira Coutinho, sabendo j das grandes partes da Bahia, da fertilidade da terra, bons ares, maravilhosas guas e da bondade dos mantiments d'ella, ordenou de a tomar sua conta j a r a a fazer povoar, como meio e corao de toda esta costa, e mandar edificr n'ella uma cidade, d'onde se pudessem ajudar e soccorrer todas as mais capitanias e povoaes d'lla como a membros seus; e pondo S. Alteza em effet esta determinao to acertada, mandou fazer prestes uma armada e provel-a de' todo o necessrio para esta empreza, em a qual mandou embarcar'Th* 17

102

m de Sousa cio seu conselho, e o elegeu para edificar esta nova cidade, de que o'fez capito, e governador geral de todo o Estado do Brasil: ,ao qual deu grande alada e poderes em seu regimento, com que quebrou as doaes aos capites px-oprietarios por terem demasiada alada, assim no crime como no eivei; de que se elles aggravaram S Aliteza, que no caso os no proveu, entendendo convir a si a seu servio. E como a dita armada esteve prestes, partiu Thom de Sousa do porto de Lisboa aos 2 dias de Fevereiro de 1549 annos ; e levando prospero vento chegou Bahia de Todos os Santos, para onde levava sua derrota, aos vinte e nove dias >d Maro do dito anno, e desembarcou no porto de Villa Velha, povoao que Francisco Pereira edificou, onde pz mil homens, convm a saber: seiscentos soldados e quatrocentos degradados e alguns moradores casados, que comsigo levou, e outros criados d'El-Rei que iam providos de cargos, que pelo "tempo em diante serviram.
CAPITULO II

Em que se contem quem foi Thom de Sousa e de suas qualidades. Thom de, Sousa foi um fidalgo honrado, ainda que bastardo, homem- avisado, prudente e mui experimentado na guerra de frica e da ndia, onde se mostrou mui valoroso cavalleiro em todos os encontros em que se achou ; pelos quaes servios e grande experincia que tinha, mereceu fiar d'elle El-Rei tamanha empreza como esta que lhe encarregou, confiando de seus merecimentos e grandes qualidades que daria a conta d'ella que se d'elle esperava; a quem deu por ajudadores ao Dr. Pedro Borges, para com elle servir de ouvidor geral, ppr o governo da justia em ordem em todas as capitanias ; e a Antnio .Cardoso de Barros para tambm ordenai- n'este Estado o tocante Fazenda de S. Alteza, porque at ento no havia ordem em uma cousa nem em outra, e cada um vivia ao som da sua vontade. O qual Thom de Sousa tam-

103 bem levou em sua companhia padres da de Jesus, para doutrinarem e converterem o gentio na nossa santa f catholica, e a outros sacerdotes, para ministrarem os sacramentos nos tempos devidos. E no tempo que Thom de Sousa desembarcou achou ua Villa Velha a um' Diogo Alvares, de alcunha o Caramur, grande lingua do gentio, o qual depois da morte de Francisco Pereira fez pazes com o gentio; e, com ellas feitas, se veiu;dos Ilhos a povoar o assento ds casas em que d'antes vivia, que era afastado da povoao; onde se fortificou e recolheu com cinco genros que tinha, e outros homens, que o acompanharam, dos que escaparam da desaventura de Francisco Pereira, os quaes, ora com armas, ora com boas razes se foram defendendo e sustentando at chegada de Thom de Sousa, por cujo mandado Diogo Alvares quietou o gentio e o fez dar obedincia ao governador, e offerecer-se ao servir : o qual gentio em seu tempo viveu muito quieto e recolhido, andando ordinariamente trabalhando na fortificao da cidade a troco do resgate que lhe por isso davam.
CAPITULO III

Em que se declara como se edificou a cidade do "Salvador. Como Thom de Sousa acabou de desembarcar a gente d'armada e a assentou na Villa Velha, mandou descobrir a bahia, e que lhe buscassem mais para dentro alguma abrigada melhor que a em que estava a armada, para a tirarem d'aquelle porto da Villa Velha onde no estava segura, por ser muito desabrigado; e por se achar logo o porto e ancoradouro; que agora est defronte da cidade, mandou passar a fiota para l por ser muito limpo e abrigado; e como teve a armada segura mandou descobrir a terra bem, e achou que defronte d'o mesmo porto era o melhor sitio que por alli havia para edificar a cidade, e por respeito do porto assentou que no convinha fortificar-se no porto d e Villa Velha, por defronte d'este porto

estar- ma grande fonte bem; borda da gua: quej ' servia, pa,;ra agu-ada dos navios e servio da cidade, o qjue pareceu bem todas as pessoas do eonselho> cfie n'?issO' assignarami E. tomada esta "resoluo se p> em OEdem para este edifcio, fazendo, primeiro uma. cerca muito, forte de po. a pique, para os. trabalhadores e soldados poderem estar seguros do< gentio. Come foi acabada, arrumou a cidade .d-'ella pira dentro, arruando-ar por boa ordem com as casas cobertas, de palma ao modo. de gentio, em as quaes por entretanto; se-^ agazalharam os mancebos e soldados que.; vieram, na, armada. E como todos foram agazalhadoSj, ordenou de cercar esta cidade de muros de taipa gros- / sa, o que fez com muita brevidade, com dois baluartes ao longo do mar e quatro da banda da terra, em cada um d'elles assentou muito formosa artilharia que para isso- levava, com, o que a cidade ficou muito, bem fortificada para se segurar do gentio : em a qual o, governador fundou logo um collegio dos padres dia? companhia, e outras igrejas e grandes: casas, paras viverem os governadores, casas, da cmara, cadeia, alfndega, contos, fazenda, armazns, e outras oficinas' convenientes ao servio de S4 Alteza.
CAPITULO- IV

Em que^ se contem como El-Rei mandou- outra armada;, em favor de Thom d)e Sousa. Logo no anno seguinte de 1550, se ordenou outra armada, com. gente e mantimentos, em soccorro d'esta novar cidade, da qual fo; por capito Simo da, Gama de Andrade com o galeo velho muito afamado e outros navios marchantes, e m a qual foi o.bispo, D.Pedro Fernandes Sardinha, pessoa de muita autoridade, grande exemplo e estremador pregador, o qual levou toda a, clerezia, ornamentos, sinos, peas de prata e outras alfaias do servio da, igreja, e todo o mais conveniente ao servio do culto divino: e sommou a despeza que se. fez no sobredito, e no cabedal que se

-ae. 105

metieu na artilharia, munies de guerra, spldps, mant-imentos, ordenados dos officiaes, passante, de trezentos mil cruzados. E logo no anno seguinte mandou S. Alteza; em favor! dfesta cidade outra armada, e por capito d'ella Antnio de Oliveira com outros moradores casados e alguns forados, em a qual mandou a Rainha D. Catharina, que est em gloria, algumas donzellas de nobre gerao, das que mandou criar e recolher em Lisboa no mosteiro das ophs, as quaes encommendou muito ao governador por suas cartas, para que as cazasse com pessoas principaes d'aquelle tempo; a quem mandava dar em dote de casamento, os officios do, governo d fazenda e justia, Com o que a cidade se, foi ennobrecendo, e com ps escravos de Guin, vaccas e guas que S. Alteza mandou a, esta nova cidade,, para que se repartissem pelos moradores d'ella,, e que p-gassem, o custo por seus soldos e ordenados, e ' o mais lhe mandava pagar em mercadorias pelo preo, que custavam em Lisboa, por a esse tempo no irem a essas partes mercadores, nem havia para que, por na terra no- haver ainda em que pudessem fazer seus empregos; pelo qual respeito S. Alteza mandava, cada anne em soccprro dos moradores d'esta. cidade uma armada com desgradados, moas orphs, e muita fazenda, com o que a foi, ennobrecendo e povoando com muita presteza, do que as mais capitanias se foram tambm ajudando, as quaes foram visitadas pelo governador e postas na ordem conveniente ao servio d'El-Rei, e ao bem de sua justia e, fazenda.
CAPITULO v

Em que.se trata como D. Duarte da Costa foi governar o Brasil, Como Thom de Sousa acabou o seu tempo de governador, que gastou to bem gastado n'este novo Estado do Brasil, requereu S, Alteza que o mandasse tornar para o reino, a cuja petio El-Rei satisfez com mandar por, governador a D. Duarte da Costa, do seu conselho ; ao qual deu a armada conveniente a tal pessoa

106 em que passou a este Estado, com a qual chegou salvamento Bahia de Todos os" Santos; desembarcou na cidade do Salvador, nome que lhe S. . mandou pr; e lhe deu por armas uma pomba branca em campo verde, com um rollo roda branco, com letras de ouro que dizem Sic Ma ad Arcam reversa est, e a pomba tem trs folhas de oliva no bico: onde lhe foi dada posse da governana por Thom de Sousa, que se logo embarcou na dita armada e se veiu para o reino, onde serviu a El-Rei D. Joo e a seu neto El-Rei D. Sebastio, de veador, e no mesmo cargo serviu depois Rainha D. Catharina em quanto viveu. E tornando a D. Duarte, como tomou a posse da governana, trabalhou quanto foi possvel, por fortificar e defender esta cidade do gentio que em seu tempo se alevantou e commetteu grandes insultos, os quaes elle emendou dissimulando alguns com muita prudncia,e castigando outros cora as armas, fazendo-lhe crua guerra, a qual caudilhava seu filho D. lvaro da Costa que n'estes trabalhos o acompanhou, e se mostrou n'elles muito valoroso capito. Em.todo o tempo que D. Duarte governou o Brasil, foi todos os annos favorecido e ajudado com armadas que do reino lhe mandavam, e em que lhe foram muitos moradores e gente forada com todo o necessrio, ao qual succedeu Mem de S, em cujos feitos j tocamos, o qual foi tambm governar este Estado por mandado d'El-Rei D. Joo o III, a quem a fortuna favoreceu de feio em quatorze annos, que foi governador do Brasil, que subjugou e desbaratou todo o gentio Tupinamb da comarca da Bahia e a todo o mais at o Rio de Janeiro, de cujos feitos se pode fazer um notvel tratado; o qual Mem de S foi pouco favorecido d'estes reinos, por lhe fallecer logo El-Rei D. Joo que com tanto fervor trabalhava por acrescentar e engrandecer este seu Estado, aqum a Rainha D. Catharina, no tempo que governou estes reinos, foi imitando; mas como ella desistiu da governana d'elles, foram esfriando os favores e soccorros

107 que cada anno esta nova cidade recebia, para a qual no mandaram d'alli por diante mais que um galeo d'armada, em que iam os governadores que depois , a foram governar, pelo que este Estado tornou atraz de como ia florescendo. E se esta cidade do Salvador cresceu em gente, edifcios e fazenda como agora tem, nasceu-lhe da grande fertilidade da terra que ajudou aos moradores d'ella, de maneira que tem hoje no seu termo, da Bahia para dentro, quarenta engenhos de assucar, mui prsperos de edifcios, escravaria e outra muita fabrica, dos quaes houvera muitos mais, se os moradores foram favorecidos como convinha, e como elles esto merecendo por seus servios, com os quaes o governador Mem de S destruiu e desbaratou o gentio que vivia de redor da Bahia, a quem queimou e assolou mais de trinta aldas^ e os que escaparam de mortos ou captivos, fugiram pra o serto e se afastaram do mar mais de quarenta lguas, e com os mesmos moradores soccorreu e ajudou o dito Mem de.S as capitanias dos Ilhos, Porto Seguro e a do Espirito Santo, as quaes estavam mui apertadas do gentio d'aquellas partes e com elles foi lanar por duas vezes os francezes fora do Rio de Janeiro e a povoal-o, onde acabaram muitos d'estes moradores sem at hoje ser dada nenhuma satisfao a seus filhos. E todos foram fazer estes e outros muitos servios sua custa, sem lhe darem soldo nem mantimentos, como se costuma na ndia e nas outras partes, e a troco d'estes servios e despezas dos moradores d'esta cidade no se fez at hoje nenhuma honra nem merc a nenhum d'elles, do que vivem mui escandalisados e descontentes.
CAPITULO VI

Em que se declara o clima, da Bahia, como cruzam os ventos na sua costa e correm as guas. A Bahia de Todos os Santos est arrumada em treze gros & um tero, como fica dito atraz ; onde os dias em todo o anno so quasi iguaes com as noites e a diffe-

108 ren> que -tem os dias de vero aos do inverno uma hora at hora e meia. E comea-s o inverno d'esta provincia no mez de Abril, e acaba-se por todo o julho, em o qual tempo no faz frio que Obrigue aos homens se chegarem o fogo, seno ao gentio porque andam despidos. Em todo este tempo do inverno correm s agua:s ao longo d costa a cem lguas ao mar d'ella, dspartesdosulpra os rumos do norte, por quatro e -cinco mezes, e s vezes cursam os ventos do sul, 'sudoeste e lessuete, que ha travessia na costa de Porto Seguro s o cabo Santo Agostinho. Comea-se o vero em Agosto como em Portugal fem Maro,51 e dura at todo o mez de Maro, em o qual tepo reinam os ventos nordestes e lesnordsts, e correm s guas ha costa ,ao som dos ventos da parte do norte i para o sul, pela qual razo se ho navega o longo d'esta costa seno, com as mones ordinrias. Em:todo o tempo do anno, quando chove, fazem s cos da Bahia as mais formosas mostras de nuvhs de mil cores e grande resplndor, que se nunca viram em outra parte, o que causa grande admirao. E ha-se de notar que, n'esta comarca da Bahia, em rompendo luz da manh, nasce eom ella juntamente o sol, assim n inverno como no vero. E em se recolhendo o sol tarde, escurece juntamente o dia e cerra-se a noite logo; a que mathematicos dm razes suffieientes que satisfaam a -quem quizer saber este segredo, porque os mareantes e philosophos que este terra foram, nem outros homens de bom jizo ho tm atinado at agora com a causa porque isso assim seja.
CAPITULO Vil

Em que se declara o sitio da cidade do Salvador* A cidade do Salvador est situada na Bahia de Todos os Santos uma lgua da barra para dentro em m alto, Com o rosto ao poente, sobre o mar da mesma Bahia; a qual cidade foi murada e torreada em

109, tempo .-do governador - Thpm de Sousa, que a.edificou comoin&trazhfica, dito; cujos muros.,se vieram, ,ap, cho' paru serem,vde taipa,, e ser no, repararem,,,nunca,,'.em| 'Oi-.quee -descuidaram; ps governadores,, pelo ,qe',ljs', sabeHas<!<0(U, <pori:Se( a/cidade, ir estendendo, muito' por fraidos m-uinos; (.e-; iseja, pel( que,, fpr, agora,, .no, ^a/ miemo|a'iaondei elles, es-fiveram- .Ter psta!pidade(oit-' centos^ visinhos, pouco mais.ou,menos,,e por, fprja,c'eiia.| n>,'todoSies ;recQn,QavoSid,B?-,hi,a,; hay.er.mais.de dois' mil visinhos, cVentre os quaeseips,da..cidade/se,'p^d^ ajuntar, quando cumprir, quinhentos homens (ie cavallo e mais de dois; pi\] r$.ej:PA afora a gente dos navios que esto sempre no porto. Est no meio d'esta cidade,^uiru^ honesta, prapa,,,em que se-, correm touros quando convm, em a .qual, sta d banda'''do sul umas nobres casas, em que' se agazalham os governadores, ,e. da banda, do nprte tem as casas donegociqlda..jazenda, alfndega e armazns ; e da parte- de 2T.I o l f i < r i . T " . - |< ; . ,.,, -:,-,,| -, T , , . .'i - !, , i < ,'T . lesje, |$m, a,,casa 'da cmara,, cadea.e outras casas de mpVdqresy ' cm 'Que 'fica'est pr' em''quadro' e1 d pelourinho no meio delia, a qual da panda do poente e.s^. 'cb^sajbafada com grande vista sobre 'mr';' bnde esto,'ssepfads algumas''peas' !de artilharia' 'grossa, djpnde^a .t^erra, vai muito a pique sobre o mar;'.ao longo^, dp |qi|al.. 'tudo,,rochedo mui' asjpro;"e ''d''st' hes-; tna banpla ,da praa,' 'dos 'cantos 'd'lla, ,: descem'dls ^nin^s em vqlts, pra " praia, um d bahd'dd n,p'rm-,,gue',|^serventia da fonte,que se'di2 d' Pereira er ,do(, d^sembarcadcvurp da gente dos navios ;'/o cmi$hV./I-ue.-,est,,da parte do. sul serventia pra Nossa gejO,hpraj,';d Conceio,s' aonde est o dsembrcdor^ geral 4M',mercadorias,' a qual, desembarcadouro 'vai t^/^^trPj-^a^mnholde carro, pr onde s"!stas!-m!rcadorias ,e, outras cosas' que 'aqui se''desembarcam,1 |;qyja^''e]^,'j'c^r,r,os,':par'a cidade,, E tofhandP*''"'p'ra|V))porpCi^d' 'd^elta' para " norte'' vi uma1,formosa" rua 'dCj!ni^rpadores' ate,',a s,,no cabo da qual, d1'banda, do m^r/ZcisU. situada "a casa'd Misericrdia chds^ pitai, cuja !,grej.a no''grande,' ms mi bem c1bada e . ornamentada ;' e se _ ' esta casa' no.; tem''grarid&s officinas e enfermarias, , por' ser muito' p";bre"''n"e)
J t

no tor nenhuma- renda de S. Magestade, nem de pessoas particulares, e sustenta-se somente de esmolas que lhe fazem os moradores da terra que so muitas, mas so as 'necessidades mais, por a muita gente do. mar e degradados que d'estes reinos vo muitos pobres, os quass em suas necessidades no tm outro remdio, que o que lhe esta casa d, cujas esmolas importam cada anno trs mil cruzados pouco mais ou menos, que se gastam com muita ordem na cura dos enfermos e remdio dos necessitados.
CAPITULO VIU

Em

que se declara o sitio da cidade, da S diante

por.

A S da cidade do Salvador est situada com o rosto sobre o mar da Bahia,, defronte do ancoradouro das nos, com um taboleiro' defronte da porta, principal, bem a pique sobre o desembarcadouro, d'onde temgrande vista. A igreja de trs naves, de honesta grandeza, alta e bem assombrada, a-qual tem cinco capellas muito bem feitas e ornamentadas, e dois altares nas hombreiras da capella mr. Est esta S em redondo cercada de terreiro, mas no est acabada da torre dos sinos e da do relgio, o que lhe falta, e outras officinas muito necessrias, por ser muito pobre e no ter para fabrica mais do que cem mil ris cada anno, e estes muito mal pagos. Serve-se n'esta igreja o culto divino com cinco digniddes, seis conegos, dois meios conegos, quatro capelles, um cura e coadjutor, quatro moos de coro e mestre da capella, e muitos d'estes ministros, no so sacerdotes; e ainda que so to poucos, fazem-se n'ella os officios divinos com muita solemnidade, o que custa ao bispo um grande pedao da sua casa ; por contentar os sacerdotes que prestam para isso, com lhe dar a cada um, um tanto com que queiram servir de conegos e digniddes, do que os clrigos fogem, por no ter cada conego, mais de trinta mil ris, e as digniddes a trinta e cinco, ti-

111

rado o deo que tem quarenta mil ris, o que lhe no basta para se vestirem. Pelo que querem antes ser capelles da Misericrdia ou dos engenhos; onde tm de partido sessenta mil ris, casas em que vivam e de comer: e n'estes lugares rendem-lhe suas ordens e p de altar outro tanto. Est esta S muito necessitada de rnmentos,.e os de que se serve esto mui damnificados; e de maneira, que nas festas principaes, se aproveita o cabido dos das confrarias, onde os pe, dem emprestados ; de que S. Magestade no deve estar informado, que se o estivra, tivera j mandado prover esta necessidade, em que est o culto divino, pois manda receber os dzimos d'este seu Estado, cuja cabea est to damnificada, que convm acudir-lhe com remdio devido com muita presteza.
. CAPITULO IX

Em que se, declara como corre a cidade do Salvador da S por diante Passando alm da ,-S pelo mesmo rumo do norte, corre outra rua mui larga, tambm occupada com lojas de mercadores, a qual vai dar cmsigo em um terreiro mui bem assentado e grande, aonde se representam as festas a cavallb, por ser maior ,que a praa, o qual est cercado em quadro de nobres casas. E occpa este terreiro e parte da rua da banda do mar um sumptuoso collegio dos padres da Companhia de Jesus, com uma formosa e alegre igreja, onde se serve o culto divino com mui ricos ornamentos, a qual os padres tem sempre mui limpa e cheirosa. Tem este collegio grandes dormitrios e muito bem acabados, nartes cios ques ficam sobre o mar com grande vista; cuja obra de pedra e cal, com todas as escadas, portas e janellas de pedrarias, com varandas, e cubculos mui bem forrados, e por baixo lageados com muita perfeio, o qual collegio tem -grandes cercas at o mar, com gua muito boa dentro, e ao longo cio mar tem umas terracenas, onde

Wcoleti ti qi^rn^hiemfercadB darjfitoaiiTetmilate. el'%ib'' (jHf^aftiitf oitentai -.relig,iosos;-quesedoctciurf pan. eni^^r^ar ,J ''ohiBffarialgidnua1, partl-jfdlell^ pdt^qk'-ehinm; ;Itimv;'artsiy! thtalogia td",ciaSOs de>c c!ieh'cia,; JcWm'r'(iUei-'tm'.',f0to mitn imitou na-.ute(rt>a.(} o^qufr elW hi"uitov-ri,^porq'ue) teifaudenSIjiMli ciada afino! "quatro' til cruzados ie ^avantagem;;imparitat]Mt ha'iJouff rnd q tm na berrai outro tanto jpoiqu ~tenwmuitos <currs u de vaccas, < nd^ se afUrmainque. trazin,7 rfars' d^duas^nil -vaccas fe tventr-,i.q'qe;$i'es!t "te^ra^^.dr^m^ todos; -'os <annos, eflte-mj.,)Outija'!im.uit gr^ng^rr; de j !ss- r le jfazendafe, o-ndetejin otodas $r,'npVidds, ds m'ntTmPnto:S;iique seMinao-terjrrdo ^nt"-^ntita 'ba&th.-';' _< U^.i^u-f> o/.j i,j o :\.OU
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CAPITULO V.VJT

Em ,ue s declara como corre a cidade por este r M ^ O th L^VU: Y^pf\:\ft co-^cabio.^h.) u U J - Passando avante do collegio, vai outra rua muito ctjni^hda p^flt-' mesmo1 rub do ibrie;Vimuit0ida.Etae povoada !'d'; casas 'e haradores alm ta qual morar*rabald"i'd! 'cidade,' em7 uin:; alto, r'-estx;uniiumdste,iru "de1 capuchinhos' de1 Santo 'Antnio/'que ha poiUia-'tm'p ')se'"'cmelu:!dl esmolas' d poyoj- qW1 Ihesjcompoueste assento;, "e';btrs'-: dVofos' - h'!'derm'-- bntros ./chos jnt^d^Ilo, -'em ,que;-'lh os tirdoresi fizeram- -. uma Igrpjai1 : cV ''qual,' e d1 ms1 ^recolhimento que 'est 'fit', 's -podem accommod a r 1 t<'! Vinte religiosas/ Je pelo ''tempo1'-' adiante ' lh ; ''faro ''outro' ^oolhmekt como os ''padres quzerfai^s ques--:t!m: 'festo ,J.rsG> miniont ii'l cerca 'com agu dentro,'--' a' )qual i- :crca Vm Correndo[ cl'eini/!; nd'" est!'-Oi mosteiro1 at* mar.< E": torhkhdp : d'est Jriiosiro :prv -praa pela banda'-'daJ terra; vai a ! cidade mto bh arru-adayom cs''S( i^orldrs^cm' sts' :qdinta!s-> tos/qaes-J esHab, povoados d'';dlriieiras. carregadas' de ecos? eI outrals "de.'tMar^''( e'/de laranjeiras ( e ' tris ' arvores* 'de espinho', '"fi^ira/^fnvrs ,J parreiras'/ 1 cormoo.que

113 fica muito fresca; aijqul-jcidade por esta banda da terra est toda cercada com uma ribeira de gua, que serve \ d lavagem & ? e *de. se-;, regaremJ ,dgnmas^h,prtai, que ao longo d'ella -esto-. HMH\
riioi' Ktvil/oi/iyi/idi 1 .--OPEClfSLO/i':?.! d-i.-io i j r o ;:oT ko ?;::-ilf[i -J; fiiu f j.J-/Jt ;>:J OJ-; n u - j q .ci holi?,,'] >0'

Em-qu^seledam
e

emo.onr,em cdchdpa^Q^pma

bTrnados! ^"pra/^pwndl o > rostoi nejsL-.cdrr. pr tfM-^rM^-ftftitjoJformosa* povoada;.' el moradores->no cabo d1-1 qual' ''st^uka-hrmida,' de Santasdbuzia; e-nde>est. uma estncia com artilharia. E ao longo d'esta; rua lheufia^Jcoufrwipteito ibem assfenfkda^Ttefibemi tda/povMdal' de^doj-as'de^mqrcadofr-esi e;-no topoiidellaj egt flttlaP 'ftmos-rigreja 'de; --Nossa- IjSenhorai -d'Ajuda -cem i-^capla^del abobda;^ no''-qual sitio, ,nd jprJinicipib d^Staciddel elevei k<" S:,' ,;- .-j^oj-.ijd pb i !>r>-.- w; _ -^PSsa&dd-lmais avante'; com 'o rbsto.;lao,'sul, ncf.-pttr tb ^arrebfde d-Tcidade,1'em ;umarf:< campolargdj st''t'lo 1'Wtaf mosteiro- de S. Banltoi,] conusiuanctelusl-f .'trj''' e-U&tgs: offiinas.f e-seus J dormitorios,' jonde, se agasalha^. Vinte- religiosos! quennWjisijelleijmsteiiifojhay Os^quaeV-itiiri- su : cerca'e horta com.ujma-lribinai\;de igua,^q^ de"nasce-dentro,-que.- aque.jroda tdd a1 cidade,.tepiind fica atraz 'ditoi Est.cmosUeiro;,de :iSj. ento^^-mito-iipferey^o- qual se miam|teni dei-esmolals qu pbdm-^ds1 frades^ pelas! fazendas LTLOSI moradores^ &-'mw!let]nenhuma^renda Jde--<SJ - Magestade, eaxqjucem sW^berai edipregda pelas . neessiddescquetem, cujos M-igiosbs avivem Jsanta 1 e 'honesta vida,' -lidando,,-d si grande1 exemplo; e"--esto-,be-mquistos ie-imu! bem ire^e!bidPs "de^povo, os"'quas;haVier ciarei anuQs.-quei.ifo-r-mt-aresta cidade comi licena detSv-iMa-gstad} (fundai'' - este-';-mosteiro/ -jque1 lhes os'moradores ^d'filial'.fJzerami ia1" -sua ! custa icohi grande fervor e. alvoroa. i\ *<; 'E nopse j'faz< aqui1 -particular mnoidas outras; vKuajs d' Cidade';'; po-qu s Jmuitas,: J e;>fora' ] n-uracai-Jacabar i qu'rel-as | particular'isar.i'j:-' J -1(!> ,'i.it'Ui ;-I-.-r-j;

,'J!U kiu si) )-;fii] Ja^bnda',<Os;Subr'y^, L-.':-. ;.cx.;ip c jJ, -ci-jfj ,T/; .j:ygi; J.O oiifju! ;Ji coi/inl ;-r,)v.o. m o v ^ -, ,?

sw~ 1 1 4 *-** CAPTULO XII

Em que se declaram outras partes que a, cidade tem para notar Tem esta cidade grandes desembarcadouros com trs fontes na praia ao p d'ella, em as quaes os mareants fazem sua aguada bem ^ borda do mar, das quaes' se serve tambm muita parte da cidade, por ' serem estas fontes de muito boa gua. No principal desembarcadouro est uma fraca hermida de Nossa Senhora da Conceio,, que foi a primeira casa de orao e obra em que se Thom de Sousa occupou. A vista d'esta cidade mui aprazivel o longe,, por estarem as casas com os quihtaes cheios de arvores, a saber : de palmeiras que apparecem por oim dos telhados, e de laranjeiras que todo o anno esto carregadas de laranjas, cuja vista de longe ' mui alegre, especialmente do mar, por a cidade se estender muito ao longo d'elle, n'este alto. No tem a cidade nenhum padrasto, d'onde a possam offender, se a cercarem como ella merece, o que se pde fazer com lhe ficar dentro uma ribeira de gua, que nasce junto d'ella, qe a vai cercando toda, a qual se no bebe agora,- por estar o nascimento d'ella pizado dos bois, que vo beber, e porcos ; mas limpa, muito boa gua ; da qual se no aproveitam os moradores por haver outras muitas fontes de que bebe cada um, segundo a affeio, qe lhe'tomam, e da que lhe, fica mais perto se ajuda por serem todas de boa gua. A terra que esta cidade tem, uma e duas lguas roda, est quasi toda occupada com roas, que so como os casaes de Portugal, onde se lavram muitos mantimentos, fructas e hortalias, d'onde se remedea toda a gente' da cidade que o no tem de sua lavra, cuja praa se vai vender, do que,.est sempre mui provida,, e o mais do tempo o est do po, que se faz das farinhas que levam do reino a vender ordinariamente Bahia, onde tambm levam muitos vinhos

115

da ilha da' Madeira, e das Canrias, onde so mais brandos, e de melhor cheiro e cr. e suave sabor, qup nas mesmas ilhas d'onde os levam; os quaes se vendem em lojas abertas, e outros mantimentos de Hespanha, e todas as drogas, sedas e pannos de toda a sorte, e as mais mercadorias acostumadas.
CAPITULO XIII

Em que se declara o como se tratam os moradores da cidade do Salvador, e algumas qualidades suas Na cidade do Salvador e seu termo ha muitos moradores ricos de fazendas de raiz, peas de prata e ouro, jaezes de cavallos, e alfaias de casa, em tanto, qUe ha muitos homens que tm dois e trs mil cruzados em jias, de ouro e prata lavrada. Ha na Bahia mais de cem moradores que tm cada anno de mil cruzados at cinco mil de renda, e outros que tm mais : cujas fazendas valem vinte mil at cincoenta e sessenta mil cruzados, e da vantagem, os quaes tratam suas pessoas mui honradamente, com muitos cavallos, criados e escravos, e com vestidos demasiados, especialmente as mulheres, porque no vestem seno sedas, por a t e r r a no ser fria, no que fazem grandes despezas, mormente entre a gente de menor condio ; porque qualquer peo anda com cales e_gibo de setJnT~6U damasco, e trazem^s_mulher"ei" cm v l q u i n n l s e g i Ees ~"do mesmo,"os' quaisT" com o-Tem. qualquer JJSSSDIlidade, itenTTuas casas mui bem concertadas e na sua mesa servio de prata, e trazem suas mulheres mui bem ataviadas de jias de ouro. Tem esta cidade quatorze peas de artilharia grossa, e quarenta pouco mais ou menos, de artilharia mida: a artilharia grossa est assentada nas estncias atraz declaradas, e em outra que est na ponta do Padro para defender a entrada da barra aos navios dos corsrios, se a cpmmetterem, d'onde no lhe podem fazer mais damno que afastal-os da carreira, para que

116 . nonpossam)-tomari o ,,porto do prirae^rq* bordo, porque, 1 -idbarra/./muito grande,e ipodenvmassar^as nos,,qq3 qaizerj@o}i ;-.semi!.dhes! a, s artilharia, fazer-, njot ,-y,u t,,,
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Qwe rata de como se pde defender mai&: facilidade.

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No parece' eprposifo''dizei' Veste;'luWr. que fm El-Rei JSosso Senhor obrigao de com muita-instncia mandar acudir ao desamparo em que esta cidade est, mandanda-a: cercar) de> muro,S".e<fprti)fiar-,) pomo convm ao seu -gerv-io; e ',\segurana -.'dos^.nipradGjeg d'ella; porque mestas:'arriscada ; ser., saqueada, ;deyfqta,j tro corsrios, q>ue a-; forem icpmmetteri) por^er^a^gE^ft espalhada por fra,j[e .ai,dar,cidade-. np ,,($> ,qhde,i ise( possa defender, at-<que i, a; gente.< das fazendas .e ipn^' genhos a possa vir socco-rrer,,-M.as; emqu^ntp-n^q . f$r; cercada, no tem remdio:'mais,fcil,--paira,-se, jpoderi d&f fender dos corsrios que1,na,-Bahiai entrarem.,) que,pj4fi , , mar com quatro galeotas; que'Oom :,p,p-ua, (4,esP-^; * * podem fazer, e estarem,:, sempre -armadas;!; ;,,,sombra das quaes podem pelejar muitas, barcas ,dos engenhos,* e outros barcos, em que se pde' cavalgar, artilharia-/. para poderem pelejar; e esta armada se pode,favorecer com as nos do reino, qu de continuo esto no, pjortQ oito e dez, e d'aqui para cima at quinze e vinte, qu esto tomando carga de assucar e algodo, em as quaes se pde metter gente da terra a defender, ;e alguma' artilharia com que offender aos contrrios, os quaes se no levarem a cidade do primeiro encontro, no a entram depois, porque pde ser soccorrida por' mar e por terra de muita gente portuguza at a' quantia de dois mil homens, de entre os quaes podem sahir dez mil escravos de peleja, a saber : quatro mil pretos de Guin, e seis mil indios da terra mui bons ftexeiros, que juntos com a gente da cidade, se far mui arrazoado exercito com o qual corpo de gente,

117 sendo bem caudilhada, se pde fazer muito damno muitos homens de armas, que sahirem em terra, aonde se ho de achar mui embaraados, e pejados por. entre o matto que mui cego e ser-lhe-ha forado recolher-se com muita pressa, o que Deus no permitta que acontea; pelo desapercebimento que esta cidade tem; do ,que sabem a certeza os inglezes, que ella foram j; d'onde podem tirar 'grande presa, da maneira que agora est, se a commetterem com qualquer armada, porque acharo no porto muitos navios carregados de assucar e algodo, e muita somma d.elle recolhido pelas terracenas que esto na praia dos mercadores^ tanto das mercadorias eomo de muito dinheiro de contado, muitas peas de ouro e'prata, e muitas afaias de casa.
"CAPITPLO x v

Em que se declaram as grandes qualidades que tem a Bahia de Todos os Santos E-Rei D. Joo III de Portugal, que est em gloria, estava to afeioado ao Estado do Brasil, especialmente Bahia de Todos Santos, que se vivera mais alguns annos, edificra n'elle um dos mais notveis reinos do mundo, e engrandecera a cidade do Salvador de feio que se podra contar entre as mais notveis de seus reinos : para o que ella estava mui capaz, e agora o est ainda mais ^ em poder e apparelho para isso, porque senhora d'esta Bahia, que a maior e mais formosa que se sabe pelo mundo; assim em grandeza como em fertilidade e riqueza. Porque esta Bahia grande, e de bons ares, mui delgados e sadios, de muito frescas e delgadas guas, e mui abastada de mantimentos naturaes da ter-: ra, de muito caa, e muitos e mui saborosos pescados e fructas, a qual est arrumada pela maneira seguinte. A Bahia se entende da ponta do Padro ao morro de Tinhar que demora um do outro nove ou dez
^ TOMO XIV 19

118 lguas, ainda que o capito da capitania dos Ilhos no quer consentir que se entenda seno da ponta da ilha deTapa.rica do Padro : mas est j averigua-, da por sentena, que se entende a Bahia da ponta do Padro t Tinhar, como j fica dito ; a qual sentena, se deu por haver duvida entre os rendeiros da capitania dos Ilhos e da Bahia, sobre a quem pertenciam os dizimos do pescado, que se pescava junto a este morro de Tinhar, o qual dizimo se sentenciou ao rendeiro da Bahia, por se averiguar entender-se a Bahia do., morro para dentro, como na verdade se deve de entender,
CAPITULO XVI

Em que se declaram as barras que tem a Bahia de Todos os Santos-, e como est arrumada a ilha . de Taparica, entre uma barra e a outra. Acima fica dito como dista a ponta de Tinhar da do; Padro nove ou dez lguas,- entre as quaes pontas da banda de dentro d'ells est lanada uma ilha de sete lguas de comprido que s chama Itaparica, a qual Thom de Sousa, sendo governador geral do Estado do Brasil, deu de sesmaria a D. Antnio de Ataide primeiro conde de Castanheira, o que lhe S, Alteza depois , confirmou, e lhe fez nova doao d'ella, com titulo de capito e governador; ao que veiu com embargos a, cmara da cidade do Salvador, sobre o que contendem ha mais de trinta annos, e lhe impediu sempre a jurisdico, sem at agora se averi^ guar esta causa. Deixa esta ilha entre si e o morro de Tinhar outra bahia mui grande, com fundo e porto, em que podem entrar nos de todo o porte, e tem: grande ancoradouro e abrigada sombra do morro,, de que se aproveitam muitas vezes as nos que vem do reino, quando lhe\escacea o vento, e no podem entrar na bahia da ilha para dentro. Da ponta d'esta, ilha de, Itaparica . ponta do Padro est, a

119 barra de leste, e entre a outra ponta da ilha e a .ponta de Jaguaripe est a barra de loeste, por cada uma d'estas barras se entra na bahia com a proa ao norte. A barra de loeste se chama de Jaguaripe por se metter n'ella um rio do mesmo nome. Haver da terra firme esta ponta da ilha perto de uma lgua de terra a terra, a qual barra aparcellada por ser cheia de baixos de ara, mas tem um canal estreito por onde navegam, pelo qual entram caravelles da costa e barcas dos engenhos; mas ha de ser com tempos bonanosos, porque com iharulho ho se enxerga o canal. E corre grande perigo quem se aventura a commetter esta barra de Jaguaripe com tempo fresco e tormentoso.
CAPITULO XVII

.Em que se declara como se navega pela barra de Santo Antnio pra entrar na Bahia. A barra principal da Bahia a da banda de leste, a que uns chamam a barra da cidade e outros de Santo Antnio, por estar junto d'ella da banda de dentro em. um alto uma sua hermida ; a qual barra tem de terra a terra duas lguas, e tanto dista da ponta do Padro terra de Taparioa como ponta onde est o Curral da Cosme Garo, que mais sabida ao mar. Da banda da ilha tem esta barra Uma lega de baixos de pedra, onde o mar anda o mais do tempo em flor. Por entre estes baixos ha um canal por onde entram com bonana navios de 'quarenta toneis, e fica a barra por onde as nos costumam entrar e sahir da parte do Padro, a qual tem uma lgua de largo, que toda tem fundo, por onde entram nos cia ndia de todo o porte, em o qual espao no ha baixo nenhum. Por esta barra podem entrar as nos de noite e dia com todo o tempo, sem haver de que se guardar, e os pilotos, qe sabem bem esta costa, se-nov podem alcanar esta -barra com de 'dia,

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conhecem a terra, quando a vm de mar em fora, maream-se.com a ponta do Padrp, e como ficam a barlavento d'ella, navegam com a proa ao norte e vo dar comsigo no ancoradouro da .cidade, onde ficam seguros sobre amarra de todos os ventos tirado o sudoeste, que, quando venta, ainda que muito rijo, no inverno, nunca passa a sua tormenta de vinte e quatro horas, em as quaes se amarram os navios muito bem, e ficam seguros d'esta tormenta, que de maravilha acontece : em o qual tempo se ajudam os navios, uns aos outros, de maneira que no corre perigo, e d'este porto da cidade, onde os navios ancoram, ponta do Padro pde ser uma lgua.
CAPITULO XVIII

Em que se declara o tamanho do mar da Bahia em que podem andar nos vella, e de algumas ilhas. Da banda da cidade terra firme da outra banda, que chamam do Paragua so nove ou dez lguas de, travessia^, e fica n'este meio uma ilha, que chamam a dos Frades, que tem duas lguas de comprido, e uma de largo. Ao norte d'esta ilha est outra, que chamam de Mar, que tem uma lgua de comprido emeia de largo; e dista uma ilha da outra trs lguas. D ilha de Mar terra firme da banda do poente haver espao de meia lgua. Da ilha dos Frades de Taparica so quatro lguas. Da cidade ilha de Mar so seis lguas, e haver outro tanto da mesma cidade ilha dos Frades, de maneira que da ponta da ilha de Taparica at a dos Frades, e ilha de Mar, e d'ella terra firme contra o rio de Matoim, e d'esta corda para a cidade, por todo este mar at boca da barra, se pode1 balraventear com nos de todo o porte sem acharem baixos nenhuns, como se afastarem da terra um tiro de bero. Esta ilha dos Frades, de um Joo Nogueira, lavrador, o qual est de assento n'plla cqm seis Qu sete lavradores, que n'ella tem da

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sua mo, onde tem suas grangearias de roas de mantimentos, com criaes de vaccas e porcos; a qual ilha tem muitas guas mas pequenas para engenhos, cuja terra fraca para canaviaes de assucar. A ilha de Mar muito boa terra para canaveaes, e algodes, e todos os mantimentos, onde est um engenho de assucar que lavra com bois, qtie de Bartholomeu Pires mestre da capella da S aonde esto assentados de sua mo passante de vinte moradores, os quaes tm aqui um igreja de Nossa Senhora das Neves, muito bem concertada, com seu cura que administra os Sacramentos a estes moradores,
CAPITULO XIX

Em que se declara a terra da Bahia, da cidade at ponta de Tapagipe, e a suas ilhas. Atraz fica dito como da cidade at ponta do Padro ha uma lgua: ag >ra convm que vamos correndo toda a redondeza da Bahia e recncavos d'ella, para se mostrar o muito que tem para ver, e que notar. Comeando da cidade para a ponta de Tapagipe, - "que unia-lgua, no meio d!est caminho se faz. um engenho de agu em uma ribeira chamada gua dos Meninos, o qual no ser muito, proveitoso por ser to perto da cidade. Este, engenho faz um morador dos principaes da terra, que, se chama Christovo de Aguiar de Altero, e n'esta ponta de Tapagipe esto umas olarias de Garcia de Avilla e um curral de vaccas do mesmo, a qual ponta bem chegada ao cabo d'ella tem uma s aberta pelos arrecifes, por onde entram caraveles, que cc m tempo se recolhem aqui, e da boca da barra para dentro ieni uma calheta onde ettes caraveles e barcos esto seguros. N'esta ponta, quando se fundou a. cidade, houve pareceres que ella se edificasse, por ficar mais segura e melhor assentada e muito forte, a qual est norte e sul com a ponta do Padro,

122 Virando d'esta ponta, sobre a mo direita est um esteiro mui fundo, por onde entram nos de quatrocentos toneis, ao qual chamam Piraj, Este esteiro faz para dentro grandes voltas; em rima d'ellas tem uma praia onde se pe os navios a monte muito vontade, e se calafetam muito bem s mars, porque com as guas vivas descobrem at a quilha, aonde se queimam e oalafeteam bem. D'este esteiro para dentro ao longo d'esta ponta esto trs ilhetas povoadas e lavradas com canavees e roas, e na terra d'esta ponta stq outras duas olarias de muita fabrica, por haver aqui muito e bom barro, d'onde se provm d'elle os mais dos engenhos, pois se * purga o assucar com este barro.
CAPITULO xx

Em que se declaram os engenhos de assucar que ha n'este rio de Piraj. Entrando por este esteiro* pondo os olhos na terra firme, tem uma formosa vista de trs engenhos de assucar, e outras muitas^ fazendas mui formosas da vista do mar, e no cabo do salgado se mette n'elle uma formosa ribeira de gua, com que me um engenho de assucar de S. Magestade, que alli est feito com uma. igreja de S. Bartholomeu, freguezia d'quelle limite, o qual engenho anda arrendado cm seiscentas e Cincoenta arrobas de assucar branco cada anno. Pelo serto d'este engenho, meia lgua d'elle, est outro de Diogo da Rocha de S, que'me com outra ribeira, o qual est muito ornado de edifcios com uma igreja de S. Sebastio muito bem concertada. A' mo esquerda d'este engenho de S, Magestade est outro de Joo de Barros Cardoso, meia lgua para a banda da cidade at onde este esteiro faz um brao, por onde se serve com suas barcas; o qual engenho tem grande aferida e fabrica de escravos, grandes edifcios e outra muita graogearia de roas canavees e curraes de vaccas,

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onde tambm est uma hermida de- Nossa Senhora da Encarnao muito bem concertada de todo o necessrio. E entre uni engenho e outro est uma casa de cozer meles com muita fabrica, a qual de Antnio Nunes Reimo. A mo direita d'este engenho de S. Magestade est outro de D. Leonor Soares, mulher que foi de Simo da Gama de Andrade, o qual me com uma ribeira de gua com grande aferida e est bem, fabricado. Este rio de Piraj mui farto de pescado e marisco de que se mantm a cidade e fazendas de sua visinhana, em o qual andam sempre sete ou oito barcos de pescar com redes, onde se toma muito peixe, e no inverno em tempo de tormenta pescam dentro n'elle os pescadores de jangadas dos moradores da cidade e os das fazendas duas lguas roda, e sempre tem peixe de que se todos remedeiam.
CAPITULO XXI

Em que se declara a terra e sitio das fazendas que ha ," da boca de Piraj at o rio de Matoim. Por este rio de Piraj abaixo, e da boca d'lle para ao longo do mar da Bahia, por ella acima, vai tudo povoado de formosas fazendas e to alegres da vista do mar, que no cansam os olhos de olhar para ellas. E no principio, est uma de Antnio de Oliveira de Carvalhal, que foi .alcaide mr de Yilla Velha, com uma hermida de S. Braz; e vai correndo esta ribeira do mar da Bahia com esta formosura at Nossa Senhora da Escada, que uma formosa igreja dos padres da Companhia, que a tem muito bem concertada ; onde s vezes vo convalescer alguns padres de suas enfermidades, por ser o lugar para isso; a qual igreja est uma lgua do Rio de Piraj e duas da cidade. De Nossa Senhora da Escada, para cima se recolhe a terra para dentro at o porto de Paripe, que d'ahi uma lgua, cujo espao se chama Praia Grande, pelo ella ser e muito formosa, ao longo da qual est tudo povoado de mui alegres fazendas, e de um engenho de assucar

124 que me com bois, e est muito bem acabado, .cujo senhorio se chama Francisco de Aguilar, homem principal, costelhano de nao. D'este porto de Paripe obra de quinhentas braas pela terra dentro est outro engenho de bois que foi de Vasco Rodrigues Lobato, todo cercado de canavees de assucar, de que se faz muitas arrobas. D aporto do Paripe se vai a terra afeioando maneira de ponta lanada ao mar, e corre assim obra de uma lgua, onde est uma hermida de S. Thom em um alto, ao p do qual ao longo do mar esto umas pegadas assignaladas em uma lagea, que diz o gentio; que diziam seus antepassados que ndra por alli havia muito tempo um santo, que fizera aquelles signaes com os ps. Toda a terra por aqui mui fresca, povoada de canavees e pomares de arvores de espinho, e outras fructas de Hespanha e da terra; d'onde se ella torna a recolher para dentro, fazendo outra praia mui formosa e povoada de mui frescas fazendas, por cima das quaes apparece a igreja de Nossa Senhora do O, freguezia da povoao de Paripe, que est junto d'ella, arruada e povoada de moradores, que a mais antiga povoao e julgado da Bahia. D'esta praia se torna a terra a afeioar maneira de ponta para o mar, e na mais sahidaaelle.se chama a ponta do Toquetoque, d'onde a terra torna a recuar para traz at boca do rio de Matoim, tudo povoado de alegres fazendas. Do porto de .Paripe ao rio de Matoim so duas lguas, e de Matoim cidade s cinco lguas. ,y
CAPITULO XXII

Em' que se declara o tamanho do rio de Matoim e os engenhos que tem. '. Entra a mar pelo rio de Matoim acima quatro* lguas, o qaD tem da boca, de terra a terra, um tiro de bero uma da outra, e entrando por elle acima mais de rima lgua vai povoado de muitas e mui

125 frescas fazendas, fazendo algumas voltas, esteiros e enseadas, e no cabo d'esta lgua se alarga o rio muito , de terra terra; e mo direita por um brao acima est o famoso engenho de Paripe, que foi de Affonso de Torres e agora de Balthazar Pereira, mercador. A este engenho pagam foro todos as fazendas que ha no porto de Paripe, a que tambm chamam do Tubaro, at a b>ca de Matoim, e pelo rio acima duas lguas. E virando d'este engenho para cima sobre a mo direita, vai tudo .povoado de fazendas, e em uma de /Francisco Barbuda, est uma hermida de S. Bento e mais adiante, em outra fazenda de Chr-istovo de Aguiar, est outra hermida de Nossa Senhora : e assim vai correndo esta terra at o cabo do Salgado, mui povoada de nobres fazendas, mui ornadas de aposentos, e no..cabo d'este est um engenho de bois de duas moendas de Gaspar Dias Barbosa, pea de muito preo o qual tem n'elle uma igreja de Santa Catharina. Junto d'este engenho est uma ribeira em que se pde fazer um engenho d'agua mui bom, o qual se no faz pr haver demanda sobre esta gua, entre partes que a pretendem. Da outra banda d'este engenho est assentado outro que se diz de Sebastio da Ponte, que me com uma ribeira que chamam Cotigipe, o qual engenho est muito adornado de edifcios mui aperfeioados; e tornando por este rio abaixo, sobre a mo direita obra de meia lgua, est uma ilha de Jorge de Magalhes, mui formosa por estar toda lavrada de canavees, e no meio d'ella em um alto tem umas nobres casas cercadas de larangeiras arruadas, e outras arvores, cousa muito para ver; e descendo uma lgua abaixo ,do engenho de Cotigipe est uma ribeira que se chama de Arat, em a qual-Sebastio de Faria tem feito um soberbo engenho de gua, com grandes edifcios de casas de purgar e de vivenda, e uma igreja de S. Jeronymo, tudo de pedra e cal, no que gastoux mais de doze mil cruzados. Meia lgua d'este engenho pelo rio abaixo est uma ribeira a que chamam de Carnaibu, onde no est
TOMO XIV 20

126 engenho feito por haver litgio sobre esta gua. Na boca d'esta ribeira est uma ilha muito fresca, que de Nuno Fernandes; uma lgua est um engenho de bois, de que senhorio Jorge Antunes, o qual est' mui petrechado de edifcios de casas, e tem uma igreja de Nossa Senhora do Rosrio. D'este engei.ho at a boca do rio ser uma lgua pouco mais ou menos, o qual est povoado de mui grandes, fazendas, cujos edifcios e canavees esto vista d'este rio, que1 mui formoso e largo de alto at baixo. , Defronte da boca d'este rio. de Matoim es l a ilha de Mar, que comea a correr d'elle para cima, no comprimento d'ella, da qual fica dito atraz, o que se podia dizer.
CAPITULO XXIII

Em que se declara a feio da terra da boca de Matoim at o esteiro de Mataripe, e os engenhos que tem em si Sahindo pela boca de Matoim fr, virando sobre a mo direita, vai a terra fabricada com fazendas e canavees d'alli meia lgua onde est outro engenho de Sebastio de Faria, de duas moendas ,que lavram combois, o qual tem grandes edifcios assim do engenho,, como de casas de purgar, de1 vivenda e de outras offcinas e tem uma formosa igreja de Nossa, Senhora da Piedade, que freguezia d'este limite; a qual fazenda mostra tanto apparato da vista do mar, que parece uma villa. E indo correndo a ribeira do Salgado, d'este engenho a meia lgua, est. tudo povoado de fazendas, e no cabo est uma que foi do Deo da S, com uma hermida de Nossa Senhora muito concertada, a qual est em uma ponta da terra. Defronte d'esta ponta bem chegada terra firme est uma ilha, que se diz de Pedro Fernandes, onde elle vive com sua familia, e tem sua grangearia de canavees e roas com gua dentro.

127 "Da fazenda de Deo se comea de ir armando enseada qUe dizem de Jacarecanga, no meio da qual est um formoso engenho de bois de Christovo de Barros, at onde est tudo povoado d fazendas e lavrado de cahaveaes; este engenho tem mui grandes edifcios e uma igreja de Santo Antnio. Esta enseada est em feio de meia lua, e ter segundo a feio da terra duas lguas, em a qual est uma ribeira de gua, em que'se pde fazer um engenho, o qual se deixa de fundar por s no averiguar o letigio que sobre ella ha; e toda esta enseada roda, sobre a vista da gua, est povoada de fazendas e formosos canavees.' E sahindo d'esta enseada, virando sobre a ponta da mo 'direita, vai correndo a terra fazendo um canto em espao de meia lgua, em a qual esto dois engenhos ; de bois, um de Tristo Rodrigo junto da ponta da enseada, defronte da qual ilha de Mar est um ilho que se chama de Pac, d'onde tomou o nome a terra firme d'este limite. Este engenho de Tristo Rodrigo , tem uma fresca hermida de Santa Anna. O, outro engenho est no cabo d'est terra, que de Luiz Gonalves Varejao, em o qual tem outra igreja de Nossa Senhora do Rosrio, q u e freguezia d"esse limite. D'este engenho se torna a afeioar a terra fazendo ponta para o mar, que ter comprimento de meia lgua, e no cabo d'ella se chama a ponta de Thomaz Alegre, at onde est tudo povoado de fazendas e canavees, em que entra uma casa de meles de Marcos da Costa. Defronte d'esta ponta est o fim da ilha de Mar, e d'aqui torna a fugir a terra para dentro, fazendo um modo de enseada em espao de uma lgua que toda est povoada de nobres fazendas e grandes. canavees, no cabo da qual est um formoso engenho de gua de Thomaz Alegre, que tem uma hermida de Santo Antnio mui bem concertada. D?este engenho uma lgua o cabo de um esteiro, que se diz a Pelinga,< at onde est tudo povoado e plantado de canavees mui formosos. Est Petinga uma ribeira assim chamada, onde se pde fazer um formoso en-

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genho de gua, o que se no- faz por haver contenda sobre a dita ribeira. * Por aqui se serve o engenho de Miguel Baptista, que est pela terra dentro meia lgua, o qual tem mui ornados edifcios, e uma hermida de Nossa Senhora mui concertada. E tornando atraz .ao esteiro e porto de Petinga, torna a terra a correr para o mar obra de meia lgua, onde faz uma ponta em redondo, onde est uma formosa fazenda de Andr Monteiro, da qual torna a terra a recuar para traz outra meia lgua por um esteiro acima, que se diz de Mataripe, onde est uma casa de meles de Joo Adrio mercador ; por este esteiro se serve a igreja, e julgado do lugar de Tayaupina (?), que est mela lgua pela terra dentro em um^alto' vista do mar, povoao em que vivem muitos moradores que lavram n'este serto algodes e mantimentos, e a igreja da invocao de Nossa Senhora do O.
CAPITULO XXIV

Em que se declara o sitio da terra da boca do esteiro de Mataripe at ponta de Marap, e dos engenhos que em si tem. D'este esteiro de Mataripe ao de Caipe ser meia lgua, ou menos, a qual est toda lavrada e aproveitada de muitos canavees que os moradores, que por esta terra vivem, tm feito.'N'este esteiro de Caipe est um engenho de bois de duas moendas, pea de muita estima, o qual de Martin Carvalho, onde tem uma hermida da Santssima Trindade mui concertada com as mais officinas necessrias. Defronte d'este esteiro de Caipe est um ilho de pedra, meia lgua ao mar, que se diz Itapitanga, do qual esteiro corre a terra, quasi direita obra de uma lgua ou mais, no cabo da qual est outro engenho de bois, fazenda muito grossa de escravos e canavees, com nobres edifcios de casas, com uma fresca igreja de Nossa Senhora das Neves muito bem acabada ; o qual engenho

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de Andr Fernandes Margalho, que o herdou de seu pai com muita fazenda. Ao longo d'esta terra, um tiro de bero, est estendida a ilhadeCururupeba, que de meia lgua de comprido, a qual dos padres da Companhia, que a tem arrendada a sete ou oito moradores, que riella vivem. Entre esta ilha e a dos Frades esto duas ilhetas, em cada uma das quaes est um morador, que a lavra, e so de Antnio da Costa. D'este engenho de Andr Fernandes para cima vai fazendo a terra uma enseada de uma lgua, no cabo da qual est o esteiro de Parnamirim ; e defronte d'esta enseada bem chegadas terra firme esto trs ilhas ; a primeira defrontedo engenho, que do mesmo Andr Fernandes, que tem perto de meia lgua, onde tem alguns moradores que lavram cannas e mantimentos ; e junto d'esta ilha est uutra mais pequena, que do mesmo, d'onde tira lenha para o engenho ; e mais avante de Parnamirim est outra ilha, que se diz a das Fontes, que de Joo Nogueira, a qual de meia lgua, onde tambm vivem sete ou oito moradores.1 A terra de todas estas trs ilhas alta e muito boa. Na boca do esteiro de Parnamirim est um engenho de bois de Belchior Dias Porcalho, que tem uma hermida de Santa Catharina. Por este esteiro de Parnamirim entra a mar uma lgua, no cabo cia qual ost outro engenho de bois de Antnio da Costa, que est muito bem acabado. Este esteiro de uma parte e da Outra est todo lavrado de canavees, e povoado de formosas fazendas, no meio do qual est uma ilha de Vicente Monteiro, toda lavrada com uma formosa fazenda." E tornando a boca d'este esteiro, andando sobre a mo direita d'ahi uma lgua, est tudo povoado de moradores, onde tem muito boas fazendas d canavees e algodes, a qual terra se chama Tamarari, no meio da qual est uma igreja de Nossa Senhora, que freguezia d'este limite, E^a terra faz no cado uma ponta ; e virando d'ella sobre a mo direita vai fugindo a terra para traz, at dar em outro esteiro que chamam Marap, onde se comeam as terras de Mem de S, que agora so de seu genro o conde de Linhares.

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CAPITULO XXV

Em que se declara o rio de Seregipe, e terra d'elle boca do Paragua.


Partindo com a terra da Tamarari comea a do engenho do conde de Linhares, a qual est muito mettida para dentro fazendo uma maneira de enseada, a que chamam Marap, a qu. vai correndo at a boca do rio de Seregipe, e ter a grandura de duas lguas, que psto povoadas de mui grossas fazendas. Entra a mar por este rio de Seregipe passante de trs lguas, onde se mette uma ribeira, que se diz Traripe, onde esteve j um engenho, que fez Antnio Dias Adorno, o qual se despovoou por lhe arrebentar um aude, que lhe custou muito a fazer; pelo que est em mortuari ; mas no estar assim, muito tempo, por ser aterra muito boa e para se mettr n'ella muito cabedal. Descendo por este esteiro abaixo, lgua o meia sobre a mo direita,,, est situado o afamado engenho de Mem ' de S, que agora do conde de Linhares seu genro, o qual est mui fabricado de casa forte e de purgar : com grande machina de escravos e outras bemfeitorias, com uma igreja de Nossa Senhora da Piedade. D'esta banda do engenho at a barra do rio, que podem ser duas lguas, no vive nenhum morador; por ser necessria a terra para omeneio do engenho, e por ter perto da barra uma ribeira, onde se pde fazer outro engenho muito bom; mas da outra banda do rio, de cima at abaixo, est tudo povoado de muitas fazendas, com mui formosos canavees, entre os quaes est uma, que foi de um Gonalo Annes que se metteu frade de S. Bento, onde osfrades tm feito uma igreja do mesmo Santo com seu recolhimento, onde dizem missa aos vizinhos. Na boca d'este rio, fora da barra d'elle, est uma ilha que chamam Cajaiba, que ser de uma lgua de comprido e meia de largo, onde esto assentados dez ou doze moradores, que n'ella tm bons canavees e roas de mantimentos, a qual do conde de Linhares. Junto d'esta ilha est outra pequena despovoada, de muito boa terra.

131 E bem chegado a terra firme, no cabo do rio da banda do engenho est outra ilha, de meia lgua em quadro, por entre a qual e a terra firme escassamente pde passar um barco, a qual tambm com as duas atrz so do conde de Linhares. Da boca d'este rio de Seregipe, virando ao sahir d'ella sobre a mo direita, vai fazendo a terra grandes enseadas, em espao de quatro lguas, at onde chamam o Acm, por ter o mesmo nome uma ribeira, que alli se vem metter no salgado, , em a qual se podem fazer dois engenhos, os quaes no esto; feitos por ser esta terra do engenho do conde de Linhares e no a querer vender nem aforar, pelo que vivem poucos moradores n'ella, onde o conde tem um formoso curral de vaccas. Do cabo d'esta terra do conde boca do rio Paragua, so trs ou quatro lguas, despovoadas de fazendas, por a terra ser fraca e no servir para mais que para criao de vaccas, onde esto alguns curraes d'ellas. Esta terra foi dada a Braz Fragoso de sesmaria, e pelo rio de Paragua acima quatro lguas ; a qual se vendeu a Francisco de Arajo, que agora a possue com algumas fazendas que n'ella fez onde a terra boa, que pelo rio acima.
APITULO XXVI

Em que se declara a grandeza do rio Paragua, os seus engenhos na terra d'El-Rei. Este rio de Paragua mui caudaloso, eter na boca de terra terra um tiro de falco, por o qual entra a mar, que sobe por elle acima seis lguas ; e de uma banda e da, outra at a ilha dos Francezes, que so duas lguas, a terra alta e fraca e mal povoada, salvo de alguns curraes de vaccas. Da barra d'este rio para dentro est uma ilha de meia lgua de comprido, e de quinhentas braas de largo e partes de menos, a qual se chama de Gaspar Dias Barbosa, cuja terra baixa e fraca. E tornando acima no cabo d'estas duas lguas est uma ilha, que chamam dos Francezes, mui alterosa,

132 que ter em roda seiscentas braas, onde elfes em tempo atraz, chegavam com suas nos por ter fundo-para isso, e estavam n'esta ilha seguros do gentio, com o qual faziam d'ella seus resgates vontade. D'esta ilha para cima se abre uma formosa bahia, at a boca do-rio da gua Doce, que sero duas lguas ; e defronte d'esta ilha dos Francezes est uma casa de meles de Antnio Peneda, E sahindo d'esta ilha para fora, pondo a vista sobre a mo direita, faz este rio um recncavo de trs lguas, ousa mui formosa, a que chamam Uguape ; e olhando;pela mo esquerda se estende perto de duas' higuas, parte das quaes esto occupachas com trs,' ilhos despovoados, mas cheios de arvoredo que be podem povoar, e de uma ilha de Antnio de Paiva, que est aproveitada com canavees, onde a terra firme se vai apertando, que ficar acima d'esta ilha o rio de terra aterra, uma meia lgua. Mas tornando casa de meles de Antnio Peneda, virando d'ella para a enseada de Uguape, sobre a mo direita, d'aqui a duas lguas, .a terra fraca e no serve seno para curraes de vaccas. No meio d'este caminho est uma ilha rasa, que Antnio Dias Adorno teve j cheia de mantimentos; alm da qual est outra ilha, que chamam da Ostra ; d'onde se ' tem tirado tanta quantidade que se fizeram de ostras mais de dez mil moios de cal, e vaise cada dia tirando tanta que faz espanto, sem se acabar. No cabo d'estas duas, lguas comea a terra boa, "que est povoada at o engenho de Antnio Lopes Ulhoa, de muitos canavees e formosas fazendas, no que haver espao dejuma lgua. Este engenho me com grande aferida, e est mui ornado com edifcios de pedra e cal,' e a ribeira com que me se chama Ubirapitanga. E indo d'este engenho para cima, sobre a mo direita ao longo do salgado, vai povoada a terra de fazendas e canavees, em que entra uma casa de meles de Antnio Rodrigues, e andando assim at junto do rio da gua Doce do Paragua, que podem ser duas lguas-, vo dar com o notvel e bem assentado engenho de Joo deBrito.de Almeida, que est senhoreand esta bahja pm a vista, o qual engenho de pedra e ca,,

133 e tem grandes edifcios de casas, e muito formosa igreja de S. Joo, de pedra e cal; o qual engenho tem mui grande aferida, e-me com' uma ribeira que vem a este sitio por uma levada de uma lgua, feita tola por pedra viva o ' pico com suas audadas, com muros e botareos de pedra e cal, cousa muito forte. E antes de se chegar a este engenho, junto da terra d'elle, ,esto trs ilhos* de ara pequenos cheios de mangues, onde se vai mariscar.. Acima d'est engenho um tiro de bero d'elle, entra n'esta bahia, que este rio aqui faz, o rio da gua Doce do Paragua, o qual ter na boca de terra terra um tiro de falco de espao, e nevega-se por elle acima at cachoeira, que pode ser trs lguas, com barcos grandes ; e indo por elle acima sobre a mo direita tem poucas fazendas, por ser a terra do engenho de Joo de Brito. E antes de chegarem cachoeira, vista d'elle, est outro engenho de agu mui bem acabado, o qual fez um R-drigo Martins, mameluco, por sua conta, e de Luiz de Brito de Almeida, junto do qual vivem muitos mamelucos com suas fazendas.
CAPITULO XXVII

Em que se declara a terra do rio de Paragua, cante capitania de D. lvaro.

to-

At ago~a tratamos n'este capitulo atraz da grandeza do rio de Paragua, no tocante terra d'El-Rei, d'aqui por diante convm tratar do mesmo rio, e declarar a terra da outra banda, que da capitania de D. lvaro da Costa, que tem da boca da barra d'este rio por elle acima dez lguas de terra, e ao longo do mar da bahia at o rio de Jagoaripe, e por elle acima outras dez lguas ; de que lhe El-Rei D. Joo lhe fez merc, com titulo de capito e governador 'esta terra, de que diremos n'este capitulo.
TOMO x i v 21

134 Comeando da cachoeira d'este rio de Paragua para baixo, descendo sobre a mo direita, o qual rio est povoado de muitos moradores por onde faz muitos esteiros, em que se mettem outras ribeiras, sem haver ainda'nenhum engenho; esahindo pela boca fora d'este rio bahia que o salgado n'elle faz, e virando sobre a mo direita, obra de uma lgua, ao longo das ilhas de que j dissemos, se vai dar no brao que se diz de Igara : e por elle acima espao de duas lguas vai o rio mui largo, cuja terra da parte esquerda fraca, de campinas, e mal povoadas de fazendas, e da banda direita a terra boa, mas muito fragosa e. povoada de fazendas. No cabo d'estas duas lguas se aparta este rio em trs braos, por onde entra a mar. E no brao da mo direita est o engenho de Lopo Fernanles, ob.a mui forte, e de pedra e cal assim o engenho como v > s mais edifcios, e a igreja, que de Nossa Senhora da Graa, obra mui bem acabada, com seus canave les ao redor do engenho, de que faz muito asscr. Pe o brao do meio vai subindo, a mar duas lguas, no cabo das quaes s mette rielle uma formosa ribeira de agu i, que se diz Igaru, onde se pde fazer um engenha ; e de uma banda e da outra tudo povoado de roas e canavees. Na ponta d'esta terra entre um e4eiro e outro est uma hermida de S. Joo ; e pelo outro esteiro que est mo esquerda est um prospero engenhos de pedra e cal, com grandes, edifcio de casas de vivenda e de purgar, e uma form.-a igreja. Este engenho copioso como os mais do rio, o qual edificou Antohio Adorno, .cujos herdeiros o possuem agora. N'este rio de Paragua e em todos os seus rec',ncavos, por onde entra o salgado, ha muito marisco de toda a sorte, especialmente ostras muito grandes, onde em uma mar vasia quatro negros carregam um barco d'ellas, e tem grandes pescarias, assim de rede como de linha, especialmente na bahia que fiz abaix-); porque por uma banda tem duas lguas de comprido, e por outra duas de lar^o, pouco mais'ou menos, e em toda a terra d'este lio ha muita caa.

~- 135 CAPITULO XXVIII

Em qe se declara e como corre a terra do rio de /Paragua ao longo domar da Bahia, at a boca de Jaguaripe e por este rio acima. Do cabo do rio Paragua, onde se elle mette na bahia grande, vai fazendo a terra umas enseadas de ara obra de duas lguas, que esto povoa la> da curraes de vaccas e da, pescadores, e no cabo d'estas duas leg-ias faz a terra uma ponta de ara muito sahida ao mir da bahia, a qual corta a mar a passos; e quando chjia,, fi :a parte d'esta ponta em ilha e passada da outra bania tain sete ou oito ilhos de ara cheios de m ingues,; e tornando a correr a costa contra Jaguaripe, se vai armando em enseadas obra de trs lguas que esto povoadas, at em direito da ilha da Pedra, de curraes de vaccas, e fazendas de gente pmre, que no plantam mais que mantimentos, de, que se mantm. Esta ilha da Pedra de pouco mais de meia lgua de comprido e tem muito menos do largura; e mais avante est outra ilha que tem mais de lgua de comprido, que se diz a de Ferno Vaz. Por detraz d'esta ilha vai correndo a costa da terra firme mui chegada ellas, a qul o s t a por d itraz d'estas ilhas ter trs lguas de espao it chegar ao rio de Jaguaripe, tudo terra de* povoada/por ser fraca de campinas, onde se mette no salgado uma ribeira, que se chama Pujuca, que servir pa^a um engenho, ainda que junto do porto vem a gua baixa, e ser necessrio fazer o engenho um pedao pela terra a dentro, por amor da aferida. E virando daboca.de Jaguaripe para cima, d'ahi_ duas lguas, a terra mui fraca, que no servo seno para Vaccas e roas de mantimentos ; e d:) cabo d'estis duas leg'.ias at . cachoeira a terra soffrivel e tem cinco ribeiras; que se \m metter a este rio, em que se p )dem fazer cinco engenhos, os quaes no so j feitos por capito d'esta terra no querer dar guas menos de a dois por cento do foro, que no cabo de annp|rtvem

136 a montar oitenta a cem arrobas de assucar, que valem a oito;;entos ris cada arroba. Este rio de Jaguaripe tamanho como o Douro, mas mais aprazivel na frescura ; navega-se at a cachoeira que est cinco lguas da barra, e duas lguas abaixo da cachoeira gua doce, a qual o salgido com a fora da mar faz recuar at cachoeira. Junto da cachoeira, virando sobre a mo direita, para baixo est iim engenho de gua de Ferno Cabral de Ataide, obra mui formosa e ornada de nobres edifcios de casas de vivenda e de outras offcinas, e de uma igreja de S. Bento mui bem acabada, o qual engenho est feito nas terras de El-Rei, que esto livres de todo o foro, que costumam pr os capites. D'esfe engenho para baixo vivem alguns moradores que tm suas oase canavees ao longo do rio, que o, afrmoseam muito, em o qual se vm metter trs ribeiras tor esta mesma banda, capazes de trs engenhos, que se n'ellas podem mui bem fazer, duas lguas abaixo de Ferno Cabral; mas a terra d'e^a banda rasa e de ara', que no serve para mais que para lenha dos mesmos engenhos, a qual terra fica no cabo em lingua estreita delronte da ilha de Ferno Vaz, a qual ponta tem uma ilhota no cabo, onde se vem ajuntar o rio de irajuhi com o de Jaguaripe.
CAPITULO XXIX

Em que se explica o tamanho e formosura Irajuhi e seus recncavos.

do rio

Correndo por esta ponta de entre ambos os rios acima com a mo direita ao longo da terra, da ponta duas lguas pelo rio acima, a terra fraca que no serve seno para lenha dos engenhos ; d'aqui para cima uma lgua da cachoeira d'este rio, tudo povoado de canavees e fazendas de moradores, at onde a gua salgada se mette por dois esteiros acima, onde se ajuntam com elle duas ribeiras de gua em as quaes esto dois engenhos, os quaes deixemos estar para dizermos pri-

137 meiro do rio de Irajuhi, que vai por este meio um quarto de lgua para cima, povoado de canavees e fazendas em que entra uma casa de meles de muita fabrica de Gaspar de Freitas, alm da qual junto cachoeira est situado o engenho de Diogo Corra de Sande, que uma das melhores peas da Bahia, por que est mui bem acabado, com grandes aposentos e outras officinas, e uma fresca igreja de Vera Cruz. E tornando abaixo o esteiro da mo direita, que se chama Caipe ; indo por elle acima, est um soberbo engenho com casas de purgar e de vivenda, e muitas outras officinas, com grande e formo>a igreja de S. Loureno, onde vivem muitos visinhos em uma povoao que se diz a Graciosa. Esta terra muito frtil e abastada d fodos os mantimentos e de muitos canavees de assucar, a qual de Gabriel Soares de Sousa ; e d'este engenho ao da Diogo Corra no ha mais distancia que quatiocehtas braas de caminho de carro, e para visihharem se servem os carros de um engenho ao outro por cima de duas pontes, e atravessam estes rios e ficam os engenhos vista um do outro. E tornando ao outro esteiro que fica da outra banda do rio Irajuhi, onde se mette a ribeira que se diz de Jacer, com a qual me outro engenho que agora novamente fez o mesmo Diogo Corra, o qual est mui bemacabad ) e aperfeioado com as officinas necessrias; todo este e.teiro est povoado do fazendas de moradores com formosos canavees; e descendo por este rio abaixo, ao longo da ferrada ma direita, andando mais de uma lgua, vai a terra povoada da mesma maneira, onde este rio como o Tejo de Villa Franca para cirna. E d'aqui at em direito da ponta que divide este rio de Jaguaripe a terra fraca, onde ha trs esteiros que entram, por ella dentro duas lguas, em os quaes se mettem ribeiras .com que se podem moer engenhos; mas aterra no capaz para dar muitos annos canas E abaixo d'este esteiro est uma ilheta que chamam do Sal, porque o gentio, quando vivia mais perto do mar, costumava-o vir fazer alli, defronte do qual est

138 outra .ilheta .no cabo da ponta de ambos os ..rios. Dfesta ilha at a ponta da barra haver uma lgua, tudo terra de pouca substancia. D'esta terra ilha de Ferno Vaz perto de uma legu, e .entre esta ilha e a de Taparica e a terra firme, fica quasi em quadra uma bahia de uma lgua, onde se mette a barra que se chama de Jaguaripe, de que se faz j meno.
CAPITULO xxx.

Em que s declara a terra que ha da boca da barra, de Jaguaripe at Juquirijape, e d'hial o rio de Una. Da ponta da barra de Jaguaripe ao rio de Juquirijape so quatro lguas, ao longo do mar, feio de enseadas quasi pelo rumo de norte e sul, cuja terra baixa e fraca com pouco mato, pelo qual atravessam das campinas quatro ribeiras de pouco cabedal, a qual terra no serve para mais que para criaes de vaccas, Este rio de Jaquirijape tem a barra pequena e baixa, por onde no podem-entrar mais que caraveles da costa por ter uma lagea na boca que a toma toda; da-barra para dentro at a cachoeira muito fundo, por onde podem navegar navios de cem toneis e de mais; e de uma parte outra pde haver quatro lguas. Este rio to formoso como o de Guadiana, mas tem muito mais fundo ; e tem indo por eHe acima, de uma banda e da outra at duas lguas, a terra fraca, e pela mr parte de campinas com muitos alagadios, terra boa para. vaccas ; e tem indo por elle acima mais avante dois esteiros, em os quaes se podem fazer dois engenhos. Do esteiro mais do cabo, para a banda da cachoeira uma lgua toda de vargea, e terra mui grossa para canavees ; da outra banda a terra mais somenos, e junto d'esta cachoeira se vem metter uma ribeira com grande aferida, onde Gabriel Soares tem comeado um engenho, em o qual ,tem feito grandes bemfeitorias, e assentado uma alda" de escravos com um feitor qu

139 s manda. Na barra d'este rio tem uma roa com mantimentos, e gente com que s grangea. Este rio muito provido de pescado, marisco e muita caa, frutas silvestres. Da barra de Juquirijape ao curral de Sebastio da Ponte soro cinco lguas ao longo do mar, tudo despovoado em feio de enseada, onde se mettem trs ribeiras que nascem nas campinas- d'esta terra, que no servem para mais que para creo de vaccas. Toda esta praia e costa no inverno mui desabrigada at barra de Jaguaripe, onde o tempo leste e lessueste travessia, e toma aqui os caraveles da costa que se mettem por esta barra, e elles no'acertam coma boca de Juquirijape para recolherem dentro, no tem outro remdio seno varar em terra, onde no ha perigo das pessoas por ser tudo ara. Este curral de Sebastio da Ponte est em uma ponta sahida ao mar com o rosto no morro de Tinhar, da qual vai fugindo a terra para dentro, fazendo uma enseada at o rio Una, que ser trs lguas todas de praia. Por este rio entra a mar mais de duas legus, no cabo das quaes est situado o engenho de Sebast'o da Ponte, que tem duas moendas de gua em um casa que me ambas com uma ribeira, o qual engenho mui grande e forte, est mui bem fabricado de casas de vivenda, de purgar e outras officinas, cm uma formosa igreja d S. Gens com trs capei Ias de abobad; e por este rio Una vivem alguns moradores que n'elle tem feito grandes fazendas de canavees e mantimentos.
CAPITULO XXXI.

Em qu se explica a terra do Rio Und ate Tinhar, e danlha de Taparica com outras ilhas. Da boca do Rio Una uma lgua se mette no mar outro rio, que se diz Tairiri; pelo qual entra a mr duas ou trs lguas, onde Ferno Rodrigues-d Sousa fez uma..populosa fazenda com um engenho mui bem acabado e aperfeioado, com as officinas acstnidas 'e

140 uma igreja de Nossa Senhora do Rosrio muito bem concertada, onde tem muitos homens de soldo para se defenderem da praga dos Aimors, que lhe fizeram j muito damno. E tornando boca d''este rio, que est muito visinho da ilha de Tinhar,. d'onde vai correndo at o morro, fazendo uma enseada de obra de trs lguas ate a p:;nta do morro, onde se acaba o que se entende a Bahia de Todos os Santos. Esta ilha faz abrigada esta terra at a ponta do curral, por a sua terra ser alta, a qual fraca para canavees, onde! vivem alguns moradores, que n'ella esto assentados d mo de Domingos Saraiva, que senhor d'esta ilha, o qual vivia n'ella e tem abi sua fazenda com grandes criaes e uma hermida onde Un d.zem missa. Da boca d'este rio deTiriri. esta ilha pde ser um tiro d falco. No mar que ha entre esta ilha e a terra firme, ha grandes pescaria^ e muito mariscp, onde por muitas vezes no inverno lana o mar fora n'esta ilha e nas praias de defronte at o Juquirijape mbar gris muito bom. Tornando ilha de Taparica, de que atraz se faz meno, pela banda de Tinhar no tem porto aonde possa desembarcar por ser' cercada de baixos de a* se pedra, aonde o mar quebra ordinariamente, a qual pela banda de dentro da bahia tem muitos portos, onde os barcos podem desembarcar com todo tempo. Tem esta ilha pela banda de dentro grandes pontas e enseadas, aonde"com tormenta se recolhem'as embarcaes, que, vem das outras partes da bahia para a cidade. Na ponta d'ess ilha de Taparica defronte da barra de Jagoaripe est uma ilheta junto ella, que se diz de LopoRebello, que est cheia de arvoredo, d'onde se tira muita madeira. E d'aqui para dehtro povoada Taparica de alguns" moradores, que* vivem junto ao "mar, que Javram, canas e mantimentos, e criam vaccas. E d'aqui at Tamrtiba sero duas lguas da*cc,sta d'esta illfa, entre a qual e a de Tamrtiba haver espao 3e um tiro de falco. Esta ilha de Tamrtiba tem uma lgua de comprido, o meia de largo, cuja terra no serve para, mais que para mantimentos, onde vivem seis ou sete moradores, a qual do conde de Castanheira. Junto da Ta-

141 martiba da banda da terra firme est uma ilheta S. Gonalo, cheia de arvoredo, muito rasa, cuja terra fraca e de ara, onde o mais do tempo esto different&s pescadores de rede, por haver, alli muitos lanos; e diante d'ella esto trs ilhos rasos, fazendo uma ponta ao mar contra a outra que vem d banda do Paraguac, e pde haver de uns aos outros uma lgua; do mar contra a ponta de Taparica est outro ilho raso com arvoredo que no serve seno a pescadores de redes. No cabo da ilha Tamrtiba entre ella ede Taparica esto trs ilhos de ara pequenos, e junto d'elles est uma ilheta, que chamam dos Porcos, que ser de seiscentas braas em quadro. Mais avante junto da terra de Taparica est outra ilheta, que se diz de Joo Fidalgo, onde vive um morador. Avante d'e.sta ilheta, em uma enseada grande que Taparica faz, est um engenho de assucar que,lavra com bois, o qual de Gaspar Pacheco, por cujo porto se servem os moradores que vivem pelo serto da ilha, onde tem uma igreja de Santa Cruz: e d'este engenho duas lguas est a ponta de Taparica, que mais sahida ao,mar, que se chama ponta da Cruz at onde est-povoada a ilha de moradores, que lavram mantimentos e,algumas canas. D'e-ta ponta uma lgua , ao norte est uma ilha que se diz a do Medo, cuja terra rasa e despovoada por ser de ara e no ter gua. Da ponta de Taparica , se torna a recolher a terra fazendo rosto para cidade, a qual est toda povoada de moradores que lavram muitos mantimentos e canavees. E na fazenda de Ferno de Sousa est uma igreja mui bem concertada da advocao de Nossa Senhora, onde os visinhos d'esta banda tm missa aos domingos e dias santos. | E por aqui temos concluid com a redondeza da Bahia e s u a s ilhas, que so, trinta e nove,, a saber, vinte e d u a s ilhas e dezesete. ilhos; fora as ilhas que ha dentro nos rios, que,go dezeseis entre grandes e pequenas, que junto todas fazem a somma de cincoenta e cinco'; e tem a Bahia da ponta do Padro, T O M O xiV 22

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andando-a por dentro sem entrar nos rios, at chegar a ponta, do. Tinhar, cincoenta e trs lguas.
CAPITULO XXXII

Em que se contem quantas igrejas, engenhos e, mbar* caes tem a Bahia. Pois que acabamos de explicar a grandeza da Bahia e seus recncavos, convm que lhe juntemos o seu poder, no tratando- da gente, pois o fizemos atraz. Mas comecemos nos engenhos, nomeando-os em summa ainda que particularmente se dissesse de cada um seu pouco> havendo que- dizer d'elles e de sua machina muito, os quaes so moentes e correntes trinta e seis, convm a saber: vinte e um que moem com gua quinze que moem com bois, e quatro que se andam fazendo.. Tem mais oito casas de cozer meles, de muita fabrica e mui proveitosas. Sahem da Bahia cada anno d'estes engenhos passante de cento e vinte mil arrobas de assucar, e muitas conservas. Tem a Bahia com seus recncavos sessenta e duas igrejas, em que entra a S, e trs mosteiros de religiosos, das quaes- so dezeseis freguezias curadas, convm a saber: nove vigararias que paga S. M. e outras sete pagam- aos curas os freguezes, e a mr parte das outras igrejas tem capelles e suas confrarias como em Lisboa; e todas ests igrejas esto mui concertadas, limpas e providas de ornamentos, em as quaes nos dias dos oragos se lhe faz muita festa. Todas as veze que cumprir ao servio de S. Magestade, se juntaro na Bahia mil e quatrocentas embarcaes: de quarenta e- cinco para setenta palmos de quilha, cem embarcaes mui fortes, em cada uma das quaes podem jogar dois, falces por proa e dois beros por banda; e de quarenta e quatro palmos de quilha at trinta e cinco se juntaro oitocentas embarcaes, nas quaes pde jogar pelo menos um bero por proa ; e se, cumprir ajuntarem-se as mais pequenas embarcaes ajuntarse-ho trezentos barcos de trinta e quatro palmos de

143, quilha para baixo, e mais de duzentas canoas, e todas estas embarcaes mui bem remadas. E so tantas as embarcaes na Bahia, porque se servem todas,as fazendas por mar; e no ha pessoa que no tenha seu barco, ou canoa pelo menos, e no ha engenho que no tenha de quatro embarcaes para cima; e ainda com ellas no so bem servidos.
CAPITULO XXXIII

Em qms s comea a declarar a fertilidade da Bahia e como se n'ella d o gado da Hespanha. Pois se tem dado conta to particular da grandura da Bahia de Todos os Santos e do seu poder, bem que digamos a fertilidade d'ella um pedao, e como produz em si as criaes das aves e alimarias de Hespanha e os frutos d'ella, que n'esta terra se plantam. Tratando em summa da fertilidade da terra, digo que acontece muitas vezes valer mais a novidade de uma fazenda que a propriedade; pelo que os homens se mantm honradamente com pouco cabedal, se se querem accommodar com a terra e remediar com os mantimentos d'ella, do que muito abastada e provida. As primeiras vaccas que foram Bahia, levaram-nas de Cabo Verde e depois \ de Pernambuco, as quaes se do de feio, que parem cada anno e no deixam nunca de parir por velhas; as novilhas como so de anno esperam o touro, e aos dois annos vem paridas, pelo que acontece muitas, vezes mamar o bezerro na novilha e a novilha na vacca juntamente, o que se tambm v nas guas, cabras, ovelhas e porcas; e porque as novilhas esperam o touro de to tenra idade, se no consentem nos curraes os touros velhos, porque so pezados e derream as novilhas, quando as tomam; as vaccas so muito gordas e do muito leite, de que se faz muita manteiga e as mais cousas de leite que se fazem em Hespanha; e depois de velhas criam algumas no buxo umas mas tamanhas como uma plla e maiores, e quando so ainda novas tem o caro

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de fora como o couro da banda do carnaz; as pelles das mais velhas so pretas e lisas que parecem vidradas no resplandor e brandura, umas e outras so muito leves e duras, e dizem que tem virtude. As egoas foram Bahia de Cabo Verde, das quaes se inou a terra, de modo que custando em principio a sessenta mil ris e. a mais, pelo que levavam l muitas todos os annos e cavallos, multiplicaram de uma tal maneira, que valem agora a dez e a doze mil reis; e ha homens que tm em suas grangearias quarenta e cincoenta, as quaes parem cada annc?; e esperam o cavallo poldras de um anno, como as vaccas, e algumas vezes parem duas crianas juntas. So to formosas as egoas da Bahia, como as melhores de Hespanha, das quaes nascem formosos cavallos e grandes corredores, os quaes at a idade de cinco annos so bem acondicionados, e( pela maior parte como passam d'aqui criam malicia e fazem-se mui desa^socegados, mal arrendados e ciosos; assim elles como as egoas andam desforrados,mas no faltam por isso em nada por serem mui duros de cascos. Da Bahia levam os cavallos a Pernambuco por mercadoria onde valem a duzentos e a trezentos cruzados e mais. Os jumentos se do da mesma maneira que as egoas, mas so de casta pequena; os cavallos no querem tomar as burras por nenhum caso; mas os asnos tomam as egoas por inveno e artifcio, por ellas . serem grandes- e elles pequenos, que lhe no podem chegar, e as egoas esperam-nos bem, pelo que ha poucas mulas mas estas que ha, ainda que so pequenas, so muito formosas, bem feitas e de muito trabalho. As ovelhas e as cabras foram de Portugal e de Cabo Verde, as quaes se do muito bem, umas e outras parem, tirada a primeira paridura, duas crianas, e muitas vezes trs, as quaes emprenham como so de quatro mezes, e parem cada anno pelo menos duas vezes, cuja carne sempre muito gorda, mui sadia e saborosa; e quanto mais velha melhor, e umas e outras do muito e bom leite, de que se fazem queijos e manteiga.

145 Os cordeiros e cabritos so sempre muito gordos e saborosos; a carne dos bodes gorda e muito dura; a dos carneiros magra, em quanto so novos ede* pois de velhos' n tem preo ; e criam sobre o cacho uma carne como ubre de vaccas de trs dedos de grosso. A porca pare infinidade de leites, os quaes so muitos tenros e1 saborosos, e como a leitoa de quatro mezs espera o macho, pelo que multiplicam cousa de espanto, porque ordinariamente andam prenhes, de feio que parem trs vezes por anno, se lhe no falta o macho. A carne dos porcos muito sadia e saborosa, a qual se d aos doentes como gallinha, e comese todo o anno, por em nenhum tempo ser prejudicial, mais no fazem os toucinhos to gordos como em Portugal, salvo os que se criam nas capitanias de S. .Vicente e nas do Rio de Janeiro. As gallinhas da Bahia so maiores e mais gordas quedas de Portugal, e grandes poedeiras muito saborosas ; mais de espantar, que como so de trs mezes, esperam o gllo, e os frangos da mesma idade tomam as fmeas, os quaes so feitos gallos e to tenros, .-.saborosos e gordos como se no viu em outra parte. As pombas de Hespanha se do na Bahia, mas fazem-lhe muito nojo as cobras que lhe comem os ovos e os filhos, pelo que se no podem criar em pombaes. Os gallipavos se criam, e tambm fazem to formosos como em Hespanha, e davantagem, cuja carne muito gorda e saborosa ; os quaes se criam sem mais ceremonis que s gallinhas. E tambm se do muito bem os patos e ganos de Hespanha, cuja carne muito gorda e saborosa. CAPITULO xxxiv Em que se declara as arvores de Hespanha que se do na Bahia, e como se criam n'ella Parece pazo que se ponha em capitulo particular os frutos de Hespanha e de outras partes, que se do na Bahia de Todos os Santos.

146 E comecemos nas canas de assucar, cuja planta levaram capitania dos Ilhos das ilhas da Madeira e de Cabo Verde; as quaes' recebeu esta terra de. maneira em si, que as d maiores e melhores qrie rias^ ilhas e parte d'onde vieram ella, e que em nenhuma outra parte qrie se saiba que crie canas de assucar-f porque na ilha da Madeira, Cabo Verde, S. Thom, Trudente, Canrias, Valencia e na ndia no se dp as canas se se no regam os canavees como as hortas e se lhes no estercam as terras, e na Bahia plantam-se pelos altos e pelos baixos, sem, se estercar a terra, nem se regar; e como as canas so de seis mezes, logo acamam e foroso cortal-s para plantar em outra parte, porque aqui se nste, do to compridas como lanas;, e na terra baixa no , se faz assucar da primeira novidade que preste para/ nada, porque acamm as canas e esto to viosas que no coalha o summo d'ellas, se as no mistura th'-i com canas velhas, e como so de quinze mezes, logo.i fiam novidade s canas de prantas ; e as de, socas. como so de anno logo se cortam. Na ilha da Madeira e nas mais partes aonde se faz assucar cortam1 as canas de pranta de dois annos por diante e a soca de trs anno, e ainda assim, so canas, mui curtas, onde a terra no d mais que duas novidades! E na Bahia ha muitos canavees que ha trinta annOs* que dp canas; e ordinariamente as terras baixsjinunca canam e as altas do quatro e. cinco novidades e mais. Das arvores a principal a parreira, 'qual Seda de maneira n'esta terra que nunca lhe cah a folha, se no quando a podam que lh'a, lanam fora ; e quantas vezes a podam, tantas d fruto; e porque duram poucos annos com a fertilidade, se as podam muitas vezes no anno; a poda ordinria duas vezes para darem duas navidades, o que se faz em qualquer tempo do anno conforme ao tempo que cada um quer as uvas, porque em todo o anno madurecem e so muito doces e saborosas, e no ma^ durecem todas juntas; e ha curiosos que tm nos; seus

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jardins p d parreira que tem uns braos cota uva, maduras, outros com agraos, outros- com fruto em -flor e outros podados de novo; e assim em todo o anno tem uvas. maduras, em uma s parreira; mais no ha n'quella .terra' mais planta que de uvas ferraes e outras uvas pretas, e / se no ha n'esta terra miriitas. vinhas por respeito das formigas, que em um noite que do em uma parreira, lhe cortam a folha, e fruto e o lanam no cho. pelo que no h, na Ipja tanto vinho como na ilha da Madeira, e Vcomo "se d na capitania d S. Vicente, porque no tem formiga que lhe. faa nojo, onde ha homens que colhem j a trs e quatro pipas de vinho fc^da anno, ao qual do uma fervura no fogo por r se lhe *no azedar, o que deve de nascer das plantas* As figueiras se do d maneira, que no priueiro" anriovrque as plantam vem como novidade, e d'ah por diante, do figos em todo o anno, s. quaes nunca ;Cahe folha; e , a s que do logo novidade e figos em Istdo a anno so figueiras pretas, que do mui grandes e saborosos figos pretos, e as arvores no so muito grandes,, nem duram muito tempo, porque como so de inp,; seis annos, logo se enchem de carrapatos que as comem, e lhe faz cahir a folha- e ensoar o fruto, os qts' figos pretos no criam bicho como os de Portugal, Tambm ha outras figueiras pretas que do figos bebaras ,'Mu,i saborosos, as quaes,so maiores arvores e duram perfeitas mais annos que as outras, mas; "no do a novidade to depressa como ella A.s -romeiras se.plantam de quaesquer raminhos, os quaes; legam- e logo do fruto aos dois annos; as arvores "no so nunca grandes, mas do roms era pdp: o anno, e no lhes.eahe nunca a folha de todo; d fruto d'ellas maravilhoso np gosto; e de bom tamanho;, mas no do muitas roms por'pecarem muito e cahirem rio cho estando; em flor, com as quaes arvores tem as formigas grande guerra, e no se defendem d'#fIas seno com testos de gua ao p que fica no .meio; e se se atravessa uma palha por cimaj. por fella lhe do logo tal assalto que lhe lan-^

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am a folha, toda no cho; pelo que se sustentam com trabalho estas arvores e as parreiras, que figueira no faz a formiga nojo. As larangeirs se plantam de pevide, e faz-lhe a terra tal companhia, que em trs annos se fazem af c % vores mais altas que um homem, e n'este terceiro anno , do fruto, o qual o mais formoso e grande que ha no mundo ; e as laranjas doces tem mui suave sabor, e o seu doce mui doce, e a camisa branca, com que se vestem os gomos tambm muito doce.. As laranjeiras se fazem muito grandes e formosas, e tomam muita flor de que se faz gua muito fina de mais suave cheiro que a de Portugal; e, como as laranjeiras doces so velhas, do s laranjas com uma ponta de azedo muito, galante, s quaes arvores as formigas em algumas partes fazem nojo, mas com pouco trabalho se defendem d'ellas. Tomam estas arvores a fir em Agosto, em que se comea n'aquellas partes a primavera. As limeiras se do da mesma maneira, onde ha poucas que dem fruto azedo, por se no usar delle'-na terra. As limas doces so muito grandes, formosas-;,; e muito saborosas, as quaes fazem muita vantagem s de Portugal assim no grandor, como- no sabor. As arvores das limas so tamanhas como as--laranjeiras, a quem a formiga faz o mesmo "damno, se lhe, pde chegar, e plantam-se de pevide tambm. As cidreiras se plantam de estaca mas de pevide se do melhor ; porque do fruto ao segundo anno ; e as cidras so grandissimas e saborosas, as quaes fazem muita vantagem s de Portugal, assim no grandor, como no sabor ; e faz-se d'ellas muita con-r serva. Algumas tem o mago doce, outras azedo, e em todo o anno as cidreiras esto de vez para dar fruto, porque tem cidras maduras, verdes, outras pequenas e muita flor ; a quem as formigas no fazem nojo, porque tem o p da folha muito duro. Do-se na Bahia limes francezes tamanhos, como cidras de Portugal, e so mui saborosos; 'e. outros limes de perdiz e osgallegos; uns e outros se plan-

149 tm de pevide, e todos aos dons.annos vm com novidade, ps quaes muito depressa se fazem arvores, mui formosas e ; tomam nqito fruto, o qual dbem todo o anno, como est dito das cidreiras; e alguns d'estes limoeiros se fazem muito grandes, especialmente os galegos. Tambm se da na Bahia outras arvores de espinho qu chamam azambas, de que no ha muitas na terra, por se no aproveitarem n'ella d'este fruto. As palmeiras, que do os cocos, se do na Bahia melhor que na ndia, porque, mettido um coco debaixo da terra, a palmeira que d'elle nasce d coco. em cinco e seis annos, e na ndia ho do estas palmas fruto em vinte adnos. Foram os primeiros cocos Bahia de Cabo Verde, d'onde se encheu a terra, houvera infinidade d'elles se no se seccaram, cqmg so de oito e dez annos para cima ; dizem que lhes nasce um bicho no olho que os.faz 'seccar. Os cocos so maiifse-melhores que os das outras partes, mas no ha qu%nJhes saiba matar/este bicho, e aproveitar-se d muito aproveito que n 4 n d i a se faz dos palmares, pelq que no se fiz n'esta terra:cotta d'estas arvores. Tamareiras se do na Baha muito formosas, que do taquaras mui perfeitas; as .primeiras nasceram. dos caroos que foram do Reino,e depois de semeadas e nascidas, d'hi a oito annos, deram fruto e dos caroos d'este fruto ha outras arvores que do j, mas no faz ningum conta d'ellas ; e pde-se contar por estranheza esta brevidade; porque se tem que quem semeia estas tamavas, elle nem seus filhos lhe comem o fruto seno seus netos. Estas tamareiras ho do fruto se no houver macho entre ellas, e a arvore que macho no d fruto 7 e mui ramalhuda do meio pra cima, e as folhas so de cr verde escuro ; as fmeas, tm uma' copa em cima, e a cr dos ramos de um verde claro. ' ; CAPITULO x x x v . Em que se inta e outros frutos estrangeiros que se do na '"', Bahia. Da ilha de S. Thom levaram Bahia gengibre, e comeou-se de plantar obra de meia arroba d'elle, repartindo por muitas pessoas, o q u a l s e deu na terra de maneira que d'ahi a quatro annos se colheram mais de quatro mil arrobas, a qual com muita vantagem do que Vem da ndia, TOMO xiv 23

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...

em grandeza e fineza ^'porque.'s colheii d'elle', penca que pesava dez e doze arrteis, ms no o sabiam curar bem, como o da ndia, porque ficava denegrido, do qual se fazia muita e boa.conserva, do que ,se no usa j na terra por El-Rei defender que o no tirem para, fora; Cerho se' isto soube o deixaram os homens pelos campos, sem o quererem; recolher, e por no terem nenhuma sabida pra?fora apodreceram na terra muitas logps cheias d'elle. Arroz se d n Bahia melhor : que em outra nenhuma parte Sabida, porque o semeam em brejos e em terra enxuta ; como for terra baixa, sem duvida que o anno d novidade; de cada alqueire de semeadura se recolhe de quarenta para sessenta .alqueires, 0 qual to grado e formoso como o de Valencia : e a terra em qe se semea s a tornam a limpar d putra novidade, sem lhe lanarem- semente nova, seno- que lhe cahiuAao colher da novidade. Levaram a semente do arroz ao Brazil de Cabo Verde, cuja palha s a comem os cavallos lhe faz muito mormo, e, se; comem muito d'ella, morrem d'isso. Da ilha de Cabo Verde e da d S. Thom foram Bahia inhames que se plantaram na terra logo, onde se deram de'; maneira que pasmaim os negros de Guin, que, so os que usam mais d'elle ; , e colhem inhames que no pde um negro fazer mais que tomar um s costas : o gentio da terra no usa d'elles, porque os seus, a que chamam carazes, So mais saborosos, de quem diremos em seu logar.
CAPITULO XXXVI,

Em que se diz as sementes de Hespanha que se do na Bahia, .-o como se procede com ellas. -No razp que deixemos de tratar das sementes de Hespanha que se do na Bahia,, e de pomo frutificaram.' B peguemos logo dos meles que- se do em algumas partes' muito bem, e so mui arrazoados, mas no chegam todos a" maduros, porque lhes corta, um bicho o p, cujas pevides* tornam a nascer se as semeam. ,' Pepinos se do melhor que nas hortas de Lisboa, e duram quatro e cinco mezes os pepineiros, e do novidade que infinita, sem serem regados, nem estercdos , --. ' Abboras das de conservas se do mais e maiores que rias; hortas^ de Alvalade, das quaes se faz muita conserva' e as

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abobr,ei'ras duram todo um anno, sem-se seccarem, dando sempre novidade mui perfeitas.-. Melancias se do maiores e melhores que onde se podem dar bem em Hespanha., das quaes se fazem latadas que duram todo o vero verdes, dando sempre, novidade ; e faz-se d-ellas conserva,mui substancial. Abboras de quaresma, a que s chamam de Guin, se do na Bahia fanhosas de grandes, muitas e mui g-ostosas ; cpjas pevide? e das outras abboras, melancias e pepinos, se tornam a semear, e nada se rega. Mostarda se semea ao redor das casas das fazendas uma s, vez, da qual" ordinariamente nascem mostardeiras, e .-colhe-se cada anno muita e boa mostarda. Nabos e rabos.s do melhores qe entre Douro Minho; os rabos queimam muito, e do alguns to grossos como a perna -de um homem, ^ms uns nem outros no do semente seno fallida e pouca e que no torna a servir. As couves tronchudas e murcianas se do to boas como em. Alvalade, mas no do sementes : como as colhem cortam-nas pelo -p, onde lhes arrebentam muitos filhos, que como so do tamanho da couvinha, as tiram e plantam Como convinham, as quaes pegam todas sem seccar uma, e criam-se d'elles melhores couves que da couvinha, com o que se escusa semente de couve. Alfaces se do amaravilha de grandes e doces; as quaes espigam e do semente muito boa.. Coentrbs se do tamanhos que cobrem um homem,- os quaes espigam e do muita- semente. Endros se do to altos que parecem funcho, e onde os semeam um vez,ainda que seccam, outros tornara a nascer, se lhe ali.mp-am.a terra, ainda que lh'a np cavem. Funcho.se,d com vara tamanha, que parece uma cana de roca muito grossa, e d muita semente como os endros, e np ha quem' os desincc da terra-onde se'semeam uma .vez./ ' ' A salsa se d muito formosa,.,e se no vero tem conta com ella, deitndo-lhe uma pouca;oL gua, nunca se secca, s mas no d-semente, nem espiga. V ' A hortel tem na Bahia por praga nas hortas, porque onde a plantam lavra toda a terra e arrebenta por entre' a outra hortalia. ) ; A semente "de cebolinho nasce mui bem^e,d'elles se do" muito boas cebolasas quaes espigam,mas no secca aquella maaroca em quecriam a semente, a qual est em flor e

152;-^ Com o pezo qetem, faz vergar o grelo .at dar com esta maaroca-no cho, cujas flores se no seccam, mas quantas' so * tantas pgamno cho, e nasce" de cada uma um eboiinhp, a cujo p chegam uma pequena de terra, e cortam o grelo da cebola, para que no abale ocebolinho, o qual: s cria assim e cresce at ter disposio pra se transpor. ,Alhos no do cabea na Bahia, por mais que os deixem estar na terra, mas na capitania de S. Vicente se faz cada dente que plantam tamanho como uma cebola em uma s pea, e corta:se em talhadas para se pizarem. Bringelas se do na Bahia maiores e melhores que .em nenhuma parte, as quaes fazem grandes arvores, e torna a nascer a sua semente muito bem. Tanchagem se semea uma s vez, a qual d muita semente que se. espalha pela terra que se toda ina d'ella." vPoejos se do muito e bem aonde quer que os plantam, lavram a terra toda como a hortel, mas no espigam nem florescem. . Agries1 nascem pelas ruas onde acertou de cahir alguma semente, e pelos quintaes quando chove, a qual semente vai s vezes misturada cm a da hortalia,efzem-s ihuito formosos, e do tanta semente que no ha quem os desince,' & tmbem os ha riaturaes da terra pelas .ribeiras sombrias;,, Mangerico'se d muito bem de semente, mas no e usa d'ela na terra, porque com um s p se enche todo um jardim, dispondo raminhos sem raiz e por pequenos que sejam, todos prendem, seih seccar nenhum como se tivessem razes, a qual se faz mais alto e forte que em Portugal," e dura todo o annqno o deixando espigar, e espiga com muita semente se lh'a querem apanhar, o que se no usa. Alfavaca se planta da mesma maneira, a qual s d pelosmatos to alta que cobre um homem, a quem a formiga no faz damno como ao mangerico. , Beldrs nem beldroegas se no semeam, porque nascem infinidade de uns e de outros, sem os semearem, nas horta ' e quintaes e em qualquer' terra que est limpa de mato ;so naturaes da mesma terra. As chicorias e os maturos .se do muito bem e de muita semente e boa para tornar a semear. As senouras, selgas, espinafres se do muito bem, mas: no-espigam, nem do semente; nem s cardos : vai muita" semente de,Portugal, de qe os;moradores aproveitam.

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OAPITtO X X X V I T . .

Em que .e declara qe. cousa mandioca. , ; At'agpr se disse "da fertilidade da terra da Bhfa :tqcante s arVores. de fruto.de "Hespanha, e" s outras sementes, que se n'lla,do. E j qe se sabe como n'sta provincia fruCtificam as alheias, saibamos dos seus mantimentos ..natures,: ; peguemos primeiro da mandioca, que o principalmrintiinnto e de mais substancia, a que em Portugal chamam farinha de pu. ^Mandioca^ uma raiz da. feio;'dos inhames e batatas, e tni.a grhdura conforme a bondade da terra, e a criao que tem.- Ha caslrde mandioca,; cuja rama " delgada e*da, cr cominips-desabugueir dentro ; a folha .de feio, e da.braidura-da da parra, mas tem cr do verdc-mis escura,' os ps d'estas folhas so. compridos e vermelhos,, como os ds mesmas folhas das parreiras. Plnta-se a mandioca em. covas redondas como meles, muito -beiu cavadas, e em cada; cova se metem trs quatro pusinhs da rama, de ;plmo cada um, e no entram pela terra mais que dous dedos, os quaes paus quebram mo, ou ps "cortamcpm |a,ca ao tempo que os plantam, porque em fesco deitam leite pelo corte, donde nascem e se gerrasraizes; e fazem-se -estas plantadas mui ordenadas seis palmos de Uma cova outra. Arrebenta a rama d'esta mandioca, dos, ns d'stes pusinhos' aos trs dias at Os oito_, segundo a ffesquido do tempo, os quaes ramos somuito tenros e rhuito cheios de ns, que sa fazem ao p de cada,folha, por onde quebrarri muito; quando a.planta rebentt por estes ns, e quando os olhos nascem d'ells' so como de partir. A grandura da raiz e da rama da 'mandioca -conforme a terra em que a plantam, e criao, que tinp' mas ordinariamente a rama mais alta que um homem,'! a partes cpbre um homem a cavallo ; mas ha uma casta, que de sua natureza d pequenos ramos, a qual plantam.em lugares sujeitos aos tempos tormentosos, porque a nao arranque e quebre o vento. Ha casta de mandioca, que s a deixam criar, d raizes-de cinco seis $amp de comprido, eto- grossos como a perna de; um homem : querern-rse as roas da mandioca limpaa de herva, t. qrie ienha disposio para criar boa raiz. 'Ha- uma casta de hindiqca_, que se diz manipocamirim, e irtra que chamam manaibuss, que se quer comesta de
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iann.o e, meio por diante,,; e ha outras castas1, qu chamam taiau '6 manaibr, que s % querem comstas de. rim anrib por diante, e duram estas raizes debaixo 'da terra' sena. apodrecerem trs, quatro annos. ,, - '-,'.: ,'.-, Ha outras-Castas, que se dizpm mnaitinga e parati,, qiie: se .co-mecm a comer de oito mezes por, diante, e se passa de anno'pbdrecpm muito; est maridioCaAinanaitriga p, parati se quer .plantada em terras faas e.de ara.- v Planta-seafoiandioani t-odp annonosndpnoinvrno;,: e quer iriais tempo so que invernoso; sp o inverno grande apodrece a raiz .da iriandioca nos.lugva;re;S;baixos,,. Lana a rama da rnandioca n entrada do vero, umas flores brarias 'como de.jasmlns,-qrie,riao tem nenhum cheiro,, e por onde, quer que quebram a folhalanaje^te, a qual folha o gentio om cozida em tempo d necessidade) coto pimerita da ter^. ra. A formiga,faz muito dmno mandioca,, se lhe come a folha, mais de uma- Vez, fada seccar ; a qual eoingcimjsl ta d'ella riunc d boa rriiz, e para se deffnderm as. roas d'esta praga d formiga, buscin-lhe os-formigueiros dri|:'; as arrancam com enchadas e as. queimam ; pttros costu-; mam s tardes^antes quse recolham, pizaem a terra dbs olhos dos formigueiros cpm pics muito benS,^ para qrie de noite, em que ellas. dp ps? seus'assaltos,- s detenham e-rri! tornar a furar a terra'pra sahirem fora, e lanam-lhe :! redor folhas de arvores, que elascomrn,' ds da mandioca velha, com o que, quando sahem ,aeima se ibaraam at pela mnha, que se recolhem aos formigueiros,;.ese asfoi-migas vem de fora das roas a comera, ellas, lanam,-;, lhes d'esta folha no caminho, antes que. entrem na roa, qual caminho ; fazem muito limpo, por onde vqe.veni vontade, e cortam-lhe a herva com o dente, e desviam-na do, caminho. N'este trabalho andam os lavradores at,que a mandioca de seis mezes,; que cobre bem a tetra com a rama, que ento nao.lhe faz' a formiga'nojo,,porque"a,cha sempre pelo cho as folhas, que cahen; de cima,'Coin o que se contentam, e nas'terras novas no ha formiga que,fac; nojo a nada. ^' :
CAPITULO X X X V I I I . :;''

Que trata das raizes da mandioca & do para que servem.' ,"' As raizes da mandioca comem-nas as vaccas, egoas, ove,:', lhas, cabras, porcos e a caado inato, e todos engordain"

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com, ellas cpmendo-as cruas, e se as comem os ndios, ainda que sejam assadas, morrem disso por serem muito peonhentas ; e para se aproveitarem os ndios e mais gente d'esta,s raizes depois de arrancadas, rapam-ns muito bem at ficarem alv-issimas> o quefazem com cascas de ostras, e depois d e lavadas,,ralam-nas em uma pedra ou ralo que ,para isso tem, e depois de qem raladas* espremem esta massa m um engenho,de palma, que chamam tapitmyquelhe , faz/lnar ;'a agria; qu tem toda fora, e fica est massa toda nito enxuta, da qual se faz a farinha que se come, que cozem em-um alguidr para: isso feito, em o qual deitam ' esta massa e a enxugam sobre o fogo, onde uma india a me-, he com um mi Cabao, copio quem faz. confeitos, at que fica enxuta: serq nenhuma humidade, eSca como cuscuz ; -mas mais branca, e'd'esta maneira s come, mui t,o doce e saborosa. Fazem mais d'esta massa, depois de espremida, '. rimas. filhsi a Q-ue chamam heijris, stendendo-a no alguidr sobre " fogo, de maneira qu ficam to delgadas como fllhs mpurisCas, que se fazem- de massa de trigo, mas ficam toiguaes conip^obreas, as quaes se cozem n'est' alguidr ;ate que ficain, muito sccas e torradas- ' D'estes 'beijsrso 'mui saborosos, sadios e de boa digesto, que o M-antimehtoi qu se usa entre gente de primor, * o que foi inventado- pelas mulheres portuguezas, que o gentio no usava d'elles-. Fazem mais d!esta mesma massa tapiocas, as qiiaes so,g:i!pssas como filhos de polme e mo- les, fazm-.serip mesmo alguidr-como os beijs, mas no s,o~de,to.ba digesto, nrn to sadiosl; e querem-se comidas quentes, corri leite tem, muita graa ; e com assucar clarificado fmbem.
- 1 . '-;..',OEITULO X X X I X ' . ,

Em que se declara quo terrvel peonha a da gua da ".- ',',lij<-;,''v.';''' Anmiiocay ' AriteS de passarmos avante* convm que declaremos.a natural estranheza d gua da mandioca que ella de si. deita quando a espremem depois de ralada, porque a mais terrvel peonha que, ha nas partes, do, Brasil, e quem "quer' que a bebe noesapa por mais contrapeorihaque lhe dem ; , a qrial- de qualidade que asgllirihas em lhe tocando com o bjcp,'e levando uma s gota parajbaixa, chem todas da outra banda mortas, o niesmo acontece aos patos, perus,

156 * , papagaios e a todas as aves ; pois os porcos, cabras, oveIhas^m bebendo o primeiro bocado do trs e quatro voltas em redondo e cabem mortas ? ; cuja carhe se faz Idgnegra'e nojenta ; e o mesmo acontece a todo o gnero .pe* alimria que a bebe; e por esta razo se espreme*~esta mandioca por curtir em cpvs cobertas, e em outras partes, aonde no faa nojo s- criaes, e se estas alimarias comem a mesma" mandioca por espremer, engordam com ella no lhes faz damno. Tem esta gua tal qualidade;que se metem n'ella Uma espada ou coolete-, espingarda ou outra qualquer cousa cheia de ferrugem, lha come em vinte, e quatro horas, de maneira que ficam limpas como quando sahem da m, do que se aproveitam algumas pessoas para. limparem algumas peas de armas da ferrugem que, na m se no podem alimpr sem entrar pelo-so. Nos lugares onde se est mandioca'espreme, se criam da agu d'ella uns bichos brancos como vermes grandes que so peonheutissir mos, com os quaes muitas indfas mataram seus maridos e senhores, e matam a quem querem, do qu:tambem se aproveitavam, segundo'dizem, algumas mulheres brancas contrasus maridos ; e basta lanar-se uni d'estes bichos no comer para uma pessoa n escapar, sem lhe aproveitar alguma contrapeonha, porque no mata com tanta'presteza como a gua de que se, criam, e no se sente este mal seno quando no tem remdio nenhum. '
CAPITULO X L .
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Que, trata da farinha que se faz da mandioca. O mantimento de mais estima e proveito que se faz da mandioca a farinha fresca, a qual se faz d'estas raizes, que se lanam primeiro a curtir, de que se aproveita, o gentio ; e os Portuguezes, que no fazem a farinha da mandioca crua, de que atraz temos dito, seno por necessidade. Costumam as indis lanar cada' dia d'estas raizes na gua corrente ou na encharcada, quando no tem perto, a corrente, onde est a curtir at qu lnca a casca de si; e como est d'est maneira, est curtida ;*da qual traz para -casa outra tanta como lana na gua para curtir,, as quaes razes escascadas ficam muito ,alvase brandas serir nenhuma peonha, que toda se gastou na gua, as quaes se comem assadas e so muito boas. -,.,E para se fazer a farinha d'estas raizes se lavam primeiro-

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muito berh,.e depois desfeitas m, se espremem, no tapti, cuja gua no faz mal; depois de bem espremidasdesmancham esta-massa sobre uma urupema, que como jaeir-a; por onde.s ca o melhor, e ficam os. caroos em cima, e o p que se coou-lanam-no em um alguidr que ,st sobre o.fogo,/aonde s.enxuga e coze da maneira que fica dito, e fica como cuscuz, a qual em quente e em fria muito boa e assim no sabor, ,como em ser sadia e de boa digesto. Os indios usam ,d'estas raizes to curtidas que ficami detg-ridas e a farinha azeda. Os Portuguezes no a .querem .curtida mi que at dar casca, qual mandam' misturar algumas raizes de mandioca crua, com o.que fica a farinha mais alva;e doce ; e d'esta maneira se aproveitamda mandioca,, a,qual farinha fresca dura sem se damnar Cinco aseis dias-^mas faz-se secca; e quem bem servido em sua casa, comera sempre fresca e quente,. , Estas,:'raizes da 'mandioca curtida tem grande virtude para, curar postm-as, as quaes se plzam muito bem sem.se espremerem ; efeito d massa um emplasto, posto sobre a posteina a mollefica de maneira, que a, faz arrebentar por si, : se^a, no .-querem7 furar.'; /, ".
' ':'"' ',.:''CAPITULO' X L I .

Que, trata. do. muito para que prestam as raizes da ;'"> carim. '^
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-,. Muito frira notar que de uma mesma qusa saia peo'nha econfcrponha,, como da mandioca, cuja gua cruelissima peonha, e a mesma raiz secca contrapeonha; a qual se chama carim que se 1fa;z d'esta maneira". Depois que as raizestda mandioca esto curtidas na gua, se pe a .enxugar sobre o fogo m cima de umas varas, alevantadas trs e quatro palmes d cho, e como esto bem seccas, ficam muito vdurasj,;as' quaes razes servem para mil cousas, e tem outfas tahtas virtudes > a principal serve de contrapeonha para os mordidos das cobras, e que comem bichos "peonhentos, e/para os que comem a mesma mandioca por curtir assada; cuidando que so outras raizes, que chamam aipis, bons de comer, que/, se' parecem com ella; a qual carim s d d'esta'feio : tomam estas raizes seccas, e rapam-lhe o defumado da parte de fora e ficam alvissiiqas "pisam-nas muito bem, e depois peneiram-as e fica o p, d'ellas ,tp delgado e mimoso como de farinha muito boa ;

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e tomada, uma pouca d'esta farinha e delida era gua fria, que fique como amendoada, e dada a beber ao tocado da peonha, fz-lhe arrevear quanto tem no bucho, com o qu a peonha que tem no corpo,no vai por diante. E tambm serve esta carim para os meninos que tem lombrigas, aos quaes se d a beber desfeita na gua,. como fica dito, e mata-lhes as lombrigas todas ; e uma cousa e outra est muito experimentada, assim pelos ndios, como pelos Portuguezes. Da mesma farinha da carim se faz uma massa qu posta sobre feridas velhas que tem,carne podre lh'a come toda,,, at que deixa a ferida limpa ; e como os ndios' esto doentes, a.sua, dieta fazerem d'este p da carim uns caldinlros no fogo ( como os de poejo? ). que bebem, com que se acham mui bem por ser muito leve,.e o mesmo usam os brancos no matto lanando-lhe mel ou assucar, com o q;uese acham bem ,;' e outras muitas cousas -de comer se fazem d'esta carim'que se apontam no capitulo que se segue.
CAPITULO -XLU.

Em que se declara que cousa farinha de guerra, como se faz da carim, e, outras cousas. Farinha de guerra se diz r porque o gentio do Brazil costuma chamar-lhe assim pela sua lingua ; porque quando1 determinam de a ir fazer a, seus contrrios algumas jorna- : das'fora de sua casa, se prove d'es,ta farinha, que levam s costas ensacada" em uns fardos de folhas, que para isso fazem, da feio de uns de couro, em que da Judia trazem, especiaria e arroz ; mas so muito mais pequenos, onde devam esta farinha muito calcada e enfolhada, de maneira que ainda que lhe caia em um rio e que lhe chova em cima, np se .molha. Para se fazer esta- farinha se faz prestes muita somma de carim, a qual depois de rapada a pisam em rim pilo, que para isso tem,, e como t>em pisada a peneiram rnuito bem, como no capitulo antes fica dito.* E, como tem esta carim prestes, tomam as raizes da'mandioca por curtir, e ralam como convm uma somma d'ellas,> e depois de espremidas como se fa,z primeira farinha que dissemos.atraz, lanam ulna pouca d'esta massaemni' alguidr,que est sobre o fogo, e por cima d'ell uma pouca de farinha da carim, e embrulhada uma com. outra a vo mechehdo sobre o fogo, e assim como se vai cozendo

159 lhe vo lanando do p da carim, e trazem-na sobre "o fogo^ at que fica muito enxuta e torrada, que a tiram fora. 1 D'esta farinha de. guerra usam os Portnguezesque no tem roas, e os que esto fora d'ellas na cidade, com que sustentam seus creados e escravos, e nos engenhos se provm d'ellapara sustentarem a ; gente em tempo de necessidade, e os navios, que vem do Brazil para estes reinos, no tem outro remdio de matalotagem, para se sustentar a gente at Portugal, seno, o^da farinha de guerra ;'e um alqueire d'eila da medida da Bahia, que tem dous de Por1tugal, se d de regra a cada homem para um mez, a qual farinha de guerra muito sadia e desenfastiada, e molhada no caldo da carne ou do peixe fica branda e to saborosa corno cuscuz.-Tambm costumam levar para o mar matalotagem de/beijs grossos muito torrados, que dura um anno, e mais sem se danarem como a farinha ,de guerra. D'esta carim e p d'ella bem peneirado fazem os Portuguezes muito bom po, e bolos amassados eom-leite,e gemmas de Ovos, -d'esta mesma massa fazem mil invenes de beilhs, mais saborosos que de farinha de trigo, com os mesmos materiaes, e pelas festas fazem as frutas doces com. a massa d'esta carim, em lugar da farinha de trigo, e se a que v a l a Bahia do reino no muito, alva e fresca, querem as mulheres antes a farinha de carim, que alvissimae lavra-se melhor, com a qual fgizem tudo/muito primo.
C A P J T U L O XLTIL
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Em que se declara a qualidade dos aipins. D-se n'esta terra outra casta de mandioca, a qu o gentio chama aipins, cujas raizps so da feio da -mesma mandioca, a rama e a folha so :da nesina maneira, sem haver nenhuma -diferena, e p]anta-se, de mistura com a mesma mandioca, e pra se recolherem estas raizes as conhecem os indios pela cr doramos, no que atinam poucos Portuguezes. E ests raizes dos aipins so alvissimas ; como estocruas, sabem s castanhas cruas d'Hespanha ; assadas so muito doces, e tem o sabor das mesmas castanhas assadas^e riavantagem, as quaes se'comem tambm cozidas, e so muito saborosas; e de uma maneira e da outra so ventosas como as castanhas. D'estes aipins se aproveitam nas povoaes novas, porque como so de 'cinco-mezes secomam a

1.60 comer assados, e como passam de seis mezes, fazem-se dq-ros, e no se assam bem '; mas servem ento para beijse para farinha fresca, que mais' doce que a da mandioca, as qris raizes duram pouco debaixo da. terra, e como passain de oito mezes apodrecem muito. D'estes aipins ha sete ou oito castas; _mas os que'mais se estimam, por serem mais saborosos, sao uns que chamam gerums. Osindios se valem dos aipins para nas suas festas fazerem d'elles cozidos seus vinhos, para o que ps plantam mais' que para os comerem assados, "como fazem os PortuA guezes. . - r,-' ' -.",,'.. E porque tudo mandioca, concluamos que o maritimento d'ella o melhor que se sabe, tirado o do bom trigdvj porque po de trigo do rnar, de milho, de;enteio, de cevada. ho\pi'esta a par da mandioca, arroz, inhames e cocos.:. Milho de Guin se d, na Bahia, como ao diante se ver; mas no se tem l por inantimento, e ainda digo que a mandioca mais sadia e proveitosa que o bom trigo, por ser de melhor digesto. E por se averiguar por tal, os governadores Thom d Souza, D. Duarte e Mem de S nO' comiam no Brazil po de trigo, por se no acharem bemcom elle, e assim-o fazem outras muitas pessoas.
CAPITULO XL1V. '

Em que se apontam alguns mantimentos de raizes que se criam depaixo. da terra na Bahia. Como fica dito da mandioca o que, em breve se pde dizer d'ella, convm qUe declaremos d'aqui por diante'outros. mantimentos que se do na Bahia, debaixo da terra. E peguemos logo nas'batatas, que.somaturaes da terra e se do n'ella-, de maneira que onde se plantam uma vez 1 nunca/mais se,desinarn, asquaes tornam, a nascer das pontas das raizes, que-fiaram na terra, quando se colheu a nov i d a d e d'ellas. As batatas no se plantam da rama como ' nas Ilhas, mas ce talhadas das mesmas raizes, e e m c a d a enxadada, que do na terra, sem ser mais.cavada, mettem uma talhada de batata ; as quaes se plantam em Abril,-e comeam a colher a novidade'em Agosto, donde tem que tirar at todo o Maro, porque colhem umas batatas grandes e ficam' outras pequenas, que se vo creando erri quinze <-e vinte dias. ' ' Ha rimas batatas grandes, brancas e compridas como as

rei
das Ilhas; ha outras pequenas e redondas comotubaras da terra, e mui saborosas ; ha outras batatas que so roxas ao longodaeascaebrrincas por.dentro; ha outras qu so todas .encarnadas e mui gostosas; ha outras que so cr azul.anilada muito fina, as quaes tingem as mos; ha outras verdoengas muito doces e saborosas: e ha outra casta, de cr almeceg'ada, mui saborosas ; e outras todas amarelas, de cr muito tostada, as quaes so todas humidas e ventosas, de que se,no faz muita conta entre gente de primor, seno entre lavradores. Dorse na Bahia outras raizes maiores que batatas, a que os indios chamam carazes, que se plantam da mesma maneira que as batatas, e como nascem; poem-lhe ao p uns pos, por onde atrepam os ramos que lanam, como'herva. Estes carazes se plantam em Maro e colhem-se em Agosto, es qtlaes se comem cozidos e assados, como os inhames, mas tem melhor sabor :,os mais d'elles so brancos, outrosNroxos, outros brancos por dentro,e roxos per fora junto casCa, que so os melhores, e de mr sabor ; outros so'todos negros cdmo ps; e uns e outros se curam no fuino, e duran de um anno para outro. Da massa d'estes carazes fazem as Portuguezas muitos manjares com assucar, e cozidos com -carne tem muita graa. Do-se.riesta terra outras raizes tamanhas como nozes e avells, que s chamara mangarazes ; e quando se colhem .arrancam-nos debaixo da terra em touas comojuna, e ,,'tira-sede cada p duzentos e trezento's juntos ; e o que est , no meio como um ovo, e como um punho, que a 'planta donde nasceram os outros ; q, qual se guarda para se tornar a plantar : e quando o plantam s faz em talhadas, como as batatas e carazes ; mas, plantam-se to juntos e pela ordem com qu se dispe a couvinha, e no se cava a terra toda, mas limpa do mato a cada enchadada mettem uma talhada. As folhas d'estes mangarazes nascem em moutascpmo os espinafres, eso da mesma cr e feio, mas muito maiores, e assim mollescom as dos espinafres, as quaes se chamam. taiaobas,que se comem esperregadas como elles ; eso mui medicinaes, e tambm servem cozidas conf o peixe. As," raizes d'es,tesinangarazes secpmm cozidas com gua e sa,, - e do a casca corno tremoos, e molhados em azeite e vinagre, so mui gostosos /cora assucar fazem- as mulheres d*elles mil manjares ; e colhem-se duas novidades no anno ; os que se plantam em Maro se colhem em Agosto; e os qup se plantam em Setembro se colhem em Janeiro.

" , >:,.

162-"

Do-se n'esta terra outras ri-zes, que se chamarri taizesV que se plantam como cs magarazes, e so d feio de maarocas, mas cintadas com uns perfilos com barbas, como raizes de cannas de roa,, as quaes se comem cozidas na gua, mas sempre ficam tezs'. As folhas so grandes, de feio e cr das dos platanos que se acham nos jardins v de Hespanha, aos quaes chamam .taiaobu; comerivse'estas* folhas cozidas com peixe em lugar dos espinafres, e com faVas verdes em lugar das alfaces, -e tem m u i vantajado -sabor : r os indios as comem cozidas na :gim e sal, e com muita somma de pimenta. ., '
CAPITULO XLV-

Em que, se contm o milho que sew e para o que serm.

Bahia,

D-se outro mantiment, em todo o Brazil, natural da, mesma terra, a que os indios chamam ubatim, que milho de Guin, que eto Portugal chamam zburro. As espigas, que este milho d, so de mais de palmo ; cuja arvore . mais alta queum homem, edagrossura das cannas da roa, com ns e vs por dentro; e -d fres, quatro, e mais espigas, d'estas em cada vara. Este milho se planta por entre ,a;, mandioca e por entre as cannas novas de assucar, e colhe-s> a novidade aos tr.es mezes, uma em Agosto,' e outra em Janeiro. Este milho come o gentio assado por fruto, e fazem seus vinhos cm elle cozido, pqm o qual se embebedam, e. os,Portuguezes qu communicam com o gentio, e os mestios no s desprezam d'elle,e bebera-no mui valentemente. Costuma' este gentio dar suadouros com; este milho cozido aos doentes de boubas, os quaes tomam com o bafo d-'elle, com o que se acham bem ; dos quaes, suadouros se acham sos algmns homens brancos ,e mestios que se valem d'elles; o que parece mistrio, porque este milho por natureza e frio. Plantam os Portuguezes este milho para matena dos cavallos, e criao das gallinhas e cabras, ovelhas e porcos-, e aos negros de^Guin o do por fruta, os quaes o no querem por manfimento sendo p melhor da, sua terra: a cr geral d'este milho branca ; ha outro . almecegada, outro preto, outro, vermelho, e todo se planta mo, e tem uma. mesma qualidade. . , Ha outra casta de milho, que sempre molle, do qual fazem os Portuguezes -muito' bom po e belos com ovos e

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t -

assucar. O mesmo milho quebrado e pizado no pilo bom para se cozer com caldo de carne, ou pescado, e de gallinha, o qual mais saboroso,qrie o arroz, e de uma casta e outra secriram ao fumo, rinde se conserva para se no danar ; dura-de um anno paraoutro. '
. ' ,. ..,-.,; PITULO XLVI.

iEsm.que sep0nfdWkos legumes que s do na Bahia. .

Pois que af aqui tratmos dos mantimentos naturaesda terra da\,||ahfa,: bem' que digamos dos legumes, que se n'ella,criam.Y Econieetn os pelas favas, que os indios chamam comenda,, s,quais so muito alvas, e do tamanho e maipresque as de vora em Portugal; ms so delgadas e amassadas;: demo rps figes passados. ' Ha outrasr favas meias brancas e, meias pretas, ms so pequenasi; ^ stsiavas'se plantam, mo na entrada do inverno, e comO nascem pe-s ao pede cada uma um po pororid arepaihj co.to.fazemeni Portugal s ervilhas ; e. se tem por onde atr.epar fazem grande ramada :-a folha coriid.a dos/feijes de Hespanha, mas maior; a flor branca: comeam^ a .dar, a novidade no fim do inverno e dura mais de trs mezes. Estas, favas so em verdes mui saborosas, e 'cozem-se cqm as ceremonias que se costumam em Portugal* e ; so reimosas como a$ do reino; e do em cada bainha quatro; e;!6"inp.favas,;, depois de seccas se cozem muito beiri, ' nao criam bichos, como as sde Hespanha, e so muito .raettres, de cozer; e de uma, maneira de outra fazem iririitia vantagem no sabor s de Portugal, assim as declaradas como adulta'casta de favas, que so brancas e pintadas todas de pontos negros.. ^DSp-s^nMst terra infinidade de feijes natraes d'ella, unssobrnposroutros pretos, outros vermelhos, e outros pintados'de; branco e preto, os quaes se plantam mo, e como nascem ge-se-lhe a cada p Um po, por onde atrepmcomo se. faz s ervilhas, e sobem de 'maneira pata cima,que fazem\d'elles latadas nos quintaes, e cada p d infinidade de feijes, os quaes so. da mesma feio que os de Hespanhj nis.:;tem mais compridas bainhas, e a folha e flor como servihs ;,xzem-se estes feijes sendo seccos como eih Pjjpugl, eso mui saborosos, e em quanto, so verdes cozem-se com a casca como fazem s ervilhas, eso mui^enlastiados.,,/ , '

164 Chamam os indios gerums s abobras d a q u a r e s m a , qso naturs: d'esta terra, das quaes ha dez' ou doze castas, cada uma de sua feio : e plantam-nas duas vezes no anno, e n t terra h u m i d a e solta, s, quaes se estendem muito pelo cho, e d cada abobreira muita somma : mas no so tamanhas como as da casta de Portugal. Costuma a gentio cozer e"assar estas bobrs inteiras por lhe no entrar gua dentro, e depois de cozidas s cortam como meles, lhes deitam as pe.vides fora, e so assim mais saborosas que cozidas em talhadas, e curam-se no fumo para durarem todo o anno. , As que em Portugal ChamamoS^cabaos, chama o gentio pela1 sua lingua gerumuy. das quaes tem entre si muitas castas d differentes feies,' tirando as abobras dompridas, de que dissemos atraz. Estas abobras ou cabaos semei.,o gentio para fazer d'ellas vasilhas para seu uso,' as quaes mo costuma -comer, mas deixam-nas, estar nas abobreiras , at se fazerem duras, e como esto de Vez ourm-mas, no fumo, de que fazem depois vasilhas para acarretarem gua, por outras pequenas bebem, outras jneias levam s costas cheias de gua quando caminham :, ha alguns d'estes cabaos tamanhos que levam dous almudes e mais, em o' quaes guardam as sementes que ho de plantar ; e costumam tambm' cortar estes cabaos em verdes, como esto .duros, pelo meio, e depois de curadas estas metades servemlhes de gamelas, e outros despejos,- e as ametades dos pequenos servem-lhes de ; escudelas, e do-lhes por dentro uma tinta preta,: por fraoutra amarella, que se no tira nunca ; e estas so as s u a s porcelanas.
CAPITULO XLVII, \

Em que se declara a natureza dos amendols, e o para que servem.


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Dos amendois temos que dar conta particular, porque ' cousa, que se.no sabe-haver -seno no Brazil, s -quaes nascem debaixo da terra, onde se plantam mo, um palmo um do..outro ; as suas folhas so como as dos feijes de Hespanha, e tenros ramos ao longo do cho. E cada-p d um 'grande prato d'estes amendois, que nascem nas pontas'das raizes, os quaes so tamanhos como bplotas, e teto a casca da mesma grossura e dureza, toas branca e crespa, e tem, dentro de cada bainha trs e quatro -amendois-, que so da,

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feife|b, dos pinhes com Casca, e\ ainda mais grossos. Tem uma tona parda, que 'se lhes; sane logo como a do miolo osjpafes, o qual miolo alvo. Gomestoscrus tem sabor de graVinos crus; mas comem-se assados e cozidos com a Cassa, como s castarihas^e so muito^saborosos, etorrados fora da casca so melhores. De uma maneira* e d'outr esta fruta niriito quente emdihasia, e Causam dor de cajbea, a quem pane- muitos, se doente d'ella. Plantarri-se -estes amendois em terra solta e humda, em a qual plantai e beneficio d'ella no entraJaomenmacho'; s as ndias os costumam plantar, e as mestias;; e n'esta lavoura no eteudem os maridos, e tem1 pra si que se ellesou seus escravos os plantareln, quno hpde nascer. s fmeas os vo apanhar, e "segundo seu uso ho d ser as* mesmas que os plantem ; e para durarem todo d ahno Curam-nos no fut, Onde os tem at vir outra novidade. ; , , 'est; fruta fazem as mulheres portuguezas todas as corisas doces, que fazeto. dal, amndoas, e Cortados os fazem Cobertos de assucar de mistura como os confeitos. E tambm o curam'em peas delgadas e compridas, de que fazem ,|rinhodas ;' quem os no conhece, por tal a come se lh'a s do. Qproptio tempo eraquese as amendois plantam em Fevereiro, e np esto debaixo da terra mais que at Maio, que o tempo m que se lhes colhe a novidade, o que as fmeas vo fazer com grande festa.
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CIPITUEO XLVIII.

'-'EmK que se declara quantas castas de pimenta ha na BMd. A' sombra d'estes legumes, e na sua visinhana, podemos ajuntar quantas castas e pimenta ha-na Bahia, segundo ris^a riotia:, e digamos logo-da que chamam cuihem, que ,,;o tamanhas como cerejas^ s quaes se comem em verdes, e depois de maduras Cozidas inteiras com o pescado e com :s leguraps, e de unia maneira e d'outra queimam muito, e o gentio comera inteira .misturada com a farinha.. > Costumam os Portuguezes, imitando o costume dos indios,' secarem esta pimenta, e depois de estar bem secc a pizam de Mistura comvSl, p que chamato jqriiray, m a qual molham 0 peixe e a carne, e entre os brancos se traz no saleiro, e no descontenta a ningum. Os indios a comem misturada com a farinha, quando no tem que comer com
\ TOMO XIV ' ;;$&.- '

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ella. Estas pimenteiras.fazem arvores de quatro e de Cinco palmos de alto, e duram, muitos annos sem se seccaiy; Ha outra pimenta, a qe pela lingua dos negros.se chama cmhemocu ; est grande e comprida, e depois de madura faz-se vermelha; e usam d'ella como da dcima; -faz arvores de altura de um hohaem, e todo o ann-o.d-c novidade; sempre tem pimentas vermelhas, verdes, e flor,, e dura muitos annos sem se seccar. ."'".Ha outra casta, que 'chamam cuipi, a qual tem bico,/, feio, etamanho de gravanos ; come-se em verde, cruae cozida como a de cima, e como madura faz-se vermelha, a qual,queima muito ; a quem as gallinhas e pssaros tem grande affeio ; e faz arvore me que em todo .o anno d; : novidade. Ha outra casta, que chamam saba, que comprida e , delgada, em verde no queima tanto como* quando ma : dura; que vermelha; cuja arvore pequena, d fruta todo o anno, e tambm se usa d'ella corno da.mais. ',,. Ha outra casta que se chama cuihejuritou, por ser da feio de abbora, assim amassada,; -sta quando verde. tem a cr azulada, e.como madurase faz vermelha ; da qrial se usa como das mais de que temos dito, cuja arvore pequena e em todo o ahno d novidade. Ha outra casta que chamam cumari, que bravi e nasce pelos matos, campos e pls roas, a qual nasce do feitio dos pssaros que a comem "muito, por ser inis pequena que gravanos ; ms queima mais que todas as que dissemos, e mais gostosa: qu todas ;,e quando toadura faz-se vermelha, e quando se acha d'esta no se come da outra; faz-se arvore pequena, tem as flores brancas como as mais, e d novidade em. todo o anno.
CAPITULO XLIX.

Daqui por diante se dir das arvores de fruto, comeando nos cajus e cajuis.
' ,' -^./

Convm tratar d'qui por diante das arvores de fruto naturas'da Bahia, guas, vertentes ao mar e vista d'elle; e demos,o primeiro logar e capitrilo por si aos cajueiros;, pois uma arvore de muita estima, e ha tantos ao longo do mar e na vista d'elle. Estas arvores so como figueiras grandes, tem a casca da mesma cr; e a madeira branca e mole como figueira, cujas folhas so da feico^a cidreira

'- 167 , - - ' --. e mais macias. As folhas dos olhos novos so vermelhas, muito brandas frescas, flor como a do sabugueiro; de bom-cheir-o^mas muito breve. A, sombra d'estas arvores muito fria e fresca, o fruto formosissimo ; algumas arvores d fruto vermelho e comprido, outras do da mesma cr e redondo. Ha otitr casta que d o fruto da resma feio, ms a partes vermelho e-n'outras de cr almcegadaf ha outras arvores quCdO o fruto amarllo e.comprido como peros d!EI-Rei, ms so em tudo maiores que s peros e da mesma Cr" ' ; v, ' '."'/'' . - , ' " ' . . . ' Ha Outras-arvores q Ue. do, este fruto-redondo, e uhs e outros so ;'muito gostosos, sumarentose de suave cheiro, os quaes se dsfz'ih todos era gua:. . ^ natureza d'esfs," cjs fria, e so medicinaes para doentes d febres, e para quem teto -fsiio, os quaes fazem bom estom,agove muitas pessoas-lhes tomam o sumo pelas manhs em jejurav para conservao do estmago, e fazem bom bafo a qdam os come pela manh, /por mais que se coma d'elles no fazem mal a nenhuma hora do dia, e so "de>tal dlgstp^que mdpus credos se esmpem. Os ca|sj.,slvstrS'travam junto do ol-hq que se lhes bota fora, mias ps";que se criam nas roas e nos quintaes coraemrse todos semptereto qrie lanar fora por no travarem. Fazem-se estes cajris de cortserva, que muito suave, e para se Gomeremdi;p!p,:cozidos no assucar eobertos de canella np teto preo^ip); sumo d'esta ' fruta faz o gentio vinho, com que se /nbebeda, que de bom cheiro e saboroso. >E' para notar, que no olho d'este pomo to formoso cria a,natureza outra-fruta parda, a que chamamos castanha^ que d;a feio e tamanho de um rim de cabrito, a qual "castanha teto a casca muito dura e d natureza quntissi. toa e miolo que tem dentro ; deita esta casca Um leo to forte, que aonde toca na carne faz empola, o qual leo , da cr de azeite e tem o cheiro mui forte. Tem esta castanha o miolo branco, tamanho como o de uma*amendoa grandeza qual muito saborosa, e quer arremedar no sabor aos pinhes, mas de multa vantagem. D'estas castanhas fazem as.toulheres todas as conservas doces que costumam fazer com as toendoas, o que tem graa na suavidade do sabor ; o'miolo d'estas castanhas, se est muitos dias fora da casca, pria rand do azeite qu tem em si ; quando se quebram ests castanhas para lhes tirarem o miolo, faz d azeite que tema casca pellar astoos a quem as quebra.

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Estas arvores se do em ara e terras fracas, p se as cortar tornam logo 4 rebentar, o que fazem poucas arvores n'estas partes. Cria-se n-estas arvores um resina muito alva, da ,qual as mulheres se aproveitam para fazerem alcorce de assucar em logarde alquitira. Nascemestasarvoresdas castanhas, eem dous annos se fazem mais altas que um homem, e no mesmo tempo do fruto, 0 qual, emquanto as arvores so nova, avantajado no cheiro esabor. Ha outra casta d'esta fruta, que os ndios chamam caju, cuja arvore nem mais nem menos que a ds cajus, seno quanto muito mais pequena, que lhe chega um homem do cho ao mais alto d'ella a colher-lhe o fruto, que amarllo, mas n maior que as cerejas grandes, e tem maravilhoso sabor com, pontinha de azedo, e criam tambm sua castanha na ponta, as quaes arvores se no do ao longo do mar, mas nas campinas do serto alm da Ctinga.
CAPITULO L.
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Em que se declara a natureza das pacobas .e bananas. Pacoba uma fruta natural d'esta'terra, a qual se d em uma arvore muito molle e fcil de cortar, cujas folhas so de doze e quinze,palmos de comprido ede trs e quatro de largo ; ,s de junto ao olho so menores, muito verdes umas e outras, e a- arvore da mesma cr, mas mais escura'; na ndia chamam a estas pacobeiras figueiras e ao fruto figos. Cada arvore d'estas no d mais que um s cacho que pelo menos tem passante de duzentas pacobas, e como este cacho est de' vez, cortam a arvore pelo p e de um s golpe que lhe do cora uma fouce a cortam e cerceam, como se fora um nabo, do qual corte corre logo aguemfio, e dentro em vinte e quatro horas torna a lanar do meio do corte um olho mui grosso d'onde se gera outra arvore; de redor d'este p arrebentam muitos filhos que aos seis ihzes do fruto,, e o mesmo faz mesma arvore. E como se corta esta pacobeira,tiram-lhe o cacho que tem o fruto verde e muito tezo, e dependuram-no -em parte onde amadurea, e se faam amarellas as pacobas ; e na casa onde se fizer fogo amadurecem mais depressa com a quentura; e como esta fruta est madura, cheira muito bem. Cada pacoba d'estas tem um palsmo de comprido e a grossura de um pepino, s quaes tiram as cascas, que so de grossura das das favas; e fiarlbe, o miolo inteiro alrnecegado; muito saboroso. Do-se estas

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pacobas assadas os doentes* emTogr d ms,: das quaes se fz marmelada muito soffrivel, tambm- as concertam (comoheringelas, eso muito gostosas; e cozidas no assucar com canella so estremadas, e passadas ao sol sabem a p'ecegos passados. Basta que de toda a maneira so muito boas, edorseem todo o anno; mas no inverno noiha tantas como no vrp, a a estas^ pacobas chama o gentio pacobu, que quer dizer pba: grande. - Ha outra Casta que np, so tamanhas, ms muito melhores, no sabor, e, verme-hacs, por dentro quando,, as cor-tam, e se do e criam da mesma maneira das grandes. Ha outra casta, que os indios chamam pCbmirim, que quer dizer pacoba pequena, que sp; do cohprimentode, um dedo, ms mais grossas ; estas so to doces como tamars, em tudo mui xcellentes. * As,bananeiras, teto as arvores,: folhas e criao como as pacobefas,.e.no ha; nas arvores' de umas s outras"nenhuma dmeren,'as qesvforrn;, ao Brazil de S. Thom, aonde ao seu fruto chamam bananas, en, ndia chamam a estas figos: de .horta, as quaes sdinais curtas que as pacobas, -mas riiais,grossas e de trs quinas ;. teto a casca da mesma cr e grossura da das pacobas, e o miolo mais molle e cheiram /melhor como so de vez, s 'quaes arregoa' a casca como vo amadurecendo e fazendo algumas fndas ao, alto;. que fazem na arvore ; no so to sadias como as pacobas. _ : Os negros de Guin so toais affeioados a estas bananas que s paobas, e d'ellas usam has suas roas ; e umas e outras seiquecem plantadas em valles perto da gua, ou ao menos em terra que seja muito hutolda para se darem bem e, tambm se do to" terras seccas e de ara ; quem cortar atravessadas as pacobas ou bananas, ver-lhes-ha no meio uma feio de crucifixo, sobre o que s contemplativos tem muito que dizer.
I; , " CAPITULO LI.

i Em que se diz que o fruto o que se chama mames ,,-; ,, jacarates. De Pernambuco veio Bahia a semente de uma fruta, a que chamam mames; os quaes so do tamanho e da feio e cr de grandes v peros camoezs, e tm muito bom' cheiro como so -de vez, que se fazem ns rvores, em

i 170 ' . '< 'V * casa acabam de amadurecer ; e como so maduros se fazrri; moH.es como melo; e para se comerem cortam-se ein talhadas como toa, e tiram-lhe as pevides que tem envoltas em tripas como as de melo, mas so crespas e'pretas como gros d pimenta da ndia," s quaes talhadas se apara: a casca, coino a ma, e o que se come da cr e brandur do melo, o sabor doo.ee muito gostoso. Estas sementes se semearam na Bahia, nasceram logo ; e tal agazalhado lhe fez a terra que no primeiro nno se fizeram as arvores mais altas que um homem, eao segundo comearam de dar fruto, e se fizeram as arvores de mais de vinte palmos de alto, e pelo p to grossas como um homem pela cinta; os seus ramos so as, mesmas folhas arrumadas como as das palmeiras ; e cria se o fructo, no tronco, entre as folhas. .'" Entre estas rvores ha machos, qe no do fruto como as tamareiras, e umas e outras em poucos annos se fazem , pelo p ta/grossas como uma pipa, e d'avantagem. N'esta terra da Bahia.se cria. outra fruta natural d'ella, que em tudo se parece com estes mames de cima, seno, queso mais pequenos, qual os indios chamana jaracate, mas tem a arvore delgada, de cuja madeira se no usa. Esta arvore d a flor branca, o fruto amarellopor fora, da feio e tamanho dos figos bberas' ou longaes brancos, qe tem a casca dura e grossa, a que chamam em Portu> gal longaes ; d'esta maneira tem esta fruta a casca, que se lhe apara quando se come, tem bom cheiro, e o sabor toca. de azedo, e tem umas sementes-pretas que s,lanam fora.
CAPITULO LII.

Em que se diz de algumas arvpres.de fruto que se do>na -, visinhanadg mar da Bahia. < - , Na.visinhana do mar da Bahia se do umas arvores nas campinas e terras fracas,' que se chama,m mangabeiras, que so do tamanho de peceguiros. Tem os troncos * delgados, e a folha mida, e a fir como a do rnarmeleiro ; o frrit amarello crado de vermelho, como pecegos calvos, ao qual chamam inangabas ; que so tamanhas como ameixas e outras maiores, as quaes em verdes so todas, cheias de leite, e colhem-e inchadas para amadurecerem,-. em casa, o que fazem de um dia para o outro, porque se amadurecem na arvore eahem no cho. Esta fruta se come toda sem se deitar nada fora como figos, cuja Casca to dei*

171 ~ : gada que se lhe pella se as enxovalham,, a qual cheira, muito beto e tm suave sabor, de boa digesto faz bom>estoaago, ainda qrie comam muitas ;>,cuj,natureza fria, p:elj) que muitoboa para , os doent.es de febres por ser/.muito leve. Quando estas iriangabas no esto berit maduras, travam ha boca como as sorvas; verdes em-Portugal, e quando esto inchadas so boas para conserva de assucar, /que muito medicinal e gostosa. ) ; Eug arvore desffioada que, se no d seno em terra -boaide cuja lenha se faz ba decoada para os engenhos. ; E d: uma fruta da feio ds. alfarrobas de Hespanha,,. ' tem dentro umas pevides como, as das alfarrobas, e no. se lhe conae seno um doce que tem derredr das pevides, que muito- saboroso. '". - ..( - ,_; ' Cj ; uma arvore comprida, cmcopa pmo-piuhiro ; tem , asca grpss, e spera, e se a picam1 deita um leo branco como leite eto fio, que muito-pegajoso. A madel* ra muito mplle' serve, para fazer codva^para os engr nhps ; d a flor brarica como de mpeira^e 9; fruto amarello do tamanho das ameixas, tem grande caroo e pouco -'qu comer, a easca ctoo a da-sltoeixs". Esta fruta arregoa, se lhe chove," qlino madura, a qual cahe com o v e n e n o cho, e Cheiram muito,bem o fruto e as.flpQS., qUso brancas' e.fo.rmfsris; o sabor precioso, com ponta :deazedo, cuja!natureza fria e sadia ; do. esta fruta aos doentes" de febres, por ser fria e appettosa, chama-sC como a arvore, que se d ao longo do'mr. 1 Bacoropry outra arvore- de ;honesta graridura, que se d perto do',in.ar, ,.e quando a*- cortam corre-lhe uni leo , grosso d"'e'ntre a, madeira ,a C.sc, muito atoarello e pegajoso como visco. D' sta-arvore ura fruto tamanho como fruta novafque -amfelioe' cheira muito bem ; e tem a _ casca grossa como laranja, a, qual se lhe tira muito bem, e "/tem dentro deus caroos juntbs, sobre os qaes-tera o que se lhe come, quq de maravilhoso,sabor. Piquihi um arvore real, "de cuja madeira se dir adiante, a qual arvore d. fruta como Castanhas,.cuja casca - parda e';tz,a,, e - tir.adUv ficara utos /castanhas alvissimas," ,que:.sabm cpm-, pinhescrs,"e cada arvore d disto muito." :,:"-'.'. ' ; ':.' '., "-'.'

172
CAPITULO LIU.

Que trata-da arvore, dos ambs, que se d pelo serto da Bahia. Amb urna arvore pouco alegre vista, spera da madeira, e comespinhos como romeira, e do seu tamanho, a qual tem a folha mida. D esta arvore umas.flores brancas, e o fruto, dot mesmo nome, do tamanho e feio das ameixas brancas, e tem a mesma cr e sabor, e o caroo' maior. D^se esta fruta ordinariamente pelo serto, rio mtto que se chama a Ctinga, que est pelo menos afastado vinte lguas do mar, que terra seCa, de pouca gua pnd a natureza criou a estas arvores para remdio da d que os indios por alli passam. Esta arvore lana das raizes nturaes outras raizes tamanhas da feio ds botijas, outras maiores e menores, redondas e compridas como batatas, e aham-se algumas afastadas da arvore cincoenta esessenta passos, e outras mais ao perto. ,E para o gentio saber onde estas:raizes esto, rida batendo com um pu pelo cho, por cujo tom o conhece, pndecava e tira as razes de trs e quatro palmos de alto, e outras se acham flor da ferra, s ques se tira uma casca-parda que tem, como ,a dos inhames, ,e ficam alvssimas e brandas como mas de coco ; cujo sabor mui doce", e to smarento que se desfaz^na boCa tudo em gua frigidissimae m u i desencalmada ; com o que a gente que anda' pelo serto mata a sede onde no acha aguri para beber, e mata a fome comeq-. do esta raiz, qu mui sadia, no fez,nunca mal a ningum que comesse muita d'ella. D'ests rvores ha j algumas nas fazendas dos Portuguezes, que nasceram dos caroos dos ambs, onde do o mesmo fruto e raizes.
CAPITULO LIV.

Em que se, diz de algumas arvores de fruto afasjtaas do mar. Afastado do mar da Bahia e perto d'elle se do rimas arvores qu chamam Sabucai, qe so mui grandes, de cujo* fruto tratamos aqui somente. Esta arvore tpma tanta flor amarella, que se lhe no enxerga a folha ao longe, a qual flor muito formosa, mas no tem nenhum Cheiro. Nasce d'esta flor uma bola de po to dura como feiro, que est por dentro cheia de fruto. Ter esta bola uma polegada de

173 grosso, e tem a boca tapada com uma tapadoura to justa que se no enxerga, a junta d'ella, ar qual se no despega seno corno a fruta que est dentro e de vez,.que esta bola cahe no cho, a qual tem por dentro dez ou doze repartimentos, e em cada-um uma fruta tamanha como uma castanha de Hespanha, ou mais comprida ; s quaes castanhas so muito alvas e saborosas, assim assadas como cruas ; e despegdas estas bolas das castanhas e bem limpas por dentro, servem de graes ,ao gentio, onde pizam o sal e a pimenta,'* Piqui uma arvore de honesta grandura, tem a madeira amarellae boa de lavrar, a.qual d umfruto tamanho como .marmelos que tem o nome da arvore; este fruto tem a casca dura e grossa como cabao, de cr parda por fora, por dentro todo cheio de um mel branco muito doce ; e tera misturado umas pevides como de mas, o qual mel se lhe come em sorvos,'e refresca muito no vero. Maeug uma.arvor comprida,delgada e muito quebradia, e d-se em;aras junto dos rios, perto do salgado, e pela terra dentro dez ou doze lguas. Quando cortam esta *rvore, lana de si um leite muito alvo e pegajoso, que lhe corre em fio; a qual d umas frutas do mesino nome, redondas, com os ps compridos e Cr verdoeng,e so tamanhas cptoom,as pequenas; e^quando so verdes travam muito, e so todas cheias de leite. Colhem-se inchadas para amadurecerem em casa, e como so maduras tomam a-cr almecegada; comem-se todas como figos, cujo sabor mui suave, e tal que lhe ho ganha nenhuma fruta de Hespanha, nem de outra nenhuma parte;,e tem muito bom cheiro. Gehipapo uma arvore que se d ao longo do, mar e pelo serto, de cujo fruto aqui tratatoossmente. A sua folha como de castanheiro,a flor branca,da qual lhe nasce muita fruta, de que toma cada anno muita quantidade ; as quaes .,so,tamanhas como limas, e da sa feio; so de cr verdenga, e como so maduras se fazern de cr pardaa, e mlls, e tem honesto sabor e muito que comer, com algumas pevides dentro,xde que estas arvores nascem. Quando est fruta pequena, faz-se d'ella conserva,e como ^ grande antes de amadurecer tinge o sumo d'ella muito, com a qual tinta se tinge toda a nao do gentio era lavores pelo corpo e quando pe esta -tint'a* branca como gua, e como se enxuga s faz preta como azeviche : e quanto mais a lavam, mais preta se faz; e dura nove dias, no cabo dos quaes se
TOMO xiv > 26

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174

vai tirando. Tem virtude esta tinta para^fazer seccar as bustelas das boubas aos indios, e a quem se cura com ella.. Pela terra dentro ha outra arvore, a qu chamam g u t t que .demdnesta grandura;. d uma fruta do mesmo nome, do tamanho e cr das peras pardas, cuja casca se lhe apara; mas tem grande caroo, e o qe se lhe come se tira eto ta-, lhadas", como s peras", muito saboroso; e lanadas' estas talhadas em vinho no tem preo.. Faz-se d'esta fruta marmelada muito gostosa,a qual tem grande virtude para estancar cambras de sangue. Nas campinas ha outra arvore a que Chamam ubcaba, Cuja madeira mole, e d umas frutas pretas e midas eomotorurtinhos, que se cornem^ e tem sabor mui soffrivel. Mondurur outra arvore que d umas frutas pretas, tamanhas como avels, que se comem todas, lanando-lhes fora uinas pevides brancas que tem, a qual fruta muito saborosa. Ha outra outra arvore como larangeira que se chama oomich, a qual carrega todos os annos de-umas frutas' vermelhas, tamanhas e de feio de murtinhos, que se comem j /; todas lanando-lhes fr uma pevide preta que tem, que a semente d'estas arvores, a qual fruta muito gostosa. * Mandiba um arvore grande que d fruto,, do mesmo nome tamanho como cerejas,de cr vermelha, e muito doce; come-se como sorva lanando-lhe o caroo fora e uma pevide que tem dentro, qu a sua semente. Cambuy uma, arvore delgada de cuja madeira se no ' usa, a qual d uma flor branca, ,e o fruto amarello do mesmo nome ; do tamanho, feio e cr das mas d'an- "fega. Esta fruta, mui saborosa, e tem ponta*de azedo; lana-se-lhe fora um carocinho que tem dentro como coentro. D-se no mato perto do mar e afastado d'elle uma fruta , quese : chama uruanhas, cuja arvore como vides, e trepa por.outra arvore, qualquer,' a qual tem pouca folha ; o fruto que d de uns oito dedos de comprido e de tres.a quatro de largo, de feio da fava, qual se parte pelo meio como fava e fica em duas metades, que tem dentro trs e quatro caroos, da feio das colas de Guin, da mesma cr e sabor, os quaes caroos tem virtude para. o figado. Estas metades tem a casquinha muito delgada como mas, e o mais que se come da grossura de uma casca de laranja ; tem estremado sabor ; comendo-se esta fruta crua, sabe e cheira a, camoezas, e assada tem o mesmo sabor d'ellas as^

175 sadas ; faz-se d'esta fruta marmelada muito boa, a qual por sua natureza envolta no assucar cheira a lmiscar, e tem o Sabor de perada almiscarada ; e qriiem a no' conhece entende e affirma que perada. i Os araazeiros so outras arvores que pela maior parte se do em terra fraca na visinhana do mar, as quaes so como macieiras na grandura, na cr da casca, no cheiro da folha e na cr e feio d'ella. A flor branca, da feio da de murta, e cheira* muito bem- Ao fruto chamam araazes, que. so da feio das nesperas, mas alguns muito riiaiores. Quando so verdes'tem a cr verde, e como so maduros tem a cr das peras ; tem o olho como nesperas, e por dentro caroos como ellas, irasinuito mais pequenos. Esta fruta se,come toda, e tem ponta de azedo mui saboroso, da qual se faz marmelada, qub e muito boa e melhor para os doentes de cambras. Peito do salgado ha outra casta de araazeiros, cujas arvores so grandes, e o fruto como laranja, mas mui saboroso, o qual aparam a casca por ser muito grossa. / Aratic uma arvore do tamanho de uma amoreir, cuja folha muito verde escura, da feio d dalarangeira mas maior ; a Casca da rvore como de loureiro, a madeira muito molle, a flor fresca, grossa e pouco vistosa, mas o fruto tamanho como uma pinha, em verde lavrado como pinha, mas o lavpr lizo e branco. Como este fruto maduro, arregoa todo-,peiosjlavores que ficam ento brancos, e o "pomo muito molle e cheira muito bem, e tamanho o spu cheiro que, estando em cima da arvore, > se conhece debaixo que est maduro pelo cheiro. Este fruto por natureza frio e sadio ; para se comer corta-se em quartos, lnando-lhefra umas pevides que tem amarellas e compridas, como de cabaos, das quaes nascem , estas arvores ; e aparam-lhe a casca de fora que muito delgada, e todo mais se come,-qe tem muito bom sabor com ponta de azedo, a qual fruta para a calma mui desehfastiada. ,, Pino uma arvore comprida,, delgada, esfarrapada da folha, a qual do tamanho e feio da folha da parra'. O seu fruto nasce em ourio cheio d espinhos como os das castanhas, e tirado este ourio fora fica uma cousa do tamanho de uma noz, e da mesma cr, feio e dureza, o qual lhe quebram, e tiram-lhe de dentro dez ou doze pevides do tamanho de amndoas sem casca, mas mais delgadas, s quaes tiram uma camisa parda que tem como as-

176 amndoas, es<fica-lhe o miolo ai vissimo,que tem o sabor como ' as amndoas'; de,que se fazem todas as frutas doces qe se costumam fazer'das. amndoas, os quaes pinos, lanados em gua fria, incham e ficam muito desenfastiados para comer, e so bons para dr de, cabea, de que, se fazem amendoados. Do,se estas arvores em ladeira sobre o mar e vista d'ile, eni terras dependuradas. Abajer uma arvore'baixa como carrasco, natural don- de lhe chega o rocio do mar, pelo que se no do estas arvores seno ao longo, das praias, cuja folha spera, e d unia flor branca, e pequena. O fruto do mesirio^nome da feio e tamanho das ameixas de c, e de cr roxa ; come-se como ameixas, mas .tem maior caroo ; o sabor ' doce esaboroso. .-, Amaytim uma arvore'muito direita, .comprida e delgada ; t e m a folha como figueira, d uns cachos maiores que os das uvas ferraes ; tem os bagos redondos,, tamanhos' como os das .uvas mouriscas, e muito esfarrapados, cuja cr roxa, e cobertos de um pello tomiacio como velludo ; mettem-se estes bagos na boca e tiram-lhe fora um caroo como de cereja, e a pelle que tem o pello, entre a qual e o caroo tem um doce hui saboroso como o sumo; das boas uvas. Ap uma arvore do tamanho e feio das oliveiras, mas, tem a madeira spera e espinhosa como romeira, a folha : da feio de pecegueiro e da mesma cr. Esta arvore d um fruto- do mesmo nome,da feio, das amoras, mas nunca sao pretas, e tem a cr bran.cacenta ;' come-se , como as amoras ; tem bom sabor,, com p o n t a d e azedo, mui appeti-. titoso para quem tem fastio; as quaes arvores se 'do a o . longo, do mar e. vista d'ell. -' .). --;. Murici uma arvore pequena, rqito secca da casca e da folha, cuja madeira no serve para nada ;, d raas 'frutasamarellas, mais pequenas que cerejas, que nascem em, pinhas como ellas, com os ps compridos; qual '/ruta molle e come-se toda ; cheira e sabe a queijo do 'Alemtejoque requeima. Estas arvores se do ns campinas perto do mar ern terras fracas. ^Copiuba uma arvore da feio do loureiro, assim na cr da casca do tronco como ria folha, a qual carrega por' todos os ramos d e u m a fruta preta do mesmo nome, maior que murtinhos -e. toma tentos ordinariamente que negrej,am ao longe. Esta fruta se.come como uvas, e tem o s a b o r d'ellas quando as vendimam, que esto muito maduras, e

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tem uma pevide preta que se lhe lana fora. Do-se estas arvores ao longo do mar e dos-rios por onde entra a mar. Maarandiba uma1 arvore real de cuja madeira se dir ao diante. S lhe,cabe aqui dizer do seu fruto., que cia cr ds medronhos e do seu tamanho, cuja casca teza e tem duaspevides dentro, que se lhe lanada fora com a, casca ; o mais se lhe come, que doce e muito saboroso ; e quem come' muita d'esta fruta que se chama cPmo a arvore, pegam-se-he os bigodes com o sumo d'ella, que muito doce e pegajoso e para.os indios lhe colherem esta fruta cortam as arvores pelo p como fazem a, todas que so altas. Ests se do ao longo do mar ou vista d'elle. ; Moeury uma arvore grande que se d perto do mar, a qual d umas frutas amarelias,: tamanhas como abricoqries, que cheiram rnnito bem, e tem grande caroo;-'o que se lhe come de maravilhoso sabor, e aparam-lhe a casca de fora. -'.:, ' - Cambuc outra arvore de 'honesta grandura, que d mas frutas.amarelias do mesmo nome, tamanhas como abricoques, toas tem. maior caroo e pouco que comer; muitp;docee de honesto sabor..'
,'' CAPTTULO L V .

Em que se contm muitas castas de palmeiras que do fruto pela terra:a Bahia no serto e algimas junto do mar. , Como ha tanta diversidade de palmeiras que do fruto na terra da Bahia;, convm que s arrumemos todas n'este capitulo., comeando logo em umas a que os indios chamam pindoba, que so muito altas, e grassas, que do flor -como as tamareiras, e o fruto m cachos grandes' como os coqueiros, cada um dos quaes tamanho que no" pde um negro mais fazer que lev'al-o scostas ; era os quaes cachos tem os-cocos tamanhos como peras pardas grandes, etem; a casca-de fora cprao-coco;, e outra dentro de um dedo de grosso, muito dura, e dentro d'eliaum miolo toassio coto ,esta casca, d'onde se tira com trabalho, o' qual tamanho como uma bolota, e mui alvo e duro para-quem tem ruins dentes ; e se no de vez, muito tenro e saboroso ; e de mina maneira e outra bom mantimento para o gentio quando no- tem mandioca, o qual faz d'ests cocos azeite .parasuas mesinhas.Do olho cl'estas palmeiras se tiram palmitos faarihosos de cinco seis palmos de comprido, e to

178, grossos-como. a. perna de um homem. De junto, do olho d'estas palmeiras tira o gentio trs e quatro folhas.cerrads, que s depois abrem mao, coto as quaes cobrem as casas, que chamam pindobu, com o qe fica uma casa por dentro, depois de.coberta, muito formosa; -a qual palma no vero fria, e no inverno quente ; e se no fora o perigo do fogo,, muito melhor e mais sadia cobertura que a r da telha. ,, Anajamirim outra casta de palmeiras bravas- que do muito formosos palmitos, e o fruto como, as palmeiras acima; mas sao os Cocos mais pequenos, e as. palmas, que. se lhe tiram de junto dos olhos tem a folha mais mida,; com que tambm cobrem as casas onde se no acham as palmeiras acima. Os cachos d'estas palmeiras,: e das outras acima nascem ,em umamaaroca parda de deus a trs palmos de comprido, e como este cacho quer lanar a 'flor arrebenta esta raaaroca ao comprido e sahe o cacho para fora, e a maaroca fica muita liza por dentro e dura como po; da qual se servem os indios como de gamellas, e ficam da feio de altodia. V Ha outras palmeiras brava$ quechamam japeraaba, que tambm so grandes rvores ; maSno sprVe a foha para cobrir casas, porque muito rara e no cobre bem, mas " serve para remdio de quem caminha pelo mato cobrir com ella as choupans, as quaes palmeiras do tambm palmito no olho e seus cachos de cocos, tamanhos como uiri punho, com.1 rriiolo' como as mais, que tambm, serve de mantimento ao gentio, e de fazerem azeite ; o qual e o de cima tem o cheiro muito fortum. Paty outra casta de palmeiras bravas muito compridas e delgadas ; as mais grossas so pelo p como a coxa de um homem, tem a rama pequena, molfoe verde-escura. Os. palmitos que do so/pequenos,: e Os,cocos, tamanhos comonozes, com o seu miolo pequeno que se cofoe. D'estas arvores se usa muito, porque teto a casca muito dura, que se fende ao machado muito beto, da qual se faz, ripa para aS casas, a que chamam pataiba, que to dura que com- trabalho a passa um prego ; e por dentro estopenta, a qual ripa quando se 'lavra por dentro cheira, a mas maduras. Ha-outras palmeiras qu chamam bory, que tem muitos ns, que tambm do cocos em cachos, mas so midos * r estas tem a folha da parte de fora Verde e' da de dentro branca, cota pello como marmelos, as quaes tambm do palmitos muito bons.

179, . PiandSjSo uinas palmeiras bravas e baixas que se do m terras fracas : e dp uns cachos de cocos pequenos e amarellos por fora, que mantimento, para quem anda pelo serto, muito bom, porque tem d miolo muito saboroso como avels, e tambm do palmitos. As principaes palmeiras bravas da Bahia so as que chamam ururucuri, queinoso muito-altas, do uns cachos de cocos muito midos do tamanho e cr- dos abricoques, os quaes se come o de fora, como os abricoques, pr' ser brando e1 de soffrivel sabor; e quebrando-lhe o caroo, d'onde se lhe tira ura miolo como o das avels, que afvo tenro e, muitosabor-oso, os quaes coquinhos so mui estimados" de todos. Estas palmeiras tem o tronco fofo, cheio / de um miolo alvo e sblto como cuscuz, e. molle; e quem , anda pelo serto-tira esfe miolo e coze-o era um alguidr ou tacho, sobre,o fogo, onde s lhe gasta a humidade, e : manttmento muito sadio, substancial e proveitoso1' aos que andam pelo serto, a que.chamam farinha de po. Patiob corno palineira nova no tronco e olho, e d; umas folhas de cinco a seis palmds de comprido e dous ,e trs de largo : de cr, verde e teza como pergaminho, e serve para cobrir as casas np legar pnde se no acha outra, e para as.choupanas dos qe caminham ; quando se estas folhas secpam, fazem-se em pregas to lindas como de leques da ndia ; e quando nascem, salem feitas em pregas, como est um leque estando fechado ;d palmitos* pequenos, mas mui'gostosos. '
CAPITULO L V I .

'Em que se declaram as hervas, qe do fruto "na Bahia, que no so arvores. Como na Bahia se criam algumas frutas que se comem, em heryas que no fazeiri, arvores, pareceu, decente arrumal-as n'este capitulo apartadas das outras arvores. E Comecemos logo a,dizer dos maracujs, que uma rama conurhera e tem a folha da mesma feio, a qual atrepa prilas arvores e as cobre todas, do que se fazem rios quintaes ramadas multo frescas, porque duram, sem se secca, muitos annos. A folha da herva muito fria e boa para, desafogar, pondo-se em cima de qualquer nascida ou chaga, e tem outras muitas virtudes ;,e d uma flor branca 'muito formosa e grande que cheira muito bem; d'onde nas-

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cem umas frutas como laranjas pequenas, mu|b lizas ppr, -fora ; a- casca da grossura: da das laranjas de cr verdes clara, e tudo p que tem dentro se corne, que alm de ter bom cheiro tem suave sabor. Esta fruta fria de sua natureza e boa para doentes de febres, tem ponta de azedo* e ,;mui desenfastlda ; e eraquanto nova, faz-se ri'ella. boaconserva ; em: quanto no bem madura, muito azeda.Canap umaherva que s e parece com herva toura; e dtima fruta como--bagos de, uvas brancas cradas d si: e molles, a qual scome, mas no : tem bom sabor-sho para os indios. '' *."':'l"'' '-' Moduruc. nem mais nem menos que uma figueira das qrie se plantara nos jardihs de Portugal, qu'tem s "folhas grossas., a qu chamam figueiras da ndia ; ests tem ris* folhas d m palnio.de comprido e quatro* deds~d, largo-' e um de, grosp,,, e nascem as folhas nas pontas, nias ds outras, as\uaes so tpdas cheias de espinhos tamanhos e to duros como agulhas, e to agudas como ells, e do cv fruto nas1 pontas nas ilhargas das. folhas,, que so uns figos tamanhos como ps, lamparps, vermelhos-, por fora,, com a casca grossa que se no come-; o miolo de malhas brancas e pretas;' o branco alvissino, e o preto como azeviche, cujo sabor mui appetitos e fresco ; o que" se cria nas aras ao longo d mar. Mrujaiba so uns ramos espinhosos, mas limpos dos, espinhos ficam: rimas canas pretas qu servem de bordes como canas de rota, cujos espinhos so pretos, e to agudos como agulhas. Nos ps d'estes ramos se do uns cachos como os das' tamareiras, feitos os fios em cordes cheios dp bgos como os de uvas fries, e do mesmo tamanho; os quaes tem a casca dura e roxa por fora, o, caroo dentro como cerejas, qual com casca se lhe lana" fora; e gosta-se de um sumo que tem dentro doce^e- suave: ,, Ao longo do mar se criam umas folhas largas, que do um fruto a que chamara crauat, que d a feio de maa-, roa, c-amarello por fora ; tem,bom cheiro, a casca grossa eteza, a qual selamea fora para se comer miolo, qu mui doce; mas empola se a boca a quem come muita' frrijta d'esta. '. ; " - "..,.V;,: ; Ha uma herVa que secham.anhamby, que se parece na folha com coentro, e queima como mastruos, a qual comem os ndios e Os mestios crua, e temperam as panellas ds seus inanjares com ella, de quem mui' estimada.

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CAPITULO LVII.

. Em que se declara a propriedade dos nanazes , no nomeados No foi descuido deixar sananazes para este.logar por esquecimento ; mas deixamo-los para elle, porque se lhe dramos o primeiro, que o seu, no se pzeram os olhos nas frutas declaradas no capitulo atraz ;"e para o' pormos s, pois se lhe no podia dar companhia conveniente a seus merecimentos. , Ananaz uiria fruta do tamanho de uma cidra grande, mas mais comprida ; fera olho da feio dos alcachofres, e o corpo lavrado como alcachofre mofar, e cora uma ponta e bico em cada signal das pencas^ mas todo macio ; e muitos nanazes lanam o olho e ao p do fruto muitos olhos tamanhos comoalCachfres. A hervaem quetee criam os nanazes da feio da que em Portugal chamara herva babosa, e tem as folhas armadas, e do tamanho da herva babosa, mas no so to grossas ; a qual herva ou ananaziro espiga cada anno no-meio como o cardo, e lana urri grelo- da mesma maneira, e m cima d'elle lhe nasce * fruto tamanho como alcachofre, muito vermelho,'o qual assim como vaicrescendo, vai'perdendo a cr e fazendo-se verde; ,. 0 como vai amadurecendo, se vai fazendo amarellg acatolado de verde, como maduro conhece-se pelo cheiro como o melo. Os ananazeiros se transpem de uma parte para a outra, e pegam- sem se seecar nenhum ; ainda que estejam.com as raizes para o ar fora daterra ao sol mais de um mez ; osquaes do novidade d'ahi a.seis mezes : e alm dos filhou qu lanam ao p do fruto e no olho, lanam 'outros ao p do ananazeiro; que tambm espigam e do seu ananaz, como a ni donde nascr-am, os quaes se transpem, e os.olhos que nascem no p eno olho do ananaz. Os ananazeiros duram na terra, spm se seccarem, toda,a vida ; e se andam limpos; de herva, que entre ells nasce, quanto mais velhos so do toais novidade; os qaes no do o fruto: todos juntamente ; mas em todo o anno uns mais temporos que os; outros, e no inverno dao menos fruto que no vero, em que vem a fora da novidade, que dura oito mezes. Para se comerem os nanazes ho de se aparar muito bem ; lanando-lhe a casca toda fora, e a ponta d junto do 'olho "por no ser to doce, e depois de aparado este fruto, o cortam em talhadas redondas, como
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de laranja o ao comprido-, ficando-lhe o grelf que tem dentro, que vai correndo do p at o olho ; e quando se corta fica o prato cheio de sumo que d'elle sahe, e o que se lhe come da cr dos gomos d laranja, e alguns ha de cr mais amarella ; e desfaz-se tudo em sumo na boca, como o gomo de laranja, mas muito mais sumarento ; o sabor dos nanazes muito doce, e to suave que nenhuma fruta, de Hespanha lhe chega na formosura, no sabor e no cheiro ; porqu uns cheiram a melo muito fino, outros a comoezas : mas no cheiro e no sabor no ha quem se,saiba afirmar em nada ; porque, ora sabe cheira a uma Cousa, ora a outra. A natureza d'ste fruto quente e humido, e muif damnoso para quem tem ferida ou chaga aberta:' squaes nanazes sendo verdes so proveitosos para curar chagas com elles, cujo sumo come todo o cancere, e carne podre, do qu s aproveita o gentio : e em tanta maneira come esta fruta, que alimpam com as suas cascas a ferrugem das espadas e facas, e tirin^com ellas as nodoas d; roupa ao lavar; de cujo sump, quando so maduras, os ndios fazem vinho, com que se embebedam ;.para o que os colhem mal maduros, para ser mais azedo,, do qual vinho todos os mestios e muitos Portuguezes so mui afeioados:/ D'esta fruta se faz muita conserva, aparada da. ca"sca,: a, qual muito formosa e saborosa, e no tem a quentura e numidade de quando se. come em fresco.
CAPITULO LVI1I.

D1aqui.por diante se vo arrumando as arvores e hervas de virtude que ha na Bahia. No se podiam arrumar em outra parte que melhor estivessem as arvores de,virtude que apoz das que do fruto ; e seja a primeira a arvore do balsamo q ue se chama caburei"b; que so rvores mui grandes de que se fazem eixos para engenhos, cuja madeira pardaa e incorruptvel. Quando lavram esta madeira cheira a rua toda a. balsamo, e todas as vezes que se queima cheira riiuito bem. D'esta arvore se tira o balsamo suavissimo, dando-lhe piques at um certo logar, donde comea de chorar este suavissimo icor na mesma hora, o qual se recolhe em -algodes, que lhe mettem nos golpes ; e como esto bem molhados do balsamo, os espremem em uma prensa, onde lhe tiram este licor, que grosso e da cr do arrobe ; o qual milagroso

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para curar feridas frescas, e para tirar os signaes d'ellas no rosto. O caruncho d'este po, que se cria nojlogar donde sahiu o balsamo, preciosssimo no cheiro; e amassa-se com o mesmo balsamo, e fazem d'esta massa contas, que depois de seccas ficam de maravilhoso cheiro. De to santa arvore como a do balsamo merece' ser companheira visinha a que, chamam copaiba que arvore grande, cuja madeira no muito dura, e tem a cr pardaa ; e faz-se d'ella tabodo ; a qual no d fruto que se corria, mas-um plo santssimo em virtudes, o qual da cr e clareza de azeite sem sal; e antes de se saber de sua virtude servia de noite nas candeias. Para se tirar este leo das arvores lhes do um, talho com um machado acima do p, at que lhe chegam veia, e como lhe chegam corre este leo em fio, e lana tanta quantidade cada arvore que ha algums.quedo duas botijas cheias, que tem cada uma quatro canadas. Este leo tem muito bom cheiro, e excellente para curar feridas frescas, e as que levam pontos da primeira'cura soldam se as queimam com elle, as estocadas ou feridas que no levam pontos se curam, com elle, sem outras mzinhas ; com o qaj se cria a carne a,t encourar, e no deixa criar nenhuma corrupo nem matria. Para frialdades, dores de barriga e pontadas de'frio este leo santssimo, e to-subtil que se vai de todas, as vasilhas, seno so vidradas ; e algumas pessoas querem afirmar que at no, vidro mingoa ; e quem *se tintar com este pleo ha-sede guardar do ar, porque prejudicial*.
CAPITULO LIX.

"Em que trata da virtude da embaiba e caraobu e caraobamirim. Embaiba uma arvore comprida e delgada, qrie faz uma copa em cima de pouca rama ; a folha como de figueira, mas to spera que os indios cepilham com ellas os seus arcos e hastes de dardos, com a;qual s pe a madeira melhor que com a pelle de lixa. O fruto d'esta arvore so umas candeias cachos como as dos castanheiros, e como; amadurecem as comera os passarinhos e os indios, cujo saibo adocicado, e tem dentro uns gros de milho, como os figos passados, que a-smente de que estas arvores nascem : as quaes' se no do em mato virgem, se no na terra, que foi j aproveitada ; e assim no tronco como nos

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ramos' toda oca por dentro, onde se criam infinidade de formigas: midas. Tem o olho d'esta arvore grandes virtudes para com elle curarem feridas, o qual depois,de pisado se.pe sobre feridas mortaes, e se curam com elle com muita brevidade, sem outros unguentos ; e o entrecasc.o d'este olho tem ainda mais virtude, com o que tambm se curam feridas e chagas velhas ; e taes cuias se fazem, com o olho d'esta arvore, e com o olep do copaiba, que se no occupam na Bahia cirurgies, porque cada um o em sua casa. ; Caraobu uma arvore omp pecegueipo, mas tem a madeira muito secca e a folha mida,,como -a d. men-* doeira: esta madeira- muito dura e de cr almecegada, a qual se parece com o po das Antilhas; cuja casca delgada: da folha s aproveitmos indios>. e com ella pisada curam as boubas, pondo-a com o sumo m cima das bostellas ou chagas, com que se sccam muito depressa : e quando isto no basta,xqueimam em uma telha estas folhas, e com o p d'ellas, feitas em carvo, seccaih estas bostellas ; do que tambm se aproveitam os, Portuguezes, que tem necessidade d'este remdio para curarem, seus males; de que muitos tem muitos. , Carabamirim outra arvore da mesma casta, seno quanto mais pequena, e tem a folha mais mida, da qual. se aproveitam como da caraoba de cima, e dizem qu tem mais virtude; com as folhas d'esta rvore cozidas, tomam os Portuguezes doentes d'ests males suadouros, tomando o bafo d'esta- gua, estandomuito quente, de que acham muito bem ; e lhes faz sahir todo o humor para fora e ,seccar as bostellas, tomando d'estes nove suadores, e o, shmo da mesma folha bebido por xarope.
CAPITULO LX.

Que trata da arvore da almecega e de outras arvores de virtude. Ha outras arVores de muita estima, a que os indios chamam ubiracica ; tem honesta grandura, de cuja madeira se no aproveitam, mas valem-se de sua resina, de que lana grande quantidade, e quando a deita muito molle pegajosa ; a qual maravilhosa almecega, que faz touit vantagem que se vende nas boticas, e para uma arvore lanar muita picam-na ao longo da casca com muitos pi-

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ques, e logo comea a lanar por elles esta almecega, que -lhe os indios vo apanhando com' umas folhas, aonde a vo ajuntando e fazem m pes. -, Esta almecega muito quente por natureza; d qual fazem emplastos para defensivo da frialdade, epara soldar carne quebrada, e para fazer vir a furo postmas, os quaes fz arrebentar por si, e lhes chupa de dentro os carneges,e derretida boa para escaldar feridas frescas, e faz muita vantagem trebentiria de beta ;v coto a qual almecega) se fazem rnuitos unguentos e emplastos para quebraduras de pernas, qual Os indios chamam icica. ' Corneiba uma arvore, que na folha, na flor, na bga e no cheiro a aroeira de Hespanha, e tem a mesma virtude para os dentes, e differente na grndura das arvores, que so tamanhas como-oliveiras, de cuja madeira se faz boa cirizparax dcoada dos' engenhos. Naturalmente se d estas arvores em terra de areia, debaixo de cujas raizes se acha muito anime, que no cheiro, na vista, e na virtude como o de Guin, pelo que se entende, que o estila de si, pelo baixo do tronco da arvore, porque se no acha junto de outras arvores.' Em algumas partes do .serto da Bahia se acham arvores de canafistula^ a que o gentio chama geneuna, mas.:'de agrestes do a canfistula inuito grossa e comprida ; e tem a codea aspra, mas quebrada, e da mesma feio, assim nas pevides que tem como no preto ; que se come e tem o mesmo saibo, da qual no risa o geriti, porque no sabe o para que ella presta. Em algumas fazendas ha algumas arvores de canifistua, que nasceram das sementes, que foram de S. Thom, que do o fruto mui perfeito como o das ndias": / Cuipena um rvore pontualmente como a murta de Portugal, e no tem outra differena que fazer maior arvore ter a folha maior do vio da terra; a qual se d pelos Campos da Bahia, cuja' flor e o cheiro d'plla da murta, ms no d murtinhos ; da qual murta se usa na Misericrdia para cura dos penitentes e para todos os lavatoris, para qu ella serve, porque tem a mesma virtude desecativa. Ao longo do mar da Bahia nascem umas arvores que tem o p como parras, as ques atrepam por Outras arvores grandes, por onde lanam muitos ramos como vides, as quaes se chamam mucuns, cujo fruto so umas favas redondas e aleohads na cr, e do tamanho de um tosto, as quaes tem um circulo preto, e na cabea um olho branco.

186 Estas favas para comer so peonhentas, ms tem grande virtude, para curar com- ellas feridas velhas d'esta maneira. Depois de serem estas favas bem seccas* Iro^se de pizar muito bem, e cobrir as chagas com os ps d'ellas, as quaos .comem todo o cancere e carne podre. , Crim-se ri'esta terrra outras arvores semelhantes s de cima, que atrepam por outras maiores, que se chamam o cip das feridas, as quaes do umas favas aleonadas pequemnas, da feio das de Portugal, cuja folha pizada e posta nas feridas, sem outros unguentos,-as cura muito bem. Ha uns mangues, ao longo do mar, a que o gentio.chama apareiba, que tem a madeira vermelha e rija, d e que, se fz carvo ; cuja casca muito spera, e tem tal virtude .que serve aos curtidores para curtir toda a sorte de pelles, m lugar de sumagre, com o que fazem to bom curtumecomo Com elle. Estes mangues fazem as arvores muijo, direitas, do umas candeias verdes compridas, que tem, dentro uma semente, como lentilhas, de que elles nascem.
> CAPITULO LXI.

D1 aqui por diante se vai relatando as qualidades das hervas de virtude que se criam na Bahia, comecemos logo a dizer d herva santa e outras hervas semelhantes. Petume a herva a que em Portugal chamam santa; onde ha muita d'ella pelas hortase quintaes, pelas grandes mostras que tem dado da sua virtude, com qual se temfeito curas estranhas ; pelo que no diremos d'esta herva se no o que np notrio a tolos, como matarem com o seu summo os vermes que se criam em feridas e chagas dgente descuidada.; com a qual se curam tambm s chagas e feridas das vaccas e das egoas sem outra cousa, e com. o sumo d'esta herva lhe encoriram. Deu ria costa d Brazil uma praga no gentio, como foi adoecereih do ssso, e criarem bichos n'elle, da qual doena morreu muita somma d'esta gente, sem se entender de que ; e depois que se soube o seu mal, se curaram com esta herva santa, e se curam hoje em dia os tocados d'ste mal, sem terem necessidade de outra" mezinga. A folha d'est herva, como. secca e curada, muito estimada dos indios e matoelucos e dos Portuguezes, que bebem o fumo d'ella, ajuntando muitas folhas d'estas, torcidas umas com as outras, e raettidas.em um canudo de folha de

187 palma, e pe-lh o fogo por uma banda, e como faz braza mettem este canudo pela outra banda na boca, e sorvemlhe o fumo para dentro atque lhe sahe pelas ventas fora. Todo o homem que se toma do vinho, bebe muito d'este fumo, e dizem que lhe faz esmoer o vinho. Afirmam os indios que quando andam pelo mato e lhes falta o mantimento, matam a fome e sdp com este fumo ; pelo que o trazem sempre comsigo ; e no ha duvida seno que este fumo tem virtude contra a asma, e os que so doentes d'ella s acham bem cora elle, cuja natureza muito quente. .\ Pino pontualmente ria folha, como as que em Portugal chamam figueira, do inferno. Esta herva d o fruto em cachos" cheios d bagos, tamanhos como avels, todos cheios de bicos, cada um d'estes bagos tem dentro um gro pardo, tamanhp como um feijo, o qual pizado se desfaz todo em azeite, que serve na Candeia ; bebido serve tanto como purga de canafistula ; e para os doentes de elica, bebido este azeite, se lhe passa o aceidente logo; as folhas d'esta herva so muito boas para desafogarem enagas e pstemas. Jeticu uma herva, que nasce pelos campos, e lana por cima da terra uns rairios como batatas,, os quaes do umas sementes pretas como ervilhacas grandes ; deitam estas hervas umas.raizps por baixo da terra como batatas, que so maravilhosas para purgar; do que se usa muito-na Bahia; as quaes raizes se cortam em talhadas em verdes, que so por dentro alvissimas, e seccam-nas muito bem ao sol; e tomara d'ests talhadas, depois de seccas, para cada purga o pezo de dous reales de prata, e lanando em vinho ou em, gua muito bem pizado se d a beber ao doente de madrugada, e faz fnaravilhas. D'estas raizes se faz conseri v em assucar raladas muito bem, como cidrada, e. tomada pela manh uma colher d'esta conserva faz-se com ella mais obra, que Com assucar rozado de Alexandria. PecaCriem so uns ramos que atrepam como parra, cuja folha pequena, redonda e brancacenta; as suas raizes so corno de juna brava, mas mais grossas, as quaes tm grande virtude para estancar cameras; do que s usa tomando uma pequena d'esta raiz pizada e lanada em gua; posta a serpnar e dada a beber ao doente de cameras de sangue lh'as fa'z estancar Jogo.

188:
CAPITULO LXII.

Em que se declara o modo com que se cria o algodo, e de sua virtude, e de outras Jiervas que fazem arvore. Maniira chamam os indios ao algodo, cujas arvores parecem marmeleiros arruados em pomares, mas, a madeira d'elle como de sabugueiro, mole e oca por dentro; a folha parece de parreira,, com o p comprido e vermelho, com o sumo da qual se, curam feridas esprimido n'ellas. A flrdo algodo um campainha amaEella,muitQ.formosa, donde riasce uni capulho, que ao lprige parece rito-,noz verde,, o qual ,sp fecha com trs folhas grossas e duras, da fep das con que..se fecham ps,-botes das rozas; e-como o algodo est de Vez, que , de Agosto por diante, abrem-se .estas folhas, com que se fecham estes capnlhos, e vp-se seccando. e mostrando o algodo que tem dentro muito alvo>.e senp, o apanham logo, cahe-to Cho ; e era cada capulho d'estes-, esto quatro de algodo,;cada um do tamanho de um ca-, pulhode seda ; e cada capulho d'estes tem dentro um caroo preto, cO/to quatro ordens d carcinhos pretos, e; Cada carcinho tamanho e da feio do feitio dos ratos, que a semente donde o algodo nasce, qual no mestoo anno qne-sesemea d novidade. ,\ ' ' '-' Estes caroos" do algodo come o gentio pizadps 1 e depois cozidos, que se faz em papas que chamam mingu. ... As arvo-rps d'estes algodoeiros duram sete a oito annos e , toais; quebrando-lhe cada anno as pontas grandes mo, porque se. secca th ; para que lancem- outros filhos novos, em que tomam mais novidade ; os quaes algodes se alimpam enchada, duas e trs vzs pada anno, para que a herva ps ho acanhe. Camar uma herva que, nasce pelos campos, que cheira herva cidreira; a qual faz/ arvore, com muitos ramos come d-roseira de Alexandria; 1 cuja. madeira -sec,ca. e, quebradia, a folha como da herva cidreira ; as flores s Como clavos-de Tunes, amarellos, e d mesma feio,-mas de feitio mais artifioioso. Cozidas as folhas e flores d'esta herva, tem a sua -agu muito bom*cheiro e virtude para sarar sarna e comicho, e para secca-chagas de bobas lavando-as com esta agria quente/; do que se usa muito n'aquellas partes. Ha.outra casta d'ste camar, que d'flores brancas da mesma feio, a qual tem a mesma virtude ; e como lhe

189 cahe a flor, assim a uma como a outra, ficm-lhe umas camarinhas denegridas, que eomem os meninos e os passarinhos, que a semente, de que esta herva nasce. . Nas campinas da Bahia se do urzes de Portugal, da mesma feio, assim ns ramos como na flor, mas rjdo camarinhas : dos quaes ramos cozidos na gua se aproveitam os indios para secar qualquer humor ruim. ' , As cannas da Bahia chama o gentio ub, as quaes tem folhas como as.de Hespanha,, e as raizes damesma maneira que lavram a terra muito; as quaes cozidas era gua tem a.mesma virtude desecativa que as de Hespanha. Estas cannas so compridas, cheias d ns por fora e macias por dentro, ainda que tem o miolo mole e estopendo. Espigam estas cannas cada anno, cujas espigas so de quinze e vinte palmos de comprido ; de que os indios fazem as flexas com que atiram. E tambm se do na Bahia as cannas de Hes-< panha, mas ho crescem tanto como as da terra. Jaborandi uma herva, que faz arvore de altura de um homem, e lana umas varas em ns como cannas, por onde estalam muito, como as apertam ; a folha ser de palmo de comprido, e da largura da folha d cidreira, a qual cheira a hprtel franceza, e tem a aspereza da hortel ordinria ; a gua cozida com estas folhas loura e muito cheirosa e boa para lavar o rosto, ao barbear ; quem tem a boca damnadaj o chagas n'ella, mastigando as folhas d'esta herva, drias ou trs vezes cada dia, e trazendo-a na boca, a cura muito depressa; queimadas estas folhas, os ps d'ellas alimpam o cancere das feridas, sem dar nenhuma pena, e tem outras hiuitas virtudes. Esta herva d umas.candeias como castanheiro, Onde se cria a semente de que nasce. Nascem outras hervas pelo campo, a que chamam os in-' dios caapiam, que tem flores brancas da feio dos bemmequeres, onde ha umasxsementes como g/ravno; dasquas eds flores se faz tinta amarella como aafr muito fino, do que usam os indios no seu modo;de tintas. A arvore que faz esta herva como a d alecrirh, e tm a folha molle, e a cr de verde claro como alface. Do-se ao longo da ribeira da Bahia umas hervas, a que os indios chamam jaborandiba ; e dap o mesmo nome da de. cima,, por se parecer nos ramos com ella ; 6 os homens que andaram na ndia lhe chamam btele, por se parecer em tudo com elle. A folha d'esta herva mettida na boca rqueima como folhas de louro, a qual muito macia, e tem o verde muito escuro. A arvore que faz esta herva to alta
TOMO xiv 28

-i-190 como ura homem, os ramos tem muitos ns, pr onde estala muito. Quem se lava com ella cozida nas partes eivadas do fgado', lh'as crira em poucos dias ; e cozidos os olhos e comestos', so sanissimos para este mal do figado ; e mastigadas estas folhasse trazidas na boca, tiram a dr de dentes.
CAPITULO L X I I I .

Em que se declara a virtude de outras hervas menores. :: Ha outras hervas menores, pelos campos, de muita virtude,, de que se aproveitam os indios e os Portuguezes; das quaes faremos meno brevemente n'este capitulo, come* ando na que o vgentio chama tararucu, e os Portuguezes fedegoscs. Est herva faz arvore do tamanho das mpstardeiras, e tem as folhas em ramos arrumadas como folhas de arvores, as quaes so rnuito macias, da feio das folhas, de pecegueiro, mas tem o verde muito escuro, e o cheiro da, fortido da arruda ; estas folhas deitam muito sumo, se s pizam ; o qual de natureza muito frio, e-serve para desafogar chagas : coto este fumo curam o ssso dos ndios e das gallinhas ; porque, criam n'elle muitas vezes bichos de que morrem, se lhe no aodem cora tempo. Estas, hervas do umas flores amarelias como as da pscoa, das quaes ,lhe nascem umas "bainhas com semente como ervilhacas.. Pelos campos da Bahia se do algumas hervas que lanam grandes braos como meloeirs, queatrepam se acham por onde, as quas do umas flores brancas, que se parecem at no cheiro com a flor do legaco em Portugal; cujos olhos comem os indios doentes de boubas, e outras pessoas.; e dizem acharem-se bem om elles, e afirma-se qiie esta a salsaparrilha das Antilhas. " Cpeb unia herva que nasce em boa terra perto da gua, e faz arvore comocouve espigada ; mas tem a folha redonda muito grande com p comprido, a qual muito macia; a arvore faz um grelo co por dentro, e muito tenro e depois de bem espigado, lana rimas candeias crespas em que d a semente, de que nasce. Esta herva de natureza frigidissima com cujas folhas passadas pelo ar do fogo; se desafoga toda a chaga e inchao que est esquentada-, pondo-lhe estas folhas em cima ;*e se a fogageto grande, secca-se esta folha; de maneira que. fica spera, e como est secca se lhe pe outras at que-o fogo abrande. Criam-se outras hervas pelos campos da Bahia, que se

191 ' chama guaxima, da feio de tanchlggrh ; mas tem as folhas mais pequenas, da feio de escdet', e tem o p comprido ; as quaes so brancas da banda de baixo, cuja natureza fria ; e posta sobre chagas e caduras das pernas que tem fogagem, as desafoga, e encouram conrellas, sem outros unguentos. Pelos mesmos campos se criam outras hervas, a que o gentio chama ca^pi,^ os Portuguezes malvaisco ; porque no tem outra differena do d Portugal que ser muito vioso ; mas tem a mesma virtude ; a qual usam, os mdicos da Bahia, quando necessrio, para fazerem vir a furo as postmas. e inchaes. Peipeaba uma hrva que se parece com belverde, que se d nos jardins de Portugal', da qual fazem as vassouras na Bahia, com que varrem as,casas ; cuja natureza fria, a qual pizam os indios e curam cm ella feridas frescas ; e" tambm entre os Portuguezes se cura com o sumo d'esta herva o mal rio,ssso, para o que tem grande virtude ; a qual no d flor, mas semente muito mida, de que nasce. Por estes-campos se cria oufra herva, a que os indios^ chamam campuava,. que so mentrastos, nem mais, nem menos que os, de Hespanha, e tem a mesma virtude, cuja gua-cozida boa pra lavar os ps ; e so tantos que juncam com elles as igrejas pelas endoenas, em logar d rosrnanirihos. Nas campinas da Bahia se cria outra herva, a que o gentio chama caamcum,, que tem as folhas de trs em treSxem tres.juntas, e so d cr dasalva ; e.d a flor roxa, de que nasce" uma bainha^ como de fremoos, que tem dentro upias sementes como lentilhas grandes; a qual herva tem o cheiro muito fortum, que causa dr, de cabea a quem a colhe: o gado que come esta herva engorda muito no primeiro ahri com ella, e depois d-lh como cameras de que morre: pelo qual respeito houve quem quiz desinar est herva de sua fazenda, e pz um dia mais de duzentos escravos arrancal-a do campo, os quaes no poderam aturar p trabalho mais que at o meio dia ; porque todos adoeceram com o cheiro d'ellade dr d Cabea,, o que fez espanto ; e os homens que tem conhecimento da. herva besteira de Hespanha, e a viram n'esta terra, affirmam qu esta mesma herva a besteira.

192.
CAPTULO LXIV.

Daqui por diante se vai dizendo das arvores reaes e o para que servem, comeando reste capitulo 64, que traia, do . vinhaticoe cedro. . Como- temos dito das arvores de fruto, e das que- tem virtude para curar, enfermidades, convm que se declare as arvores reaes, que se do na Bahia, de que se fazem os, engenhos de assucar e outras obras, de cuja grandeza ha tanta fama. , E parece rzao que se d o primeiro logar a vinhatico, a que o gentio chama sabigejuba, cuja madeira amarella e doce de lavrar, a, qual incorruptvel, assim tobre a terra como debaixo d'ella, e serve para as rodas dos, engenhos, para outras obras d'elles, e para casas fe outras obras primas. Ha tambm fanhpsos pos d'est cast,,.que se acham muitos de cem palmos de roda, e outros d'aq'ui para baixo, mui grandes; mas os muito grandes pela maior parte sap ocos por dentro, dos quaes se fazem cnas to compridas , como galeotas ; e acham-se muitos pos maios, de que se tira taboado de trs, quatro e cinco palmo*s de largo.. Esta madeira no se1 d seno em terra boa e afastada do mar. , Os cedros da Bahia no tem differena' ds das Ilhas seno na folha, que a cr da madeira e o cheiro, brandura ao laVrar todouto : a esta arvore chama o gentio acajcatinga, cuja madeira se no corrompe nunca ; da qual se acham mui grandes pos que pela maior parte so cos,^ mas aham-se alguns macios, de que' se tira taboado d trs' e quatro palmos' d largo. r * ' Pelo rio dos Ilhos trouxe a cheia um po,de cedro, ao mar, tamanho que se tirou d'elle a madeira e taboado com quesemadeiroueforroua igreja da Misericrdia, e sobejou .madeira: a qual branda de lavrar e proveitosa para obras primas e outras obras dos engenhos, de que se faz muito taboado para o forro das casas e-para barcos-; e faz uma vantagem' cedro da Bahia ao das Ilhas, que logo perde a fortido do cheiro, e o fato que se toette nas caixas de cedro no toma nenhum cheiro d'ellas, e as obrssdo cedro das Ilhas nunca jamais perderam o cheiro, e dmnara com elle ' o fato que se ri'ellas agazalha. .

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CAPITULO

LXV.

<< I

,Que trata das qualidades do pequihie de outras madeiras reaes. Pequihi uma arvore grande, que se d perto do mar, em terras baixas, huraidas e fracas; acham-se muitas,d'estas arvores de quarenta a cincoenta palmos de roda; cuja madeira parda, estopenta, muito -pesada, de que se fazem .gangorras, mesas, virgens e esteios para engenhos, a qual 'dura sem apodrecer para fito dos fins, ainda que esteja lanada sobre a terra ao sol e chuva. Quando lavram esta madeira cheira a vinagre, e sempre que se/tiramri'ella'os cavaeos molhados, ainda que esteja cortada de cem annos; e j se viu mettr um prego por uma gangorra, que havia dezeseis nnos que estava debaixo da telha de um engenho, e tanto que o prego comeou a entrar.para dentro, comeou a rebentar pelo mesmo furo um torno d'agua em fo^qu correu at o cho, o qual cheirava a vinagre; e se mettem os cavacos d'est madeira no fog^em quatro horas no pega n'elles, e j quando pega no fazem braza, nem levantam Ia varrida. E' esta madeira t pesada que em a deitando na gua s vai ao fundo, da qual sefazem bonsiiames e outras obras para barcas, grandes e navios. Quaparaiva outra arvore real muito grande, de que se acham muitas de trinta e quarenta palmos de roda, cuja madeira vermelha e mui fixa, quenrinca se viu podre; de que se,fazem gangorras, mesas, virgens e esteios para engenhos outras obras ^ e acham-se muitas arvores to compridas d'esta casta, que cortadas direito, o grosso d vigas de oitenta a cm palhios,de comprido, fora o delgado que fica no mato de que se fazem frexaes e tirantes dos engenhos. Estas arvores so naturaes de vargeas de ara visinhas do salgado ; e so to pesadas que era lanando a madeira na gua se vai logo ao fundo. Ha outras arvores tambm naturaes de vargeas d ara, a que o gentio chama- jutaypba, cuja madeira, vermeMiaca e muito fixa, que nunca apodrece; e mui,dura ao, lavrar; acham-se muitas arvores d'esta casta de cincoenta a sessenta palmos de roda; e pela maior parte estas grand so ocas por dentro; mash a outras de honesta grandeza macias, de qe se fazem gangorras, rnesas, virgens, esteios ou trs obras de engenhos, como so os eixos.- No so estas'" arvores muito altas, por se desordenarem pelo
:

-*- 194 alto, lanando grandes troncos; mas tiram-se d'ellag gangorras d cincoenta a sessenta palmos,de comprido^ e a madeira boa de lavrar, ainda que muito dura e to pesada que se vai na agu ao fundu. Sabucai outra arvore real que nunca apodreceu, assim debaixo da terra como sobre ella, de cujo fruto tratmos atraz, cuja madeira vermelh, dura e to pesada; que se vai ao fundo; d qual se achato grandes arvo,res, de que se fazem gangorras, mesas, eixos, fusos,, virgens, esteios e doutras obras dos engenhos. Quando se, cortam estas arvorestinem n'ellas os, machados como se dessem por ferro, onde se quebram muito.
CAPITULO LXVIv

Em que se acaba de concluir a informao das arvores reaes ,que se criam na Bahia. . Maarandiba outra arvore real) de cujo fruto j fica' dito traz : so naturaes estas arvores da visinhana do mar ; e acham-se muitas de trinta a quarenta palmos de roda, de que se fazem gangorras, mesas, eixos, fusos, vir- , gens, esteios e outras obras dos engenhos, cuja madeira, dcr de carne de presunto, e to dura de lavrar que no* ha ferramenta que lhe espere, e to pesada que se vai ao fundo. Estas arvores so to compridas-e direitas que seaproveitam do grosso d'ella de cem palmos para cima, e nunca se corrompem. , Ha outra arvore real que se chama jatymond, que no' tamanha como as de cima, mas de honesta grandura ; de que se fazem eixos, fusos, virgens, esteios e' outras obras dos engenhos; cuja madeira amarella de cr formosa, muito rija e doce de lavrar e incorruptvel; e tp pesada que vai ao fundo ; e no se d em ruim terra. Nas vrzeas de rea se do outras arvores raes: a que os ndios, chafoam curu, as quaes se parecem na feio, na folha, na cr da madeira, com carvalhos ; e achamse alguns de vinte e cinco a trinta palmos de roda, de que se fazem gangorras, mesas, eixos, virgens, esteios e outras obras midas ; mas nao muito fixe ao longo da terra; a qual tambm serve para liames de navios e barcos, e para taboado ; e de pesado se vai ao fundo. i Ha outras arvores reaes, a'que os Portuguezes chamam ahgelim, e os indios andurababapari, as quaes so muito

195 , grandes e cham-se muitas de mais de vinte palmos de roda d que fazem gangorras, mesas, eixos, virgens, esteios e outras obras ds engenhos e das casas de vivenda, e boas caixas por ser madeira leve e boa de lavrar, e honesta cr. Juquitlb outra arvore real, faanhosa na grossura e comprimento, de que se fazem gangorras, mesas dos engenhos e outras obras, e muito taboado ; e j se cortou arvoe d'estas ,to comprida grossa, qrie. deu rio comprimento e grossura duas gangorras-, que cada uma pelo menos ha de ter cincoenta palmos de comprido, quatro de assento cinco de alto. Esta madeira tem a cr brancacenta, leve e pouco durvel onde lhe chove ; no se do estas arvores em ruim terra,. , Ubiraem outra arvore real, de que se acham-muitas de vinte palmos de roda para cima, de que se fazem gangorras, mesas, virgens, esteios dos engenhos, e > taboado para navios, e outras obras, cuja cr amarellaa ; no muifo pesada, e boa de lavrar. 'Pelas campinas e terra fraca se criam muitas arvores, que se chamam sepepiras, que em certo tempo'se, enchem -de flor-como de pcegueiro ; no so arvores" muito faanhosas na grndura, pr serem desordenadas nos troncos mas tiram-se d'ells virgens, esteios e fusos para os enge-' nhos, a madeira parda e muito rija, e to liada que nunca fende; e paraliao d navios barcos a melhor que ha no inundo,; que sffre melhor o prego e nunca apodrece ; de qu 'se. tambm fazem carros muito bons; e to pesada esta madeira que se vai ao fundo. Putum-uj ; uma arvore realce no se d seno em terra muito boa'; ho so arvores muito grandes, mas do t-res palmos de testa. Esta das mais fixas madpiras qu ha no Brazil ; porque nunca se corrompe, da qual se fazem eixos, virgens, fusos, esteios para os engenhos, e toda, a . obra de casas e de primor ; a cr d'esta, madeira amarella coin umas veias vermelhas ; pesada e dura, ms muito , doce de lavrar.. Ha outras arvores, que se chamain, urcuranas, que so muito compridas e de grossura, quefazem d'ellas virgens e esteios para ris engenhos, e outras muitas obras de casas, e taboado para navios, a quem p gusano np faz mal ; a qual madeira pesada, vai-se ao fundo ; tem a cr de carne de fumo, e boa de^favrar e serrar.

196
CAPITULO LXVII. .

Daqui por diante se trata das madeiras mes. Madeiras mes, e de toda a sorte, ha tantas na Bahia, que se no podein contar, das quas diremos alguma parte das que chegaram nossa noticia. / E comeceinos no camaari que so arvores naturaes de ara e terras fracas. So estas arVores muito compridas, e direitas, das quaes sentiram frechaes e tirantes para engenhos ide cto palmos, e de cento e vinte.de comprido e dois de largo, espalmo e meio afora o delgado da ponta,lque, serve para outras cousas ; a qual madeira serve para toda a obradas casas, do que se faz muito taboado para ellas para os navios. Esta madeira tem a cr vermelhaca, boa de lavrar, e melhor de serrar. Dristas arvores se* fazem mastros para os navios, e se foram mais leves erain melhores que os de pinho, por serem toais fortes; as qries arvores so to rolias, que parecem torneados. Cria-se entre a casca e o mago d'esta arvore uma matria grossa e alva, que pega como termentina; e da mesma cr, ainda que mais alva ; o que' lana dando-lhe piques na casca em fio, e o mesmo lana o lavrar e ao, serrar, e lana muita quantidade,; e setoca nas mos, no se tira seno com azeite ; e se isto no termentina,, parece que fazendo-lhe algum cosimento, que engrossar e coalhar como rezina, que servir para brear os navios, de que se far muita quantidade, por haver mujta somma d-estas arvores aborda d'agua,'e cada uma deita muita matria d'sta. Guanandi 'uma arvore comprida, e np muito grossa cuja madeira amarellaa, que serve para obra de casas em parte aonde lhe no toque a gua: a casca drista arvore muito amarela por dentro, e entre ella e o po lana um leite grosso, e de cr ^iriarella muito fina, o qual pega como visco; e com elle armam os moos aos pssaros;, da qualmadeira se np faz conta; nem se aproveitam d'ella seno em obras de pouca dura ; as quaes arvres.so muito compridas, direitas e rolias, de que se fazem mastros para navios.

197
CAPITULO LXVIII.

'''">';'Qe tratat das arvores que do a envira, de que se fazem cordas e estopa para calafetar navios. i Acham-se pelos matos muitas arvores de que se tira a envira para calafetar :, e comecemos a dizer das que se chamam enviro, que so arvores grandes, cuja madeira mole, e no se faz conta d'ella seno para o fogo ; as quaes t e m a casca spera por fora, a qual se esfolla das arvores, e se pisam muito bem, faz-se branda como estopa, que serve para calafetar. Do estas arvores umas flores brancas como cebola cecem muito formosas, e da vmesma feio, que esto fechadas da mesma maneira, s quaes se abrem como-se pe o sol : e esto abertas at pela manh, emquanto lhe no d o sol, e como lhe chega se tornam a fechar, e as que so mais velhas cahem no:* cho ; cujo Cheiro suave, mas muito mimoso ; e como apertam com ellas no cheiram. Ha uma arvore me, que se chama ibiriba, de que se fazem esteios para os engenhos, tirantes e frehaes, e Outra obra de casas, tirando taboado por ser m de*serrar. Esta' madeira muito dura em de lavrar, muito forte para todo o trabalho, e no ha machado com que se possa cortar, que no quebre ou se trate mal, muito boa de fender; a qual os indios fazem em fios para fachos1 com que vo mariscar, epara andarem denoute;e ainda que seja verde cortada d'aquella hora, pega o fogo n'ella como em alatro; e no apaga o vento os,fachos d'ella; e em casa servem-se os indios das achas d'sta madeira, como de candeias, com que se servem de noite falta, d'ellas. Estas arvores se esfHam e abrem-se mo, as quaes se fazem todas em fios muitos compridos, que se fiam como canhamo, de que se fazem amarras e toda a sorte d eordoalha, que to forte como de cairo ; e pisada esta casca muito bem, se faz to branda e mais que estopa, com o que se calafetam os navios e barcos :"e para debaixo d'agua muito melhor que estopa, porque no apodrece n'agua, e incha muito. !.' Embiriti outra arvore me, cuja madeira molle;e do entrecasco drilla se tira envira branca, com que se faz em cordas to alvas como de algodo, e morroes de espingarda muito bons, que se no apagam nunca, e fazem riiuito boa braza; o qual entrecasco se tira to facilmente, que fazem os negros de Guin d'elle pannos de cinco a seis palmos de>
TOMO xiv 29

198 . lrgd, e do comprimento que querem ;: os quaes amassam e pisam com uns pos com que os fazem estender, e ficam to delgados como lona, mas muito macios, cora os quaes se cingem e cobrem. Goayaimbira rima arvore pequena, que no mais grossa que a perna de um homem ; cortam-n'a os indios em rolos de dezy doze jpalmos, e esfolam-n'a inteira para Baixo pomo ^ebi0:y e sahem os entrecasos inteiros ; de que QS W? Lios fazem ajavas em que mettem os arcos e flechas, aq;uai envira muito alva ; de que fazem cordas e murroes d es$ingardav .
CAPITULO J-XIX.

Que trata, de algumas, arvores muito auras. O condur arvore de honesta grossura, e acham-se algumas que tem trs palmos de testa, e no do um palmo de mago vermelho, que todo o mais branco que apodrece logOj e o vermelho incorruptvel; de que se fazem leitos, leadeiras e outras obras delicadas. D'estes cridurs novos s |azera espeques para os engenhos, porque no quebram, por darem muito de si quando lhp fazem fora.. Suaeucanga uma' arvore pequena, cujo tronco no mais grosso que a perna de um homem, a madeira alvissima como marfim, e com as mesmas guas, a qual muito dura ; e serve para marchetar em lugar de marfim. Ha outras arvores grandes de que se fazem esteips_par os engenhos, a que os indios chamam ubiraet, e os Portuguezes po-ferro, por serem., muito-duras e trabalhosas de cortar, cuja madeira pardaa e incorruptvel, s quaes arvores se do em terra de pedras e lugares speros. Ubirapariba arvore grande, muito-dura, de que os indios fazem os seus arcos, a madeira tem a cr parda, e muito dura de lavrar e de cortar; que pelo ser se tip apror deitam d'estas arvores, por quebrarem os machados n'ellas; cuja madeira se no corrompe, nem estalam os arcos, que se d'ella fazem i em os ques se faz alenada depois de cortada : e to pesada que, em tocando n'agua, se vai logo ao fundo. Ubirauna so arvores grandes: de que se fazem esteios para os engenhos, por se no corromper nunca ; cuja madeira preta, muito dura de lavrar, e to pesada que se vai ao fundo se a lanam n-agua.

199 Mandiocahi uma- arvore assim chamada pelo gentio, de honesta grossura e comprimento, de que se fazem es-* teis dos engenhos virgens, por ser madeira d muita dura, a qual pesada e boa de lavrar, e de cr de amarellaa. Ha outras arvor.es, a que p gentio chama ubirapiroca : so arvores compridas, muito-direitas, de que se tira grossura at .palmo e meio de testa, de que se fazem tirantes e frejnaes de casas; Esta madeira pesada.e vai-se ao fundo, e muito rija eboa de lavrar; tem estas arvores a casca lisa, qual pella cada anno, 6.vem criando outra casca nova por baixo d'aquella pelle.
CAPITULO LXX,.

^Que trata das arvores-que se do ao longo do. mar. longo do mar se criam umasarvores, a que os Portuguezes ehatoam espinheiros, e os indios tatagiba, que tem as folhas como romeira, e os ramos cheios de espinhos ; madeira por fr muito spera e por dentro amarella de cr fina ; a qual se lavra muito bem, sem embargo de ser dura ; e to fixa que no ha quem visse nunca um po d'estes podre, de qu se fazem muitas obras boas. ~ Pelo salgado ha uma Casta de mangues, a-que,os indios Chamam sereiba, qu se criam pnd descobre a mar, os qriaes lanam muitos filhos ao p todos de uma grossura, delgados, "direitos, de grossura que servem para encaibrar s casas de mato, e os mais grossos servem para as casas dos engenhos, por serem muito compridos e rijos, e de grossura bastante. D'estes mangues se faz tambm lenha para os engenhos, aos quaes ahem algumas folhas, que se fazem amarelias, de que se mantm os caranguejos, qu por entre elles se criam ; e do estas arvores umas espigas de um palmo, de feio das dos feijes,, e tem dentro um fruto maneira de favas; de q ue tornam a nascer ao p da mesma arvore-, e por derredor d'ella. . Canapariba outra casta de mangues, cujas arvores so muito tortas e desordenadas, muito speras da casca, cujas pontas tornam para baixo em ramos muito lisos, em quanto novos e direitos, e vem assim crescendo para baixo, at que chegam a mar ; e como esta chega a elles logo criam ostras, como peso das quaes vem obedecendo ao cho at qu' pega d'elle, e como pega logo lana ramos para cima,

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que vo crescendo mui desafeioados, e lanam mil.filho:. ao longo d'agua, que tem to juntos que se afogam uns aos> outros. , -;,. -,,
:/||#"-CAPITULO LXXI.,,: '. ,,-

m que se trata de algumas arvores molles. Ha umas arvores muito grandes, a que o gentio chama, copabuc, cuja madeira molle, e no,serve seno para cinza, pr os engenhos fazerem decoada. Estas arvores tem umas raizes sobre a terra, feitas por tal artificio, que parecem taboas postas ali a mo, as quaes lhe cortam ao machado; de que se tiram taboes, de que se fazem gameiIas de cinco, seis palmos de largo, e sete e oito de comprido, d'onde se fazem tambm muitas rodellas, que.so como as de adargoeiro, e da vantagem na levido, cuja madeira estopenta e muito branda, que no fende, Paraparaiba uma arvore, que se d em boa terra que foi j lavrada, a qual em poucos annos se faz muito alta e grossa, e tem a casca brancacenta, a qual ao longe parece na braricura e grandura o.alamo. Tem esta arvore-a-folha como figueira, mas os ps mais compridos, a madeira, muito molle e ca por dentro ; de que fazem bombas_aos caraveles da costa; e por dentro tem muitas infindas formigas. ' - Apeyba uma arvore comprida muito, direita,, tem a casca muito verde e lisa, a qual arvore se corta de dous golpes de machado, por ser muito molle ; cuja madeirase muito branca, a que se esfollaa casca muito bem ; e to leve esta madeira, que traz um indio do mato s costas trs pos d'estes de vinte cinco palmos de comprido e da grossura da sua coxa, para fazer d'elles uma jangada para pescar no mar linha-; as quaes arvores se no do senoem terra muito boa Penaiba rima arvore comprida e delgada, muito direita, cuja madeira leve e de cr de pinho, que serve para mastros e vergas das embarcaes da terra, a qual df de si muito e no estala; mas no dura muitos annos,-, porque a corrompe a chuva. Geremari outra arvore, que se d pela terra dentro, a qual delgada no p, e muito grossa em cima ; e d umas favas brancas ; cuja madeira no serve mais, que para ; o fogo. ,

201 |- Do-se nas campinas perto do mar umas'arvores, que se parcehi com os cajueiros, de que j falamos, que no do fruto, que se chama cajupeba, tem estas arvores a folha branacenta, crespa e spera como de amoreira, a casca d?stas arvores secca como de sobreiro. A madeira leve, mas muito liada, que no fende, de qu se tiram crirvas para barcos, e se fazem vasos de sellas* d'estas folhas podem manter bichos de seda, se os levarem a estas partes. Pelo serto da Bahia se criam umas arvores muito grandes em comprimento e grossura, a que os indios chamarii ubragara, das quaeri fazem umas embarcaes para pescarem pelo rio e riavegarem, de sesserita e setenta palmos de comprido, que so facilissiinas de fazer ; e porqu, se cortam estas arvores muito depressa por no ter dura mais; que a casca e mago muito, molle e tanto que dous iridiois em trs dias tiram com suas fouces o miolo todo a estas" arvores, e fica a casca s, que lhe serve de canoas, tapadas as cabeas; em que se embarcam vinte e trinta pessoas.
CAPITULO LXXII.

Em que se, apontam algumas arvores de cheiro. Entre as arvores de cheiro, que se acham na .Bahia, ha uma a que os indios chamam crunje, que se parece na folha, na casca e np cheiro aos loureiros de Hespanha, mas n na baga; cuja madeira sobre o molle, que se gasta no fogo dos engenhos. Anhaybata uma arvore que se d em vrzeas humidas e de ara a qual ria:grandeza e feio como o louro, cuja madeira touito rriHe e de cr alihecegada; P entrecaspo d'esta, arvore da cr de canella; e cheira, queima, e sabe cotoo canella; mas tem a quentura mais branda, esem duvida que parece canella, e parece que se a beneficiarem, que ser muito fina, porque o entrecasco ds.ramos queima mais do que o do tronco da arvore. ' Jacarnd uma arVore de bom tamanho, que se d nas campinas em terras fracas, cuja madeira preta1 com algumas guas; e muito dura, e boa de lavrar para obras primas ; e muito pesada, e no se corrompe nunca sobre a terra, ainda que lhe d o sol e chuva, a qual tem muito bom cheiro. Jucuriacu uma arvore que se d em terras fracas, e no demasiada na grandeza, mas com tudo se acham algu-

20,2

mas,(que do trs palmos de testa : a madeira d'esta arvore no se corrompe nunca, dura, pesada, e muito boa de lavrar para-obras primas. Ha uma casta de cr parda, conx aguas^ pretas, e outra vermelhaa, com guas tambm pretas', umas e outras da feio do chamalote ; e umas. outras tem o cheiro suavissimo, e na. casa onde se lavra sane o cheiro por toda a rua, e os seus cavacos no fogo. Cheirara muito bem ; a qual madeira muito estimada erii toda a parte pelo cheiro e formosura. Mucetayb uma arvore que se d.em terras boas e no de demasiada grandeza, a qu chamam er Pernambuco po santo ; cuja madeira de honesta grossura, muito rija e- pesada, mas boa de lavrar e melhor de tornear, e tem boas guas, para se d'ella fazer obras de estiina ; nunca se corrompe do tempo, e cheira muito bem. (. Ubirataya qma arvore que no grande, cuja madeira imolle, de cr parda, que cheira muito bem; e na casa onde se queima recende o cheiro por toda a rua. Entagapena uma arvorequ tem a madeira dura, com, gua sobrealeonad,.cheira muito bem, de que se fazem contas muito cortezs, e o gentio as suas espadas.
CAPITULO LXXII. -

Em que se traia, e arvores de que se fazem iremos' e hastes 'r : ', -., de lanas. ' ' ,' Atraz tratamos do genipapo'no tocante ao fruto, agora lhe cabe tratar no tocante madeira ; cujas arvores so altas, e de honesta grossura, tem a folha como castanheiro; a madeira de cr branca, como^buxo, de que se fazem, muitos e bons remos, que durara mais que os de faia; em quanto verdes so pezados, mas depois de seccos so muito leves ; est madeira no fende nem s.talla, de que se faz tambm toda a sorte de poleame, por ser doce de; lavrar ; e cabos e cepos para toda a ferramenta de toda a sorte. Huac outra arvore de que se fazem remos para os barcos, a qual se d em tenras hutaidas e de ara. So estas arvores de ma grossura, e quando se. lavram fazem um roxo claro muito formoso, mas dura-lhe pouco a cr.; as quaes, depois de derrubadas, as fendem os indios de alto baixo em quartos, para fazerem^os remos, que no duram, tanto como os de genipapo. , , ;

203

-Tua entras arvores, a que os indios chamam ubiratipga, qri ho so'grossas, mas compridas e direitas, e tem a casca spera; a cr da madeira aafroada e boa de fender, o qrie se lhe fa para fazerem hastes de lana e arremees, - que se fazem mujto formosos, e de dardos que so mais pe-r sadas que as de Biscaia,; mas mais duras e formosas, DHse eslas arvores em terras baixas e numidas perto dp salgad)..
CAPITULO LXXJV.

Em que se diz de algumas^ arvores que tem ruim cheiro, " :N'estes maitos se acham umas arvores mes e direitas,, de que se fazem obras de casas, a sua madeira por /fora alse> cegada e o mago ppr dentro muito preto ; mas quando a lavram no ha quem lhe soffra o fedor, porque peor que o de umas necessrias, chegar os cavacos aos narizes morrer, q?u to teprivel fedor tem ; e raettendo-se no fogo se refina mais o fedor; a estas arvores chamam os indios mbirarema, que quer dizer madeira que fede muito. Ha outra casta de ubirarema, cujas arvores so grandes e desordenadas nos troncos, 'como as oliveiras; cujos ramos, folhas, cascas e madeira fedem a alhosj de feio que quem os aperta com as mos lhe ficam fedendo de*maneira que se lhe no,fea em todo o dia o cheiro, e tem estas arvores as folhas da feio das ameixeiras, .Ao p de algumas arvores se criam uns ramos como parreiras, da grossura e da feio de uma corda me, a que es indios chamam cips, os quaes atrepam pelas arvores acima como as Videiras ; os quaes cips cheiram a alhos, e quem pegax d?elles no se lhe tira o cheiro, em todo aquelle dia, pdr mais que se lave.
CAPITULO LXXV.

Em qese apontam algumas arvores que do frutos silvestres, que se no comem. Nos matos se criam umas arvores de honesta grandura, a qu os indios chamam comedoy, de cuja madeira se no faz conta. Esta arvore d umas bainhas como feijes, meios verinelhos, e meios pretos, mui duros, de finas cores, que a semente de que as rvores nascem, os quaes servem para tentos, e so para isso mui estimados.

204

- Araticurana uma arvore do tamanho e feio do .mar* meleiro; as quaes se criam nos algadios, onde s ajnt; a gua doce com a'salgada, cuja madeira mole e liza que s esfola toda em lhe puxando pela casca. Do estai arvores um fruto tamariho como marmellos, lavrado pela casca, como pinha, e muito lizo, o qual arregoa como maduro, e cheira muito bem. Este fruto comem osindips a medo, por que tem para si qe quando os caranguejos da terra fazem mal, que por comerem este.fruto n'aquelle tempo. Anhangquiabo quer dizer pente do diabo; arvore de ;bom tamanho, crijo fruto so umas bainhas grandes; tem dentro em si uma cous branca e dura, affeioda como pente, do que os gentios se aproveitavam antes de pmmunicarem com os Portuguezes e se valerem dos seus pentes.Cuiyba , uma arvore tamanha como nogueira,' e tem a folha como nogueira, a qual se ho cria em ruim terra, ed rimas flores brancas grandes. Da, madeira se no trata, porque as no cortam os indios : por estimarem muito o seu fruto, que como meles, maiores e menores de feio redonda e comprida, o qualfruto se no d entre as'folhas eomo as outras arvoresjseno pelo,tronco da rvore e pelos braos^ d'eila, cada um por si r estando esta fruta na arvore, s da cr dos cabaos verdes, e como ps colhem, cortam-n'os pelo meio ao comprido e lanam-lhe fora o miolo, que como o dos cabaos ; e,vo curando estas peas at se fazerem ds, dando-lh por dentro uma tinta prefcri e por fora amarella que se no tira nunca; ao qUe os indios chamara cuias, que lhe servem de pratos, escudelas, pucaros, taas e de outras cousas. ^Ha outras arvores mes, a que os indios chamam jatuaiba, cuja madeira muito pezada, s quaes caheSa folha cada anno, e torna a rebentar de novo. Esta arvore d umas frutas brancas do tamanho e feio d azeitonas cordvezas. Pelo serto se criam umas avores a que os indios chamam beribebs, que do um fruto do tamanho e feio de,noz moscada, o qual amaruja e requeima como ella.~
CAPITULO LXXV.

Que trata dos cips e o para que servem. Deu a natureza no Brazil, por entre os seus arvoredos, umas cordas muito rijas e muitas, : que nascem aos ps das

^..205 -se fPtpres e atrepam por ellas acima, a que chamam cips, com que QS indios atam a madeira das suas casas, e os bancos qUe na,o ppdera mais; com que escusam pregadura:. e. em outras partes servem em lugar de cordas, e fazem d'ell'es cestos melhores que de vime. e sero da mesma grossura, mas'tem comprimento de cinco e seis braas. N'stes mesmos matos se criam outras cordas ma*is delgadas e primas, que os indios chamam timbs ; que so mais rijos que os cips acima,'servem do mesmo, aos quae3 tendem tambm em quatro partes, e ficam uns fios mui lindos conio de rota da ndia em cadeiras, e com estes fios atam a palma das casas quando as cobrem com ella, do que fazem tambm cestos finos : e far-se-ha d'elles tudo o qu se faz da rota da; ndia. Ha outra'Csia, qu os indios chamam timborana, que da mesma feio dos timbs, mas n so to rijos, do qu se aproveitam os indios, quando no acham os timbs ,,Criam-se tambm n'este& matos uris cips muito grossos, a que os indios chamam'cip-emb, cujo nascimento tambm ao p ds arvores,^por onde atrepam ; e so to, rijos que tirara cpm elles as gangorras dos engenhos do mato e as madeiras grossas ; pelos quaes puxam cem e duzentos indios; sem, quebrarem, e^se acertam de quebrar, tornam-se logo, a atar, e com elles varam as barcas em terra, e as deitam ao mr, e acham-rios to, grossos como o necessrios ; com os quaes se escusam calabretes de .lihho.
CAPITULO LXXVII. /

ue trata de algumas folhas p^veitosas que se criam no mato. Cet uma folha, que se d em terra boa e humida, que, da feio das folhas, das alfaces estendidas, mas de. quatro incpplmos de comprido, e so-muito tezas : as quaes nascem em touas muito juntas,_e tem o p de quatro cinco palmos d comprido, e no fazem arvore. Servem^ estas folhas aos indios para fazerem d'ell;as uns vasos, em' que metem a farinha, quando vo a'" guerra, ou algum /outro caminho, onde a farinha'vai de feio que ainda que. chova muito no lhe entra gua dentro.' Capara outra folha qe nasce como a d cima, mas em, cada p esto pegadas quatro folhas como as atraz, pegadas, umas nas outras ; com estas folhas arma o gentio nijims' TOMO xi*v 30

, 206 ' -' - varas uma feio como esteira muito-tecida, e fica cadi! esteira de trinta palmos de comprimento e trs de largo,,e' assritara-nas sobre o errimadeirament das casas, com*o que ficam muito bem cobertas; e dura rima cobertura d'ests sete, oito annos e mais.' ' Tocum :uma herva, cujas folhas so como de can do reino, mas mais curtas e brandas ; a vara onde s criam, cheia de espinhos pretos, e ,limpa, (felles fica como rota' da ndia. Estas folhas quebram os indios s mos, e tiram d'ella o mais fino Unho do mundo, que parece seda, de que fazem linhas de pescar torcidas mo, e so to rijas qu' rio quebram com peixe nenhum,. Este toum, "ou seda que d'ellesahe, pontualmente do toque da herva d ndia, e assim o parece ; do qual se faro obras mui delicadas, se quizerm. , E porque se'no pde aqui escrever a infinidade das arvores e hervas que ha pelos matos e campos da Bahia, nem as notveis qualidades e virtudes que tem; achamos que, bastava para o propsito d'este compndio dizeri que se contm 'eni seu titulo ; mas ha-se de notar que aos arvoredos d'sta provincia lhe no ahe nunca a folha, e em todo anuo esto Verdes e formosos.
-\ CAPITULO LXXVIII.

Summariodas : aves que se criam na terra da Bahia de Todos .'.- , os Santos do Estado do Brazil. J que temos satisfao cora o qu est dito no tocante ao arvoredo que ha na Bahia de Todos oslSantos, e com os frutos, grandezas e estranhezs d'ell, e ainda que o que se disse o menos que se ode dizer, por haverimuitas mais arvores, convm que se d conta quaes vs se criam entre estes arvoredos, i se mantm de seus frutos e* frescura d'elle. " E peguemos.logo da agia como da principal ave de to-' dass criadas. A guia,' a que o gentio chama cabureac, tamanha como as guias de Hespanha, fem o corpo prdo e as azas pretas;; tem o bico revolto, s. pernas compridas, as unhas grandes e muito voltadas, de que s fazem apitos; criam em mpntes altos,, onde fazem seus ninhos e pem dous ovos somente ; e sustentam s filhos daxaca qu tomam, de qe se mantm. CriamTse 'estps inatos emas muito grandes, a que o gen-

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tfo chama nhand, as quaes.se criam pela terra dentro em 'campinas, e so tamanhas como as da frica, e eu vi um /quarto de uma depennada tamanho de um carneiro grande. So estasaves brancas, outras cinzentas, e outras malhadas de preto, as quaes tem as pennas muito grandes, mas no tem n'ellas tanta penugm como as da Alemanha ;_os seus ovos no so, redoridos, nem tamanhos como os das da frica, Estas aves fazem os ninhos no cho, onde criam,; e mantm os filhos com cobras, e outros bichosque tomam, e com frutas do campo ; as quaes no voara levantadas do chof cortem em pulos, com as azas abertas: toman>n'as os indios a coco ; e tanto as seguem, at que as canam, e de cariadas as tomam. Tem estas aves as pernas e pescoo compridos, cuja carne dura, mas muito gostosa; ds pennas se aproveita o gentio, e fazem d'ellas uma roda de penachos, que pelas suas festas trazem nas costas, que tin em muita estima, f - Tabuiai uma ave muito maior que patp,; tem as pernas altas, os ps grossos, a Cr parda, o bico grosso e grande ; tem sobre o bico, que branco, uma "maneira" e crista vermelha, e sobre a-abea umaspennas levantadas,, como ppupa. Criam em arvores altas, os ovos so como de patos,*mantem-se de frutas do mato ; cuja carne dura, mas boa pra comer.
CAPITULO LXXIX.

Em que se declara a, propriedade do macucago, moum e da$ gallinhas,. do mato. Macuago uma ave grande de cr cinzenta, do tamanho de Um grande pato, mas fora no peito mais titellasI que dous galipavos. as quaes so tenras como de perdiz, eda mesma cr ; -mais carne sobre dura, sendo assada,, toas.cozida muito boa. Tem estas aves s pernas compridas, clfeis deescamas verdoengas ; tem o bico pardao da feioda gallinha; voam pouco e ao longo d cho, pr onde correm muito; e s tomam com ces a coco, e s vezes as matam s flexadas ; criam no cho, onde pem, muitos ovos, em ninhos como de gallinhas; mas tem a casca verde de cr muito fina, e mantem-se das frutas do mato. Motm so umas aVes pretas nas costas, azas e barriga branca ; so do "tamanho dos gallipavos,- tem as pernas compridas e pretas, e sobre a cabea umas pennas levanta-

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ds como pavo, e voam pouco e baixo, correm muito pelo cho, onde os matara a flexadase as tnam. a-ceriW ces. Criam n cho, os seus ovos s tamanhos como.de pata, muito alvos, e to crespos da casca como cohfi^ tos, e ,clara d'elles tno manteiga de porco derretida, qual enfastia muito. .Teni estas aves o bico preto_como de corvo, e tocado ao redor de! vermelho, maneiradocrista ; a carne d'sts aves i 'muito boa, pontualmente como a de gallipvs, e tem no pit muitas mais titellas. Jacris so umas aves a que Os Portugze chamada gallinhas do mato, ~e so do tamanho ds gallinhas e pretas ; mas tm as pernas mais compridas, a cabea e ps como grillinha, o bico preto, cacarem como perdizes, criam no cho, e tm o vo muito curto ; matm-sede frutas, matamn'as s indios s flexadas ; cuja carne muito1 boa, etm p peito cheio de titellas como perdiz da mesma cr, e ihuito; tenras ; a mais carne dura para assada, e cozida ' muito "
boa.
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, , Tuyuyri- uma ave grande de altura, de cinco palmos, tem as azas pretas, e papo vermelho, eb^mis branco ; tem o pescoo riiuito grande, e o bico de dous palmos de comprido : fazem os ninhos no cho, era .montes muito altos, onde fazem grande ninho, em'que pem dous, ovos, cdi um como um grande punho : toantem os filhos coto peixe dos rios, o qual comem primeiro, e reozem-ri'o no papo, e depois arreveato-h'o, e fepartem-n'o pelos filhos.
CAPITULO LXXXj

Em que se declara a natureza doscaninds, araras, e tucanos. Canind um pssaro tamanho como um grande gallo; tem/s pennas das pernas, barriga e collc- amarelias, de Cr muito fina,' e as costas acatazoladas de azul e verde", e as. das azas e rabo azues, o qual tem muito comprido, e a cabea por cima azul, e ao redor do bico amarello; tem o bico, preto, grande e grosso ; e as pennas do rabo e. as das-azas so vermelhas pela banda debaixo. Criam em arvores altas onde os indios os tomam novos nos ninhos, pra se criarem nas casas; porque,fallam gritam muito, com voz alta e grossa : ps quaes mordem, mui valentemente, e cmm frutas das arvores, e em casa tudo quanto lhe do ; cuja carne dura, mas aproveitam-se d'ella os que andam pelo mato. "Os ndios se aproveitar das suas pennas amarelias para as

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, '

'rias carapuas, e as do rabo, que so de trs e qutr palmos, pra as mbagaduras das suas espadas. Arara outro pssaro do mesmo tamanho e feio do nind, mas tri as pennas do Collo, pernas e barriga vernlhas, e as das costas, das azas, e do"rabo azues,, e algumas verdes, e a cabea e pescoo vermelho, e o bico branco !e nitb grande, e to drP*que quebrara com elle uma Cadeia de ferro, os quaes mordem muito e gritam mais. prlm estas vs, em arvores altas, comem frutas do mato milho pelas roas,,e a,mandioca quando est a curtir. s indios tomam estes pssaros quando so novos nos ninhos, para os criarem ; os quaes depois- de grandes cortam com o bico por qualquer po, como s fosse uma inx. A sua carne como a dos caninds, de cujas pennas se aproveitam ris ndios. TuCans so outras aves dp tamanho de um corvo ; tem s pernascurtase pretas, apenna das costas azulada, a das azas e do rabo nilada, o peito cheio de frouxel muito mido de finssimo amarello, o qual os indios ..esfolam para frro.de Catapuas. Tem a cabea pequena, bico branco e amarello, muito grosso, e alguns so to compridos como rim pim, e to pesados qrie.no podem com elle quando Cornem, porque tomam grande bocado, com o que viram bico para cina, porque no pde o pescoo com tamanho peso, como tm. Criam estes pssaros em arvores altas, e tomam-n'os novos para se criarem em casa; s bravos matam os indios- flexa, para lhe esfolarem o peito, cuja carne muito dura e magra.
CAPITULO LXXXI.'

Em'que se diz das aves que se criam n,os riose lagoas 'da gua doce. Ao longo dos rios da agua,doce se criam mui formosas garas a qe o gentio chama 'riratinga, as quaes s brancas, e tamanhas como as de Hespanha. Tem .as pernas longas pescoo e bico mui comprido, pernas e ps amarellos,- e tem entre "os encontros um molho de plumas, que lhe chegam ponta.do rabo, que so mui alVas e formosas, e para estimar ; e so estas garas rarilto magras, e criam no cho junto da gua; mantem"-se do peixe, que tomam nos rios, e esperam iril que lhe atirem. Criam-se mais ao longo d'estes rios e nas alagas. muitas

210 adens, a que o gentio chama upeca, que so da feio das d Hespanha, mas muito maiores, as quaes dormem-em arvores altas, e criam n cho perto da agu. Comem peixe,; e da mandioca que est a curtir nasribeirs ; tomam s indios estas adens, quando so novas, e criam-nas em casa, onde se fazem muito domesticas. Aguapepca uma ave do tamanho de um frango; tem, as pernas muito compridas, e 0 pescoo e p vestido d penna aleonada, e derredor do bico uma rosa muita amarella;,e tem nos encontros das azas dous espors de osso amarello, e nas pontas, d'ellas outros dous, com que offendem aos pssaros com que pelejam. Andam estas aves,nas alagas, e criam na* jnqueiras junto d'elas, onde pem trs ovos no mais, e manteni-se de car.aces que buscam. Jabacatim v uto pssaro tamanho como um pnto, tem ,o bico comprido, o peito vermelho, a barriga "brna, as costas azues, criam era buracos, que fazem nas barreiras sobre os rios,-ao longo dos quaes andam sempre com os ps pela gua a tomar peixinhos, de que se mantm. E ha outros mais pequenos da toesma feio e costumes, a que o gentio chama garirama. ,,; Jacuau so outras aves da feiap das garas grandes, e do seu tamanho ; so pardas e pintadas de branco', andam nos rios e lagoas, criam ao longo d'ellas e dos rios, nocho ; mantem-se do peixe que tomam.
CAPITULO LXXXII.

Das,aves que se parecem com perdizes, "rolas e pombas: ' Picau como pomba brava,mais pequena alguma cousa>, tem a cr cinzenta, os ps vermelhos ; cria no cho, onde pe dous ovos ; tem, o peito e carne mui saborosa, Payrary uma ave do tamaho, cr e feio das rolas, as quaes criam no cho em ninhos, era que pem dous ovos,,e tomam-rios em redes, e amanam-n'as em casa de maneira que criam como pombas, as quaes'tem o peito muito cheio, e boa carne. _Jurutis outra casta de rolas do rrismo tamanho, masso aleonadas, e tem o bico. pardo ; tambm criam no cho/ onde pem dous ovos, e tomam-n'as em redes, cuia carne miuto tenra e boa. Namb uma ave da cr e tamanho da perdiz, tem os ps e bico vermelho, voam ao longo d cho, por onde cor-

211 rem muito, e criam em ninhos que fazem no cho, onde pem muitos ovos. Estas aves tem grande peito cheio de titellas muito tenras e saborosas, '. Ha otrs aves, a que os indios chamam piquepebas, que so da feio das rolas, e da mesma cr, ma so mais pequenas, e tem as pernas vermelhas e o bico preto : estas .andam sempre pelo1 Cho, onde criam, e, pem dus ovos : as quaes o mais do tempo andam esgaravatando a terra opm o bico, buscando umas pedrinha brancas de que se mantm.
CAPITULO LXXXIII. , ^

Em que se relata a diversidade que ha de papagaios. geruau so uns papagaios^ grandes todos verdes, que temtamaiho/corpo como uma adem,os quaes se fazem mui domsticos em casa, onde faliam muito bem,: estes no; mato criam em ninhos, em arvores altas ; so muito gordos e de boa carne, e muito saborosos ; mas ho de ser cozidos. Agerut' So uns papagaios verdadeiros que se. levam Hespanha, os quaes so verdes, e tem os encontros das azas vermelhos, e o tocado da cabea amarello ,;, criam nas arvores em ninhos, e comer a fruta d'ellas, de que-se manter ; cuja carne se. come ; e para se amanarem tomam-n'os.novos. Ha outros papagaios a que chamam coricas, qu so todos verdes, no tem mais qu o s queixo amarello, e algumas pennas nas azas encarnadas ; os quaes criam em ninhos nas, arvores, d'onde fazem grande damno nas searas do milho ; tomam-n'os novos para se amanarem em casa, onde .fallana muito bem ; cuja carne Comem os que andam plo mato, mas dura. Marcan um pssaro verde todo, como papagaio, tem a cabea tpucada de amarello, o bico grosso e sobre o grande, VoltdP-pra baixo, o rabo comprido e vermelho : criam-se em rvores altas, em,ninhos ; e. araamam-se alguns por que faliam, cuja carne dura, mas come-a quem no temi outra melhor. Ha uns passarinhos todos verdes, qu tem os ps e bico branco, a que os indios chamam tuim ; tem o bico revolto para baixo, e criam em arvores, em ninhos de palha, perto do mar e no os h pelo serto ; os qtaes andam em.bandos : tomam-n'os em novos para s criarem

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em casa, onde faliam muito, claro ri bem, e tem muita g.ra, rio que dizam' > / ,. Ha outros pssaros todos verdes, maiores que os tuins,, qne tem o bico-branco voltado, toucario de amarello, e azul, que criam m arvores, era ninhos, d'onde se tomnj em novos, para se criarem em casa, aonde faliam tambm;. estes andam m bandos destruindo as milharadas. ,r,,
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CAPITULO
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LXXXIV.
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Em que se conta a natureza de algumas aves da -ga, \ salgada. ' ' '-,<"_ Na Bahia ao longo da g u a Galgada, nas ijhg/s que ella tm, se criam garcetas pequenas, a que os indios chamam carabuu : algumas so brancas e outras: pardas-, s quaes do umas plumas cinzentas pequenas, mriio fidalgas para gorro ; todas criam ao longo do mar, opdft tomam peixe, de que se mantm, e caranguejos nvds ; ,/e, esperam bem a espingarda. *' ',...- Ha outros pssaros, a qe os.indios chamam uir^toritpn, que se criar perto do salgado, que so pardos, t p m o pescoo branco, o bico verde,e so tamanhos como.adens,, ter os ps da sua feio. Estes pssaros andam no mar perto da terra, e voam ao longo d'agua tanto sem descanar, at qrie cahem como mortos ; e assim, descnam at" que se tornam levantar, e voam'*' . Carapir uma ave, a que os marcantes chamam rabiforeado, os quaes se vo cincoenta e sessenta lguas ao toar, d'onde se' recolhera para a Bahia, diante de algum navio do reino, ou do vento sul qu lhe veni nas costas ventando, d'onde tornam logo fazer volta ao mar ; mas Criam em. terra ao longo d'elle. ' , Jabor outra ave tamanha cprao um grou, tem a cr cinzenta, as pernas compridas, o bico delgado e mais que de palmo de comprido ;:estas.aveS criam em terra ao longo, do salgado, e comer o pexe que tomam no mar, perto da/ terra por onde andam. )' Ao longo do salgado s criam' uns* pssaros, quedos; indios chamam urateon ; so pardos, tamanhos como fran* gos, tem as pernas vermelhas, p bico preto e comprido ; so mui ligeiros, e andam sempre sobre-a g u a salgada,, saltando em pulos, espreitando os peixinhos de que se; rntem. - 'l'

213 Ao longo do mar se criam outros pssaros a que os indios ehamam aty ; tem o corpo branco, as azas,pretas, e o bico de peralto, com qu cortam o peixe como com tesoura; tem as pernas curtas e brancas ; andam sempre nas barras do, rio buscando peixe, do que comera. M-atuim-a so unsi pssaros, que andam sempre sobre os mangues, tamanhos eom franganitos, de cr parda ; tem as pernas e bico /preto, e mantem-se de peixe qu tomam, latuimirim so outros-pssaros de, feio dos de cima,* mas mais pequenos e brncacentos ; maritem-se do peixe ique tomam ; e uns e outros criam no cho ao longo do salgado. , Pitaoo so passarinhos d tamanho e cr dos canrios, , e tem uma coroa branca na cabea ; fazem grandes ninhos nos mangues, ao longo ds rios salgados,: onde pem. dous ovos; e mantem-se dos peixinhos, que alcanam por sua lana. , Ha umas aves como garcetas, a que os indios chamam socry, qrie tem as pernas compridas e amarelias, o pescoo longo, o peito pintado de branco e pardo, e todo o, mais pardo; criam em terra no cho, perto da gua ;salgada, aonde se m,antem do peixe que n'ella tomam, e de caranguejos dos mangues. Margulri mm pssaro pequeno e pardo, tem. as pernas mui compridas, o bico e pescoo longo; e est sempre olhando ,para o cho e coro v gente foge dando rim grande grifo. Estas aves se criam ao longo do salgado, e mantem-se do peixe que tomam no mar.
CAPITULO LXXXV.

Em que se trata de algumas aves de rapina que se criamna Bahia. Urubus so uns pssaros pretos, tamanhos como corvos, mas tem o bico mais grosso, e a cabea como gallinha cucurutada, e as pernas pretas, ms to sujos que fazem seu feitio pelos pernas abaixo, e tprnam-n'o logo a comer. Estas aves tem.grande faro de cousas mortas, que o que andam, sempre buscando para sua nantena, as quas criara em arvores altas : algumas ha mancas m poder dosindios que tomaram nos ninhos. rTat um pssaro, que na feio,, na cr e no tamanho
TOMO x i v . 31

214 um gavio, e vive de rapina no mato ; e em povoado no lhe escapa pinto que n tome, -e criara em arvores altas. . Uraoa so como os minhotos de Portugal, sem terem nenhuma differena;~so pretos e tem grandes azas; cujas pennas os indios aproveitam para empenarem as flexas, os quaes vivem de rapina n mato, e m povoado destroem uma fazenda de gallinhas e pintos. , Sabipitanga so uns pssaros pardos como pardaes, que andam pelos monturos, e correm pelo cho comi muita ligereza* e mantem-se da mandioca que furtam dos indios quando est a curtir; os quaes criar em ninhos emarvores. Carcar so uns pssaros tamanhos como gavies, tem as costas pretas, as^azas pintadas de branco e o rabo, 0 bico revolto para baixo, os quaes se mantm de carrapatos, que trazem as alimarias, e de lagartixas que tomam ; e quando' as levam uo bico vo pz elles uns passarinhos, que chamam suriri, para qu as lrguer ; e vo-n'os picando, at que de perseguidos se per.no cho, copa a lagartixa debaixo dos ps, para a, defender. , Gacaoam so pssaros tamanhos como gallinhas, tem a cabea grande, o bico preto voltado para baixo, a barriga branca, o peito vermelho, o pescoo branco, -as costas pardas, o rabo e azas pretas e brancas. Estes pssaros' comera cobras que tomam, e 'quando faliam se nomeam pelo seu nome ; em os ouvindo, as cobras lhes fogem, por que lhe no escapam ;, cor' as quaes mantm os filhos. E quando o gentio vai de noite>pelo mato'que se teme das cobras vai arremedando estes pssaros. para as- cobras fugirem. Pela terra dentro se criam umas aves, a que os indios chamara urubutinga, que so do tamanho dos gallipavos ; e so todos brancos, e tem crista como os gallipavos. Estas aves comem carne que acham pelo campo morta, e ratos, que tomam ; as quaes pem um s ovo, que mettem em um buraco, onde o tiram ; e mantm nrille o' filho com ratos ! que lhe trazem para comer. \ '<
CAPITULO LXXXVI.
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Em que-se contm a natureza de algumas aves noeturnais. Urucuream urna ave, v pontualmente como as corujas.de. Hespanha; umas so cinzentas e outras brancas; gritam de noite como corujas ; as quaes criam no mato em tronco

215 de arvores grossas^ e em povoado nas igrejas, de cuias alampadas comera o azeite. Jucurut uma ave tamanha como um frango, que em povoado anda de noite pelos telhados ; e no mato' cria em tocas de arvores grandes, e anda ao longo dos caminhos e aonde quer que est, toda a noite est gritando pelo -seu nome. Esta ave. de cr brancacenta, tem as pernas curtas a cabea grande com trs listas pardas por elia que parecem cutiladas, e duas, pennas n'ella de feio de orelhas. Ha outros pssaros, a que os indios chamam ubujas, que so tamanhos como pintos, tem a cabea grande, o rabo comprido,;, e so todos pardos e muito cheios de penugem, os! quaes andam, de noite gritando cxaiguigril. Ha outros pssaros do mesmo nome mais pequenos, que so pintados, os quaes andam de madrugada dando, os mesmos gritos e uns e outros criam no cho, onde pem dous ovos somente ; emantm-s das frutas do mato. ' Ha outros -pssaros pardos, a que os indios chamam oitib, com quekter grande agouro ; os quaes andam ordinariamente gritando oitib, e de dia no os v ningum ; e mantem-se dasfrutase folhas de'arvores, onde lhe amanhece. Aos morcegos chamam os indios andura ; e ha alguns muito grandes, que tem taranhos dentes como gatos, com que mordem ; criam nos concavps das arvores, e nas casas. e logares escuros ; as fereas parem,quatro filhos e trazemos pendurados ao pescoo com as cabeas para baixo, e pegados com as unhas ao pescoo da me ; quando estes morcegos mordem algum que est dormindo de noite, fazemn'o to subtilmente que se no sente ; mas a sua mordedura mui peonhenta. Nas casas1 de purgar assucar se criam infinidade d'elles, onde fazem muito damno, sujando o assucar com o seu feitio, que como de ratos ; e comem muito d'elle.
CAPITULO LXXXVII.

Em que se declara de alguns pssaros de diversas cores . e costumes. TJranhengat uma ave do tamanho de um estorninho, que tem o peito, pescoo, barriga e coxas de fino amarello, e as costas* azas e rabo de cr preta mui fina, e a cabea e de redor do bico um s queixo amarello, e as pernas e ps como flouba; os quaes criam em ninhos, em arvores altas,

216 onde os tomam em novos e os criam eni casa, ode se fazer to domsticos, que vo comer ao mato e tornam para Casa.Sabitinga so uns passarinhos brancos, que tem as pontas das azas pretas, ! as do rabo que tem compridas;'os quaes criara er ninhos que'fazem nas, arvores, mantm-se das-pimentas que buscam ; de cujo feitio se criam pelocampo muitas pimenteiras. Tipiranga so pssaros vermelhos do corpo, que tem as{ v azas pretas, e so -tamanhos como pintarrxos ; criam etir arvores, onde fazem seus ninhos ; aos quaes ps indios esfo-,; lam os peitos para forrarem as carapuas, pr serem m,uito formosos. , Gainambi so rins passarinhos mujto, pequenos, de "cr apavonada, que tem os bicos maiores que o corpo, e to delgados como alfinetes : comem aranhas pequenas e fazem ^os seus ninhos das suas ts ; ter s azas pequenas e andam sempre bailando no r^espreitando as aranhas ; Criam em tocas de arvores, ' Ha outrasve, a que os indios chamam ayay, que do' tamanho de uma franga toda vermelha, tem bico verde, os ps pretos e cabo do bico amado coro pata; fazemseus ninhos em arvores altas, e mariter-se da fruta d'ellas. Jaan so uns pssaros pequenos todos encarnados e os ps vermelhos : criam-se em arvores" altas, onde fazem os, ninhos, e mantem-se das frutas do,mato. ^H outros passarinhos pequenos todos vestidos de azul,, cor muito subida, aos quaes os indios chamam sayubui, que tem o bico preto, e criam, em arvores, e mantem-se-dos bichinhos d terra. . ' TUpiana so uns passarinhos que tem o peito vermelho, a barriga branca.e o mais azul; e tem os bicos compridos, muito delgados; e criam' has arvores, em ninhos, o mantem-se de bichinhos. Tijuba so passarinhos pequenos que tem o corpo amarello, as azas- verdes, o bico preto ; criam em tocas de arvores, e mantem-se de pedrinhas . que apanham pelo Mccica um pasSaro pequeno que tem as'azas verdes, a Darriga arnarella, as costas e o rabo pardo, e o bico preto; lazem estes pssaros os ninhos nas pontas das rvores, aepenuradospor um fio da mesma arvore; e os ninhos so ae oarro e palha, com curucheos por cima muito agudos, e servem-se por uma portinha, onde' pem dous ovos; &

217 * fazem os ninhos d'sta feio por fugirem, s cobras qu lhes comem s ovos, se os achara em outra parte, Ha outros pa^aros -que os indios chamam sij, que so tamanhos como papagaios todos verdes, e o. bico revolto para baixo, Os quaes criam em tocas de arvor, de cuja fruta se mantm.
CAPTULON LXXXVIII .

Em'que se trtd de aigns passarinhos que cantam. Suiriri so Uris passarinhos Como chamarizes,' que Criam em ninhos nas arvores, os quas se ranteto com bichinhos e formigas, ds qu tem zs, a qe, m7 Portugal chamar agudes; estes se criar m gaiolas, onde cantam muito bem, rs no dobram muito quando cantara. Ha Outros pssaros pretos, com os encontros amarells, a que Os indios chamar urndi, que criam em ninhos de palha, ondper dus ovos, s qs cantam ruitobem. Ha outros passarinhos, a que os indios chamam uranhangrit, que so quasi todos1 --amarells, que criam era ninhos de palha/que fazem nas arvores, os quaes cantam nas gaiolas muito bem. \ .Criam-se em arvores baixas em ninhos outros pssaros, a que o gentio chama sabi: coca, que so todos alponados muito formosos,'os quaes cantam muito bem. Pexarorem so uns passarinhos todos pretos tamanhos como calhandros, que andam sempre por irria das, arvores,, mas comem no cho bichinhos e cantam muito bem... . ,., , Querejuso uns passarinhos todos azues de cr fihissima,. que andara sempre por c ir a das arvores, onde criam e s e ! mantm por o fruto d ellas,.e cantam muito bem. Muiepe.reru so uns passarinhos pardos tamanhos como carrias; criam nos buraros das arvores das pedras, pem muitos ovos, cornem aranhas,,e minhocas, cantam tomo roxines, ras np dobram tanto como ellesCAPITULO LXXXIX.

Que trata de outros pssaros diversos. Nhapup uma ave do tamanho de uma franga, de cr aleonada, temos ps coro gallinha, , qual anda semprp

=-r 218 " pelo cho, onde cria e pem ( muitos ovos de fina cr alepriad, cuja carne dura, conie-se cozida. Saracura uma ave tamanha como gaHinha, de cr aleonad, que tem as pernas muito compridas, e p pescoo e bico comprido; cria no cho, onde chega a mar de guas vivas, que se mistura Com gua doce; as quaes no andam pelo salgado,, nem pelo. mato grande* mas ao longo d'elle: de noite crcari coirio perdiz; e ter o. peito cheio de titellas tenras,' e a mais.-carne bo tambm. Ors so umas aves tamanhas como papagaios, d cr preta e o bico revolto'; criam em arvores altas, e quando tem filhos nos ninhos remettem aosindios,.qrie lh'os querem tomar ; estas aves tem grande peito cheio de titellas, as quaes e a mais carne so muito tenras e saborosas como ; galliriha. ' An outra ave preta, do tamanho e feio, de gralha; e andam sempre em bandos} Voando d arvore ein arvore ao longo do cho ; criam em arvores baixas em ninhos, e mantem-se deumabaga preta, comotourtinhos,.edeoutras frutinhas que buscam, Magoari outra ave d cr branca, que faz tamanho vulto como uma gara,,- e.i tem as pernas e ps mais compridos que as garas, o pescoo to longo que quando va o faz em voltas ; e tem obico curto e o peito muito.agudo e nenhuma carne, porque tudo penna; e va muito ao longe, e corre pelo cho por entre o mato, que faz espanto. Araco outro, pssaro tamanho como Um frango, d cr parda ; tem as pernas como de frangos, mas, os dedos muito compridos e o rabo longo ; e tem duas goelas, ambas por uma banda, que leva ao longo do peito at abaixo, onde se juntam; criam-se ests aves em rvores, e comem fruta d*ellas. '.'.'' Sbiuna so uns passarinhos pretos que andam sempre entre arvoredo; comem frutas e bichinhos, criam nas arvores em ninhos de palha. , , Atia um pssaro tamanho c mo um estorhinho, tem as costas pardas, o peito e barriga branca, o rabo comprido, as^pernas verdoengasi os olhos vermelhos ; criam m arvores, Comem o fruto d'ellas, e cantam r assobios. Ha uns passarinhos pequenos todos pretos, a que os indios chamam timuna, que criam em ninhos de palha, mantem-se de frutas e minhocas. ; Uanandi um pssaro pequeno pardo, pintado de preto >

219 - ^ pelas costas e branco ha barriga; e tem o bico curto, e cria em ninhos de palha que faz nas arvores. Ha outros pssaros, a que o gentio chama uapic, tamanhos como fordos, ter o corpo preto e as azas pintadas de branco, e o bico comprido, to duro e agudo que fura com elle as arvores que tem abelheiras at que chega ao mel, de que se mantm ; e quando do as picadas no po, sa a pancada a oitenta passos e.mais ;os quaes pssaros tem na cabea-um cucuruto vermelho e alevantado. e criam nas tocas das arvores., *
CAPITULO XC. ,

Que trata de alguns bixs menores que tem azas e tem -alguma semelhana de aves. ComP foi forado dizer-se de todas as aves como fica dito, convm que junto d'ellas se diga de outros bichos que tem azas e mais aparncia de aves que de alimarias, ainda que sejam immhdicias, e'pouco proveitosas ao servio dos homens. ., \ . ^ Comecemos logo dos gafanhotos, a que o gentio chama tacura, os ques se criam ria Bahia muito grandes, e andam muitas vezes em bandos, os quaes so d cr dos que ha em Hespanha, e ha outros pintados, outros verdes e de differentes cores, e ter maiores azas que os d Hespanha, e quando voam abrem-n'as como pssaros e no so muito damninhos. Ha pu-tros bichos a que os indios chamam tacuranda, e em Portugal sades, os quaes so muito formosos, pintados e grandes, mas no fazem mal a nada. Nas tocas das arvores se criam uns bichinhos como for_ migas, com azas brancas, que no sahem do ninho seno . depois que chove muito, e o primeiro dia de sol, a que os indios chamam arar ; e quando sahem fora voando ; e sahe tanta multido qu cobre o ar, eno torna ao lugar donde sahiu, e perde-se com o vento. ,As borboletas a que chamam mariposa, chamam os ridios sarar; as quaes andam de noite de redor das candeias, maiormente em casas palhoas do mato, e em noites de escuro , e so to perluxas s vezes que no ha quem se valha com ellas, porque se vem o rosto e do nfadamento s cas, porque se pem no comer, e no deixam as candeias dar seu lume, o que acontece em povoado.

220

Ha outra casta de borbletas:giahdesy umas brancas, e outras amarelias, outras pintadas, muito formosas vista, a que os indis chamam panama, as quaesvem s vezes de passagem no vero em, tanta multido, qrie cobrem o ar,*"e pem logo todo ura dia, era passar por cima da cidade do Salvador outra banda da Bahia,: que so riove' ou dez lguas de passagem; Estas borboletas fazera muitodam-no nos algodes quando esto em flor. .-*'-
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CAPITULO XCI.

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Em que conta a propriedade das abelhas da Baia.'


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Na Bahia ha muitas castas de abelhas. Primeiramente ha umas a que o gentio chama her, que so grandes e pardas; estas fazem o ninho no" ar, pr amor das cobras, como ps pssaros de que dissemos atraz; onde fazem seu .favo e criam mel muito bom 'alvo, qu lhe os indios tirara com fogo, de-que ellas fogem muito ; s quaes,mordem.valente^ mente. '. "',", - ' - - ' - ' " ' ' -" ' ;"-'1' ' Ha outra casta de abelhas a que os indios chamam tapiuja, que tambm so grandes, e criam enr ninhos qne^fazeto nas pontas dos -ramos: das arvores^ com barro-, cuja abobada to subtil que rip mais grossa que papel. Estas'/ abelheiras crestam tambm com fogo, a quem os indios cometo as crianas, e ellas mordem muito?. Ha outra ast de abelhas, maiores que as de Hespanha, a que os indios chamam taturama; estas criam.nas arvores altas, fazendo seu ninho de barro ao longo, do tronco d'ellas, e dentro criam seu mel em favos, o qual baco, e ellas so pretas e mui cruis. ,, " Ha outra casta d abelhas a.que o gentio chama cabec, que mordem muito,, que tambm fazem o ninho em rvores, onde criam mel muito alvo e bom,; as quaes so louras, e, mordem,muito.. ,..' . /',, Ha outra casta de abelhas, a que os indios chamam caapoato, que so peqrienas, e mordem muito a quem lhe vai bolir no seu ninho, que fazem rio cho, de barro sobre um ( torro ; o qual redondo, do tamanho -de uma panella, e tem serventia o longo do cho, onde criam seu -mel, que no bom. Cabatan so outras abelhas que no so grandes, que fazem seu ninho no ar, dppendurado por ura fio, que desce da ponta de um raminho: e so to bravas querem sentindo

221 gente, remettem logo aos beios, olhos e orelhas, onde mordem cruelmente ; e n'estps ninhos armam seus favos onde criam mel branco e bom. ' Saracoma:so outras abelhas pequenas que fazem seri gazalhadp entre folhas-das arvores, onde no criam mais que sete ou oito juntas ; e fazem alli seu favo, em que criam mel muito bom e alvo ; estas mordem rijamente, e dobram umas folhas sobre outraSjZque tecem com uns.fios como aranhas, onde tem os favos. ; Ha outra casta de abelhas,a que o gentio, chama cabaojuba, qe so ararellas, e criam nas tocas das arvores, e , so mais cruis que todas ; e em sentindo gente remettem logo a ella ; e convm levar apparelho de fogo prestes, com o qual lhe tirar os favos cheios de mel muito bom. apueruri outra casta de abelhas grandes : criam seus favos em ninhos, que fazem no mais alto das arvores, do tamanho de, uma panella, os quaes so de barro ; os indios os crestam com fogo,e Ihps comem os filhos, qu lhe acham; as quaes tambm mordem onde chgrn a quer lhes vai bolir.
./ ' CAPITULO xcn.

Que trata das vespas'"e moscas. Criam-se na Bahia muitas vespas, qrie mordem muito ; em especial umas, a que chamam os indios trigo, que se' criam em ramos de arvores poucas juntas, e cobrem-se com uma capa que parece ta de aranha, d'onde fazem seu officio em sentindo gente. Amisagoa outra casta d,e vespas, qu so maneira de moscas, que se criar em rim ninho, que fazem nas paredes, e nas barreiras da terra, tamanhos dr uma castanha com nr olho rio^meip, por onde entram, qual ninho de barro, e ellas-mordm a quem lhe vai blir n'elle. E porque as moscas se no queixem, convm que digamos d sua poUa virtude : e comecemos nas que se chamam^ rutuca, que so as moscas geraes.e enfadonhas que ha" em Hespanha ; as quaes adivinham a chuva, comeando a morder onde, chegam, de maneira que, se se sente sua picada, que ha,bpa novidade. -'"-., -I[a outra cas.ta.de moscas,"a que os indios chamam mu- : runja, que spmais midas que as de Cima e azuladas;"
TOMO XIV 32

' / 222

estas seguem sempre os:ces e eomem-lh ak orelhas : e ^ tocam er sangue ou chaga, logo lanam varejas. Mers, so outras moscas grandes e azuladas; que -mor* dem.muito, onde chegam, tarito que por cima de rede passar o gibam a quem ; est lanado ,n'ella, e logo fazem arrebentar o sangue pela mordedura : aeonteceu muitas vezes porem ellas varejas a homens que estavam dormindo, hs orelhas, nas ventas e no co da boca, e: lavrarem d feio por dentro as varejas, sem'se saber o que era; /que morreram alguns d'isso. Tambm, ha outras como as de cavllo, mas mais pequenas e muito, negras, que tambm mordem onde chegam.
CAPITULO XCII.

Que trata ds msquistos, grillos, bizourost e brocas que ha '' '' na Bahia. ' .*.*.?' - "'' Digamos logo dos mosquitos, a que eharm nhitinga 5 e so muito pequenos e,da feio das moscas ; os qasno mordem, mas so muito enfadonhos, porque se .pem'-rios olhos, nos narizes"; e no deixam dormir de dia-ne campo, se -no faz vento. Estes so ;amigs' de chagas, e chupar-lhe a peonha que tem.; e s' s vo pr .era qualquer cossadura d pessoa s, deixam-lhe a peonha r'ell, do. que se vem muitas pessoas a encher de bdubas. Estes mosquitos seguem sempre em bandos as indis, que andam1 nuas, mormente iquando andam sujas do seu costume. > ' Marguis so uns mosquitos que se criar ao longo,sdo salgado, e outros na_terra perto d'agua, e apparecem quando no ha vento; so tamanhos' como um pontinho de penna, s quaes onde chegap so. fogo de tamanha comi-cho e ardor que fazem perder a'pacincia, mormente, quando as guas so Vivas ; e crespr em partes, despo-. voadas ; e se lhe pem a mo, desfazem-se logo em p. Ha outra casta que se cria entre os mangues, a que ps indios chamam inhatirim, que tem as pernas compridas, e zunem de noite, e mordem a quem anda onde d& ha, qu' . ao longo do mar; mas se faz vento no: apparce nenhum. ' .. ';-; , Pium outra casta de mosquitos tamanhos como, pulg^ grandes com azas ; e em chegando estes- carne; logo sangram ser se sentir, eem lhe tocando, com a mo se esborracham; os quaes esto cheios de sangue ; cuja mordedbr ;

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223

causa muita comicho depois v e quer-se esprimida do san* gue por- no fazer guadelht na carne. Ha outra casta de mosquitos, a que os indios chamam nhatium-a; estes so de'pernas compridas, emordem e zunem pontualmente como os,qrie ha em Hespanha, qu entram rias casas-bnde no ha fogo ; e de que todos so inimigos. Tambm secria na Bahia outra immundlcia, a que chamamos brocas, que so como plgas, e voam sem lhe enxergarem, azas; as quaes furam as pipasdo vinho e do vinagre^,, de maneira que fazem muita perda, se as no vigiam; e furam todas as pipas e barris vazios, salvo se tiveram azeite ; enas terras povoadas de pouco fazem mais damno. Ha tambm grande copia de grilos na Bahia, que se criar pelo inato e campos ; que andam',, em, bandos, como gafanhotos ; e s.criam tambm nas casas de palha, em quanto so novas; nsi quaes.se recolhem muitos entre a palma que vem domat o ; os quaes so multo damninhos ; porque roem muito os vestidos, a qrie poder chegar; e mttem-se muitas vezes nas caixas^ onde fazem destruio no fato que acham no-cho, o qual cortara de maneira que parece cortado tesoura ; mas como as casas so defuma-'das recolhem-se todos para o 'mato : estes so grandes e pequenos, e tem zinhas ; e saltam qorno gafanhotos. Tambm se criam n'estas partesrauitos bisours, a que os indios chamar- unauna ; mas no fazem tp ruim feitio com as ras que fazem os,de Hespanha; andam porlugares sujos, tem azas, e so negros; com a cabea, pescoo e pernas muito resplandecentes, e tudo muito duro, mas so muito maiores que os de Hespanlia; e tem dous cornos viradoscom as pontas uns para os outros ; 3 parecem de azevche. -
CAPITULO

xciv.

Em que se declara a natureza das antas do Brasil. Apontamentos das alimarias, que se.criam na Bahia e da condio efiqtufza'ellas: , , ,"";'.Bem modernos dizer n'este logar que alimarias se mantm e criam com a fertilidade da Bahia, para se acabar de crer entender o muito que se diz de suas grandezas. E comecemos das antas a que os indios chamam tpiru, por ser. a maior alimarri que esta terra cria; s quaes sao

.-^-224- * -

pardas, em o cabello assentado, do tamanho de rima mula: mas mais baixas das pernas; e temas unhascendidas como vacca, e o, rabo muito, curto, sem mais cabello que^nas ancas ; e tem o focinho como mull, e o beio-de cima mais. comprido que o debaixo, em .que tem muita'fora, No correm muito, eso pezagas para saltar: defendem-se estas, alimarias na mato, cora as mos, das outras alimarias/, cm o,que-fazem damnO aonde chegam ; comem frutas silvestres e hervas; parem uma s criana; e emqanto so pequenas, so raiadas;de preto e amarello tostado ao comprido do corpo,' e sov muito fpnhosas; ras depois de grandes" tornam-se pardas : e emqunt os filhos no. andam, esto os machos por elles e emqiganto a fmea vai buscar de eorher.-: /Matam-n^as em fojos, em que caheto, s flexadas. Acrne muito gostosa, como a d vacca., mas no tem sebo ; e quer-se bem cozida, porque " dura; e tem o cacho ComPi: ma do peito da vacca ;e.no peito h^tem nada- Os ossos dristas alimarias queimados e dados a, beber so bons para estancar cmaras; /as srias, pelles s; muito rijas, e emmuitas, partes as ho passa;, flexa ainda que seja'de bom brao, as quaes os indios comem cozidas pegadas cor carne. Dristas,pelles, se.so bem- cortidas, se fazem.mui . boas couraas, que as no passa estocada, Se tomam estas nts pequenas, criam-se em casa, onde se fazem muito domesticas, e to mansas que comem as: espinhas, e os ossos com,os, cachorros e gatos de mistura ; e.brincam todos juntos. ' . ,' - >
..CAPTULO xcv,-

Em que se trata de uma alimaria, que se chama ,, . , juguaret. Tm para si os Portuguezes que jaguaret ona, ' ou-, tros dizem que tigre : cuj,a grandura como um bezerro ;de seis mezes; fallo dos raaehps,* porque as fmeas so maiores. A maior parte dristas alimarias soruivas, cheias ,de pintas pretas; e algumas fmeas so todas pretas; e todos tem o cabello nedio, e o rosto a modo de eP e as mos e unhas muito grandes,-o rabo comprido; e,o cabello n'elle Como'nas ancas. Tem prezas nos dentes como. libro, os olhos, como gato, que lhe luzem de noite tanto que se conhecem por isso a raia lgua ; tem ris braos e , pernas muito grossos;, parem as feraeas uma e duas"cri-

,,22.5.-r ancas ; se lhes matam algum filho andara to bravas que d nas roas dos indios, onde matam todos quantos podem alcanar ; comem a * caca que matam, para o que so mui ligeiras, e, tanto que lhes no escapa nenhuma alimaria. :grande por ps : e saltam por cima apiqrie altura dedz, doze palmos ; e trepam pelas arvores apz os indios, quando tronco grosso; salta.m, o_gntid de noite pelos caminhos onde os matam, e .comem; e quando andam esfaimadas;, ntram-lhenas casas ds roas se lhes nosritm fogo,,,o que tem grande medo. ,E n visinhna das povoaes ds Portuguezes fazem muito damno nas vaccas, e como se comeam encarhiar/n^ellas destroera um curral; e tem > tanta fora que corri uma unhada *que do m rima vacca lhe derrubam a anca no^ho. Armam os indios a/estas,aliraaris em nondos, que ^uma ta^aginde po a-pique,, muito alta e forte;com um s porta; onde lhe armam com. uma arvore alta e grande levantada dp cho, onde lhe pem um cachorro ou outra alimaria preza; e indo'para a tomar cahe est,a arvore que est deitada sobre eMa alimaria, onde d grandes bramidos; ao que os indios aodem e a matar: s flexadas ; e comem-lhe a Carne,'que muito dura e no, tem nenhum "sebo. ,.;'".,- ., . "'--.' ' (
, CAPTULO'XVI..

Qu trata de*outra:casta d tigres e. de alimaria damninhas:. Criam-se, no rio de' S. Francisco umas alimarias tamanhas como poldros,' s quaes os indios chamam jaguru que so pintadas-de ruivo e preto e malhas grandes ; e,tem as quatro prezas dos dentes do tamanho de um palmo : criam-se na agiua driste rio, no serto,; donde sahem a terra fazei* suas prezas em, antas ; e ajuntara-se trs e quatro destas' alimarias, para levarem qos dentes a anta ao rio, onde a comera sua vontade, e a outras alimarias ; e tambm aos indios qu podem apanhar. '-,',.. Jaguaracango -eutra alimaria e,casta de tigre ou ona da qu tratmos j : e so muito maiores, cuja cabea to grande como de um bom novilho. Criam-se estas alimarias pelo serto longe do mar, e tem as feies e mais condies dos. tigres, de que, primeiro falamos. Quando es-tas alimarias matam algum indio que se encarniam n'elle,. fazem despovr toda uma aldeia, porque em sahindo algu-'

mapessoa^rilla/fradeCaa no escapa qu a ho matem eeomam. - -';'--" '- > "-, "/' , = --"..';-'-- - ;> .HdritraaMmria, a que o gehti chairi suaraa, qu do tamanho de um/rafefto, tem o cabello comprido ,e ma-. ci, o rabo como co, o rosto carranrido, as rhos corao rfro, mas ter, maiores urihas emui agudas e voltadas;, vivem de rapina;;t';r- muita ligeireza para correr'e saltar; 6 so spmelhante na rapina ao lobo, matam "ris ^ndios s os podem alcanar, e pela terra dentro as ha mui/to raiores que navisiriharia do toar. Par os.indios matarem ests alimarias esperarn-n'as em cirna .das arvores, donde as fie? " xrira, e lhe comem a carne ; as qaesno tem mais que rima
. s tripa.

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. , CAPITULO

"'"'.'
XCVII.

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Em que se declaram:as castas dos, veados que eslalerrqueria. riam-s' riosmatosdrist Bahia muitos-veados, a qrie-os indios chamar suari-, qrie sao ruivosetamarihos como cabras; os quaes, ho tm cornos rie-to sebo, como os de H- , pariha. Correm muito ;,as fmeas parem uma s criana. Tomar-n'os er armadilhas, e com ces ; cuja carne sobre i o duro, toas saborosa s pelles srriito boas para botas, as quaes se curtem com casca de mangues ; e fazem-se mais. brandas quea.sribs veados d Hespanha.' '.. Mais pela.terra dentro pelas campinas se criam outros veados brancos que tem pornos, qu no so tamanhos como os de Hespanha ; mas so muito maiores qrie,-s, primeiros ; .;0.s. quaes andam,em bandos Cro cabras, e tem a mesma qualidade das que se criam perto do mar.; : Entrando pelo mate alm das;campinas, na terra dos Tbajares, se criara, uns veados ruivaos, maiores que os de Hespanha, e de maior cornadura, dos quaes se acha armao pelo matpde cinco e seis palmos de a to, e de muitos' galhos : os quas rudam os cornos cPm os; de Hespanha, e tem as pelles muito grossas,' e no tem nenhum sebo: as. emeas parem uma s criana, s ques s indios chamam suaupra, cuja carne muito boa;"os quaes matam em. armadilhas,, em que s tomam, s flexadasi'--

-,"227
1

, CAPITULO XCVIIi

Em que se trata de MgM$M alimarias que se mantm '-.'"' -- y de;rapina* ' - . < v. ' Tamando um animal do tamanho de,uma raposa, que 'tem o rosto como furo; a cor preta, -e rabo delgado/na arreigada, e cor o cabello curto ; d'ahi para; a ponta muito felpudo, e tem-n'ell"a os cabellos grossos como cavallo, e tamanhos .e Cantos que se. cobre todo com elles qriando dorme ;.tem as mos como co, com grandes unhas e muito voltadas,- de' que se fazem apitos. Este bicho se mntem d forinig/s que toma,d maneira seguinte : chega-se a um formigueiro, deita-se ao frigo rirille comd rortoye lana-lhe a lingua fora, que tem init: comprida, ao qu. acodm asi'forriga's cora. muita pressa: e cobremlhe a lingua umas sobre outras ; e Conto) a-serite bem cheia reelhe-a pradentr, : engole-as; o qu;faz- at que ' no pde comer, rais,.'cuja ,rirne comem os iridis velho/s", que os'maneebos'teiri:nojO''.d'ella. , '- - ' / , Jaguapitn^a , ::uma. alimaria do tamanho de um cachorro; de cr preta-", e tem o rosfo de cordeiro; tera pouca carne,, as unhas agudas,: e to ligeira qu se mantm no mato de avesque andam pelo cho, que tOriaa coco, e,em' povoado faz oficio de /raposa, despovoa ura fazenda de gallinhas qup :furta. ,: ,.' ,,;; . Coaty rir' bicho tamanho como gato, tem ,o focinho como furo e mais comprido, ;S-P pretos, e alguns rui vos; tem os ps^coro gato, rabo grande ''felpudo, o qual trazem sempre levantado para o,art; so mui ligeiros, andam pelas arvores, de cujrifru tassrijan tem,.ede pssaros que nrillas tomam. iTi-omam-n'os os ces quando os.acham fora do; mato, a que-feremcomas,unhas itiui valentemente; os novos se.amnar m casa, onde tomam as gallinhas que podem!, alcanar; as feineas paem; trs , quatro, Mracajs so' rins gatos bravos tamanhos como cabritos de seis mezes ; so muito gordos, e-,n feio .pontualmente como os outros gatos, mas pintados de,amarello e preto em raias; cousa muito formosa; e so flpudos, mas tem o caboinuito macio, e as ..unhas grandes e ;muito,agudas:; parem muitos filhos, e mantem-se das avs que tomam pelas-arvores, por onde andam como bogioS. Os que s tomam peqrios fzem-se era;casa muito domsticos, mas no lhe escapa gallinha nem papagaio, que n mater.

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Srigo ura bicho do tamanho dri um gato grande, de cor preta e alguns ruivaos; tem o focinho comprido, e-p rabo, em o qual, nem ha cabea, notem Cabello ; as fmeas tem n barriga rim bolso em que trazer os filhps metidos, emquan to so pequenos/e parem quatrpe cinco ; - t e m a s tetas-junto do; bolso, onde, .ps filhos mamam j^e J quando empreriham geram s filhos n'este bolso, que est ; fechad, e se abre quando parem;1 onde trazem os filhos at qrie podem andar com a me ; que se lhri fecha o bolso. /Vivem vestes de rapina, e andam pelo cho, escondidos es,( pritndo as aves, e em povoado ari gallinhas ; e so to lig-eirosqe lhes no escapam. ;
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CAPITULO
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xcix.
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Que trata da ^natureza e esfcahhei&ldo jaguarecca. '-, Jaguarecaca -um animal do tamanho de um gato grande,; ter. a cr pardaa e o cbell riompridri, eos ps mos da fei/dos bgios ; o rosto corno co; e o rabo com- ' prido, o qual se mantmdas frutas do mato.' Anda sempre" ' pelo cho, onde pare umas criana, qual to estranho , e fedorento, que/por onde quer que passadeixa tamanho fedor que, um, tiro de pedra afastado de ur banda e da outra, no ha quem OpOssa soffrer, e no ha quem por ali, possa passar mais de dous mezes, por ficar tudo to emperihentado com o rao cheiro que se no pd sflrer. Vest animal pegam os ces quando vo caa, mas vose logo lanar'na agu., e esfregam-se com aterra por tirarem o fedor de, si, o que fazem pr muitos dias sem lhes aproveitar, e o caador fica de maneira que por mais que se lave fica sempre com este trrivel Cheiro, que lhe dura, trs e quatro mezes; e como estebicho se v em pressa preseguido dos ces, lana de si tanta veritosidade, e to peonhenta que perfuma d'esta maneira a quem lhe fica perto ; e com ests armas se defendem das onas de outros animaes, quando se v perseguido d'elles, cuja artilharia tem;, tanta fora que a ona os outros inimigosque o buscam se tornam, e o deixam ; e vp-se logo lavar e esfregar pela. terra,- por tirar/de-si to ^terrvel cheiro, E aeoriteceu a um 'Portuguez, que encontrando com um d'stes bichos, que trazia o seu" caador do mato morto para, mzinhas, ficou to fedorento que no podendo soffrer-sa a si se fez mui: amarello, e se foi para casa doente do cheiro que em si trar.

229 zia, que lhe durou muitos dias. A carne d'este bicho boa para estancar cmaras de sangue ; mas a casa onde est fede toda a vida, pelo que as ndias a tem assada muito embrulhada em folhas, depois de bem seca ao ar do fogo ; e a tem no fumo para s conservar; mas nem isso basta para deixar de feder na rua, emquanto est na casa.
CAPITULO c.

Em qu se declara a natureza dos porcos do mato que ha na .Bhia..-'; r ' Criam-se ns-matos da Bahia porCos mon tezes, a que os indios chamam tajau, quej so de cr parda e pequenos; tudo/ tem semelhante com o porco; seno rabo, que no tem mais comprido que uma^pollegada; e tem embigo nas costas ; as fmeas parem muitos n mato,; por onde andam em- bandos, comendo as frutad'elle; onde os matam cm cachorros e armadilhas, s flexds'; os quaes no -tem banha, nem toucipho, seno uma pelle vistosa ; a carne toda magra, mas saborosa, e carregada para quer no tem ' boa disposio. : . Tajautirica outra casta de porcos montezes maiores que ps primeiros, que tem os dentes como os moptezes de Hespanha; e os indios que os flexam, ho, de ter prestes, aonde se acolham, porque se no pem em salvo com muita presteza, no lhes escapara ; os quaes so muito ligeiros e bravos,, e; tem tambm o embigo nas'costas; e notem banha, nem toucinho, mas a carne mais gostosa que s\ outros ; e era tudo mais so como elles. Tajaut outra casta de porcos montezes que so maiores que ps de que fica dito, e tem toucinho como os mOntezes de Hespanha, e grandes prezas e 0 embigo nas costas, mas no so to bravos e perigosos' para es'caadores ; os quaes os fazem levantar com os cachorros para^ os flexarem; e estes eos mais andam em bandos pelo mato/ onde as fmeas parem muitos filhos; e rio tempo das frutas entram pelas aldas dos indios e pelas casas; os quaes fazem muitodamno nas roas e nos canavees de assucar. A estes 'porcos cheira o,embigo muito mal"; e se quando os matam lh'o no cortam logo, cheira-lhe a carne muito ao mato ; e se lh'o cortam muito saborosa.
TOMO xiv 33

280
. . CAPJTULO-CI.
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Dos prs e outros bichos que se criam na agita doce.'


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Nos rios de gua doce e nas lagoas tambm se criam muitos porcos, a que os indios chamam capibars,, qrie no so tamanhos como os porcos do matp ; os quaes tem pouco, cabello, e a cr cinzenta, e o rbo.cino os outros ; e no tem na boca mais que doris dentes grandes, ambos debaixo na dianteira, que so do cohiprimento e", grossura de unt dedo ;, e cada um fendido pelo meio e fica de duas peas e tem mais outros dous qixaes,, todos n queixo debaixo, que no de cima no tem nada ; os quaes parem e criam os filhos debaixo da gua, onde tomara peixinhos e camares que Comera; tambm comem herya ao longo da gua, donde sahem em terra, e-fazem muito drno nos cnayeaes de assucar, e roas que esto perto da gua, onde os matar em. armadilhas: cuja carne molle, e o toqcnho;pegajoso,; mas salpreza boa de toda a maneira, mas carregada para quem no tem sade. ^ ',-.. . Criam-se nos rios de,gua doce outros bichos, qe se parecem com lontras de Portugal, a que/O gentio chama jagoarpeba, que,tem o cabello preto, to macio como velludo. So do tamanho de rim gozo, tem a cabea como de gato, e a boca muito rasgada vermelha por dentro e ns dentes grandes-prezas, as pernas curtas. Andto.. sempre n'aga, Onde Criam e parem muitos filhos e onde se rantem dos peixes qri tornam e de camares,: no sahem nunca fora da gua, Onde gritam' quando vem gente Pu outro bicho. Arer outro bicho da gua doce,, tamanho cprao ur grande rafeir, de cr parda, e outros pretos. Tem feio , de co, e ladram como co, e remettem : gente/ com muita braveza: as fmeas parem muitos filhos juntos; e se oS tomam novos, criam-se m casa, onde Se fazem domsticos. Mantem-se do peixe e dos camares que tomar na gua; cuja carne comem os indiosNos resmps rios se criam outros bichos, a que os indios chamam vivia, que so do tamanho dos gozos, flpudos do Cabello,e de cr cinzenta; tem o focinho comprido e agudo, as orelhas pequeninas e redondas, do tamanho dp ma Casca de tramoo; tem o rabo muito comprido e grosso1 pela arreigada, como carneiro; quando gritam -rib-.r nomeain-se pelo seu nome; te,m as mos eunhas de COj

231 andar sempre na gua, onde s fmeas parem muitos filhos ; mantem-se d peixe e camares que tomam, cuja carne ,Comem os indios. . " ,
CAPITULO CII.

De*uns animaes a que chamam tatus. Tatua um animal estranho, cujo.corpo com o.um bacoro, tem as pernas curtas cheias de escamas, o fociriho ,comprido cheio de conchas, as orelhas pequenas, e a cabea, que toda cheia d-conchfnhas; os olhos pequeninos," o rabo comprido cheio de lminas em redondo, que cavalga uma sobre outra; e tem-o'corpo todo coberto de conchas feitas em lminas, que atravessam o corpo todo, de-que tem armado uma formosa coberta; e quando- se este animal teme de outro, mette-se todo debaixo d'.stas armas, sem lheflcar nada de fora, as quaes s, muito fortes ; tem as unhas grandes, com que fazem as covas debaixo do cho, onde criam; e parem duas crianas. Mantem-setde frutas silvestres e minhocas; andam de vagar, e se ahem de cristas,-tem trabalho para se virar; e tem ; a barriga vermelhaa, toda cheia de verrugs. Matani-n'os os indios erflL armadilhas onde cahem;; trr-lhe o corpo inteiro fora' dristas armas; que estendidas so tamanhas como uma adarga; cuja carne muito gorda e saborosa,. ssim,cozida, como assada..' . Ha uma casta de tatus pequenos da feio dcs grandes, Os quas tm as mesmas manhas e condio; mas quando, -., se temem de lherfazrein mal, fazem-se em uma boja toda , coberta em redondo com suas, armas, onde ficam mettidos sem lhes pprecer cousa alguma; cuja carne muito boa; comem-, eririam como os grandes- A estes chamam tat-

merim.' '*-,

"

- Ha outros tts meos, qrie ho so tamanhos como os primeiros, de que se acham, muitos no mato, cujo corpo no maior que de um leito*, tem as pernas curtas cobertas de conchas,.a cabea ,comprida cheia de conchas, os dentes de gato, as unhas d co, o rabo comprido e muito agudo coberto de conchas at a ponta, e por cima sua coberta de lminas como os grandes, que so muito rijas, e na barriga no tem nada ; cuja carne quando esto gordos boa,, mas"cheira ao mato ; mhtem-se^de frutas e minhocas,

232

criam debaixo do cho em covas, e tem as' mais manhas e condies dos outros. Tatripeba outra casta de tatus maiores que os ommuns, que ficam nristaaddio acima, oqaes tm as. conchas mais grossas, e so muito baixos das mose pernas, e temn'as muito grossas, e So muito carrancudos; e andam sempre debaixo do cho como toupeiras, e no comem mais que minhocas; e em tudo o mais so, semelhantes aos de cima' ematam-n'os s indios quando vem blir a terra"; cuja carne muito boa. v , -:;,-,
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CAPITULO C H I .

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Em que se relata a propriedade das ps ej'etiSi Criam-se nristes matos, uns animaes, a; que os indios chamanrpacas, que so do tamanho de leites d seis m-e* zes, tem a barriga grande^ e os ps e mos curtos, as unhas como cachorros, a cabea como lebre, o pelo muito macio, raiado de preto e branco ao comprido do corpo ; tem o rabo muito comprido, correm pouco. As fmeas prritt drias e trs crianas^ comem frutas e. herva, criam eiri ' covas. Tomam-seriomo s, e com armadilhas, a que charam,, mondos; s algumas vezes muito, gordos, e tem a banha como porco; cuja carne muito sadia e gostosa, assim.' assada, como Cozida, : p ei Ia-se como leito sem se esfolar, e assada faz couros como leito} e de te da a maneira .muito boa carne. , , Cotias so uns bichos tamanhos como coelhos grandes, mas so muito barrigudos; tem, o cabello como lbr,, a cabea*com fucinho agudo, e os dentes'mui gudote, os dous dianteiros so compridos e gdissimos,'como que os; indios se sarjam como com ,uma lanceta ; tem os ps e mos como crelhos, as unhas como co, criam em covas, em,qu parer duas e trs crianas; mantem-se com frutas; quando correm fazem na anca uma roda de cabellos, que alli tem compridos, so muito ligeiras,'em tanto que no ha co queastome, seno nas covas, onde se defendem cora os dentes; tambm se tomamem laos ; se as tomam em-pequenas, fazem-se to domesticas cmo- coelhos; irias so damninhas, porque roem muito o fato; cuja carne se no esfola, mas pellam-n'as, como leilo; cozida e assada, muito boa. ,-,., Cotimerim outra casta de; cotias do tamanho deum

233

laparo; tem,o focinhocomprido, eso muito felpudas, de cr parda; e tem o rabo muito felpudo^ o qual viram para > Cima e passa-lhe a felpa por cima da cabea, com que se cobrem: e trepam muito pelas arvores; onde matar outros bichos, que chamam saguins; do que se mantm, criam em covas debaixo do cho, e tem os dentes muito agudos.
;

APITULO

civ.:

Que trata das castas dos bogios e suas, condies. Nos matos, da Bahia se criam muitos bogios de diversas maneiras: a uns chamar;-guigs, que-andam era bandos pelas arvores, e como sentem gente, do uns assovios com que se avisam, uns aos outros, de maneira que em um romento corre a nova em espao de unia legoa, com que entendera que entrada gente, para se porem em salvo-. E se atiram alguma flexada a algum, e o no acertam, raatam-se todos derizo; estes bogios criara em tocas de arvores, de iCjri frutos 6 da caa se mantm. "Guaribas outra casta de bogios queso grandes e mui entendidos; estes tm barbas como um homem, e p rabo muito corprido; os quaes Como se sentem flexados. dos indios, s no. cabem da flexada, fogem pela arvore acima, mastigando folhas, e mttrido-as pela flexada, com trie tomam o sangue e se curam; e aconteceu muitas vezes tomarem a flexa que tem em si, e atirarem com ella ao indio que lh atirou, e ferirem-n'o com ella; e outras vezes , deixam-se cahir com a flexa na mo sribre o indio, que os flexou. Estes bogios criam tarnbem nos troncos .qVas arvores, de cujas frutas se mantm, de pssaros que tomam; e as fmeas parem, uma s criana. Saguins so bogios pequeninos mui felpudos e de cabello macio, raiados de pardo e preto ebranco; temo.rabo comprido e muita felpa no pescoo, a qual - trazem, sempre, arrepiada, o que os faz muito formosos; e criam-se em casa, se os tomam novos, onde se fazem muito domsticos ; os quaes criam nas tocas, das arvores, e mantem-se do fruto d'ellas, das aranhas que tomam'. Do Rio de Janeiro, vem outros saguins da feio d'este, ie cima, que tem o pello amarello muito macio, que cheiram muito bem ; os quaes e os de traz so muito mimosos, 3 morrem em casa, de qualquer: frio, e das aranhas de

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' 2 3 4

casa;. qu so mais peonhentas que as das arvores, onde andara sempre saltando de ramo,em ramo. Ha nos matos ria Bahia .outros bogios, a que os indios chamam saanhang, que quer dizer bogio diabo, que so muito grandes, np andam seno de noite; so d feio dos outros, criam era cncavos de arvores; raantem-se*de frutas silvestres ; e o gentio tem. agpro n'elles, e como os ouvem gritar, dizem que ha de, morrer Nalgum.
" CAPITULO cv. '

Que trata da diversidade dos ratos que se comem, e coelhos e -, ' , outros ratos jle casa. - _' Peloserto ha rins bichos que os indios chamam savi e so tamanhos eomo.laparos ; tem o rabo comprido, o cabello como lebre; criam em covas no cho ; mantem'-s das frutas silvestres tomam-n'os em armadilhas, cuja carne muito estimada de foda\a pessoa, por ser muito saborosa, e parec-s com a dos coelhos. Aperis so outros bichos -tamanhos como lapriros, que no temi rabo ; e tem o rosto da feio de leito, as orelhas como eoelho, e o cabello como lebre'; criam'em covas, comem frutas e cannas de assucar^ .a que fazem muito s damno, cuja carne muito saborosa. Mais pela terra dentro ha outros bichos da feio de ratos, lhas tamanhos como coelhos, com o cariello" branco, a que os indios chamam savitinga,, os' quaes/criam em covas, e comem frutas ; cuja carne muito boa, s"adia e saborosa; ";- f ' ' , No mesro serto .ha outros bichos da feio de ratos, tamanhos como coelhos, a que os indios charm savicoca, .que tem o cabello vermelho, criam, m-cova,, e, m'nter-se da fruta do mato ; cuja carne como de coelhos. Em toda a parte, dos matos da Bahia se criam coelhos corno s-de Hespanha, mas no so tamanhos, a qrie os indios chamam: tapptim ; e todas-as feies tem de coelhos;, seno o,rabo, porqueo no tem'-; os, quaes criam em covas, e as fmeas parem muitos ; cuja carne. emo a,dos coelhos e-muito.saborosa. ' ,,., ' Em algumas, partes dos matos.da Bahia se criam uns bichos, sobre o grande, com todas as, feies e parecer de ratos, a que os gentios -chamam j.upti, que -se ho comem,, os quaes criam em ris troncos das arvores velhas ; e as

235 "fmeas tem rim bolso na barriga em que trazem sete oito filhos, at que so criados, que tantos parem. Aos ratos das casas chamam os indios savi, onde se criam infinidade d'elles, os quaes so muito damninhs, e de. dia .andam pelo mato,, e de noite vem-se meter nas casas.
CAPITULO cvi.

Que traia dos cUgaos da. Bahia. Em qualquer parterios matos da Bahia se acham muitos cagados, qe s. criam pelos ps das arvores,-sem irem aga, a que os indios chamam jabuty ; ha uns que so muito maiores qu s de Hespanha, mais altos, e de" mais carne, e teri s conchas.laVrads em compartimentps oitavados de muito notavpl feitio; os lavores do.s corparfiments s pretos, o meio de cada um branco e almecegdo. Estes cagados ter as fhos, ps, pernas, pescoo e cabea, cheios de verrugas tamanhas, cotoo chicharos, muito Vermelhas, agudas nas pontas ; estes pem infinidade de oVos, de qe nascem era terra humida, onde criam debaixo d arvoredo ; mritem-se de frutas, que caem pelo Cho ; "-metidos em casa comem tudo quanto acham pelo Cho; cuja crn muito gorda, saborosa e sadia para doentes. Ha outros cagados, que tambm se criam no mato, sem ireraagua, a que os indios chamara jabutiapeba; os quaes tem os mesmos lavores nas conchas, mas so muito amassados, e tm as costas muito chs^eno tem verrugas; tem pouca carne e mui saborosa: criar e mantm-se pela ordem dos de cima. ., Ha outras castas d Cagados da feio dos de Hespanha, a que os indios chamam jiabterairim, que se criam e andam sempre n gua, que tambm, so mui saborosos emedici.naes ; e dos que se criam na gua ha muitas castasde diversas feies, qu tem as mesmas manhas, e natureza, mas mui differentes na grahdura. E pareceu-me decente arrumar n'este capitulo os cagados por-serem animaes que se criam na terra, e se mantm .de frutas d'ella.

23:6;
CAPITULO
i .

,
,

CVII.

Em que se declara que bicho oqueschqrna

preguia.

' N'estes matos s cria r animal mui estranho, a que os indios chamam ahy, e os portuguezes preguia, nome Certo mui acomraoddo a esto animal, pois no ha fome, calma, frio, gua, fogo, nenroutro nenhum perigdque veja diante, que,o faca mover rima hora mais que outra; o qual felpudo como Co d'agua, e do mesr tamanho ; tem acr cinzenta, os braos e pernas grandes, com pouca carne,, e muita l; trh as*unhas como co e ruito^ voltadas; a Cabea como gato, mas coberta,; de gadelhas que lhe cobrem os olhos;os dentes como gato, As fmes parem ums ' criana, etrl-a des que a pare, ao pescoo dependurada pelas'mos, at que criada e pde andar por si; e parem em cima ds arvores, de cujas folhas se mantm, e no s descem nunca ao cho^, nem bebem) e so estes animaes to vagarosos que posto um ao p de um arvore, ho chega ao meio d'ella desde pela nianh at s vsperas, ind que esteja morta de fome e sinta ladrar os ces que a querem' tomar ; e andando sempre, mas ruda uma mo s muito de vagar, e depois a outra> faz espao entre uma e a outra, e da mesma maneira faz aos ps, e depois cabea ; e tem sempre a barriga .chegada arvore, sem se pr nunca sobre os ps e mos/; e se no faz vento, pormenhum caso se , move do lugar onde est encolhida 'at que o vento lhe chegue : os quaes: do uns assobios, quando esto comendo de tarde em tarde, e no remetem nada, nem fazem resistncia a quem quer, pegar d'elles, mais que pegarem-se com as unhas arvore onde.psto, com quefazein' grande preza; , acontece hiuitas vezes tomarem ps indios'um d'estes animaes, e levrena-n'o para casa, onde o ter quinze e vinte dias, sem comer cousa alguma, at que de piedade o tornam a largar ; cuja carne no comem por terem nojo d'ella.
',, , ' / . ' CAPITULO CVIII. .;

Que trata de oulrfls animaes diversos. Nristes matos se cria um animal, a que os gentios chamam jupar, que quer dizer noite, ,que do tamanho de um bogio, e andade arvore em arvore como bogio, por ser muito ligeiro ; cria no concav das arvores, onde pare um

237

s, filho, e mantem-se ds frutos silvestres. Este animal tem a boca por dentro at as goelas, e lingua to negra, que faz espanto, pelo que lhe, chamam noite, cuja carne os indios no comem por terem nojo d'ella. Ha outro bicho que no mato se cria a que chamamos indios candri, que do tamanho de um gato ; no corre .muito, por ser pesado no andar ; cria no tronco das arvores onde est mettido de dia ; e de noite sahe da cova ou ninho a andar pela,arvore, oride faz sua.morada, a buscar uma casta ; de formigas qup se cria,n'ella, a qrie chamam copy de quese manter /Este bicho pare uma s criana, e tem a cr pardaa, o qual dorme todo o dia, e anda"de noite. E n lugar qnd pariu ahi vive sempre, e Ps filhos, e toda a sha gr que d'elle procede; e no buscam outro lugar seno quando n cabem no primeiro. Cuim outro bicho assim charado dos ndios, que do tamanho de um laparo, tem os ps muito curtos, rabo corprido, o focinh como doninha ;,e todo cheio de cabellos brancos'e tezos, e por entre o cabello todo cheio de espinhos at o rabo, cabea, ps, os quaes so tamanhos como alfinetes ; com,os quaes se defende de quem lhe quer fazer mal, sacodindo-os de si cota muita fria, com o que fere ps ostros animaes ; os qaes espinhos so amarells, e tem as pontas pretas e mui agudas; e por onde esto pegados no couro so farpados. Estes bichos correm pouco, criam debaixo do cho, onde parem uma, s criana, e mahtem-se de minhocas e frutas, qu acham pelo cho. - Acham-se outros bichos pelo mato a que os indios chamar queiro, que so, nem mais nem menos, como ourios caheiros de Portugal, da mesma feio, e com os mesmos espinhos; criam em covas debaixo do'cho ; mantem-s de minhocas e de frutas que cahem das arvores, cuja carne os indios no comem.
.CAPITULO cix.

Em que se declara a qualidade 4as cobras, lagartos e outros bichos. Agora cabe aqui dizermos que cobras so estas-do Brazil, de que tanto se falia em Portuga*l e.com razo; porque tantas e to estranhas, no se sabe onde asdiaja. Comecemos logo a dizer das cobras a que os indios chamam jibias, das quaes ha muitas.de cincoenta sessenta
TOMO" XIV 34*

238

balto-os de comprido, e d'aqui para baixo. 'Estas-andar %os rios e alagas, onde tomar muit porcos d'agu, que' "Crimem,; e dormem em terra, onde tolham muitos porcos, veados e outra muita caa, o qe engolem .sem mastigar, ^rier espdcr; e no ha* duvida seno/que 'engolem uma %ht inteira", e um indio; o que fazr porque no -ter brites, o entre os queixos lhe rom os ossos para o podef rer erigolir. E para matar uma anta ou um ndio, ou outra Qualquer Caa, cinger-se com ella muito ber^, e como tm segura a preza, buscam-lhe o sess coto a ponta do rabo,, por onde o metem at qrie matam.o que ter abarcado; -p como tem morta a caa, mpm-n'a ritr os queixos para poder melhor engolir. E como tem a anta, ou outra eous grande que no pdri digirir, empanturra d maneira que no podem andar. E Cpmo se sente,1 pzada, lan"-se.ao solcomo mort^at /j-rie lhe apodrece a barriga; que tem n'lla; do qu d o faro logo\ a uns-pssaros que se chamam urubus, e do sobre -ella; comendo-lhe a barriga Cni o que tem dentro, ei tudo o mais, por"pstr podre ; e no lh deixam seno 0 espinhao, qu est pegado n cabea na ponta do rabo, e muito duro ; e Comp isto fica limpo da carne toda, vao^se os pssaros; e torn-lhe a crs-' Cer a carne nova, t ficar a cobra em sua perfeio; e assim Como lhe vai crescendo a carne; comea abolir com o rabo, e torna a reviver, ficando como d'ants : o qrie se tem por Verdade, por se ter totoado d'isto muitas informaes,/dos , indios e dos linguas qrie andam por entre elles no* serto, o's,quaes o afflrmani assim. -" E um Jorge Lopes, almoxarife da capitania deS. Vicente, grande lingua, e homem de verdade, ,armava qe indo para uma aldeia do gentio no serto, achara uma cobra dristas, no caminho, que tinha liado trs indios para os matar, os quaes livrara d'este perigo ferindo a cobr-a corri a espada por junto da cabea-e do rabo, como que ficou sem fora para os apertar, e que os largara; e q acabando de matar esta Cobra, lhe achar dentro quatro porCos, a qual tinha mais de sessenta palmos de comprido ; junto do curral de Garcia de vila; na ,Bahia, andavam duas cobras que lhe matavam e comiam as Vaccas, o qual afilrmoh que adiante d'elle/lhe"sahira um dia rima, quereriettd a um touro, que lh'o levou para dentro de rima . lagoa ; a que cudiu um grande lib"ro, ao qual a cobra arrmetteu e engoliu logo ; e no pde levar o touro para baixo pelo impedimento que lhe tinhafeito , libro; o

T-.

239 - ^

qual touro sahiu acima da ,gua depois de afogado; e-, affirmou qhe.n'este resmo, lugar matariam'seus vaqueiros! outrarCobra que tinha noventa e trs palmos, e pesava, mais do oito'arrbas; e eu vi uma pelle do uma cobra dristas que tinha quatro palmos de largo. Estas cobras tem as. pelles cheias de escamas verdes, amarelias e azues, das quaes tiram logo uma arroba de banha da barriga, cuja carne os indios temem muita estima, e os mamelcos, pela acharem muito saborosa.
CAPITULO CX. -

Qufi trata de algemas cobras grandes que se criam ns rios da. i \ "'' .., Bahia, -Sriour outra casta de cobras,, que andam sempre na gua, eno sahem terra; sp mui grandes, tem as escamas pardas brancas, das quaes matam os indios muitas de quarenta a cincoenta palmos de comprido. Estas engolem um porco d'agua, cuja carne'os indios e alguns Portuguezes comem, e dizem ser muito gostosa. Boiuna outra s^ta^de cobras, que se criar n gua, nos rios do serto, as quaes so descompassadas de grandes e grossas, Cheias de escamas pretas, e tem tamanha gar/ganta qu engolem um. negro sem o tornarem, em tanto qu quando " o engolem ou alguma alimaria, se mttefn na aga para o afogarem dentro, e no shein da gua seno pra remetterem aum pessoa, ou .caa; qrie anda junto ao rio ; e s- Cm a pressa com que engolem a preza se embaraa e" peja, com o qup no pde tornar para a^gu d'onde sarii, morre em terra, e sahe-se a pessoa ou alimaria de dentro, viva; e affirmar os lnguas, qu hpve indios, que estas cobras enguliram, qe estando* dentro da sua barriga tiveram acordo de as matar cm a faca qu levavam dependurada ao pescoo, como cpstumm. Nos rios e lagoas se criam umas cobras, a que os indios chamam araboya; que so mui grandes, e tem o corpo verde e a cabea preta, as qaes no sahem nunca aterra e mntem-se ds peixes e bichos, que tomar ria.gua, cuja carne os indios comem. Ha outra casta de cobras que se criammos.rios, sem sahirm terra, a que os indios chamam taraiboia, que so

240

amarelias e muito Cpmpridase, grossas; as quaes se manter do peixe que tomam ns rios e so muito gordas eboas para' comer.
CAPITULO CXI;,

Que trata das cobras de coral e das gereracas. .[

',

Pelos matos e ao redor das casas se criam umas cobras, a que oS, indios chamam gereracas; as maiores so de sete e oito palmos de comprido, e so pardas ebrancacentas nas co*stas, as quaes se pem s tardes a.O longo dos caminhos esperando a gente que passa, e em lhe tocando om o plhe do tal picada, queselhe n aodem logo com algum defensiyo, nodura o mordido vinte e quatro horas. Estas cobras se pem tambm em ramos de rvores junto dos , caminhos* para morderem a gente, o que fazem muitas vezes aos indios, e quando morder pela manh, ter,a pe-:' onha toais fora; como a vibora; as; quaes mordem tambm s egos e Vaccas,, do que morrem-' algumas, sem se sentir de qu, seno depois que no tem remdio. Ter estas : cobras nos dentes prezas,,as ,quaes mordem, de ilharga ; e aconteceu na capitania dos Ilhos morder uma d'ests cobras um homem por cima da bc^ta, e no sentir cusa que lhe dpsse, e zombou da cobra, mas elle morreu ao outro dia ; e vendendo-se o seu fato em leilo comprou outro , homem as" bpts e morreu em vinte e quatro horas com lhe incharas pernas; pelo que se buscaram as botas, e 'acharam n'ellas a ponta d dente, como de uma agulha, que estava mettida na bota ; no que se viu claro que estas gereracas tem a peonha nos dentes : estas cobras se criam entre pe-, dras e pos podres, e muaam a pelle cada anno; cuja carne os indios comem:Ububocas so odtras cobrasassin chamadas do tamanho das gereracas, mas mais delgadas, a: que os Portuguezes chatom de coral, porque tem cobertos as pelles de escamas grandes vermelhase quadradas, que parecem coral; e entre uma escama e outra vermelha, tem uma preta pequena. Estas cobras 1no remettem gente, ms se lhe tocam, picam logo com os dentes dianteiros e so as suas mordeduras mais peonhentas que as: das gereracas, de- maravilha escapa pessoa mordida drillas.' E qurido esto enrospadas n cho parece um ramal de coraes; > e houve homem qe

241 tomou uma que estava dormindo, e meteu-a no seio, cuidando sereto coraes, e no lhe fez mal; as quaes criam debaixo de penhascos e da rama secca.
CAPITULO CXII.

Em que se. declara que cobras so as de cascavel,' e s dos formigueiros, e as que chamam boitiapia. Boicminga quer dizer cobra que tange, pela ' lingua do gentio; as quaes So pequenas e muito peonhentas quando .mordem; Chamam-lhe os Portuguezes'cobras d cascavel, porque ter sobre o rabo uma pelle dura; ao'mod de reclamo, tamanha como uma bainha de gravano, mas muito agrida na ponta, que tem para cima, onde'tem dous dentes com qrie mordem; que so agudos. TStaibainha lhe refine muito, quando andam, pelo que' so logo sentidas; e ho fazem tanto,damno; E affirmam os indios, que as "-cobras drista 4c'|ta>:!no mordem cora a boca, mas com aquelleaguilho -farpado que tem n'este cascavel, o qual .tambm retihe fora da cobra: e teto tantos reclamos-, como a cobra tem.de nnos; e cada anno lhe nasce um; as quaes cobras riJordem ou picam com esta ponta de cascavelde salto. Nos-formigueiros velhos*se criam outras Cobras, que se , chamam bojra, qrie s d trs a cinco palmos, e tem o rabo rombo-na ponta, da feio da cabea; e no "tem outradiffereha um do outro que ter a cabea boca, em a qual hotni olhos so pegas; e sahem dok formigueiros, quando se elles enchem com. a gua da chuva; e como se sahem fora, ficam perdidas, sem saberem por onde andam; e se chegam a morder, so tambm toui peonhentas. Estas cobras no so ligeiras como as outras, e andara muito de" vagar, tpm a pelle de cr acatasolada-pela banda de cima1, e pela de baixo so brancas; mantem-se nos formigueiros'das formigas quando as podem alcanar, e do seu mantimento, d'onde tambm se sahem apertadas de fome. , , > -' ,Boitiapias so cobras de cincoenta e sessenta palmos de comprido e muito delgadas, que no mordem a nada^; porque tem o focinho muito comprido, e o queixa de baixo muito curto; onde tm a boca muito pequena e no podem chegar com os dentes a quem querem fazer mal, porque lh'o impede o focinho; mas para matarem uma pessoa ou

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alimaria enrscar-se, com ella,, e' apertam-n'a rijamente; e buscam-lhe com a ponta do rabo os ouvidos, pelos :qas lhe mettem om muita presteza, por que a tem muito, dura e aguda; e por este lugar matam a prpza, em quese depois desenfadam vontade. '
CAPTULO ^CXII.

'Em que se1 declarada, natureza de cobras diversas.' , Surucucu so umas- cobrasmuito grandes e brancas n cr,-que andam, pelas arvores, drinde remettem gente, e caa que passa por junto "d'ellas, as quaes tem ps dentes tamancos qe quando mordera levam logo bocado de Carne fra.D'estas cobras so ps indios muito amigos,e toram-n'as em umas armadilhas, que^chamai iriondos, e se o macho acha alli a fmea,preza e morta, espera alli o arrador, com - qur se cinge, e no o larga at que o mata, e-torna a* esperar alli at que venha outra 'pesada-, a. quem rord somente, e.cpm esta vingana se vai d'aquelle lugar. ' Ha outra casta de cobras, a q u os indios, chamam' tiopurana, que so-de quarenta e cincentst: palmos de com' prido, qu no mordem nem fazer toai gente nenhuma, e mantem-se da caa que tomam* Estas tomam os indios s, mos, quando so novas, e prendem-n'as em casa, aonde as ; criam,;e se fazemto domesticas que vo buscar comer ao mato e tornam-se para casa, cuja carne muito saborosa. Caninam so outras'cobras mes na grandura,- com,a pelle preta nas costas e amarella na barriga, as quaes criar em os concavos dos pos podres, e so muito peonhentas, e oS mordidos d'ells morrem muito depressa, se lhes no aodem logo. , Boiub quer dizer cobra verde, que rid so grandes, e criam-se no campo, onde se mantm com ratos que1 tomam-; Estas tambm mordera gente se podem, mas so muito -peonhentas, as quaes seeriroscam com as lagartixas, ratos e com outros bichos om que se atrevera, que tambm . matam para comer. ' , , . - . ' . Ha outra casta de cobras a que os indios chamam ubiraco, que so pequenas de cr ruivaa, as quaes andam sempre pelas arvores, d'onde morder, no rosto pelos lugares altos das pessoas, e, no se descem nurica ao cho; e se np aodem mordedura d'estacom brevidade, a sua

. - ,y:' ipeonha to fina que faz arrebentar o sangue em trs horas ipr todas as partes, de que o mordido inrre logo. iJrapiagras so outras cobras, que andam pelas arvores saltendo pssaros, e a comer-lhes os ovos, nos ninhos, do ft que se niantem; as quaes no so grandes, mas muito ; ligeiras.
CAPTULO CXIV.

-243

'Que; trata dos lagartos e dos amelee?.

Nas lagoas e rios de agha doce se criam uns lagartos ianque os indios chamam jacar, dos quaes ha alguns tamanhos Como, um homem,, e qe tem a-cabea como um grande ,i! libro ; estes lagartos so todos cobertos de Conchas luito -Tijas, os quaes no remetem gente, antes fogem d'ella ; e *mantem-se do peixe que tomam, e da herva que comem ao "longo da gua ; ha alguns negros que lhes tem perdido o inedo, e se vo a lles, chamando-os pelo sri nome; e vo-se IftChgarido a elles at que os tomam s mos e os matam "para s comerem ; cuja carne um. tanto adocicada, e to -.,$*qrda qe ter ria barriga banha como porco, a qual, alva "e saborosa e cheira bem. Os testculos dos machos cheiram como os dos gatois de algalea, e's fmeas cheira-lhes , ;-fCrn,e de junto do vaso muito bem* No, mato se criam outros lagartos, a que os. indios chamam snerhs, que tambm so muito grandes, mas no tamanhos como os jacars: estes remetem gente, e criam-se nos trancos das arvores; cuja carne muito/boa e saborosa. Criam-se. no nat outros lagartos tamanhos como os de cima, a que,QS indios chamam tijua, os quesso mansos, e criam em Cova na terra, raantem-s das frutas que buscam pelo mato ; cuja carne havida por muito boa e saborosa. Pelos inatos'se criam outros lagartos pequenos pintados Como os de"Hespanha,,a quedos ndios chamam jaarpinima, os quaes-criam po ehtre as pedras, e em tocas de arvores, com os quaes tem as cobras grandes brigas^ Anijuachgas so outros bichos qu no tem nenhuma ^differena dos camelees, mas so muito' maiores que Ps de frica, cuja cr naturalmente v:rd,; a qual mudam como fazem os de frica, e esto logo presos a uma janella um mez sem comerem nem bebrerh; e esto sempre virados com '0'rsto para o vento, de que s-mantm; e no querem comer cousa, que lhes dem, do que comem os outros

244,

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,animaris; so muito pez.ad.ps no ;ndar, e, tomm-n'os s mos, semS defenderem ; os quaes tem o rabo,muito comprido, tem um modo d.prepatnas.n'elle coro os.caes;
CAPITULO cxv.

Que trata d diversidade das rs e sapos que 'ha -no Brazil.

Chamam os indios cururs ps sapos de Hespanha, d que no tem'nenhuma differena, mas no mordem, nem fazem mal, estando,vivos, mortos sim, porque o seu fel peonha mui cruel, e os fgados e a pelle, da qual o gentio us quando quer matralguem. Estps,sapos se:criam pelos , telhados, eer tocas de arvores buracos das paredes,- os quaes ter um bolso na barriga em que trazem os ovos, que so tamanhos como avells e amarells como gemmas de ovos, de que se gerar os filhos, onde os trazem meifdos at que saiam para buscar sua vida ; estes sapos buscam de comer de noite, a quem as indios orrem, como as rs; mas tirar-lhe as tripas' e forura fora, de maneira" que lhe ho arrebente 0 fel; porque sp arrebenta fica ariarne toda; peonhenta, e no escapa quem a,come, o alguma, cousa cia - pelle e forura. " '..; E porque as.rs,so de'differtentes feies e costumes, dir gamos fogo de umas a que o indios chamam juiporiga, que so grandes, e, quando cantam parecem caldeireiros que malham nas caldeiras; e,estas so pardas, e. criam-se nps rios onde desovam cada I,ua; as quaes se comem, e so.muito alvas e gostosas. . - , . . ' D'esta mesma casta se criam rias lagoas, onde desovam emquarito tem, gua, mas como se secca, recolhem-se para o mato ns troricos das arvores, onde esto at que chove, e como asdagas tem qualquer gua, logo se tornam para ,ellas, onde desovato ; os seus ovos so pretos, e de cada um nasce ura bichinho com prepatanas e rabo, e as prepatanas se lhes convertem nos braos, e o rabo se lhes converte nas pernas. Emquanto'so bichinhos lhes chamam ps indios juins, do qu ha sempre infinidade d'elles, assim nas lagoas como no remanso dos rios; do que se enchem balaips quando os tomara, .para os alimparem apertam-n'os entre os dedos, e lanm-lhes as tripas fora, e embrulha,m-n'os s mos cheias em folhas, assam-n'os no borralho ; o qual manjar gabar muito ps linguas qe tratam com o gentio, ,,e os mestios. ''',

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Jigi outra casta de rs, que so brancapentas, e andam sempre na gua, e quando chove muito faliam de maneira que parecem crianas que choram^ as quaes se comem esfoladas, como as mais;.e so muito alvas e^ostosas* Ha outra casta de rs, a que os indios chamam juihi; e so muito grandes, e,de cr pretaa, e desovam na gua como as outras, as quaes, depois de esfoladas, tem tamanho corpo como um honesto coelho. /Cria-se :qa gua putra casta de rs, a que os indios chamam juiperega, que saltam muito, em tanto que do saltos do cho em cima dos telhados, onde andam no in. verno, e cantam de cima como chove; as quaes so verdes, e desovam tambm na. gua em lugares humidos; e esfoladas coiem-se como as outras. Ha outra casta de rs, a que os indios chamam juigoaraigarai, que so pequenas, 'e no inverno quando ha de fazer sb e bom tempo, cantain toda noite no alagadio, 'jond se criam, o qual signal muito certo; estas so verdes, e desovam na gua que corre entre junco ou rama, e tambm esfoladas sp comem e so muito boas. Como no ha ouro sem fezes, nem. tudo vontade dos homens, ordenou Deus que entre tantas Cousas proveitosas para o servio d'elle, como; fez na Bahia, houvesse algumas immundicias que os enfadasse muito, para que no cuidas-* sem que estavam em outro paraizo terreal, de que diremos d'aqui por diante'; comeando no capitulo que se segue das lagartas.
CAPITULO .cx vi.

jQue trata das. lagartas que se criam na Bahia. Soca charam os indios lagarta., que tambm como bichos d seda, quando querem morrer que esto gordos, a qual s Cria de borboletas grandes que vo de passagem. A"'s vzs se criaessa lagarta com muita gua e morre como. faz.sol, outras vezes se cria com grande seCca e morre como chove. Uma e outra destroe as novidades de mandioca, algodo, arroz ; e.faz mal cana nova de assucar, e s vezes tanta esta lagarta,, que. vo as estradas cheias d'ellas, e deixam o caminho varrido da herva, e escaldada. E quando do nas roas da mandioca chascam de maneira que se ouve um tiro d pedra, as quaes comem os olhinhos novos, e depois as outras folhas ; e muitas vezes tanta que comem
TOMO XIV 35

246

a casca dos ramos da mandioca ; e se se no muda o tempo, destroe as novidades de maneira qrie cas haver fome na terrai e o cho por onde est praga passa, ainda que seja mato, fica escaldado de maneira que no cria herva eal dus annos. imb outra casta de. lagartas verdes pintadas de preto e a cabcri branca, e outras pintadas de vermelho e preto, e todas so to grossas como um dedo, e de meio palmo de comprido, com muitas pernas, as quaes crestam a terra e arvores por onde passam. Haoutras mais pequenas que as de traz, que so pretas; de cr muito fina, todas cheias de pello to macio como veludo, e to peonhento, que faz incharia carne se lhe tocam, com cujo pello os indios fazem crescer a natura,; e chamam a estas socauna. Nos limoeiros e em outras arvores'naturaes da terra se criam'outras lagartas verdes, todas cobertas de esgalhos verdes, muito subtis e de estranho feitio, to delgados, como cabellos da cabea, o'que impossive poder-se contrafazer coto pintura festas temos indios por mais peonhentas que todas, e fogem muito d'ellas ; e affirmam que fazem seccar os ramos das arvores por onde passam com lhes morderem os oihos. *-, Em outras arvores qu se chamam cajuzeiros, s criam umas lagartas ruivas, tamanhas como as das couves em Portugal, todas cobertas de pello, as quaes como sentem gente debaixo, sacodem este pell de si, e na carne onde chega, se levanta logo tamanha comicho que , peior que a das ortigas, o que dura todo um dia : e criam-se estas nos ramos velhos.
CAPITULO CXVII.

Que trata das lucernas e de outro bicho estranho.'" Na Bahia se criara uns bichos, a que os indios chamam mamos, aos quaes chamar era Portugal lucernas, e outros cagalume, que andam em noites escuras, assim em Portugal como na Bahia, em cujos matos os ha muitgrandes; os quaes entram de noite nas casas s,escuras, onde parecem candeias muito claras, porque alumiara urna casa toda, em tanto que s vezes acorda uma pessoa de sbito vendo a casa clara, deitando-se s escuras, do quese espanta cui-

247

dando ser outra cousa ; dos quaes bichos ha muita quanti dade em lugares mal povoados. , Tambm se criam outros bichos na Bahia mui estranhos a que os indios chamam buijeja, que so d tamanho de uma*lagarta de couve, o qual muito resplandecente, em tanto que estando de,noite em qualquer casa, ou lugar fora / d'ella, parece uma candeia acez, e quando anda ainda mais resplandecente. Tem este bicho uma natureza to estranha que parece encantamento, e tomando-o na mo 1 parece um rubim, mui resplandecente, e se o fazem em pedaos, se torna logo a juntar e andar como d'antes;.e . sobre assinte se viupor vezes em differentes partes cortar-se um dristes bichoricom uma faca em muitos pedaos, e Ve tornarem logo a juntar ; e depois o embrulharam em um papel durante oito dias, e cada dia o espedacavam em migalhas, e tornava-se logo a juntar e reviver* at que enfadava, e o largavam.
CAPITULO CXVIII.
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Que trata;'da. diversidade e estranheza das aranhas e dos '>' lcros.


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Na Bahia se cria muita diversidade de .aranhas, e to estranhas que convm declarar a natureza de algumas., E peguemos logo nas a que chamam nhandua, as quaes so tamanhas como, grandes carangueijos, muito cabelludas e peonhentas ; remetem gente de salto, e tem os dentes tamanhos como ratos, cujas mordedras s"a mui perigosas ; e criam-se em pos podres, rio Concavo d'elles, no povoado em paredes velhas. \ Ha outra casta de aranhas, a que os indios chamam nhandui, que^so asadostuniadas em toda a parte de que se criam tantas no Brazil, com a humidade da terra que, se no alimpam as casas muitas vezes, no ha, quem se defenda d'ellas. Estas fazem um bolso na barriga muito' alvo, que parece jle longe algodo, que do tamanho de dous reales, e de quatro, e de oito reales, em o qual bolso criam mais de duz- ntas aranhas ; e como podem viver sem ame largam o bolso de si com ellas, e cada uma vaifazer seu ninho ; e como esta sevandija to nejenta, escusanios de dizer mais drilla. Snrajri chamam os indios a um bicho como os lacros de Portugal, mas so tamanhos como camares, etem duas

248- bocas compridas; e se mordem uma pessoa, est atormentada, com ardor vinte quatro.horas, mas no periga. Criam-se na Bahia outros bichos da feio dos lacros, a qu os indios chamam nhanduabij, os qaes tem o corpo tamanho como um rato, e duas bocas tamanhas como de lagosta ; s quaes so todos cheios de pello, e muito peonhentos, cujas mordedras so mui perigosas; e criam-se em tocas de arvores velhas no podre d'ellas. No so para lembrar s immundicias de ,/que at. aqui tratamos, porque so pouco damnosas, e ao que se pde atalhar com alguns remdios ; mas praga das, formigas no se pde compadecer, porque se ellas no foram, a Bahiase podra chamar outra terra de promisso, das quaes comearemos a dizer. d'aqui por diante.
.CAPITULO

cxix.

Que trata das formigas que mais damno fazem, que se '.' chamam saba., Muito havia que dizer das formigas do Brazil, o que se deixa de fazer to copiosamente como se poder fazer, por se escusar prolixidade ; mas diremos em breve de algumas, comeando nas que mais damno.fazem na terra, a que o gentio chama ussariba, que a praga do Brazil, as qua/es> so comb s grandes de Portugal, mas mordem muito, e onde Chegam destroem as roas de mandioca, as hortas-, das arvores de Hespanha,as lai^angeiras, romeiras e parreiras. Se estas formigas no foram, houvera na Bahia muitas vinhas e uvas de Portugal; as quaes formigas vem de muito longe de 'noite buscar uma roa de mandioca, e trilham o caminho por onde passam, como se fosse gente por:: elle muitos dias, e no salteam seno de noite;' e por atalharem, no comerem as arvores a que fazem nojo, poem-lhe um testo de barro ao redor do p, cheio de gua, e sede dia; se lhe secou a gua, ou lhe cahiu uma palha de noite que>a atravesse, trazem taes espias que so logo- disso avisadas; e passa logo por aquella palha tamanha multido d'ellasque. antes que seja manh, lhe do com toda a folha no cho ; e se as roas e arvores esto cheias de mato de redor no lhes fazem mal, mas tanto que as vem limpas; como quem entende que tem gosto a gente disto, saltam n'ellsde noite, e do-lhe com a "folha no cho, para a levarem para os formigueiros ; e no ha duvida seno que trazem

249 rispias pelo ,ampo, que .levam aviso aos formigueiros; porque se vi muitas vezes irem trs e . quatro formigas para os.formigueiros,, e encontrarem outras no caminho e virarem com ellas, e tornarem todas .'carregadas, e entrarem assim no formigueiro, e sahirm-Se logod'le infinidade drillas a buscarem de comer roa, onde. foram as primeiras ; e tem tantos'ardis qup fazem espanto. E como se dristas formigas na diz o muito que drillas ha que dizer, melhor no dizer mais seno, que se ells oforam qu o despovoara.muita parte de Hespanha para irem povoar o Brazil; pois se d n'elle tudo o que se^ pd desejar, o que esta maldio impede de maneira qe tira o gosto aos homens de plaritarni seno aquillo,ser1 o,que no podem viver na terra.
CAPITULO cxx.

Em.que se trata da natureza das formigas de passagem. Temos que dizer de outra.pasta de formigas mui estranha, a que os^ indios chamam goajugoaj, as quaes so pequenas e ruivas, e mordem muito; estas de tempos,em tempos se sahem da cova, maiormente depois que chove muito,,e torna a.fazer bom tempo que se lhe enche a cova de gua; e do em uma casa onde lhe no fica caixa evc\ que no entrem, nem buraco, nem greta pelo cho e pelas paredes, onde matar as baratas, as aranhas e os ratos, e todos os bichos que acham ; e so tantas que os cobrem de improviso, e entram-lhes pelos olhos, orelhas e narizes, e pelas partes baixas, e assim os levam para os seus.aposenr tos, e a tudo o que matam ; e como correm uma casa toda passam por diante,a outra, onde fazem o mesmo e a toda uma alda ; e so tantas estas formigas, quando passar,, que no ha fogo que baste para as queimar, e pem em passar por um lugar toda uma noite, e se entrara de dia todo um dia; as quas vo andando"em ala de mil em cada fileira ;-e se as casas em que entram s trreas, e acham a roupa da cama no cho, * por onde ellas subam, fazem; alevantar mui depressa a quem n'ellajaz, e andar por cima das caixas e cadeiras, sapateando, lanando-as fora, e cossando ; porque ellas, em chegando, cobrem uma pessoa toda, e se acham cahorros e gatos dormindo, dap nrilles de feio, e em outros animaes, que os fazenvvoar; e matar tambm as cobras que acham descuidadas; e

250 viu-se por muitas vezes levarem-n'as estas formigas a rastes infinidade d'ellas; ematam-n'as primeiro, entrndodhe pplos olhos e ouvidos, por onde as tratam e mordem to ral, e de feio que as acabar.
CAPITULO CXXI.
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Que trata, da natureza de certas formigas grandes. . N'esta terra Se criar umas formigas grandes, a que os indios chamam qriibuquibura; que so s qum Portugal chamam.guries, mas s maiores. Estas sahem dos formigueiros depois que chove muito, e vo diversas voando por lugares onde enxameam grande somma de formigas, e comolhes toca qualquer cousa, .ou lhes d o vento lpgo lhes cahem as azas e morrem ; eno pde ser menos arestas enxamearem de vo, porque em hortas cercadas de.aga que ficar em ilha, lhes arrebentam formigueiros dentro, estando antes a terra limpa d'ellas, e no podem passar por respeito da gua que cerca ests hortas. 4 ' Criam-se na mesma terra outras formigas, a que, os indios chamam ians, as quaes tem o corpo tamanho como passas deAlicant, e',so daraesmricr, as quaes tem azas como os agudes, e tambm se saem,dos formigueiros depois que chove muito, a nxugar-s ao sol; e tem grande boca, eto agudas que cortam pora ell como tesoura p -fato a que chegam, quando pegam na carne de alguma pessoa se aterram de maneira qe no se podem tirar seno cprtandolhe a cabea Com as unh ; s quaes se mantm ds folhas ds rvores e d minhocas, e outros bichinhos que tomam pelo cho ; a estas formigas eomem os indios torradas sobre o fogo, e fazem-lhe muita festa; e alguns homens brancos -que andam*entre elles, e os mistios tem por bom jantar, e o gabam de saboroso, dizendo qu sabem a passas d Alicante ; e torradas so brancas por dentro. Ha outras formigas a que os indios chamam turus, qrie 'so ruivas, e tem o corpo tamanho como gro de trigo, e grande boca ; as quaes so amigas das caixas, onde roem o fato que est nrills, e o que acham pelo cho ; em o qual fazem lavores, que parecem feitos tesoura, e succdeh muitas vezes terem os'sapateiros o calado feito, eficai*nas enoospeas do cho, onde lhe chegaram de noite, e quando' veiu pela manh as acharam todas lavradas pela banda da flor e a tinham tpda abocanhada.

'251
CAPTULO CXXII.
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Que trata de diversas castas de formigas.


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Ubiraip outracasta de formigas, que se criam nos ps das arvores; so pardas e pequenas, mas mordem muito ; as quaes se mantm das folhas das arvores, e da podrido do concavo drillas. Ha outra casta,, a que os indios chamara tacicema, que se criam nos mangs qrie esto corn a mar cobertos de gua, at o meio ; as quaes so pequenas, e fazem ninho na terra n'estas arvores, obrados como favo de mel, onde criam ; a ,qual terra vo buscar enxuta, quando a mr es^ vazia ; e mantem-se dos olhos dos mangues e de ostrinhas que sp n'elles criam, e de uns caramujos que se criam nas folhas dristes manvgues.,e que so da feio e natureza dos earaces. Tacibura outra casta de formigas, que so pequenas do corpo e tem grande cabea, tem dous corninhos nrilla ; so pretas e mordem muito, e criam-se nos pos podres que esto no cho, e mantrn-se d'elles e da humidade que estes pos tm em si. Tacipitanga outracasta de formigas pequenas, as quaes no mordem, irias no ha quem possa defender d'eflas as cousas doces, nem outras de comer. Estas se criam pelas casas errlugares pccultos que se no podem achar, mas como as cousas doces entram em casa, logo lhes do assalto, com o que enfadam muito; eso muito certas em casas velhas, que tem as paredes de terra. Outras'formigas chamam os indios. taciahi,- que so grandes e pretas, e criam-se debaixo do cho; tambm mordem muito,, mas np se afastam muito do seu formigueiro, - -, ,
CAPITULO OXXIII.

Em que: se trata qu cous ocop, que ha na Bahia, e dos carrapalo.s.^ Copi so uns bichos que so to prejudiciaes como as formigas, os quaes arremedam na feio s formigas, mas so mais curtos, redondos e muito nojentos, e se lhe tocam m as mos logo se esborrhamT e ficam fedendo a percevejos e so brancacentos. Estes bichos,-se criam nas arvores e na madeira ds casas, onde no ha quem se defenda drilles;

' 252 os Quaes vem do mato por baixo do cho a entrar nas casas, e trepam pelas paredes aos forros e.ermadeiramento d.ellas; e fazem de barro ura caminho muito para ver, que vai todo coberto com uma aboboda de barro de volta de bero, cousa subtilissima e to delgada" a parede drilla como casca de castanha, e servena-se pOr dentro por Onde : sempre caminham, uns para cima e outros para baixo; e fazem nas partes mais altas das casas seus aposentos, pelas juntas de madeira m redondo ; uris tamanhos como bollas, outros como botijas, e tamanhos'como potes; e, se se no tem muito tento n'isto,'dstrom umas casas, e comem-lhe a madeira,, e apodrentam-n'a toda; e o mesmo feitio fazem nas arVores,com qu as fazem seccar : e necessrio que Se alimpem as. casas d'elle, de quando era quando ; e quando lhe tiram fora estes aposentos, esto todos lavrados por dentro como ' favo de mel, mas tem as casas'mais midas, e todas estas Cheias d'este copi; o qual lanam s gallinhas-Com o que engordam muito," ,, Pelas arvores se cria Outra riasta de copi preto, e do tamanho,e feio do gorgulho, que er Hespanha Se cria no trigo ; este morde muito, e mais,ligeiro que. o de cima, e faz seus ninhos pelos-ramos das arvores seccas", elavram: n'os todas por dentro. ." Ha na Bahia mitoS carrapats,; ds quas se cria infinidade drilles no mato, nas folhas das arvores, e com o vento caem no cho ; e quem anda por;baix dristas arvores leva logo seu quinho ; dos quaes naseja grande comicho ; mas como se uniam com, qualquer azeite^ logo morrem. Dristes Carrapats se pegam muitos ri caa grande, e nas vaccas, onde se fazem nuito grandes ; mas ha uns pssaros de que dissemos atraz, que os matarh/s alimarias.e s vaccas, que os esperam muito bem, e mantem-se d'isto. Tamben sexiriam nas- palmeiras uns Caraces do tamanho de oito reales,. que so baixos e enroscada a caca em voltas, como a postura de uma cobra quando est enroscada, os quaes fazem ml aos indios, se comem muitos. Dos craces de Hespanha se criam muitos nas arvores e nas hervas.
CAPITULO -:

cxxiv.
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Que tratadas pulgas e piolhos, ejdos bichos que se criam nos ps. ' Pulgas ha poucas no Brazil, a que os indios chamam tunga,ri nenhus piolhos do corpo entre a gente branca;

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entre ps indios se criam alguns nas redes em que dormem ' como esto sujas, ps quaes so compridos com feio de pernas, como os piolhos ladros, e fazem grande comiho no corpo. , Y . Para se arrematar esta, parte das informaes dos bichos prejudiciaes, e de nenhum proveito que se criam na Bahia, convm que se diga due so estes bichos to temidos er' Portugal, que se meter nos ps d gente, a que os indios chamam tungas, os quaes so .prptinhos, pouco maiores que oues. Criam-se m casas despovoadas, como as pulgas m Portugal, e em casas sujas de.negros que as no alimpam, e dos brancos que. fazem o mesmo, mormente se esto em terra solta e de muito p, em os qiiaes lugares estes bichos.saltam como pulgas nas pernas descalas; ras nos ps arorada a que elles so-'mais inclinados, mormente junto das unhas ;-e como estes bichos'entram na carne,, logo se sentem como picadas de agulha. Ha alguns que doem ao entrar na carne, e outros qe fazem comiho, como de frieiras ; e ho andara nas casas sobradadas, nem nas trreas que andam limpas, nem fazem mal a quem anda calado; aos preguiosos e sujos fazem estes bichos mal, que aos outros homens no; porque em os sentindo os tiram logo com a ponta de um alfinete como quem tira um ouo ; e os queesfp?ehtr"as unhas, doem muito ao tirar; porque esto metidos pela carne, os quaes se tiram em menos espao de. uma Ave Maria; edrirtde saem fica uma covinha, em que pem-lhe uhs ps de cinza ou nada. e no se sente maisdr nenhuma; mas os preguiosos e sujos que nunca lavam ofe ps, deixam estar os bicheis 11'elles, onde vem a crescer, e. fazerem-rse tamanhos como camarinhase d'aquella cor; porque esto por deiltro todos cheios de lendeas, e come arrebentam vo estas lendeaslavrando os ps, do que se vem a fazer grandes Chagas. No principio da povoao do Brazil, vieram alguns homens a perder os ps, e outros a encherem-se de boubas, o que no acontece agora ; porque todos os sabem tirar, e no se descuidam tanto de si, como faziam os primeiros povoadores. D'aqui p^r diante vo arrumados os peixes que se criam no mar da Bahia e nos rios d'ella. Pois queremos manifestar as grandezas da Bahia d Tpdos os Santos,,a fertilidade da terra, e abastana' dos mantiTOMO xiv 36

^.- 254 -*mantos, frutos e caca d'ell, Converaquerie' saiba se; tem o; mar to abundoso d pescado e marisco como tem a terra1 d muito que se nrilla cria, como j fica dito ; e porque havemos de satisfazer, a es,ta obrigao, gastando um pedao em relatara diversidade de peixes que este mar e os rios qe n'elte entram criam, comecemos logo no capitulo seguinte. .' . .. /,'. '" "1 CAPITULO cxxv.
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Que trata das balas que se entram no mar da Bahia. Entendo que cabe a este primeiro capitulo dizermos das balas qu entram n Bahia (como do taaior peixe do mar d'ella), a que os indios chamam pirapu ; das qesentram na Bahia muitas eriro mez de Maio, qe o primeiro do invero n'aquellas partes/ndri andam at o fim deBzembr que se vo : e n'este tempo de inverno, que reiria atfo mez de Agosto, parem as fmeas abrigada da terra da - Babl,-, pela tormenta : que faz no mar largo, e trazem aqui os^filhos, depois que parem, trs e quatro mezes, que elles ter disposio para seguirem as mes pelo rar largo; e n'este tempo tornar as fmeas a emprerihar, ena a qual obra fazem grandes estrondos no. mar. ' E em quarito as balas andam n Bahia, foge o peixe do meio d'ella para os baixos e rconcavosfonde ellas no poder andar, as quaes s vezes pelo irerri seguindo do em secco, como aconteceu no rio de Piraj o anno de 1580, que ficaram n'este rio duas era secco, macho fmea, as quaes foi vr quem quiz ; e u mandei medir a feme, que ;estava inteira,- e tinha do rabo af. a cabea setenta e trs palmos de comprido, e dezasete dealto,fora que tinha raettido pela vasa^ em que estava assentada ; o macho era sm comparao maior, o que s no pde medir, por a este tempo estar* j despido da carne, quelhe tinhato levado para azeite; fmea tinhaa boca tamanha que vi estar um negro mettido entre um queixo e outro, cortando cora um machado rio beio debaixo com ambas as mos, sem focar no beio de cima; e a borda do beio erto grossa como um barril de seis almudes; e o beio debaixo sahia para fora mais que o de cima, tanto qup'Se podia arrumar de cada banda n'elle um quarto de meao ; a qual bala estava prenhe, tiraram-lhe de dentro un filho tamanho como um barco de trinta palmos de quilha; e se fez er ambas de duas tanto azeito que fartaram a terra d'elle-

255 dous annos. Quando .estas balas andara na Bahia acompanham-se em bandos de dez, doze juntas, e fazem grande temor aos que navegam por ella em barcos, porque andam urrando, e em saltos, lanando a gua mui alta para cira; e j aconteceu por vezes spedaarem barcos, em que deram com o rabo, e matarem a gente"drilles."
-, ' ' CAPITULO CXXVI.

Qu trata do, espadarte e de outro peixe no conhecido que. ../ deu costa.

Entram, na Bahia, rio tempo das balas, outros, peixes muito grandes, a que os indios chamam pirapic, e os Portuguezes espadartes, s quaes tem grandes, brigas com as balas, e fazem tamanho estrondo quando pelejam, levantando sobre a gua tamanho vulto e tanta drilla para cima, que parece de longe um navio vella; o que se v de trs e quatro lguas - de spap, e com esta revolta, em que andam, fazem grande espanto ao outro peixe mido ; com o qu foge, para os rios e recncavos da Bahia. Aconteceu na Bahia, em o vero do anno de 1584, onde chamam Tappam, vir um grande vulto do mar fazendo grande-mar ulho d/e diante apz o peixe min do que lhe yinha fugindo para'a terra, at dar em secco; e como vinha com muita fora, varou em terra pela praia, donde se no pde tornar ao mar por vazar a mar e lhe faitar a gua para nadar; ao que acodiram os vizinhos d'aquella 'Comarca a desfazer este peixe, que se desfez todo m azeite, como faz abala ; qual tinha trinta, e sete palmos de com-, prido, e no tiuha escama, mas couro muito grosso e gordo Como toucinho,, de cr verdoenga; o qual peixe era to alto e grosso qu tolhia a vista do mar, a quem se punha de traz drille; cuja cabea era grandssima, e tinha por natureza, um s olho o* meio da frontaria do. rosto;. as espinhas ossos eram verdoengas: ao qual peixe no soube ningum o norne, por :no haver entre os indios nem Portuguezes quem soubesse dizer que visse nem ouvisse que o mar lanasse outro peixe como este fora, de que se admiraram muito. ,

CAPITULO CXXVII.
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Que trata.dos homens marinhos. No ha duvida seno que se encontram na Bahia e nos reeoncavosdrilla, muitos homens marinhos, a qrie os indios chamara pela sua lingua pupiara, os quaes andam pelo rio d'aguadc pelo tempo do vero, onde fazem muito' damno aos indios pescadores e mariscadores qrie andam em jangadas, onde os tomam, e aos que andam pela borda da ag, metfidos n'ella; a uns e outros apanham, e mettemn'os debaixo d'agua onde os afogam: os quaes sahem terra Com a mar vazia afogados e mordidos na boca, narizes e na s rifura;- e dizem outros indios pescadores que viram tomar estes mortos que viram sobre\agua uma cabea d homem lanar um brao fora d'ella levar o morto ;* os que isso Viram se recolheram fugindo , terra assombrados, do que ficaram to atemorizados que no quizeram tornar a pescar d'ahi a muitos dias ;, o que tambm aconteceu a alguns negros de Guin; as quaes fantasmas ou homens marinhos mataram por vezes cinco indios meus; e j aconteceu tomar um monstro d'estesdous indios pescadores de uma jangada e levarem um; e salvar-s outro to assombrado qrie esteve para morrer; e alguns rorrem disto. E um mestre de assucar do meu engenho affirmo.u que olhando da janella do'engenho que est sobro o rio, e^ que gritavam -umas negras, uma noite, que estavam lavando umas frmas de assucar, viu ura vulto maior queur homem borda d'agua, mas que.se lanou logo' n'lla; ao qual mestre de assucar as negras disseram que aquella fantasma vinha para pegar nrillas, e que aquelle era o, homem marinho, as quaes estiveram assmbradas"muitos dias; e d;'estes acontecimentos acontecem muitos no vero, que no inverno no falta nunca nenhum negro.
, CAPITULO CXXVIII.

Que trata do peixe serra, tubares, toninhas, e lixas. Aragogpay , chamado pelos indios o peixe a que os Portuguezes chamam peixe serra ; s quaes tem o couroe, feio dos tubares, mas tem no focinho uma espinha de" osso muito dura, com dentes de ambas as bandas,mui grandes, uns de meio palmo,,, e outros de mais, e de menos; se-

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gundo o peixe, a espinha de seis, sete palmos de comprido, os quaes se defende com ellas dos tubares e de outros peixes. Estes se tomam com anzes de cada com rpoeiras compridas, que lhe largam para quebrar a fria e se vazar dp sangue. Este peixe naturalmente secco, e fazemh'o em tassalhos para se seccar, que serve para a gente do servio; e tem tamanhos, figados, qu se tomam muitos de cujos fgados, se tiram trinta a quarenta canadas de azeite, que serve para a candeia e para concertar o breu para os barcos. ' Uperu o peixe a que os Portuguezes chamam tubaro, de que ha muita somraa rio mar da Bahia ; estes comem gente, se lhe chegam a lano, e andam sempre caa do peixe mido ; aos quaes matam com anzes de cada com grandes arpoeiras, como o peixe serra, em ris quaes acham pegados "os peixes romeiros, comomos d mar largo; cuja s carne comem os indios, e em tassalhos seccos se gasta com a gente dos engenhos, qsquaes-tem tamanhos fgados que ^ se tira drilles vinte, e vintriqatro canadas de azeite; cujos ' dentes aproveitar os indios, que os engastam nas pontas 'das flexas; eos qu os tem so muito estimados d'elles. Por tempo de calma apparecem no mar da Bahia toninhas, a que os indios chamam pojuji, das quaes tambm foge o peixe mido para os recncavos; mas no se faz conta drillas p-ar as matarem em nenhum tempo. No mar da,Bahia se criam muitas lixas maiores qe as de Hespanha, que apparecem em certmonso do anno, as quaes tem tamanhos figados que se tira drilles quinze^e. vinte canadas de azeite, as qaes andam ao longo da rea onde ha pouco fundo, e tomarn-n'as com arpos, o que esperam bem ; e seccas e escaladas servem para a gente dos engenhos, e para matolotagem da gente que ha de passar o mar. ' ,,
CAPITULO

cxxix.

Que trata da propriedade do peixe boi. Goargo o peixe a que os Portuguezes chamam boi, que anda na aga salgada e nos rios junto da gua doce, de que elles d)ebem ; e comem de uma herva mida como milha qe se d ao longo da gua ; o qual peixe tem o corpo tamanho como um novilho de dous annos, e tem dous cotos como braos, e n'lles umas mos sem dedos; notem ps,

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mas-ter p rabp ,, feio,depeixe e cabea e focinho cornos boi; ter. o corpo rutio macio, duas goellas, ,e uma si tripa; o qual ter s figd/ps eJb.pfs e.ainais-forura como; boi, e tudo rito'bom.';.ho ter,'cscm^v^ra&^^l^.-^arta^ grossa. A estes peixes se^ mata,cm'.ri^oqstoriltM g,r|? des, atados a grandes arpoifs ri fortes,' e"n cabo d^ella^ afado um barril ou outra boia, porque lhe/largam om oarpo a arpoeira, e o arpador vai em uma jangada seguindo; o rsto do barril ou boia, que o peixe leva afrz de si com muita fria, at que o peixe se vasa, todo deriange, e sri ver acima da gua morto ; o qual levara atado . terra oii ao barco, onde o esfolam como novilhof cuja carne muito, gorda e saborosa : eterno rabo "como toucinho ser'for n'elle nenhuma carne magra, o qual derretem como. banha de porco,, e se desfaz todo em manteiga, .que serve para tudo o para que presta a de porco, e tem muito melhor sabor:, a carne d'este peixe em fresco cozida com couves sabe carne de vacca, esalpreza melhor, e adubada parece e tem o sabor de carne de porco ; e feita em. tassalhos, posta d fumo faz-se, muito vermelha, parece e tem o sabor, cozida, de carne de porco muito boa ; a-qualse faz muito verrelha e feita toda em fevrs com sua gordura misturada; e em fresca e salpreza, e de vinha d'alhos, assada parece lombo de. porco, e faz-lhe vantagem no sabor ; as mos cozidas driste peixe so Como as de porco, mas tem mais qu cor mer; o qual tem os dentes como boi, e na cabea entre os miolos tem uma pedra tamanha Como um ovo" de pata,, feita, era trs peas, a qual muito alva e dura como marfim, etem grandes virtudes contra a dr- de pedra: as fmeas parem uma s criana, e tem o seu. sexo como outra alimaria; e os machos tem os testculos- e' vergalho como boi; na pelle no tem cabello ner'escama. CAPITULO cxxx. Que .trata dos peixes pesados e grandes. Beijupir o mais estimado peixe do Brazil, tamanho e da feio do solho, e pardo na cr : tem a cabea grande e gorda como toucinho, cujas escamas s grandes: quando este peixe grande, -o muito, etem saborosssimo sabor: a sua cabea quasi massia, cujos ossos so muito tenros, e desfazem-se na boca m manteiga todos ; as fmeas tem: as ovas arnarellas, e cada uma enche um prato grande, as

259 quaes so muito saborosas. Andam estes peixes pelos baixos 'ao longo d ar, aonde esperam bem que os arpem;' tambm morrem linha, mas ho lhe ir andando com a linha para comprem a isca, e assim, a vo seguindo at que chem ao anzol, onde no bolem comsigo; e porque ha phririos indios que os saibam tomar, morrem poucos. Tapyrsi outro peixe assim chamado pelos indios, em cuja lingua quer dizer olho de boi, pelo qual nome d nomeam os Portuguezes; este peixe quasi da feio do beijupir, seno quantp mais barrigdp, o qual tem tambm grandes ovas e mito-bpas; e morrem linha, e muito saboroso e de grande estima. Camuropi outro peixe muito prpzado e saboroso, taraho como uma pescada muito grande e da mesma feio, mas cheio de escamas grossas do- tamanho da palma* d mo, e Outras mais pequenas; e cortado em postas, est arrumRdo,umito d espinhas grandes, e outrp, de carne, eno cabo tem muitas juntas como o svel; as fmeas tem ovas tamanhas que enchem um grande prato cada uma drillas; e quando, este peixe gordo mui saboroso ; o qual morre linha no. vero ; e so muitos d'elles tama- nhos que dous indios no podem com um s costas atado em um p. Ha outro^peixea que os.indios chamam piraquiro, que so como os orcovados de Portugal, que se tomam alinha, os quas so ruito estimados.; porque, como so gordos, so muito saborosos em extremo. Carapitanga so uns peixes que pela lingua do gentio querem dizer vermelhos, porque o so na cr : os grandes so como pargos ; e os pequenos como gorazes, mas mais vermelhos Uns e otros,e mais saborosos ; os qaes morrem em todo o anno ; e quando esto gordos no tem preo,, e so mui sadios. Estes peixes morrem linha em honesto fundo, e ordinariamente em todo o anno morre muita somma drilles, os quaes a seu tempo tem ovas grandes, e muito gostosas, e salprezo estimado. CAPTULO cxxxi.
-'"

Que trata das propriedades dos meros, cavallas, pescadas, e xars. - \ Cunap so uns peixes, a que chamam em Portugal meros, os quaes so mui grandes, e muitos morrem tara-

260

nhos que lhe caberia x na boca um grande leito de seis mezes; e por faanha se meteu j um negrinho de trs annos dentro, na boca de um 'estes peixes,vos quaes tem tamanhos figados como um carneiro, e salpimentados so muito bons ; e tem o bho tamanho como rima grande, cidra, o qual cozido e recheado dos figados tentmuito bom sabor ; o couro driste peixe . to grosso como ur dedo muito gordo, o qual se toma om qualquer anzol e linha,, sem trabalharem por se, soltar drille, e rio tempo das agUs vivas se tornam em umas tapages de pedra.s e de pos, a que os indios chamam camboas, onde morrem niuifos, osquaes salprezos so muito bons. Cupso uns peixes a, qe os Portuguezes charar pescadas bicudas que so pontualmente da feio das das ilhas Terceiras, mas muito inaiores e'maisgvestsas, as quaes se tomam linha; e salprezas d uto dia para outro, fazem as pqstas folhas como as boas pescadas de Lisboa.e em , ex-! tremo so saborosas. Garapic so unspeixes a que os Portuguezes chamar -cvallas, das quaes ha muitas que comeam a entrar na B*hi no vero com ps nordestes, rebolhm-se com elles, com a criao que desovaram naBahia- -S estes peixes'maiores que grandes pescadas, mas da fi e cr dossvis, ris' quaes no comem a isca estando queda ; pelo- que s pescadores vo andando semprp copi s jangadas; e codm ento isca, e pegam do anzol, que grande, por trabalhar riiuito como se sente prezo. "Este peixe muito saboroso, e, quando est gordo sabem as suas ventrechas a savel, cujo rabo gordissimo, e tem 'grandes ovas em extremo saborosas ; os seus ossos do focinho se desfazem todos entre os dentes era- manteiga ; e salprezo este peixe muito gostoso, ri se faz todo em folhas como pescada, mas muito avantajadon sabor e levido. Chamam os indios guiar, a que os Portuguezes chamam charo, qe peixe largo, branco, prateado e tezo,-o qual quando_ gordo em extremo saboroso ; e tem nas pontas das espinhas, nas costas, uns ossos alvos, atonelados,1 to grossos n meio como avels, toas compridos ; o qual peixe morre linha e em redes em todo- o nno, e alem de ser gostoso toito sadio.

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. CAPITULO CXXXII.

Em que se trata:dos peixes de couro que f\a na Bahia, Panapan uma casta, de caes, que m tudo o parecem, se rio quando tem na ponta do focinho uma roda de meio Compasso, de palmo e meio e de dous palmos, o qual peixe tm grandes figdps, como tubares; e os grandes tomm-s Com anzos de cada, os pequenhos linha*, e em redes de mistura Cor o outro peixe; comem-se ps grandes seccos em tassalhos, -e os pequenos frescos, e so muito gostosos eleves, frescos e seccos. Aos caes chamam os indios ,socori, do que ha inuitos ,na Bf hia, que se tomam: linha ;e com redes ; e ps*pequenos so mriilvese saborosos,-e ,uns e, outros no tem,na feio nenhuma differeri.- dos que. andam e se tomam em Hespanha, ," ' Ha outro peixe, a que os indios chamam curis,e os Portuguezes bagres:-, tem o couro prateado sem escama, tomam-se, Unha, tem a cabea como enxarroco, mas muito dura ; etm o miolo drilla duas pedrinhas brancas ; muito lindas ; este peixe s toma em todo o anno, e muito leve e gostoso.. ., , Ha outracasta de bagres, qqe tem a mesma feio, mas ter o couro amarello, a que ps indios chamam urutus, que 'tambm morrem em todo o anno linha, da boca dos rios para dentro at onde chega a mar, cujas pelles se pegam muito nos, dedos ; e no,so to saborosos como os bagres brancos. Chamam os indios s tooras caramur, das quaes ha i muitas, mui grandes e mui pintadas como as de Hespanha, as quaes mordem muito, -e tem muitas espinhasse so muito gordas e saborosas ; no as ha seno junto das pe. dras, onde as tomam s mos. Arraias ha na Bahia muitas, as quaes chamam os indios jabubir eso'de'muitas castas como as de, Lisboa ; e morrem alinha e era redes; ha umas' muito grandes e outras pequenas, que so muito saborosas e,sadias.

^ T O M O XIV

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CAPITULO' CXXXIII.

Qu$\ tfatia.- d0,no$urma;das qlbmoras., bonitos, dourados, corvinas e outros. Taepaprera, hht pfee que arremeda as corvinas de Hespanha, o qril mrr rio vero, da boca dos rios para dentro at onde chega a mar, e ter uma Cr amaella/ er fresco,, e tem a Crn mole, salprezo faz-se emfohjs oin Pescada muito/gostoso. Este peixe tem na cabaa metidas rios niolos ds ppdras ruito alvas do tamarihri 'de rim vintr, 0 morre linha; do que ha muito por este$ rios. Bonitos entram tambm na Bahia no vef rita somma, qri morrem- linha: so como os do mar largo, e tem^e r pouca estima. Tambm entram na Bahia no ver$> muitas douradas, que So d feio das do mar largo, mas mais seccas; morrem linha, e no havido por bom peixe, etem a espinha verde. No mesmo tempo entram ha Bahia muitas abaeoras, qe. osindios chamam caroat,: que so como as que seguem os navios, mas tem bichos nas ventrrichas.quese lhes tiram, que so como,os que se criam na carne ; o qual peixe secco e toma-se linha. Piracuca chamam os indios s garoupas, que i-o como as ds Ilhas, mas muito maiores ; tomam-se linha, tem o peixe molle, mas em fresco saboroso e sadio, e secco, tambm. Cmuris so os peixes, assim chamados pelos indios, que se parecem com os roballos.de Portugal,os quaes 'so poucas vezes gordos e nenhumas estimadas; morrem linha das bocas dos rios para dentro.at onde chega a mar. ' Abrteas morrem na Bahia, que so pontualmente como as das Ilhas Terceiras ; pescam-se onde o fundo seja de pedra; peixe molle, mas mi u to sadio e saboroso. Ha outros peixes na Bahia, a que s indios chamam ubaranas, que se parecem com tainhas, os quaes morrem em todo o anno linha, tem muitas espinhas < farpadas como as do savel, e peixe muito saboroso e sadio, Goaivicora so uns peixes que os.Portuguezes chamam roncadores ; porque roncam debaixo d'agua, dos quaes morrem em todo o anno muitos linha ; e . peixe leve e pouco estimado. Sororocas so outros peixes da feio e tamanho dos

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cbicharros, que vem no vero d'arribao Bahia, e ppoz elles as cavallas de que dissemos atraz ; * morrem a linha e sqde pouco estima-.Chamam os indios ao peixe agulha timu, que morrem linha no vero; e ha alguns de cinco*, seis palmos de comprido: so muito gordos e de muitas espinhas, as quaes so muito verdes; e h a d'esta .casta muitos peixes pequenos, de que fazem a isca para as cavallas. . s,, Maracuguara um peixe a que os Portuguezes chamam pprco; porque roncara no mar como porco: so do tamanho ieio dos srgos, mas muito carnudos e tezos.,e de bom sabor, e ter, grandes fgados e muito gordos e saborosos, e em todo o anno se toma este peixe linha. Chamam ris indios s tartarugasgiruca; e tomam-se muitas na costa brava tamanhas que as suas cascas.so do tamanho de adargas, as quaes pem nas aras infinidade, de ovos, dos quaes se comem somente as gemmas, porque as claras, ainda que estejam no fogo oito dias a cozer ou assar, no se ho de Coalhar nunca ; e sempre esto como as dos ovos crus de gallinhas.
CAPITULO CXXXIV. \ ;,-}(;

Em que se contm diversas castas de peixes que se tomam em redes. Alm dos peixes que morrem nas redes, de que fica dito atraz, se toma ririllas o que se contm n'este capitulo, que no morre linha. E comecemos logo do principal, que so as tainhas, a, que os indios chamam paratis, do que ha infinidade drillas na Bahia; com as quaes secas se mantm os engenhos, e a gente dos navios do Reino, de que fazem matalotagem para o mar. Estas tainhas se tomam em redes, porque andam sempre em cardumes; e andam na Bahia ordinariamente a ellas mais de cincoenta redes de pescar ; e so estas tainhas, nem mais nem menos, como as de Hespanha,mas muito mais gostosas e gordas, das quaes sahem logo em um lano trs, quatro mil tainhas, que tambm, tem boas ovas. E de noite, com guas vivas, as tomam os indios com umas redinhas de mo, que chamam pus,que vo atadas m uma vara arcada;e ajuntam-se muitos ndios, e tapam a boca de um esteiro com varas e rama, e como a mar est cheia tapam-lhe a porta ; e pem-lhe as redinhas ao longo da tapagem, quando a mar vaza, e outros

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batem na gua no cabo do esteiro, para qu se venham;! tds abaixo a meter nas redes: e drista maneira carregam uma canoa de tainhas, e de outro peixe que entra no esteiro. Ha outro peixe que,morre nas redes, a que. os indios chmm zabucai, e os Portuguezes gallo, o qual alvacento, muito delgado e largo, com uma boca pequenina, e faz na cabea unia feio como crista, e nada de peralt-; este peixe muito leve saboroso. , Tareira ;qur dizer enxada, que .o nome que tem : outro peixe que morre has redes, qu quasi quadrado^ muito delgado pela banda da barriga e grosso pelo lombo, o qual tambm, nada de peralto, e muito saboroso, e leve. Chamam os indios coirimas a outros peixes da feio-das tainhas, que morrem nas redes e que tem p mesmo*sabor, mas' so muito maiores; e quando esto gordas, esto cheias de banhas, e so' muito gostosas, e tem grandes ovsj as quaes morrem-nas enseadas. Arbri um peixe de, arribao, da feio das savelhas ! de Lisboa, e assim cheias de espinhas, as* quaes salprezas arremedam s sardinhas de Portugal no sabor ; e tomam-se em redes. Carapeba so/uns, peixes que morrem nas redes em todo o anno, que so baixos e largos, do tamanho dos sarguets, e em todo o anno s gordos, saborosos e leves.
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CAPITULO CXXXV.

Que trata de algumas castas de peixe medicinal. Jagoara um peixe qe morre linha, tamanho como Cchuchos, e tem a" cr de peixe cabra, e feio de salmonete ; tem os figados vermelhos como lacre : carne driste peixe muito teza, muito saborosa ; e so to leves que se do aos doentes. Tomam-se na Bahia outros peixes que so pontualmente na feio, na cr, no sabor os salmonetes de Hespanha, os quaes morrem linha junto das pedras; e so to leves que se do aos doentes. t" ' Piracaquem um peixe da feio dos safios de Portugal, o qual no tem escama; morre linha em todo o anno ; peixe saboroso, e muito leve para doentes. Bodiaense um peixe de linha, que se d na costas das

265 Ilhas, dos quaes h muitos na Bahia, peixe molle, mas muito-gostoso e leve. Atucupa so uns peixes pequenos, e largos como chopas, que morrem linha : e quando gordo muito saboroso,; estespeixesnascemnoinverno.com gua do monte; no co da boca tem uns carrapats, que lhe comem todo o co da boca, os quaes lhe morrem no vero em que lhe torna a encourar a chaga, .que lhe os Irichos fazem ; este peixe se d aos doentes. Goayibieoati so uns peixes azulados pequenos, que se tomam canna, nas, pedras, que so em todo o anno muito gordos e saborosos, e leves para doentes ; e outros muitos peixes ha;muito medicinaes para doentes e de muita substancia, que por no enfadar no dige drilles.
CAPITULO

cxxxvr.

Que trata da natureza de alguns peixes que se criam na lama e andam sempre no fundo. Urama ura casta de peixe da feio de lingoados de Portugal,' o qual se toma debaixo da vasa ou com redes, cujo sabor no muito bom; e se o cozem ou assam, sem o aoutarem, faz-se em pedaos. Nos arrecifes se tomam muito polvo, eso como os de Hespanha sem nenhuraa differena, a que os indios chamam caiacanga, os quaes no andam nunca em cima d'agua ; e tomam-se na baixamar de mar de guas vivas, nas concavidades que tem os arrecifes, onde ficam com. pouca agu ;'; e de noite se tomam melhor com faphos de fogo. Aimor um peixe que se cria na vasa dos rios da gua salgada, onde se tomam nas covas da vasa, os quaes so da feio e cr dos enxarrocos: e to escorregadios como elles, tem: a cabea da mesma maneira; so sobre o molle, mas muito gostosos cozidos e fritos, e mui leves ; as suas oVas so pequenas e gostosas, mas so to,peonhentas que de improviso fazem" mal alquem,as come, e fazem arvoar a cabea, de dr de estmago, e vomitar, e grande fraqueza, mas passa este mal logo. Chama o gentio aimoros a outros peixes, que se_cnam na vasa dos mesmos rios do salgado, que so da feio dos eirs de Lisboa, mas mais curtos e assim escorregadios. Estes quando esto ovados, tem as ovas to compridas que

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qriasi lhe chegara ponta do rabo, e%lj''muito saborosa, e o mesmo peixe; mas as ovas so prihentri, e de ir?* "proviso se acha, mal quem as come como as' dos aimors ; mas o peixe muito gostoso e sadio. Baiac um peixe que quer dizer sapo, da mesma r e feio, e mui peonhento, mormente a pelle, os figados e ri fel* ao qual os indios com fome esfolam, e tiramdhe o pe, nhento fora, ecomem-n'os; mas se lhes derrama rifei, u lhes fica alguma pelle, incha quem ri come at rebentar; cora os quaes peixes assados os indios matam os ratos,, os ;quaes andam sempre no fundo da# gua. Piraquiro Um peixe da feio de um ourio caeheirp; todos cheios de espinhos tamanhos como alfinterigrudes, os quaes tem pegados na pell por duas pontas cor que esto arreigdos; tomam-se em redes; os quaes andam sempre o longo da ara no fundo ; a quem os indios esfolam, e comem-lhe a carne. : Bacup um peixe da feio,do enxarroco.ns#hombrps e na cabea, mas tem a boca muito pequena e redonda; e dos hombros para baixo muito estreito, delgado e duro como nervo, e as perpatanas do rbso duras e grossas, e na despedida, do rabo tem duas pernas como rs, eriofim drillas duas perpatanas duras como as do rabo ; e debaixo na barriga tem dous bracinhs curtos, e n'elles maneira de dedos ; e tem as costas cheias de sarna como ostrinha, e da cabea lhe sahe um'corno de comprimento de um. dedo, mas delgado e duro como osso e muito preto,-e,o mais cr verrhelhaa; e tem na barriga debaixo das mos, dous buracris. Este peixe no nada, mas anda sempre pela ara sobre as mos, onde ha pouco gua ; ao qual os indios comem esfplado, quando no. tem outra cousa>
CAPITULO CXXXVII.

Que trata da qualidade de algUns peixinhos e dos camares. _Mirocaia um peixe, assim chamado dos indios, da feio de choupinhas, que se tomam canna nos rios do salgado : saotezos e de fraco sabor ; em cujas bocas se criam no inverno, com as cheias, uns bichos como minhocas, que lhes morrem nri vero. Piraquiras so uns peixinhos como os peixes ris de Portugal como as ruivacas de gua doce, os quaes se tomam na gua salgada em camboas, que so umas cercas de p-

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"^a80ar-one-^esteis-'peixIthiOS vem recolher fugindo do peixe grande, e ficam com a mar vazia dentro nas ps as, onde se enchem balaios d'elles: e em certo tempo tra* zem os indios dristes lugares sacos cheios d'estes peixinhos. Pequitisso uns peixinhos muito pequeninos que s, tomam em poas d'gua, onde ficam como a mar vazia,, ri so tamaninos que os indios assam mil juntos, embrulhar dos em umas folhas debaixo do burraho* e ficam depois d, assados todos; pegados, afeio de uma maaro*,. earapiaaba sOns peixinhos que, se tornam canna, QSr quasso redondos: cora o choupinhas, e pintados de pardo eaiffiarello,:e so sempre gordos e muito bons para doentes* E afora estes peixlnhoslia mil castas d,outros de que se, n faz meno, por escuzar prolixidade, ms est enten^ dio que,onde ha tanta diversidade de peixes grandes, haver muito mais ds pequenos. Potipemas chamam os indios aos camares, que so como os de Villa Franca, os quaes tem as unhas curtas, as barbas compridas, e so aborrrichados na feio ; tem a casca branda e so mui saborosos; criam-se estes nos esteiros d'gua salgada, e tomam-se em redinhas de mo, e nas redes gran-r des de pescar "vm de mistura, com o outro peixe.
CAPITULO CXXXVIII.

Que trata d: natureza dos lagoslms, e usss. oslagostins chama o gentio potiquequi ; os quaes so da maneira das lagostas, ms mais pequenos alguma cousa e em tudo o mais tem a mesma feio e feitio ; e criam-se ns concavidades dos arrecifes, onde se tomam em conjuno das guas vivas muitos ; e em seu tempo, que nas mars da lua nova, esto melhores que na lua cheia, em a qual esto cheios de coraes muito grandes as fmeas, e os machos muito gordos ; e para se tomarem bem estes lagostins, ha de ser de noite com fachos de fogo. O marisco mais proveitoso gente da Bahia so uns caranguejos a que; os indios chamam usss, os quaes so grandes e tm muito que comer-/e so mui sadios para mantensa dos escravos e gente do servio ; estes caranguejos se criam na vasa entre os mangues, de cuja folha se mantm, e tem coraes uma s vez no anno ; e como desovam pellam a casca, assim os rahos- como as fmeas, e nasce-lhes outra casca por baixo; e emqanto a tem molle

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esto por dentro cheios de leite, e fzera dr de barriga aos qe os comera ; e quando as fmeas^esto com coraes^ os machos esto mi gordos, tanto qu parece o. seu casco estar cheio de manteiga ; e quando assim esto so mui gostosos, os quaes se querem antes^assados que cozidos. Tem estes caranguejos no casco urri" fel grande, e bucho junto boca com que come, o qual amarga muito, e necessrio tirl-0 a tento; porque no faa amargar o mais. Estes usss so infinitos, e faz espanto *a quem atenta por isso, e no haver quem visse nunca caranguejos d'esta casta quando so pequenos, que todos apparecem e sahem das covas de lama, onde fazem a sua morada, do tamanho que ho de ser ; v das quaes covas os tiram os indios marisCadors com o brao nu ; e como tiram as fmeas fora as tornam logo a largar para qe no.acabem, efaam criao. Estes caranguejos tem as pernas grandes, e "duas bocas muito maiores com que mordem muito, em as quaes tem tanto que comer como as das lagostas ; e o que se drillas come e maisdo caranguejo, e muito gostoso. E no ha morador nas fazendas da Bahia que no mande cada dia rim indio a mariscar dristes caranguejos ; e de cada engenho vo quatro e Cinco d-estes mriscadores, cornos quaes do de comer a toda a gente de servio; e no ha indio dristes que no'tome cada dia trezentos e quatrocentos ,ca. ranguejos, que trazem vivos em um cesto serrado feito d verga delgada, a que os indios Chamam samur; e recolhem em cada samur dristes um cento, puc mais ou menos.
CAPITULO CXXXIX.

Que trata de diversas castas de caranguejos. ' Ha outros caranguejos, a qe os indios chamam serizes, que tem outra feio mais natural cora os caranguejos, de Portugal, mas so'muito maiores, e tem as duas bocas muito compridas e grandes, e os braos drillas quadrados, m o que tem muito que -comer. Estes*desovam em cada lua nova, em a qual as fmeas tem grandes coraes vermelhos, e os machos, os tem brancos, e esto muito gordos;-os quaes rins e outros tem muito que comer, e em todo o tempo so muito gostosos e sadios : criam-se na praia d'ara dentro ria agu, onde os tomam s mos, quando a mar enche, e no tem fel como os usss.

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Criam-se outros caranguejos na gua salgada, que os indios chamam goai : estes so compridos, e tem as pernas curtas e pequenas bocas: so ; muito.poucos, mas muito bons. , . Arats.so outros, caranguejos ^pequenos, como os de Portugal, que se tomam no rio detacavem em Lisboa; criam-se entre os mangues, de cuja folha e casca se mantm, e sempre lhe esto roendo nos ps; dos quaes ha infinidade, mas tem a casca molle ; ri em seu tempo, uma vez no anno, tem as fmeas coraes, e Ps machos .esto muito gordos ; uns e Outros so sadios e gostosos. Ha outros caranguejos^ a que os indios chamam goaia* rara, qe se criam nos rios, onde a gua doce se mistura com a salgada,-os quaes sorui lizos e de cr apavonada, e tem casco redondo, as pernas curtas, e so poucos e gostosos. ' , ' Goaiss so outros caranguejos que Se criam dentro d'ara, que se descobre na vasante da mar, os quaes so pequenos e brancos, e tem as covas mui fundas ; e andam sempre pelas praias, em quanto np vm gente, e como a sentem se mettem logo nas covas: e aconteceu j fazer um indio tamanha cova,para\tirar um dristes caranguejos, que lhe cahiu ara era cima,:.de maneira que no pde tirar a cabea e afogou-se ; no que os indiostomam tanto trabalho, porque lhes serve este goaiauss drisca, que o peixe come bem ; os quaes tem a casca muito molle ordinariamente, e no se comem por pequenos.
CAPITULO CXL.

Que trata das qualidades das ostras que ha na Bahia. As mais formosas, ostras que se viram so as do Brazil; e ha infinidade drillas ; como se v na Bahia, onde lhe os indios chamam leriu, as. quaes esto sempre cheias, e tem ordinariamente grandes miolos ; e em algumas partes os tem tamanhos qu se no podem comer seno cortadas em talhadas, as quaes cruas, assadas e fritas so muito gostosas; as-boas se do dentro da vasa no galgado, e pelos rips onde se junta a gua doce ao salgado se criara muitas na vasa, e muito grandes, mas quando ha gua do monte, esto mui doces e sem sabores. E ha tantas ostras na Bahia e em outras partes, que se carregam barcos drillas muito, grandes, para fazerem cal das cascas, de qup s faz ; muita e
TOMO xiv
38

270-'

muito boa para as obras, a qual muito alva ; e ha engenho qu se gastou dris obras d'elie mais de. trs mil moios de cal dristas ostras : as-qaas so multo mais Sadias que as de Hespanha. Nos mangues se Criam outras ostras pequenas, a que os/ indios chamam lerimerini, e criam-se ns raizes e ramos drilles at Onde lhes chega a mar de premar ; as quaes raizes e ramos esto to cobertos dristas- ostras, que seno enxerga o po, e esf Umas sobre utfs,; as quaes^ so pequenas, mas, mui to gostosas; e nunca s acabam, porque tiradas umas, logo lhe nascer outras ; e em todo o tempo so: muito boas e ruito leves; < " Ha { outras ostras, a que os ndios chamam leripebas, qu: s criar era baixos de ara de'poca gua, as quaes do como as' salmoinas, que se criam rio rio de Lisboa, de-, fronte do Barreiro, da feio de vieiras. Estas leripebas so tira marisco de muito gosto, e esto na conjno da lua nova muito cheias, cujo miolo sobre o tezo e* muito excllente; eto as quaes se acham grs.de aljofar pequenos, e criato-se logo serras dristas leripebas urnas sobre as outras, muito grandes : e j aconteceu descer com a mar, serra drillas at defronte da cidade, com que a gente drilla e do seu limite teve que comer mais de dous annos.
CAPITULO CXLI .-

Que trata de outros mariscos que ha na Bahia.

. ,

Na Bahia se criam outras sortes de marisco; mido debaixo da ara, Primeiramente sernarabis marisco qe se cria na vasa, que so cotoo as ameijoas grandes de Lisboa; mas tem a casca muito redonda e grossa, e teto dentro grande miolo de cr pardaa, que se come assado e cozido, mas o melhor driste marisco fritov; porque se lhe gasta do fogo a muita reima que tem, e um cheiro fortum que assado e cozido tem ; e de toda a maneira este marisco prezado. Em os baixos da ra que tem a Bahia se cria outro marisco, a que os indios chamam tarcobs, que So d feio tamanho ds ameijoas de Lisboa, e tem' o mesmo gosto e sabor, assim cruas coma abertas no fogo ; ris quaes se tirar < de baixo da ara, e tem-se em casa na gua salgada vivas, quinze e vintedias, as quaes, alm de serem maravilhosas ri sabor, so muito leves.

271 Criam-se na. vasa da, Bahia Infinidade de mexilhes, a qiie os indios Chamam sururs, que so da mesma feio e (tamanho,e sabor dos mexilhes de Lisboa, os quaes tpm carangueijlnhos dentro, e o mais que tem os de Lisboa"; e com a minguante dalua estp muito.cheios. Dos berbiges ha grande multido na Bahia.^nas praias , da ara, a que os ndios chamam sarnambitinga/que. so da mesma feio dos de Lisboa, mas tem a casca mais grossa* e s, mais pequenos,; comem-se abertos no fogo, eso mui gostosos, e tamber crus; mas tem um certo sabor, que requima algum tanto na lingua. Nas enseadas da Bahia, na vasa drillas, se cria outro marisco, a que os indios chamam guaripoapm, a que s Portuguezes dizem lingoeires, os quaes e,o t compridos como um dedo ri mais, ri da. mesma grossura, e tem um miolo grande'e mui gostoso, que se come aberto no fogo; e a casca se abre como-a das ameijoas.
,-T-v CAPITULO C X L I I .

Que trata da diversidade de bzios qae se criam na Bahia.,


' i .

Tpue so uns bzios tamanhos de palmo e meio,. que tem unia borda estendida para fora no comprimento do bzio de um coto de largo, os quaes so algum tanto baixos, e tem,grande miolo; que os indios comem, mas muito tezo ; os quaes bzios servem aos indios de buzinas, e criam-se na, ara'; no miolo tem uma tripa cheia drilla, quese lhe tira facilmente. Ha outros bu-zios, a qp os>indios chamam oatap, que so tamanhos como uma grande cidra, e pontagudos no fundo, erolicos com grande boca ; estes tem. grande.miplo bom para comer, e algur tanto tezo, o qual tem uma tripa cheia d ar, que se,lhe tira bem. A estes buizos furamos indios pelo p por tangerem com l-l-es, e np ha_ barco que po tenha um, nem casa de indios onde no haja trs e quatro,' com qe tangem, os quaes soam muito mais que s buzinas ; e criar-se estes bzios na ara. Tambm se criam na ara outros bzios de trs quinas, aqueosindios chamam oapuau, que so tamanhos como uma pinha e-maiors; e no que a boca abre para fora sao mui formosos, cujo miolo grande e saboroso, sobre o tezo, onde tem uma tripa cheia de ara; tambm servem de buzinas aos indios. ::

272 * -

Ferigoas so Outros bzios, qu se criam n ara, tamanhos como nozes e maiores ;' so brancos, cheios de bichos \ muito bem afeicoados, os quaes tem ur miolo dentro, ique cozidos ri assados, se lhes tira com a ro muito bem;-e tem uma tripa cheia de ara fcil de se tirar. Este marisco , de muito gosto e leve, de que ha muita somma, e com tormenta lanca-os o mr fora nas enseadas. '"'&'' > Ha outros bzios, a que os indios chamam tieoarapua, tamanhos como um ovo, cm um grande bico no fundo, e so muito alvos, lavrados'em caracolpor fora: tem miolo grande cora tripa como estriutros; que se lhes tira, o qual muito "saboroso ; e s criam tambm'na r; do que ha muita quantidade. Saurauna outra casta d bzios, que criam na ara,, tamanhos como pefaspardas, que so '.speros por fora, e tm grande miolo, mas sobre o1 duro,.e tambm tem tripa de ara. , ; ' . . . H outros bzios, quese criam na ara, a que os indios Chamam' oacar, que so muito lizos, e pintados por fora, os quaestem grande miolo, e sobre tzo, Estesbuzios so os com que s mulheres burnera e assentam as,costuras. Ticoeraunaso uns bzios pequenos da feio de caramujos,pintados p r fora, outros compridos,, tamber pintados, que rvem de tentos, os. quaes se. criam nas folhas dos mangues como caraces ; e cozidos tiram-se com- alfinetes como caramujos, eso muito bons e saborosos. Outras muitas castas ha dristes buzioripequenos, que por atalhar ' prolixidade se no diz aqui drilles. '
CAPITULO CXLIII.

-Em qu? contm algumas stranhezas que o mar. cria na Bahia.-: Assim como se ria terra criam mil immundicias de bichos prejudiciaes ao remdio da vida humana, como atraz no titulo das alimarias fica declarado, da mesma maneira se criam no mar, como, se ver pe,l quenriste Capitulo,se . contm. Pind chamam ps , indios aos ourios que s crian no mar da Bahia, que so como os da costa de 'Portugal, os , , quaes.se criam; em pedras; e no usa ningum drilles para. se comerem, nem para outra cousa alguma qe aproveite para nada. ; < : Lana este mar fora muitas vezes, com tormenta, umas

273

estrellas da mesma feio e tamanho das que lana o mar de Hespanha, as quaes no.servem para nada, a que os indios chamam jac., - ' -, Tambm este mar lana fora pelas praias alforreas ou coroas de frades, como aqueflas que sahem no rio d Lisboa na praia de Belm ri em outras partes; e na Bahia sahm s vezes juntas duas, etres mil drillas, a que os indios chamam muciqu n ;Mitasyzes's acha pelas praias da Bahia rima cousa preta, mui liada comp fgado de vacca, cora o que se enganaram muitos homens cuidando sr mbar, e uma gua morta, segundo opinio dos mareantes. Tambm deita o mar por estas praias muitas vezes esponjas, a que os indios chamam itamanbeca, as quaes se criam no fundo do mar, drinde umas sahm delgadas e molles, e outra tozas e aperfeioadas. Aos guzans chamam os indios ubiraoCa, do qual no de espantar furar a madeira dos navios, pois fura as pedras, onde no acha pos, as quas se acham cada hora lavradas drilles, efuradas de uma banda e outra; esteguzano _ rim bicho molle e comprido como minhoca,e da mesma feio; e tem a cabea e boca dura, o ; qual s cria em-uma casca rolia, retorcida, alva edura,como bzio, com ella faz as obras e damno to sabido; e para roer no lana fora drista casca mais qu aboca, com qu faz o caminho diante drista sua camisa, que corpo do bicho de dentro manda para onde quer; e para este guzano no fazer tanto damno nas embarcaes, permittiu a natureza que que se cria na agria salgada morra entrando ria gua doce, e o que se cria na doce.morra na salgada.. Na,Bahia houve j muito, mas j agora no vha tanto que faa mal aos navios e outras embarcaes. , i Nas redes de pescar sahem s vezes umas pedras brancas, que fizeram j aos homens tererri pensamentos qe era coral branco, por se criarem no fundo do mar, soltas, feitas em castelletes alvissimos", que so to delicados, lindos, e de tanto artificio, que corisa estranha, os quaes , so muito duros e resplandecentes ; e dizem alguns contemplativos que se criar dos limos do mar, porque se acham alguns muitas vezes enfarinhados de ara congelada e dura, e elles mui brancos, mas no ainda aperfeioados, como cousa .que se vai criando.

- ^_ .274
; -, CAPITULO CXL1V.

"Quetrtjada natureza ~e feies do peixe de'gua doce. No menos so de notar os pescados, que se criara nos rios de gua doce da Bahia, que os que se criam no mar drilla";' dp que bem que digamos d'aqui por diante..' _. E comecemos das eirs, que ha. n'esteS rios, fl;ue se criam debaixo das pedras, a que os indios chamam mocim, as quas so da feio, e sabor,das de Portugal. Tareiras so peixes tamanhos como mgehs, ; maiores; mas so pretos, da cr dos enxarrocos, e tem muitas espinhas, s quaes se tomam linha, nos rios de aga doce: tem boas ovas e nenhuma- escama: do que ha grandes pescariasJ ,, . - . _, Jquis chamar os indios a outros peixes da feio dos safios de Hespanha, mas mais pequenos,; os quaes se tomam s mos, entre "as pedras ; o qual peixe.no tenr.escama, e mui saboroso." , '' Tamoats so outro peixe,dristes rios que se no escama, por terem a casa mui grossa dr,ri,que se lhe tira fora inteira depois de .assados ou cozidos, ris quaes se tomam linha; e peixe mido, muito gostoso esadio,. ' Piranha quer dizer tesoura : peixe de rios grandes, onde o ha, muito ; e da feio dos sargos, e toaior, de cr mui prateada ; este peixe muito gordo e gostoso, e toma-se linha ; mas tem taes dentes, que corta o anzol cerceo ;' plo que os indios se no atrevem, ametter nrigua onde ha este peixe; porque.remete a eljes muito morde-os cruelmente; se lhes alcanar os genitaes, lev-lhes cerceos, e o mesmo: faz caa que atravessa ris rios onde este peixe anda. Querico um outro peixe de gua doce da feio das savelhas, e tem as mesmas espinhas e muitas, e muito estimado e saboroso,, o qual peixe se-fo,m,a linha. '. Cria-se nristes rios outro peixe, a que os indios chamam oaquari,que so dp tamanho e feio das choupas de Portugal, mas tem o rabo agudo, a, cabea' toettida nos hombros "e duas pontas como cornos ; e tem* a pelle grossa, a qual os indios tem por contrapeonha para mordedras de cobras e outros bichos, 0 qual ;se toma cana. '',' Tomam-se n'estes rios outros peixes,, a que os indios chamam pib, que So pequenos, da feio dos paches do

275 firi de Lisboa, o qual peixri, saboroso e de. poucas espinhas. ,. - . ( Tmbem se tomam nristes rios cana outros peixes a que os indios chamam maturaqu,, que so pequenos, largos e muito saborosos. '-..', Ha outros peixes nris rios a que os indios chamam goarara, que so Como rivacas, e t e r n a barriga grande, os quaes se tprm cana. ' Acars so outros peixes d rio, tamanhos como bezugos, mas ter o focinho mais comprido, que peixe muito, saboroso ; o'qual se tor cana. Ha outras maltas,cristas de peixerinos rios de gua doce, que para se escrever hovera-s de tomar muito.de.propsito mui largas informaes, irias por ora deve de bastar o que est, dito para .qe possamos' dizer de algum marisco que se cria na aga doce.
CPT-ULO CXLV.

Qu trata do marisco que se cria na gua doce.Assir como a natureza criou tanta diversidade de mariscp na agu salgada, fez o mesmo ns rios alagas da gua doce, como se ver pelos mexilhes qe se criar nas , pedras dristes rios e no fundo das lagoas, que so da feio e tamanho ds do mar, os quaes. no so to gostosos por serem doces. '- ' Tamheirise criam nas pedras d'estes' rios caramujos maiores que os do mar e compridos, a qe os indios chamam spicaret. -' ' ' - No fundo das lagoas, nas lamas drillas, se criam ameijoas redondas que tem grande miolo, a que os indios chamam como as do mar, as quaes so, pelo lugar onde nascem, muito ensocas. ' Mais,pelo' serto s. criam,'nos rios grandes, rauito mexilhes de palmo de comprido e quatro dedos de largo, que so pela banda de dentro da cr e lustro da madre prola, que "servem de colheres aos ndios, os quaes tem grandes miolos, que por serem de gua doce riao so mui gostosos como s do mar. Tambm se criam nristes rios muitos e mui diversos camares, ds quaes diremos o qu foi possvel chegar . nossa noticia; comeando primeiro dos mais geraes, que os indios chamam potim, queso muitos, do tamanho dos grandes de

Lisboa, mas so mais grossos e tem as barbas curjas, os, quaes se criar entre as pedras das ribeiras e entre raizes das arvores; qus vizinham com a gua, e em quesquer hervas: que s criam na gua; de que os indios se aproveitartornando -os s mos; e so muito saborosos. Ha outra casta de camares, a que os indios chamam , aratem, que so da mesma maneira dos primeiros,, mast mais pretos,, na cr, e tem a casca mais dura, que s criar e:tomara.da maneira dos de cima, os quaes cozidos s .muito bons. '-''',.' , .-..,. N'esta"s ribeiras se, criara outros carares a qu os ndios chamam arature, que tem pequeno corpo e duas bocas; coro alacros e a cabea de cada ura tamanha como o Corpo, os quaes se criam em pedras no cncavo drillas, e da terra das ribeiras,, qe so muito gofetqsp|,e tomam-se s
mos. .., ''
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Potiuac so uns camares que s criam ns cavidades das ribeiras, e tem tamanho corpo corap s lagostins, e Q pescoo da mesma maneira; tem "a casca nedia e as pernas curtas, os quaes criar coraes em Certo terpo, eem outro terno casco gordo como lagostas, que s tambm tomam as mos, e so muito saborosos; e estes e ps.mais no so nada carregados. , A, 7; '-;
CAPITULO CXLVI.

Em que se declara a natureza dos caranguejos do mato, Andei buscando at agora onde agazalhar os caranguejos do mato, spra lhes achar lugar coramodo, porque para os arrumar com os caranguejos do mar parecia despropsito, pois se elles criam na terra, sem verern nem tocarem gua domar; e para os contar; cora os animaes, tambm parece qri lhe no cabia esse lugar, pois se parecem com o marisco do mar; e por no ficarem, sem gazalhado nristas lembranas, os apzentei na.vizinhana do marisco d terra; ainda quese no criam riagua estes caranguejos, ms em lugares humidos por todas as ribeiras.. , ; A estes caranguejos da terra chaim-m os indios guoanham, os quaes se criam em vargeas hmidas, no muito longe do mar, mas na vizinhana da gua doce, o quaes' so muito grandes e azues, cm o casco e pernas mui lu; zentes; os machos so muito maiores que as'fmeas, ri; tamanhos qe tem ps, braos grandes, onde tem as bocas

277"'
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com tamanhos bicos nrillas, e to compridos e voltados que faz com elles tamanha apparencia como faz o dedo demonstrativo, da, mo de lim homem com o pollegar, o que to duro om ferro, e onde pegam com esta boca nolargam at os no matarpm. Criam-s estes caranguejos em covas debaixo, da terra, to fundas que com trabalho se lhe-pde ^chegar com o brao e.riombro de um indio metidos n'ella, onde os mordem mui valentemente. No mez de Fevereiro esto as fmeas, e at meado de Maro, todas cheias de coral mui vermelho, e tem tanto no casco como uma lagosta, o qu.al e tudo o mais , muito gostoso; tirara-lhe o fel ou bucho que tem,, cheio de tinta preta muito amargosa; .porque, se se derrama faz-amargar tiido o por:onde elle chegou.' No mez de Agosto, que no cabo do inverno, se sahem os machos e fmeas ao sol, com o que anda a terra coberta .drilles; em o qual tempo se sahem ao sol passeando de uma parte para outra, e so ento bons de tomar ; enrista conjunco andara os machos to gordos que tem os cascos ,N cheios de urna amarellido como gemas de ovos, os quaes , So mui gostosos maravilha, mas so carregados ; e para ,,os indiosos tirarem das covas sem trabalho, tapam-lh'as comum rlho de, hervas, com o que elles abafam na&Co: ' .Vas, e s vem para tomar r, e por no acharem caminho desempedid morrer boca da cova abafados. Algumas vezes morreram pessoas de comerem este guanham, e dizem os indios que no tempo em que fazem ml comem uma * fruta, a que chamam ariticurana, de que j fizemos men,q,; a qual peonhenta. "'.. Daqui por diante se trata da vida e costumes^ do gentio d ','" ' ' " terra da Bahia. . -- . , ' . J era. tempo de dizermos quem'foram os pvqadores e ' possuidores drista terra da Bahia, de que se tem dito'tantas maravilhas, e quem so estes Tupinambs to nomeados, cuja vida e costumes temos prometido por tantas vezes nriste tratado, ao qe comeamos satisfazer d'aqui por diante.
CAPTULO CXLVII.

Que traia' de quaes forarn os primeiros pvoadores da Bahia. , Os primeiros pvoadores que viveram na Bahia de Todos os Santos e sua comarca, segundo as'informaes quese
TOMO xiv **

27&- :

tem tomado dos indios muito antigos, foram os Tapuias, que uma casta de.gentio muito antigo, de quem diremos ao diante em seu lugar. Estes Tapuias foram- lanados fora da terra da Bahia e da vizinhana do mar d'ela, por outro gentio se contrario, que desceu dp serto, fama da fartura da terra e mar d'est provincia, que se chama Tupinas;' e fizeram guerra um gentio a outro; tanto tempo quanto gastou para os Tupinas vencerem e desbaratarem aos Tapuias, lhris fazerem despejar a ribeira do mar, e irera-se para o serto, sem poderem tornar a possuir mais esta terra de que eram senhores, a qual os Tupinas possuram e senhorearam muitos annos,stendo guerra ordinariamente pela banda do serto com Tapuias, primeiros possuidores ds faldas do mar; e chegando noticia dos Tupinambs grossura e fertilidade drista terra, se ajuntaram e vieram d'alm do rio de-S. Francisco descendo sobre a terra da Bahia, que vinham senhorndo, fazendo guerra as Tupinas que a possuam? destruido-lhe suas aldas-e roas, matando aos que lhe fzim rosto, sem perdoarem a ningum, at que os lanaram fora'das visi-, nhanas d o m a r ; os quaes se foram para o serto e despejaram a terra aos Tupinambs, que a ficaram snhoreando. E estes Tupinas se foram pr em frpntaria com ris Tapuias seus contrrios,, os quaes faziam crua guerra com forri da qual os faziam recuar pela terra dentro, por se afastarem dos Tupinambs que os apertavam da banda do mar, de qu estavam senhores,, e assim foram possuidores drista provincia da Bahia muitos annos, fazendo guerra a seuS' contrrios cm muito esforo, at vinda dos Portuguezes a ella : dos quaes Tupinambs e Tupinas se tem tomado esta informao, em cuja memria andam estas, historias de gerao em gerao.
CAPITULO CXLVIII.

Em que se declara a proporo e feio dos Tupinambs,\, 1 como se dividiram logo. " > ">, Os Tupinambs so > homens de me,estatura, de cr muito baa, bem feitos e bem dispostos, ruito alegres do rosto, e bem assombrados: todos tem bons dentes,- alvos, midos, sem lhe nunca apodrecerem ; tem "as pernas bem feitas, ris ps pequenos; trazem o-cabello da cabea sempre aparado, em todas as outras partes do corpo,os'n*o co.nsen-

279 tem e os arrancam como lhes nascem: so homens de, grandes foras e de muito trabalho ; so muito belicosos, e..em-sua .maneira esforados, e para muito, ainda que atraioados : so muito amigos de novidades, e demasiadamente luxuriosos, e grandes caadores e pescadores,, e amigos de lavouras. Como se este gentio viu senhor da terra da Bahia, dividiu-se era bandos.por certas, differenas que tiveram'uns com os outrps;, e assentaram suas aldas apartadas, com o que se iniraizaram ; os qe se apozentaram entre o,rio de S. Francisco e o rio Real se declararam por inimigos dos que se apozentaram do rio Real at Bahia, e faziam-se cada dia cruel guerra, e comiam-se-: uns aos outros ; e os que cativavam, e a que davam vida, ficavam escravos dos vencedores. os moradores da Bahia da banda da cidade se declararam por inimigos dos outros Tupinambs moradores da outra banda da Bahia,no limite do rio de Paraguass e do de Seregipe, efazim-se cruel guerra uns aos outros por mar ; onde sedavam batalhas navaes em canoas, com as quaes faziam ciladas uris aos outros, por entre as ilhas, onde ha-via grande mortandade de parte a parte, e s comiam, e faziam escravos uns aos outros, no que continuaram at o tempo dos Portuguezes.
CAPITULO QXLIX. .

Que trata de como se dividiram os Tupinambs^ e se passaram d'ilha de Taparica e Jella a Jaguaripe. Entre os Tupinambs moradores da banda da cidade armaram desavenas uns com os outros, sobre uma moa que um tomou a" seu pai'por fora, sem lh'a querer tornar ; com a qual desavena se apartou toda a parentella do pai da moca, que eram indios principaes, com a gente de suas aldas* e passarani-se ilha de Taparica, que est no meio da Bahia, cornos quaes se lanou outra muita gente, e en--. corporaram-se com os visinhos "do rio Paraguass, e fizeram guerra aos da cidade, a cujo limite chamavam Caramure ; e salteavam-se uns aos outros cada dia, e ainda hoje em dia ha memria de unia-ilheta; que se chama a , do Medo, por se esconderem detraz drilla; onde faziam ciladas uns aos outros com canoas, em que se matavam cada dia muitos drilles. '

80 '

Dristes Tupinambs, que se passaram ilha de Taparica, se povoou o rio de Jaguaripe, Tinhar e a costa dos Ihos; e tamanho dio s criou entre esta gente, sendo toda uma. por sua avoenga, que ainda hoje, entre'esses poucos qe ha, se querem tamanho mal que se matam uns aos outros, se o podem fazer, em tanto que se encontram algurila sepultura antiga dos contrrios, lhe desenterram a caveira, e lt'a quebram, cm o que tomam nome novo, ,e d novp se tornam a^inimizar. E em tempo que oscPortuguezes tinham j^povoado este rio de Jaguaripe, houve na sua povoao grandes ajuntamentos, das aldas dos indios ali visinhos, para quebrarem caveiras em terreiros, cm grandes festas, para os-quebradores das cabeas tomarem novos nomes, as quaes caveiras foram desenterrar a uma lda despovoada para vingana de morte dos pais ou parentes dos quebradores drillas, para o que as enfeitavam com pennas de pssaros ao. seu. modo; em as quaes festas houve grandes bebedices, o que' ordenaram os Portuguezes ali moradores para se escandalizarem os parentes dos defuntos, e se quererem de npvo-mal; porque se temiam quese viessem a confederar uns com os outros para lhe virmazer guerra, o que foi bastante para o. no fazerem, e se ' assegurarem com isto os Portuguezes que viviam n'pste rio.
CAPITULO cx;

Em que1 se declara o modo e linguagem dos Tupinambs. Ainda que os Tupinambs se dividiram em bandos, e se inimizaram uns coni outros, todos faliam uma lingua que quasi geral pela costa do Brazil, e todos tem uns' costumes m seu' modo de viver e gentilidades ; os quas no adoram nenhuma cousa, nem tem nenhum conhecimento da verdade, nem sabem mais que'ha morrer e viver; e qualquer cousa que lhe digam, se lhes mett na cabea, e s mais brbaros que quantas creaturas Deus criou.' Tem ruita graa quando faliam; mormente as mulheres; so mui compendi.osas na frma da linguagem, e multo copiosos no seu orar; mas falta-lhev trs letras da do A B C, que.so F, L, R grande ou dobrado, cousa muito para se notar; "por-? que seno tem F, porque no tem f em nenhuma cosa que adorem ; nem os nascidos entre os christos e doutrinados pelos padres da Companhia :tem f em Deus "Nosso

- ' ;:^j^28i *'." Senhor, nem' tem verdadeynem lealdade a nenhumapessoa que lhe faa bem. E s no tem L na sua propunciao , porque mo tem lei nenhuma que guardar, nm preceitos para se governarem ; e cada um faz, lei a seu modo, e ao som da sa vontade ; sem haver entre elles leis com quese governem; nem tem lei uns com os outros. E se no tem.esta letra R na sua.pronunciao, porque no. tem rei que os . rrija, e a quem obedeam, riem obedecem a ningum,nem ao pai o filho, nem o filho ao pai, e cada um vive ao som da sua vontade : para dizerem. Francisco dizem Pancico, para dizerem Loureno, dizem Roreno, para dizerem Rodrigo dizem Rodigo; e * por este modo pronunciam todos os vocbulos em que entram essas trs letras.
, CAPITULO OLT. ' ; ' '

Que rat do sitio e arrumao das aldas, as quantidades dos principaes oV-llas. : . Em cada alda dos Tupinambs ha um principal, a que seguem somente na guerra, onde lhe. do alguma obedincia, pela confiana que tem etoiSeu esforo e experincia, qe no tempo depaz cada um faz a que o obriga seu apetite. Este principal ha de ser valente homem para o conhecerem pr tal ,e aparentado e bemquisto,para ter quem ajude a fazer suas roas, mas quando as faz com ajuda de seus parentes e chegados, elle lana primeiro "mo dp servio que todos. Quando este principal assenta a sua alda, busca sempre um sitio alto e desabafado dos ventos, para que lhe lave s casas, e qe tenha a gua muito perto, e que a terra tenha disposio para de redor da alda fazerem suas roas e grangarias; e como escolhe o sitio a contentamento dos mais antigos, faz o principal sa casa muito comprida, coberta da palma, a que os indios chamam pindoba, e as outras casas da alda se fazem tambm touito compridas, e arrumadas de maneira que lhe fica no meio um terreiro quadrado, onde fazem bailes eris seus ajuntamentos ; e em cada alda ha um cabea, que ha de ser indio antigo e aparentado, para lhe os outros que virem n'ests casas terem respeito; e no vivem mais n'estaalda,queemquantlhes no apodrece a'palma das casas, que lhes dura trs, quatro annos. E como lhe chove muito nrillas passam a alda para outra parte. E nristas casas no ha nenhuns repartimentos, mais que os tirantes ; e entre ura e outro um rancho ohde

"~r 282 .

seagzalha cada parentell, e o principal totoa o seu rancho primeiro, onde se elle arruma pom sua mulher .filhos,; mancebas, eredos solteiros, e algumas- velhas que o servem, e pela raesra ordem, vai arrumando a gente d sa casa, cada prentellar seu lano; driride se no podero mudar, salvo ser-lgum mancebo solteiro, casar,! porque er tal caso se irpara o lano onde est sutorilher; epor -cima dristes tirantes das casas lanar umas varas arriimadas; bem juntas, a que.chamam juros, em que guardam suas alfaias e seus.legumes-, que se aqui curam ao fumo, para no apodrecerem; e da mesma maneira se arrurnara e ordenam'nas outras casas; e em*:umas e outras a gente que se agazalha em, cada lano dristes. Quando comem no cho em cocar as; e todos juntos, e os principaes deitadps nas redes. Em estas casas tem este gphtio ajuntamento, sem ,s'-pejarem uns dos outros, rs stopre o macho-cm'fema. ,Se estas aldas esto er fronara de seus contrrios,, esem lugares de guerra, faz--este genti de roda da,alda uma cerca de po a pique muito forte, com suas porfri e seteras, e:.rifsfdO',da rierc vinte e trinta palmos, fazem de redpf drilla uma rede de madeira, coto suas entradas de fr para entre ella e a cerca ; para qe, se lhe os/contrrios entrarem dentro, lhe ;sahirer ; e o recolher se embaraarem de maneira que,os possam fiexar e desbaratar, como acontece muitas vezes. ',''[
CAPITULO C L I I . ''<

Que, tratada maneira dos casamentos dos'Tupinambs e seus' a m o r e s . ., _. , ;' ','"*


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A mulher verdadeira dos Tupinambs a primeira que o homem teve e conversou, e no tem em seus casamentos outra ceremonia mais que dar o pai a filha a seu genro, e como tem ajuntamento 'natural,, ficam casados : e os indios PLUSPi!sjejnjm^ m^slnuT^. te ,res %JSim^P-PL^^^^^ mas, ellas deTMas a obdlehci"" mais, antig7~e'' todas a servem, a qual tem armado sua rede junto da do marido,, e entre um.a e outra tem sempre fogo acezo; e as outras mulheres tem as,suas redes, em qe dormem, mas afastadas, e fogo entre cada duas redes; e quando o marido s quer ajuntar com qualquer drillas,'vai-se lanar com ella na rede, onde , se detm s aquelie, espao drist contentamento, e torna-

283

se para o seu lugar ; e sempre ha. entre estas mulheres cimes, mormente a mulher primeira; porque pela mr 'parte so mais velhas,que as outras,: e de menos gentileza, o qual ajuntamento publico diante de-todos. E quando o principal: nao o maior da alda dos indios das outras casas, o que tem mais filhas mais rico e mais estimado, e mais honrado de todos,porque so as filhas mui requestadas dos .mancebos que as* namoram ; os qas servem os- pais das damas dous e trs annos primeiro que lh'as dm por mulheres; e no as do iseno aos que melhor os servem, aqum os namoradores fazem a roa, e vo pescar e caar para os sogros, que desejam de er, e lhe trazem a lenha do mato ; e. como os sogros lhes entregam as damas, elles se vo agar zalhar no lano dos sogros com as mulheres, e apartam-se dos pais, mais e irmos, e mais parentella com quem dantes estavar ; e por nenhur caso se entrega a dama a seu marido em quanto l h e no vem seu costume ; e coifio lhe vem obrigada a moa atrazer atado pela.cinta Um fio de algodo, e em cada buchddos braos outro, para que Venha noticia de todos. E como o marido lhe leva a flor, obrigada a noiva a quebrar estes fios, para que seja notrio que feita dona; e ainda que uma moa dristas seja deflorada po quem no seja seu marido, -and que seja em segredo, ha de,romper Os.fiosda sua virgindade, que de outra maneira cuidar que'a leva logo o diabo, os'quaes desastres lhes acontecem muitas vezes ; mas o pai no se enoja por isso ; porque no falta quem lh'a pea por mulher com essa falta; e se algum principal da alda pede a outro indio .filhapor mulher, pai lh'a d sendo menina; e aqui seno; entende o preceito acima, porque elle a leyapara. seulano, e a vai criando at qu lhe venha seu costume, e antes disso por nenhum caso lhe toca.
CAPITULO

CLIII.

Que trata , dos afeites d'este gentio. Costumam os mancebos Tupinambs se depenarem os cabellos de todo o corpo, no deixar mais que os da cabea, que trazem tosquiados de muitas feies, o que fazi-., am, autes qu tivessem tezouras, com umas cannas, que, por natureza cortam muito; e alguns-o-trazem,cortado por cima das orelhas, e muito bem aparado ; os quaes cobrem os membros genitas com alguma cousa por galantaria, e no,

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pelo cobrir; e pintam-se de lavores pretos, quejfazerritjom tinta de genipapo,-;e,; s tem damas, ellas tem -cuidado de os: pintar : tambm rzm ria cabea umas pennas amarelias; pegadas pelos ps com' cera, e arrecadas de ss nas orelhas, grandes ,contas brancas, que fazem de bzios, lanadas ao pescoo;; aris quaS s resmas damas rapam a testa cm urnas canninhas/e lhe arrancam s cabellos, da barba, pestanas- sobrancelhas, e os mais cabellos de todo corpo, como j fica dito. E quando-se"estes mancebos que* rena fazer bizarros, arrepiam o cabello pra cima com almecega, ondelhe pegam umas pnninhas amarella^pegadas nrille, e sobraar outras contas brancas.* E pem nas pernas, e nos, braos umas toilbas: de penhas amarelias, e sua diadema das mesmas pennas na'cabea. As^ moas tambm se pintam de tinta de genipapo, cm muitos lavores, a seu modo,.mi luos jepem grandes rarhas .de contas Se toda a sorte ao pescoo "e nos braos ; e pem nas pernas por baixo, d joelho umas tpacurs*, que so-do fio do.algodo, tinto de Vermelho; tecido de maneira que lh'as no podem tirar, o qu-ter trs dedos de largo ;.'-o que lhe ppm asrinis em quanto so, pachopas,para ;qu lhe engrossem as pernas pelas barrigas, eto quanto crescem, as quaes as, trazem nas pernas em quanto, so namoradas, toas de maneira- que as possam tirar, ainda que com trabalho; e m quanto so solteiras piritam-ris as rpes, e depois de casada os maridos, ?se lhes querqm bem " ; as quaes mocas So barbeadas, de todos os cabellos que os mancebos tiram, por outras mulheres. Estas ndias tambemriuram os, cabellos para que sejam compridos, grossos ripretos, os quaes paraterern isto os untarn muitas vezes com leo de cocos bravos." ;;'-:..' ' ,", -;:;
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>'- CAPITULO CLIV,

'Que trata da criao que os Tupinambs db\o aos filhos, e o que fazem quando lhenascm. ; Quando estas ndias entram em dores de parir, po buscam parteiras, no se guardar do ar, nem fazem outras1 ceremonias, parem pelos campos e em qualquer outra parte como uma alimaria ; e emaabrido de parir, se vo ao rio ou fonte, onde se lavam, e as crianas que pariram ; e vem-se para casa, onde o marido se deita logo na rede. onde est muito coberto, at que seca o embigo da criana] em

285... o qual lugar visitam seus parentes e amigos,.e lhe trazem presentes de comer e beber, e a mulher lhe faz muitos mimos, em quanto o marido est assim parido, o qual est, muito empanadq pra que lhe no do ar ; e dizem que se lhe der o ar que far muito nojo criana, e que se se erguerem e forem ao trabalho, qu lhe rorrero os filhos, e elles que sero doentes da bajriga ; e no ha quem lhes tire da cabea que da parte da mae no ha perigo, seno da sua; porque o filho lhe sahiu dos lombos, e que ellas no pem' da sua parte mais que terem guardada a semente no ven- # tre onde se cria a criana. Como ..nascem os filhos aos Tupinambs, logo lhe pem o nm que lhe parece ; os ques nomes que usam entre.si so de alimarias, peixes, aves, arvores, mantimentos, peas de arriias, e driutras cousas diversas; aos quaes furam logo o beio debaixo, onde lhe pem, depois que so maiores, pedfas* por gentileza. No do os Tupinambs a seus filhos nenhum castigo, nem os doutrinam, nem os reprehendem por cousa que faam ; aos machos ensinam-nos a atirar com arcos ,e flexas ao* alvo, e depois aos pssaros ; e trazem-nos sempre s costas at a idade de sete e oito annos, e mesmo, s fmeas; e uns e outros mamam ria me at que torna a parir outra vez; pelo que mamam muitas vezes seis e sete annos ; s fmeas ensinam as mes a enfeitar-se, corno fazem .s Por. ,-tuguezas, e a fiar algodo, e a fazer o mais servio de suas casas^cohforme a se costume.
CAPITULO CLV.
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Em, que s declara o com que se os Tupinambs fazem ; , bizarros. ,

Para se os Tupinambs fazerem bizarros usar de muitas bestialidads mui estranhas, como. fazerem depois de homens trs e quatro buracos nos beios debaixo, onde metem pedras, com grandes pontas para fora ; e outros furam ris Beios dpcima, tambm como os debaixo, onde tambm metem pedras redondas, verdes e pardas, que ficam ingeridas, nas faces, como espelhos de borracha ; em as. quaes ha alguns que tem nas faces dous e trs buracos,; em que metem pedras, com.pontas para fora ; ,e ha alguns qe tem todos estes buracos, que, com as pedras nrilles, parecemos
\ TOMO XIV 40

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demnios; os quaes soffrem estas dares por parecerem temerosos a seus contrrios. , Usam tambm entre si umas carapuas de pennas amarelias e vermelhas, que pem na Cabea, que ,lh'a cobre at s orelhas ; os ..quaes fazem clars pra o pescoo d dentes dos contrrios, ohde trazem logo juntos dous, trs mil dentes, e nos ps uns cascavis de certas hervas da feio da castanha, cujo tenido se ouve muito longe. Ornam-se mais estes indios, para suas bizrrices, de ura roda de pennas de ema, que atam sobre as ancas, que, lhe faz tamanho vulto que lhe coore as costas todas de alto abaixo; para se fazerem mais feios se tinger todos de genipapo, que parecem negros de Guin, e tingem os ps de Ama tinta vermelha muito fina, e as faces ; e per sobraadas muitas contas de bzios, e outras pequenas de pennas nos braos ; e~quaido se ataviara .cn todas estas peas,levam ura espada de po marchetd com casca de tsdp pssaros de cores diversas, e na empunhadura urnas pennas grandes d pssaros, e certas campainhas de penas amarelias, a qual espada lanam, atada ao pescoo, por detraz; e leVam na mo esquerda se arco e flexas, com dentes de tubaro; e na direita um marac(,-que um cabao cheio, de pedrinhas, om seu cabo* cm'qu vai tangendo cantando ; e fazem estas bizrrices-para quando na sua alda ha grandes vinhos, ou em outra, onde vo folgar; pelas qaes andam cantando e tangendo ,ss,e depois misturados com outros; com os quaes atavios se fazem temidos eestimados.
CAPITULO CL VI.

Que trata da luxuria d 'estes brbaros. So os Tupinambs to luxuriosos que no ha pecado de luxuria.que no coirietam; os quaes sendo de muito pouca idade tem conta com mulheres, e bem "mulheres ; porque as velhas, j desestimadas dos que so-1 homens, grangeam estes-.meninos, fazendo-lhes mimos e regalos; e ensinam-lhes a fazer o que elles no sabem; e no os deixam de dia, nem de noite. ' este gentio to luxurioso que poucas-vezes tem respeito s. irms e tias, - e porque este peccadori contra seus.costumes, dormem com ellas pelos matos, e alguns com suas prprias, filhas ; e no se contentam com uma mulher, mas tem muitas, como j fica

287

dito, pelo que morrem muitos de esfalfados. E em conversao no sabem fallr seno nristas sujidades, que cometem cada hora ; os quaes so to amigos da carne que se no contentam, para seguirem seus apetites, com o membro genital como a natureza o formou ; mas ha muitos que IhiCostumam pr opello de um bicho to peonhento, que lh'o faz logo inchar, com o qu tem grandes dores, mais de seis, mezes, que se lhe vo gastando por espao de tempo; com o que se"lhe faz o seu cario to disforme de grosso que ps no podem as mulheres esperar, nem sofrer ; e no contentes estes selvagens de andarem to encarniados nrist peccado, naturalmente cometido, so mui afeiv coados ao peccado nefando, entre os quaes se no tem por afronta; e o que serve de macho, se tm por Valente, e, contam esta-bestialidade por proeza ; e ns suas aldas pelo serto ha alguns que tem tenda publica a quantos os querem como mulheres publicas. Como os pais e as mais vem os filhos com meneos para cnheqer mulher, elles lh'a buscam, os ensinam como a sabero , servir :'; as fmeas muito meninas esperam o macho,-mr mente as que vi Vem entre os -Portuguezes > Os machos dristes Tupinambs'*'no so ciosos; e ainda que achem outrem com s mulheres, no" matam a ningum porisso, e quando muito espancam as mulheres pelo caso. E^as que querem bem aos maridos, pelos contentarei), buscar-lhe moas com que elles se desenfadeto, as quaes i h e levam recle onde dormem, onde lhe pedem muito qu se queira deitar com os maridos, e as peitam para isso; cousa que no faz nenhuma nao de gente, seno estes brbaros.
CAPITULO CLVIIy

Que trata das ceremoniqs que usam os Tupinambs^ nos seus parentescos. -Costumam os; Tupinambs que quando algum morre que casado, obrigado 0 irmo mais:velho a casar com sua' mulher, e quando no tem irmo, O parente mais chegado pela parte masculina; e o irro da viuva obrigado a casar com sua filha se a tem ; e quando a mi da moa no .tem irmo, pertence-lhe por marido o parente mais chegado da parte de sua mi; e se no quer casar com esta

'288

sua sobrinha, no tolher a ningum dormir cora ella, e depois lhe d o marido que lhe vem vontade. O tio, irmo do-pai da moa, no casa com a sobrinha, nem lhe toca quando fazem* o que devem, mas tm-na era lugar de filha, e ella como a pai lhe obedece, depois da morte do pai? e pai lhe chama: e quando estas moas no tem tio, irmo de seu pai, tomam em seu lugar o parente mais chegado ; e a todos -os parentes da parte do pai em todo o gro chamam pai, e elles a ella filha ; ms ella obedece ao mais chegado parente, sempre ; e da mesmamaneira , chamam os netos o irmo e primo de seu av," av, e elles a, elles netos, aos filhos dos netos, es netas de seus irmos e primos ; e da parte da mi tambemfos irmos e primos drillas chamam aos sobrinhos' filhos, e elles aos tios pais; toas np lhe tem tamanho acatamento como aos tios da parte do pai; e preza-se este gentio de seus parentes, e o que mais parentes e parentas tem, mais honrado e temido, e trabalha muito pelos chegar para si, e,fazer corpo com elles em qualquer parte em que vivem ; e quando,, qualquer indio aparentado tem agazalhado seus parentes: ern sa casa e lano, quando h de comer, deita-se na sua rede, onde lhe pem o que ha de comer env urna vasilha; e assentam-se em ccoras, suas mulheres filhos, e todos seus parentes, grandes e pequenos ; e todos comem juntos do que tem na vasilha, que est no meio de todos. ^
' CAPITULO CLVIII.

QUe trata do modo de comer e do.'bebir dos Tupinambs,' J fica dito como os principaes dos Tupinambs quando comem, esto deitados na rede, e como comem com elles s parentes, e os agazalha comsigo ; entre os ques comem tambm os seus criados e escravos, sem lhe terem nenhum respeito;; antes quando o peixe ou carne n que sobeje, o principal reparte por quinhes iguaes, e muitas vezes fica,elle sem nada, os quaes esto todos em ccoras, com a vasilha em que comem todos no cho no meio drilles, e em quanto comem' no bebem vinho, nem gua, o que fazem depois de comer. Quando os Tupinambs comem noite, no cho como est dito, e virados com as costas para o fogo, e ficam todos s escuras ; e no praticam em cusa alguma' quando comem, seno depois.de comer ; e quando tem que, toda a noite no fazem' outra cousa, at que os vence o

289 somno ; e por outra parte mntem-se este gentio com nada, e_anda logo dous e trs dias sem comer, pelo que os que sa-o escravos do pouco trabalho a seus senhores pelo mantimento, antes elles mantm os senhores fazendo-lhes suas roas, e caando, e pescahdo-lhes ordinariamente. Este gentio no corne carne de porco,-dos que se criam em^casa, seno so os escravos criados entre os brancos ; mas comem,a carne dos porcos do mato da gua: os, quaes tambm np comem azeite, seno os ladinos : toda a caca, que este gentio come, no esfola, e charuscam-na toda ou pellam-na' na gua quente, a qual comem assada ou cozida, e as tripas mal lavadas ; ao peixe no escamam, nem lhe'tiram s tripas, eassim cptoo vem do mar ou nos, assim o cozem ri ssm: o sal de que usam, com que temperar o seu comer, m que molham o ,peixe carne, fazem-no da gua salgada que cozem tanto em umavazilha sobre o fogo at'que se coalha e endurece, com o que se rmedeam'; mas sobre o preto, e requeima. < Este gentio muito amigo de vinho, assim machosicmo fmeas, o" qual fazem de todos os seus legumes, at da farinha que comer ; mas o "seu vinho.principal de unia raiz que chamam aipim, que rse, coze, e depois pizam-na e tornam-na a cozer, e como bem cozida, buscam as mais formosas moas da alda para espremer estes aipins com as mos, e algum mastigado com a boca, e depois espremido na vazilha, que o que dizem que,lhe per a virtude, segundo a suagritilidade ; a esta gua e sumo' dristas raizes lanam ern grandes potes, que: para isso tem," onde esto' vinho se coze,, e est at que se faz azedo ; e como o st bem, o bebem com grandes cantares, e cantam e bailam toda m noite s vsperas do vinho, e ao outro, dia pela manh comeam a beber, bailar e cantar ; e as moas solteiras da casa andam dando o vinho, em uns meios cabaos, a ' q u e chamam cuias,: aos que andam'cantando, os quaes no comem nada emquant bebem, o que fazem de maneira que Vem a cahir de bbados por 'esse. cho ; e o que faz mais desatinos nrissas bebedices, esse mais estimado dos outros, m os qus se fazem sempre brigas : porqu aqui se lembram de seus cimes, e castigam por'isso as mulheres, ap que aodem os amigos, e jogam as tioadas uns com os outros. So costumados a almoar primeiro que se vo s suas roas a trabalhar, onde no comera emquant andam rio trabalho, seno depois que se, vem para casa.

290
CAPITULO CLIX.

m que s declara o modo^da grangearia dos:Tupinambs e e suas habilidades. Quando os Tupiiiambs v s suas roas, no trabalham seno das set.hptas da manh at ao meio dia, e s muito diligentes at horas de vspera ; e no comem n'este tempo seno depois dristas horas, que se vem para suas casas : os piachos costumam a roar s matos, e os queimam e alim-, .parira terra drilles ; es fereas'plantam mntlmento, e o, alimpam : os machos vo buscar a lenha com, que s aquentam e se servem, porque no dorrer sem fogo, ao longo das redes, que a sua cama; as fmeas vo buscar a agu fonte e fazem de comer ; e os machos costumam ir lavar as redes aos rios, quando esto sujas. , No fazem os Tupinatobs entre si outras obras primas que balaios de folhade palma, e outras vasilhas da mesma folha a seu modo, e do seu uso: fazem arcos e flexas, e alguns mpalhados e lavrados de.branc e preto, feitio de muito artificio : fazem cestos de varas, que chamam sam-; bur, outras.vasllhas em lavores,como as de rota da ndia: fazem carapuas e capas d pennas de pssaros, e outras; obras de pnria do s uso, e sabem dar tinta de vermelho e amarello s pennas brancas; e tambm contrafazem- s pennas dos papagaios coto sangue de rs, arrancando-lhe as verdes, e fazem-lhe nascer outras amarelias : fazem mais estos-indios, os que so pripclpaes, redes lavradas d lavores.de-esteiras, ri dri outros laos, e umas cordas tecidasj ,a qe chamam muuranas, de " algodo,' que tem o feitio dos cabos de Cabresto qe vem de Fez. Quando este gentio quer tomar muito peixe ,nos rios d'agua doce e nos esteiros driga salgada, os atravessam cm uma tapagem de, varas,e batem o peixe de cima para baixo; onde lhe lanam muita somma de umas certas hervas pizadas, a, que chamam timb, com o que se embebeda o peixe de maneira que sq vem acima d'agua como morto ; onde tomato s mos muita somra d'elle. As mulheres driste gentio no cozer, nem lavam; s- ~ mente fiam algodo,- de que no fazem tas, como poderam; porque no sabem tecer; fazem driste fiado as redes em que dormem, qp no so lavradas, e umas fitas cm passamanes e algumas mais largas, com que ennastram os cabellbs. As mulheres j de idade tem cuidado de fazerem a farinha de

291 que se mantm, e de trazerem a mandioca das roas s costas para a casa ; e as^que so muito Velhas tem cuidado de fazerem vasilhas de barro mo ; como so os potes em qu fazem os vinhos, e fazem alguns tamanhos quelevam ' tanto como uma pipa, em os quaes e em outros menores fervem os vinhos, que bebem: fazem mais estas velhas, -panellas, pucaros.e lguidares a seu uso,, em que cozem a farinha, e outros ,m que a deitam e em que comera, lavrados de tintas d cores ; ri qual loua cozem era uma Cova que fazem no cho, e pem-lhe alenha por cima; e tem e crm estas ndias que,se cozer esta loua outra pessoa, que no seja a que a fez, que ha de arrebatar no fogo ; as quaes, velhas ajudam tambm a fazer farinha que s faz no seu - lano. As feineas d'estes gehtios so muito afeioadas.a criar cachorros pra os maridos levarem .caa, e *quando ellas vo fora levam-nos s costas ; as quaes tambm folgam de Criar gallinhas e outros.pssaros em suas 1 ,casas. As quaes, >.quando com seu costume, alimpam-se com. um bordo que i'f.; ter sempre junto dsi,-que levam na mo quando vo fora de casa ; e no se pejara de se alimparem diante de gente, / nem de as verem comer piolho; o que fazem quando se catam nas cabeas umas s outras ; e como os encontra a que s ? ' busca,* us d que os trazia na cabea, que logo os trinca entreos' dentes; o que no fazem pelos comer;mas em vin':' gana: de as morderem.
CAPITULO CLX".

Qu trata de algumas Habilidades e costumes dos Tupinambs. So os Tupinambs grandes fiexeiros, assim para as aves como para a caa dps porcos, veados e outras alimarias ; e ha muitos que matam no mar e nos rios da gua doce,opeixri flexa; e- drista maneira matam mais peixe que outros linha; os quaes no arreceam arremeter grandes, -cobras, que matam, e.a lagartos que aridam na gua, tamanhos Como elles, que.tomam vivos a braos. Cestumam mais este. indios, quando vem de ca,ar ou pescar,, partirem sempre do que trazem com a principal da casa em que vivem, e o mais entregam a suas mulheres, ou a quem tem o cuidado de os agazalhar no seu lano. Ter es,tes' indios mais que so homens enxutos, mui ligeiros para saltar e trepar, grandes corredores e estremados marinheiros, como os metem nos barcos e navios, onde

292
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com todo ,o tempo ningum toma as, vellas como elles; e so grandes remadores, assina nas suas canoas, que fazem de um s po, que remam em p vinte trinta indios, com o que as fazem Voar : -so tambm muito engenhosos para tomarem quanto lhes ensinam os. brancos, como no fr cpusaori conta, npm de sentido: porque so para-isso muito brbaros ;, mas para carpinteiros de machado, serradores, oleiros^ carreiros* para todos os officios' de engenhos de assucar, tora grande destinto, para saberem logo estes officios; para criarem vaccas tem grande mo e cuidado. Tem estes Tupinainbs uma condio muito ba para frades franciscanes, porque o se facto, e quanto teto, e commum a todos os da sua casa quequeremrisar drile ; assim das ferramentas, que " que mais estimam, Cpmo das suas roupas, se as tem, e do seu mantimento ; os quaes, quando esto comendo, pde Comer cor-n: elles quem quizer,. ainda .que seja contrario, sem lh'o impedirem riem fazerem 1 por isso carranca. Tambm as moas, driste gentio, que s, criam e doutrinam com as mulheres portugmezas, tomam muito bem o cozer "e lavrar', e fazem todas as obras de agulha que. lhe ensinam, para o que tem muita habilidade, e para fazereto cousas doces, e fzem-se estremadasriozinheir.as.; mas so muito namoradas e: amigas de terem amores crim os homens brancos. - So os Tupinambs grandes nadadores rergulhadores, e quando lhes releva, nadani tres,e quatro lguas; e so taes que, se de noite no ter com que pescar, se deitam na -gua e como sentem opeixe comsigo, o tomam s mos de mergulho ;- e d mesma maneira 'tiram polvos elagostins das concayidades do fundo do mar, ao longo da costa/ ,
CAPITULO C L X I .

'

Que.traia dos feiticeiros e dos,que'comem terra,para s matarem.-y. Entre esse gentio-Tupinamb, ha grandes feiticeiros, qe tem este nome entre,elles, por lhe mettererriem cabea mil mentiras ;, os quaes, feiticeiros vivem em casa , apartada cada um por si, a qual muito escura;e tem a porta muito pequena, pela qual ho. ousa ningum.de entrar em sua . casa, nem de lhe tocar em cousa drilla; ris quaes pela maior ipart no sabem nada, e parasq fazerem estimar e temer

301 contrrios, ajuntar-se grande somma. drilles, e virem-lhe no alcance at lhe no poderem fugir; e ser-lhe necessrio esperal-os, o que fazem ao longo d'gua, onde se fortificam fazendo sua cerca de cai ; o que fazem com muita pressa para dormirem li seguros de seus contrrios, mas com boa vigia ; onde muitas vezes so cercados e apertados dos contrrios: mas os cerCados vem por detraz drista cerca a quem est de fora, para empregarem todas as suas flexas vontade, e s de fora no vem quem lhes atira ; e se no vem apercebidos para os abalroarem, ou de mantimentos, para ' continuarem,com o- cerco, se tornam a recolher, por no poderem balroar a.os Tupinambs como .queriam. E estes'assaltos, qe os Tupinambs vo dar nos Tupinas e'outros eontrarios seus, lhes acontece tambm a elles por muitas vezes, do que ficam muito mal tratados, se no so avisados primeiro, e apercebidos; mas' as mais das vezes elles so os que offendem,a seus'inimigos, e 'so mais prevenidos, quando se vem nristasaffrontas de mandar pedir soccorro a seus. vizinhos, e lh'o vem logo dar com muita presteza. Quando os Tupinariibs esto cercados de seus contrrios, as pessoas'de mais authoridade drintre ellesrihes andam pregando de noite que se esforcem e pelejem como bons cavalleiros, e qrie no temam seus contrrios; porqu muito depressase vero vingados drilles, porque lhes no tardara o soccorro muito ; e as mesmas pregaes costumam fazer quando elles tem cercado seus contrrios, e os querem balroar ; e-.' antes que dm o assalto, estando juntos todos V noite atraz,' passeia o principal de redor dos seus, e lhes diz em altas vozes o que ho de fazer, e os avisa para que se apercebam e estejam.alerta: e as mesmas nregaes lhe faz, quando, andam fazendo as cercas de cai, para que se animem, e faam aquella obra com muita pressa ; e quando os Tupinambs pelejam no campo, andam saltando defuma banda para a outra, sem estarem nunca quedos, assobiando, dando com a mo no peito, guardando se das flexas que lhe lanam seus contrrios, e lanando-lhe as suas com muita fria. " j
CAPITULO CLXX.
s

Em -que se declara que o Tupinamb que matou o contrario, toma logo nome, e as ceremonias que n'isso fazem. Costuma-se entre.os Tupinambs, que todo.aquelle que
TOMQ xiv v, 42

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mata contrario, toma, logo nome entre si, mas no o diz seno a seu tempo, que manda fazer grandes, vinhos ; e como esto para se poderem beber, tingem-se vspera tarde de genipapo, e comeam tarde a cantar, e toda a noite, e depois que tem-cantado um grande pedao,, anda toda a gente da, alda rogando ao matador, que diga o nome que tomou, ao que se faz de rogar^ e tanto que o diz, s ordenam novas cantigas fndadassobre a morte d'quelle que morreu, e em louvores do que matou, o qual, como se acabam aquellas festas vinhos, se recolhe pra a: sua rede, como anojado por Certos dias, e np come nrilles certas cousas,que tem por agouro se as comer dentro driquelle tempo. : Todo o Tupinamb que matou na guerra ou em outra qualquer parte algum contrario, tanto que vem para sa casa, e notrio aos moradores drilla da tal morte do contrario, costumam, em o matador- entrando em casa, rrerearem-se todos ao seu lano, e tomarem-lhe as armas-e todas as suas alfaias de se uso, ao qu elle. no ha de resistir por nenhum caso, e ha de deixarjevar tudo sem fallar palavra : e como o matador faz estas festas deixa crescer o cabello por d alguns dias, e corno grande, ordena outros vinhos para tirar o d,; ao que faz suas vsperas cantadas, e ao dia que se ho de beber os vinhos se tosquia o matador, e tira o d, tornndo-se a encher e tingir de genipapo, o qual tambm se risca em algumas, partesdo corpo com o dente de cotia, em lavores; e d por estassarjaduras uma tinta com que ficari vivas, e em quanto o riscado vive, o tem por grande bizarria ; e ha-alguns indios que tomaram tantos nomes, e se riscaram tantas vezes que no tem parte onde no esteja o corpo, riscado. Costumam tambm as irms dos matadores fazerem as toesm-as ceremohias que fizeram seus irmos, tosquiandose, e tingindo-se do genipapo, e dando alguns riscos em si; e fazem o mesmo pelos primos, que tambm chamam irmos, e "fazem tambm suas festas com seus vinhps comp elles; e para se no sentir a dr do riscar, se lavam primeiro muito espao com. gua muito quente, com que lhe enteza a'carne e ho sentem as sarjaduras; mas muitos ficam drillas to mal tratados qrie se pem em perigo de morte.

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CAPITULO CLXXI.

Que trata do tratamento' que os Tupinambs fazem aos que cativam, e a mulher que lhe do. , Os contrrios que os Tupinambs cativam na guerra^ ou de outra qualquer maneira,metem-nos era prises, as quaes So cordas de algodo grossas,que para isso tem mui louas, a que chamam muuranas, as quaes so-tecidas como os cabos dos cabrestos de frica; e com ellas os atam pela, cinfa e pelo pescoo, onde lhe do muito bem de comer, e lhe fazem bom tratamento,at que engordam, e esto estes cativos para se poderem comer, que o fim para que os engordam; e como os Tupinambs tem estes contrrios quietos e bem seguros nas prises, do-a cada um por mulher a mais formosa moa, que ha na sua Casa, com quem se elleagazalha, todas s vezes que quer-, a- qual moa tem cuidado de o' servir,, e de,lhe dar o necessrio pra comer e v beber, com o que cevam cada hora, e lhe fazem muitos regatos. E se esta moa mprenha do que est prezo, como acontece muitas vezes, como, pare, cria a criana at idade que se pde comer, que a rifferece para issoao parente mais chegado, que lh'o agradece muito, o qual lhe"quebra a cabea em terreiro com as ceremonias que se adiante seguem, onde toma o nome ; e como a criana morta, a cornem assada com grande fesfa,e a mi a primeira que come drista carne, o que tem por grande honra, pelo que de maravilha escapa nenhuma criana que nasa dristes ajuntamentos,qrie no matem; e a toai que no come' seu prprio filho, a que estes indios chamam' cunhmbira, que quer dizer' filho do contrario, tem-n'a em ruim. conta, e em peior, se o nc entregam seus irmos, ou parentes ' coto muito contentamento. Mas tambm ha algumas, que tomaram tamanho amor aos cativos que as tomaram por mulheres, que lhe- deram muito geito para se acolherem efugirem das prises, que elles cortara com alguma ferramenta, que ellas sescndidas lhes deram, e lhe foram pr no mato, antes de fugir, mantimentos para o caminho ; e estas taes criaram seus filhos com muito amor, e nq s entregaram a seus parentes para os matarem, antes os guardaram e defenderam drilles at serem moos grandes, que como chegam a essa idade logo escapamda fria dos seus contrrios. Muitas vezes deixam os Tupinambs de matar alguns contrrios que cativaram por serem moos,e se quererem servir d'ell,es,

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aos quaes criam efazemto bom tratamento que andam de maneira que podem fugir, o que elles np fazem por estarem sua vontade ; ms depois que este gentio teve corn^ mercio cornos Portuguezes,folgam de terem escravos, para lh'os venderem; e s vezes depois de os criarem, os matam por fazerem uma festa dristas.'
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CAPITULO CLXXII.
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Que trata da festa e apparato que os Tupinambs fazem para matarem em terreiro seus contrrios. Cqmo os Tupinambs vem que os contrrios; que tem cativos, esto j bons para matar,, ordenam de fazer grandes festas a cada um-, para as quaes ha grandes ajuntamentos de parentes e amigos, que para isso so chamados de trinta e quarenta lguas, para a vindridos quaes fa-1 zem grandes vinhos, quebebem com grandes festas ; mas fazem-nas muito maiores para o dia do sacrifcio do que ha de padecer, com grandes cantarei, a vspera em todo dia cantam e bailam, e ao dia se bebem muitos vinhos pela manh, com motes que dizem sobre a cabea do que ha de padecer, qu tambm bebe com' ells. E s que cantam fundam nrista festa suas cantigas vituprando o que ha de padecer e exalando o matador, dizendo suas proezas e louvores ; e antes que bebam os vinhos, u n t a m o cativo todo com mel de abelhas, e pr cimadriste melo empenam todo -com pennas de cores, e pintam-no a lugares de genipapo, e os ps com uma tinta vermelha, ri metem-lhe uma espada de po nas mos para que se defenda de , quem o quer ma^ar com ella, como puder; e como estes cativos": vem chegada a hora em que ho de padecer, comeam a: pregar e dizer grandes louvores de sua, pessoa, dizendo -que j est vingado de quem o ha de. matar -, contando grandes faanhas.suas e mortes que deu aos parentes do matador, ao qual ameaa e a toda a gente da alda,_ dizendo que seus parentes o Vingaro. E comeam a levar este prezo a um terreiro fora da alda, que para esta execuo -est preparado,,e metem-no entre doas moures, queestp metidos'no.ch, afastados um doputro vinte palmos,pouco mais ou rhrinos, os quaes esto furados, -por cada furo metem as pontas das cordas com que:p contrario vem preso, -onde fica preso como touro de cordas, onde lhe as velhas dizem que se farte de ver o sol, pois tem o fim to chegado ;

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ao que o cativo responde com gande coragem,'que pois elle tern a vingana da sua morte to certa, que aceita o morrer com muito esforo. E antes, de lhe chegar a execuo, contemos como se pVepara o matador.
CAPITULO CLXXIII.

Que trata de como se enfeita e apparata o matador. Costuniamps Tupinambs,primeiro que o matador saia ao terreiro, enfeital-o muito bem, pintal-o com lavores de genipapo todo ocorpo, e pem-lhe na cabea uma carapua de pennas amarelias e uma diadema/ *manilhas; nos braos e pernas, das mesmas pennas, grandes ramaes de contas brancassobraadas, e seu rabo de pennas de ema nas ancas e uma espada* de po de ambs-as mos muito pezada, marchetada com continhas, brancas de bzios, e pintada com cascas de ovos de cores, assentado tudo, em" lavores ao seu modo, sobre cera, o-que fica mui igualado e bem feito:; ,e- no cabo drista espada tem 'grandes penaChos de pennas de pssaros feitas em molho e -dependuradS da empunhadura,a que elles,chamam embagadura ; e como o matador est prestes para receber esta honra, que entre o gentio a maior que pde ser, ajuntam-se seus parentesco amigos evd-no buscar sua. casa; d'onde o, vem acompanhando com1 grandes cantares e tangeres, dos seus bzios,, gaitas e tambores, chamando-lhe bemaventurado ; pois chegou a ganhar tamanha honra, como vingar a morte de seus antepassados e de seus irmos e parentes ; e com este, estrondo entra no terreiro da execuo, onde est o que ha de padecer, que o est esperando com grande coragem com uma espada de poha mo,diante de quem chega - o matador, e lhe diz que se defenda, porque vem para o matar, a quem responde o p\reso com mil foncarias ; mas o solto remettea elle com sua espada de ambas as mos, da qualse.se quer desviar o preso para alguma banda, mas os.que teni cuidado das cordas puchm por ella de feio que o fzm esperar a pancada ; e acontece muitas vezes que o-preso primeiro que morra, chega, com a sua espada ao matador que trata muito mal, sem embargo de lhe no deixarem, as cordas chegar a elle ; por mais que o pobre trabalha, no lhe aproveita ; porque tudo dilatar a vida mais dous credos, onde a rende nas mos do seu inimigo, que lhe faz a cabea em pedaos com sua espada; e

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Como se- acaba est: execuo, tiram-no das cordas, e levam-no onde l, costuma repartir esta carne; e acabado o :matador de executar su ira no cativo, toma logo entre si : algum nome, o qual declara depois comasceremohias qe : ficam ditas triz:; e vai-se do terreiro recolher para o seu lano, onde tira s armas e petrechos'com que se enfeitou; e a mesma honra ficam recebendo aquelles que primeiro pegaram dos cativos na . guerra, do que tomam tambm novo nome, com s mesmas festas e ceremhias que j ficam ditas; o que se no faz com menos alvoroo qe aos prprios matadores; ;
CAPITULO CLXXIV: _ -

Em q se declara o,que os Tupinambs fazem, do contrario : que mataram: ,.'/-' Acabado de morrer este preso, o espedaar logoos velhos da alda, e tiram-lhe as tripas e frura, que, mal lavadas, cozem e assam para comer ; e reparte-se a carne por todas as casas ria alda ,e pelos hospedes que vierato d fora para ver estas festas e matanas, a qual carne se cozelogo, para' se comer nos mesmtfs dias de festas, e outra assam muito afastada do fogo de maneira qe fica muito rnirrada, a qu este gentio chama'moquem, a qual se no corne por man-1 timento seno pr vingana;-e os homens mancebos e mulheres rnoas-provam-na somente, e os velhos; e.:ve.Mias: so s que se. metem nrista carnia, muito, e guardam alr gutoa da assada do moquem por relquias, para. com ella de novo tornarem a fazer festas, se seno offerecer to cedo matarem outro contrario, ti os hospedes qe vieram de fora a ver esta festa levam o seu quinho de carne, qu lhe deram do morto, assada do- moquem para , as suas aldas, onde como .chegam.fazem grandes vinhos para com' granados festas, segundo sua gentilidade, os bberem sobre esta carne humana que levam, a qual repartem por todos da alda, para a provai em e se alegrarem em vingana de seu contrario que padeceu, como fica dito. Acontece muitas Vezes cativar um Tupinamb um contrario na guerra, onde o no quiz matar para o trazer cativo para a sua alda,, onde o faz engordar com s cerer monias j declaradas para o deixar matar a seu filho quando moo e no tem idade para ir guerra, o qual mata em terreiro, como fica ditof com as mesmas ceremo-'

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nias; rnas atam as mos ao-qu ha de'padecer, para com isso p filho tomar nome novo e ficar armado cavaleiro, e mui estimado de todos. E s este moo matador, ou outro algum, seno quer riscar quando toma novo nm, contentam-se com se tingir de genipapo, e deixar crescer o cabello e tosquial-o, Com as, ermonias atraz declaradas; '.e os quese riscam, quando tomam nome novo, a cada nome: que tomam fazem sua feio de lavpr, que para elles grande bizarria, para qqe se veja quantos nomes ter.
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CAPITULO C L X X V .

Que trata das ceremonias que os Tupinambs fazem quando -morre algum, e como os enterram. E' costume entre s Tupinambs qu, quando morre qualquer drilles, o leva a enterrar embrulhado na sua rede em qrie dormia, e o parente mais chegado lhehad fazei' a "cova ; e quando o levar a enterrar vo-no acompanhando "mulher, filhas e parentes,'.se as tem, as quaes vo pranteando at-a cova, com os cabellos soltos, sobre o, rosto, e esto-no pranteando ate que fica bem coberto de terra; drinde se.tornam para sua casa, onde a viuva chora,o marido por muitos dias ; e se morrem as mulheres,dristes Tupinambs, costume que os maridos lhe faam a cova, e ajudem a levar s costas a defunta, es no tm j toarido, o irmo ou parente mais chegado lhe faz a cova. E quando morre algum principal da alda em que vive, e depois de morto alguns dias, antes de o enterrarem fazem as ceremonias seguintes- .Primeiramente o untam com mel todo, ri por cima do mel o empennam cora pennas de pssaros de cores, e pe lhe rima carapua depennas na cabea, e todos os mais enfeites que elles costumam, trazer, nas siias festas; e tem-lhe feito na mesma casa .e lano onde elle vivia, uma cova muito funda e grande, com sua, estacada pr de redor, para que tenha terra que no caia sobre o defunto, e armam-lhe sua rede m baixo de maneira que no toque'o morto no cho; em a qual rede o mettem assim enfeitado, e pem-lhe junto da rede seu-arco e flexas, e a sua espada, e o marac cm que costumava tanger, e fazem-lhe fogo ao longo darrede para se aqentar, e;pemlhe de comer em Um alguidr, e gua em um cabao, como gailinh ; como esta matalotagem est feita, e lhe pem tatobem sua cangoeira de fumo, na mo, lanam-lhe muita

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somma de madeira igual no andar da rede de maneira que no toque, no corpo., e sobre esta madeira muita somma de terra, com rama debaixo primeiro, para qu no" Caia terra sobre o defunto; sobre a'qual sepultura" vive a mulher, como d'antes. E quando morre algum moo, 'filho d algum principal, que no tm, muita idade, mettem-no em ccoras, atados os joelhos, com a barriga; erri um pote em qu elle caiba, e enterram, o pote narffsm-acasa debaixo do cho, onde o filho e pai, se morto, :so; chorados -muitos dias.
CAPITULO C L X X V h
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Que trata dosccessor ho principal qUe morreu, e das ere monias qu faz sua mulher, e as qp,e se fazem por morte d^ella tambm. Costumam os Tupinambs, quando morre o principal da alda, elegerem entre si quem sucrieda em se lugar__e-.se 1 o defurito tem filho que lhe possa suc'ceder, y.a lle aceitam por sua cabea ; e1' quando no /para isso, ou o no tem, aceitam um seu irmo em seu lugar ; e no os tendo que tenham partes paraissd, elegem um parente seu, se capaz de tal cargo, e ter as partes atraz declaradas. E' costume entre as mulheres dos principaes Tupinambs, ou de outro qualquer indio, amulher cortar s cabellos "por1 d, e tingir-se toda de genipapo. -A-s,' quaes choram seus maridos muitos, dias, e so visitadas de suas parentas e amigas ; e todas as vezes que o, fazem,'tornairi com a viuva a prantear de novo o defunto, as quaes deixam crescer o. cabello, at que lhe d plos olhos, e s no casa com, outro; logo faz sua festa com vinhos, e torna-se a tosquiar para tirar,o d, e tinge-se de novo do genipapo. :, Costumara os indios, quando lhe morrem as, mulheres, deixarem crescer o cabello, no que no tem tempo certo, e tingem-se do genipapo por d ; e quando-se querem tosquiar, se tornam, a tingir de preto- vspera da festa dos Vinhos, que fazem a seu modo, cantando toda a noite, para a ql se ajunta muita gente para estes cantares, e o viuvo tosquia-se vspera a tarde,/e ao outro dia ha grandes revoltasde cantar e bailar, e beber muito ; ep que nriste dia mais bebeu foz mr valentia, ainda que vomite e perca o juzo. Nristas festas se cantam as proezas do defunto ou defunta, e do que tira o d, e o mesmo d-tomam os irmos,

; : ..-301 contrrios, ajuntar-se grande sommaririlles, e virem-lhe no alcance at lhe no poderem fugir"; e ser-lh necessrio esperal-os, o qe fazem ao longo d'agua, onde se fortificam fazendo sua cerca de cai; o que fazem com' muita pressa para dormirem ali seguros de seus contrrios^ mas com boa vigia : opde muitas vezes so cercados e apertados dos contrrios: mas os cercados vem por detraz drista cerca a quem est d fora, para empregarem todas as suas flexas vontade, e os de fora ho,vem quem lhes atira; e se no vem apercebidos para os abalroarem, ou de mantimentos, para continuarer com o cerco,:se tornam arecolher, por no poderem abalroar aos Tupinambs como queriam. ,E estes assaltos, que os Tupinambs vo dar nos Tupinas eutros contrrios seus, Ihris; acpntece tambm a elles pormuitas vezes, do que ficam muito mal tratados, se no so avisados primeiro, e, apercebidos; mas as mais das vezes elles so s que offendem a seus inimigos, e so mais prevenidos, quando "se vem n'estasaffrontas de mandar pedir soccorro a .seus vizinhos, e Ih'o veto logo dar com muita presteza. , , Quando os Tupinambs esto cercados de seus contrrios, as pessoas de toais uthoridade drintre elles lhes andam' pregando de noite que se esforcem e pelejem como bons cavalleiros,-e que no temam seus contrrios; porque muito depressa se vero vingados drilies, porqu lhes no tardar soccorro muito ; e as mesmas pregaes costumam fazer; q-pando elles4er cercado seus contrrios, os querer abalroar ; e antes, que dm o assalto, estando juntos todos noite atraz, passeia o principal de redor dos seus, e lhes diz m altas vozes que ho.de fazer, e os avisa para que' se apercebam eestejam alerta: e as,mesmas oregaes lhe faz, quando andam fazendo as cercas dp cai, para que se animem, e faam aquella obra com muita pressa ; e quando os Tupinambs pelejam no campo, andam.saltando de uma banda:para a outra, sem estarem nunca quedos, assobiando, dando com a mo no peito, guardando se das flexas que lhe lanam seus contrrios, e lanando-lhe as suas. com muita furi.
CAPTULO CLXX.

Em; que se. declara que o Tupinamb que matou o contraria, '-' .omalogo nome, e as eremonias que n'isso,fazem. ' Costuma-serintr os Tupinambs, que todo aquelle que
TOMO XIV v '42

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'inata contrario, toma logo nora entre si, mas nop diz '-seno a seu tempo,, qe inunda fazer grandes' vinhos ; e como ,esto para s poderem: beber, tingem-se .vspera tarde de genipapo, e comeam tarde a cantar, toda a noite, e depois que tm cantado ura grande pedao, anda toda a gente,da alda rogando ao matador, qup diga o nome que tomou, ao que se faz de rqgar, p tanto que o diz, se ordenam novas cantigas furidadssbrri morte driquelle que morreu, e emlouvor.es do que mato,\o drial, coro s acabam aquellas festas e vinhos, se recolhe para a sa rede, como anojado por certos dias, e no come nrilles certas cousas,que tem por agro se' as:,comer dentro driquelle tempo. '.. , Todo o Tupinarnb que matou na guerra ou embutra qualquer parte algum contrario, tanto, qe vem, para sua, casa, e notrio aos moradores drilla da tal morte do contrario, costumam,, pra o matador entrando em casa, arremearem-se todos ao seu lano, e tomarem-lhe as armas e. todas as suas alfaias de seu uso, ao que elle no ha de resistir por nenhum caso, e ha de deixar levartudoseni fatiar palavra ': e como-o matador faz estas festas deixa crescer o Cabello por d alguns dias, e corno grande, ordena outros vinhos para tirar o d ; ao que faz suas vsperas cantadas', e o.dia que se ho de beber os vinhos s tosquia o matador,' e tira p d, tornando-se a encher tingir'de genipapo, o qual -tombem se risca em algumas partes do corpo com o dente de cotia, em lavores; e d por estas sarjaduras uma .tinta com que ficam vivas, e em quanto o riscado vive, o ' texripor grande bizarria ; e ha alguns'ndios que tomaram tantos nomes, e se riscaram tantas vezes.qu no tem parte onde.n esteja o corpo riscado. Costumam tambm as irms dps matadores fazerem as mesmas., ceremonas que fizeram seus irmos', tosquiandp,se, p tngindo-se do genipapo, e dando alguns riscou era.si; e.fazem o iriesmo pelos primos, a que tambm chamar irmos, e fazem tambm suas festas com seus vinhos como elles; e para se no sentir a dr do riscar, se lavam primeiro muito espao com gua muito quente, com que lh etza a carne e no sentem as sarjaduras; ms .muitos ficam drillas to mal tratados que se pem em perigo de morte1.;

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CAPITULO C L X X I .

Queiratado tratamento que os Tupinambs fazem aos que ' cativam, e a mulher que lhe o.
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Os contrrios qe os Tupinambs cativam na guerra, ou d outra qualquer manira,metem-nos em prises, as quaes so cordas de algodo grossas,qu para isso teto mui louas, a qrie chamato muranas, as quaes so tecidas como os cabos dos cabrestos*de frica; com ellas os atam pela cinta e pelo pescoo, onde lhe do muito, bem de comer, e lhe fazem bom tratamento, at que engordam, e esto estes Cativos para se poderem ,comer, que o fim para que os engordam; e como os Tupinambs tem estes contrrios quietos e bem seguros nas prises, do a cada um por mulher a majs formosa moa, qe ha na sua casa, com quem se elle agazalha,-todas s vezes que quer, a qual moa tem cuidado de o servir, e de lhe dar o necessrio pra comer e beber, com o que-cevam cada hora, e lhe fazem muitos regatos. ,E se esta moa emprenha d que est prezo, como acontece njuitas,veZes, como pare, cria a criana at idade que. se pde comer, que a offerece para isso ao parente mais chegadp que lh'o agradece muito, o qual lhe quebra a cabea em terreiro com as ceremonias quese adiante seguem, onde toma o nome ; e como a criana - morta, a comem assada com grande festa,e a mi a primeira que come d'esta carne; o que tm por grande honra, pelo que de maravilha escapa nenhuma criana que nasa dristes ajuntamentos,qu no matem; e a mi que no come seu prprio filho, a que estes indios, chamam cunhambira, que quer dizer filho do contrario, tem-n'a em ruim conta, e em peior, se o nc.entregam seus irmos, ou "parentes com muito contentamento. Mas tatobem ha algumas, que tomaram tamapho^aror os cativos que as tomaram por mulheres, que lhe, deram muito gei to pra se acolherem ri fugirem das prises, que elles -cOrtam/com alguma ferramenta, que ellas sescorididslhes deram, e lhe foram pr no mato, antes de fugir, mantimentos para o caminho ; eestas taes criaram seus filhos com muito amor, e n os entregaram a seus parentes para ostoatarem, antes os guardaram e defenderam drilles.ate serem 'moos grandes, que' como chegam a essa idade logo escapam*da furiados seus contrrios. Muitas vezes dpixam os Tupinambs de matar alguns contrrios que-catvarm por serem moos,e se quererem servir drilles,

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aos quaes criam e fazem to br tratamento queandarndri maneira quepodmfugir, o que elles* no fazem por estarem a sua vontade; mas depois qe este gentio teve commercio com os Portuguezes, folgam de terem escravos para lh'os venderem; e s vezes depois de os criarem; os matam por fazerem uma festa dristas.. : '
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Que trata da festa eapparato que os Tupinambs fazem'p$ra matarem em terreiro seus contrrios. ] -,-. Como s Tupinambs vem quedos contrrios, rq-uri tem cativos, esto j bons para matar, ordenam--de fazer grandes festas a cada um, para as ques ha grandes ajuntamentos de parentes e amigos, que para isso so chamados de trinta e quarenta lguas, para a vinda dos quaes fazem grandes vinhos, que bebem com-grandes fsts-, mas fazem-nas muito maiores para o dia do sacrifcio do que ha de padecer, com grandes cantores, a vspera em todo dia cantam e bailam, e ao dia se bebem muitos vinhos pela manh, com motes que dizem sobre a cabea do que ha de padecer,.que tambm bebe com elles. .E s que cantam fundam nrista festa suas cantigas vtuperando o qu ha de padecer e exalando o, matador, dizendo suas proezas e louvores ; e antes que bebam os vinhos,, untam.o cativo todo >cpm mel de abelhas, e por cirna d'este mel o mpenam todocom pennas de cores; e pintam-no lugares de geni-"papo, e os ps com uma tinta vermelha, e toetm-lhe uma espada'de po nas mos para que se defenda de quem. o quer ma^ar com ella, como puder; e como, .estes cativos vem chegada a hora em que ho, de padecer, comeam .a: pregar e dizer grandes, louvores, sUa-pessoa, dzendo qe j est vingado de quem ov ha dp matar, contandograndes faanhas suas mortes que deu aos parentes,, do matador, ao qual ameaa e a toda a gente ria, lcla, dizendo q seus parentes o vingaro: E comeam a levar este prezo a um'terreiro fora da alda, qu para esta execuo' -est preparado, e metem-io entre dous mres; que esto, metidos no cho, afastados um do outro Vinte palmosj pouco mais ou menos, os quaes esto furados; e por cada furo, 'meterh as pontas das cordas com que o contrario vem preso, onde fica preso como touro de cordas, onde lhe as--Velhas dizem que se farte de ver-o sol, pois tem o fim to chegado ;

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ao, que o cativo responde corri grande coragem, que pois elle tem avihgana da sua morte to certa, que aceeita o morrer com-muito esforo. E.antes de-lhe chegar a execuo, contemos rao se prepara o matador.
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Que trata de, como, se enfeita -apparata o n\tadr. , "Costumam os Tupinambs, primeiro que o matador saa ao terreiro, nfe.ital-o muito beto, pirital-o com lavores de ^genipapo todo o corpo, e pem-lhe na cabea uma carapua de;pennas amarelias e uma diadema,' "ma.nilhas nos braos e pernas, das mesmas penhas, grandes ramaes de contas brancas sobraads, riseu rabo de pennas de ema nas ancas, e uma, empada de po de ambas as mos muito pezada, mafchetada corri continhas brancas de-'bzios, e pintada com cascas de ovos de cores,;, assentado tudo, em ; lavores ao seu modo, sobre cera, o que fica mui igualado bem feito; e no cabo drista espada tem grandes pena-ehos de pehnas de pssaros feitas em molho e dependuradas d empunhadura, a que elles; chamam embagadura ; como o matador est prestes pana receber esta honra, que, entre.o gentio; a maior qe pde ser, ajuntam-seseus parentes e amigos e vo-no buscar sua-casa ; d'onde o vem acompanhando com grandescantres e tangeres dos seus bzios, gaitas e tambores, chamando-lhp bemavehturad ; pois chegou a ganhar tamanha honra, c o u ^ vingar a morte'de seus-antepassados e deseus irmos e parentes ;. e com este estrondo entra no terreiro da execuo, onde est oque h d padecer, que o est esperando corri grande coragem com rima espada de po na mo, diante de quem chega matador, e lhe diz quese defenda, porque vm para o matar; a quem-responde o preso com railroncarias ; mas o solto remette aelle cprn a sa espada de ambas as mos,. da qual se se quer desviar o preso para alguma banda, mas os que tem cuidado das cordas pucham por ella de feio que o fazem esperar a pancada ; e acontece muitas vezes que o preso primeiro qu ihorra, chega corria sua espada ao ratador que o trata muito mal, sem embargo-de lhe no deixarem as cordas chegar a elle ; pr mais que o pobre.trabalha, no lhe aproveita; porque tudo dilatar . a s vida mais dous credos, onde a, rende nas mos do seu inimigo, que lhe faz,a cabea era pedascm sua espada; e

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coro se'acaba: estivexecuo; tiram-no das cordas, ele? vam-rio Onde se costrirarepartir esta carne; e acabado o matador de executar sua ira no cativo, toma logo entre si algum nome, qual declara depois com as cerempnias que. ficam ditas atraz ; e virse do terreiro recolher para o seu lano, onde tira as armas e pe.trfechos com que. se enfeitou ; e a "mesma honra;flcam recebendo aquelles qu primeiro pegaram, dos cativos na guerra, do que tornam tambm novo nome, Com as mesmas festas'e ceremonias que j ficam ditas ; o qu' se no faz com menos, alvoroo que aos prprios matadores. -;' ,' ",
, l . CAPITULO, CLXXrV. . :, V

m,que-se declamo que ,os-Tupinambs fazem do, contrrio ; que mataram, ; Acabado de morrer este preso,, o espedaam logo os velhos da-alda, e tiram-lhe as tripas e freur", que, mal lavadas, cozem eassampara comer ; e^reparte-se a.carne-por todas; as.casas.da alda e pelos hospedes que vierar-de fora para, ver estas festas, e matanas, a qual carne se coze logo para ,se comer nos mesmos- dias, de festas, ,e, outra, assam 'muitoafastada do fogo de maneira que fica muito mirrada, a queeste gentio chama tooquem, qual se, no corne por nrantimepto seno por vingana; e os homens manbos e mulheres*moas prpvam-na somente, e os velhos e velhas: so os.que semetem nrista carnia muito, e guardam alguma da assada do moquem por relquias; para com ella de novo tornarem afazer festas, se seno ofterecer tq-cedo matarem outro contrario. K of hospedes que viernt de fora a ver esta festa levam o seu quinho de crrie, que lhe deram do m.orto, assada do moquem para as auas aldas, onde como chegam fazem grandes vinhos para com grandes festas, segundo sua gentilidade, os bebererm-sobreesta. carne humana que levam,, qual repartem por todos" da, alda, para a provarem e se alegrarem m vingana de su, contrario que padeceu^ como fica dito. ., Acontece muitas vezes cativar umTupinamb u m contrario na guerra; onde o no quiz matar para o trazer cativo para a sua alda, onde o faz engordar coto as cere--'' monias j declaradas para o deixar matar a su filho quando moo ho tem idade para ir guerra, o qual mata em. terreiro, como fica dito, com as mesmas cermo-

307.. '

nias; mas atam as mos ae qqphride padecer, para coto isso o, filho tomar notoe novo e ficar armado cavalleiro, e mui estimado de todos. E se riste moo matador, u outro (algum, se no quer riscar quando torna novo nome, Contentam-s com se tingir de genipapo, e deixar Crescer p cabelloe tosquial-o, com as ceremonias atraz declaradas; e os quese riscar, quando 'tomam nome novo, a cada nome qrie tomam fazem su. feio: de lavor,, que para elles grande bizarra, para que se veja quantos nomes tem.
.- ' .;' CAPITULO CLXXV.

-Que trata das ceremonias que os Tupinambs fazem quando morre algUm,-e como'os enterram.
J--'-" ' '' '"' ' . y . '

. E' costume entre os Tupinambs que, quando morre qualquer d'elles, leva a enterrar embrulhado na sa rede era qqe dormia, e o parente mais chegado lhe ha de fazer a cova ;!'e quando o levam a enterrar ,vo;no acompanhando mulher,, filhas e parentes, s ,as "tem; as quaes vo pranteando at a covaKcom os,cabellos soltos sobre o rosto, e esto-no 'pranteando;at qu fica bem-coberto de ferra; drinds'tornam para sua casa, on a viuva chora o marido por muitos dias ; e se morrem as "mulheres dristes Tupinambs, costume que os maridos lhe faam a cova, e ajuder a levar s -costas: a defunta, e-se no tm j marido, o irmo ou parente mais chegado lhe faz a cova; E -quando morre algum principal da alda em que vive, ri depois de morto algmns dias, antes de o enterrarem fazem as ceremonias seguintes. Prirririiramente o untam com mel todo," e por cima do mel o.empennamcom pennas de pssaros d cores, e pe lhe uma carapua de pennas ha cabea, e todos-os mais enfeites qeelles costumara trazei nas suas festas; e ter-lhe feito na mesma casa e lano pnde elle vivia, uma cova muito funda e grande, corri sua estaqad' por de redor, para.que tenha, a terra que no caia sobre o defunto, ,e armam-lhe sua rede em baixo de maneira que no toque o morto no cho; em a qual rede ri mettem assim enfeitado, e pemlhejunto da lede seu. arco e, flexas, e/a sua espada, e o marac com que costumava tanger, e fazem-lhe fogo ao-longo da rede para se aquentar,e pemlhe de comer em um alguidr, eagua em um cabao, como gallinha ; e. como esta matalptgera est feita, e lhe pem -tambm sua cangoeira d fumo na m,.lanam-lhe, muita

308

:.

somma de madeira igual no andar da rede de maneira que no toque no corpo, ; e sobre esta madeira muita somma de terra, com rama debaixo primeiro,,: para que no caia terra sobre o'defunto; sobre a .qual sepultura vivera .mulher, como d'antes. E quando morre algum moo, filho de algum principal," quenpterit muita idade," mettem-no em ccoras, atados-os joelhos com barriga, em una pote em que,elle caiba, e enterrara o pote na mesma casa debaixo d cho,, onde o filho 'ri- o pai; se morto; s^o choradas muitos dias. /' ~ /,
/: "" .... CAPITULO CLXXVr:1

Que<trala,do sUccssor ao principal quemorreu, das , ceremonias que faz sjua mulher, e as- que -s-, fazem" por[{morte /drella tambm. -"_,, ' , '; / - ,/ ",-,;( Costumam os Tupinambs,- quando morre p principal da alda, elegerem eritre si quem sricce'4a etoseu,-lugar, ese o defunto tera filho, que lhe possa sppcicler,,' a elle aceitam por sua cabea ; e , quando no para isso, pu o ho tem, aceitarn umSpu irmo em seu lugar ;.ri'no' os tendo que tenham partes para; isso, elegem um parente seu^ se, capaz de tal cargo, tem as partes atraz declaradas. >",- * ' . E' costume entre as rnulheres dos principaes Tupinambs, ou de outro qualquer. irdio,\a mulher cortar os cabellos por d, e tingir-se toda de genipapo. As quaes chorar seus maridos muitos, dias, e -so, visitadas de suas parentas e amigas ;,e todas as vezes qe o fazem, torm cora a viuva a prantear de novo o defunto, as quaes deixam crescer ,q .cabello, at que lhe-dpelps olhos, e seno casa1 cora, outro, logo faz sua festa cora vinhos,"e torna-se a tosquiar para tirar o,d,-e tinge-se de novo do genipapo. Costumam os indios', quando lhe niorrprn as mulheres, ,deixarem crescer o cabello, rio que no.tem tempo certo, e tingem-se do genipapo pf d ;'e quando se querem tosquiar, se tornam a tingir de preto; vespera; d festa dos vinhos, que fazem a seu modo, cantando toda a noite, para a qual.se ajunta muita gente para estes cantores, e o viuvo tosquia-se vspera a tarde, eaq outro dia ha grandes ..revoltas de cantar e bailar, e beber muito; e o que nriste dia mais.bebeufez mr valentia, ainda que vomite e perca p juizol Nristas festas se cantam, as proezas do defunto ou Hefunta, e do-qrie tira p d, e o.msmo d tomam osirmps,'

309 .filhos, pai e mar do defunto, e cada um por si foz sua festa, quando tira, o d apartado, ainda que o tragam por uma mesma pessoa; mas este sentimento houveram de ter os vivos dos mortos, quando estavam doentes; mas so 'to desamoraveis os Tupinambs, que quando algum esta doente; e a doena comprida; logo aborrece a todos os iseus, e curam d'elle muito pouco:; e como o doente chega a es*ar mal, logo julgado por morto; e no trabalham s ^seus mais chegados por lhe dar vida, antes o desamparam, dizendo que pois ha tle morrer, e no tem remdio, que para que dar-lhe de comer, nem curar d'elle; etanto isto assim que morren muitos ao desamparo, e levam* enterrar outros ainda vivos, porque como chega a perder a falia do-no logo por morto; e entre os Portuguezes aconteceu muitas vezes fazerem trazer d e junto da cova escravos seus pra casa, por as mulheres o julgarem por mortos, muitos dos quaes tiveram sade e viveram depois muitos annos.
CAPITULO CLXXVII.

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Que, trata de como entre os Tupinambs ha muitos mameluco, que descendem dos Francezes, e de um indio quese achou muito alvo. , * Ainda que parea fora despropsito o que se contm nriste capitulo, pareceu*decente escrever aqui o que nrille se Contm, para.se melhor entender a natureza e condiodos Tupinambs, com os quaes os Francezes, alguns annos "antes que -se povoasse a Bahia, tinham eommercio; e quando se iam para Frana com suas nos carregadas -de po de tinta, algodo, e pimenta, deixavam entre os gentios alguns mancebos para aprenderem a lngua epoderem servir na terra, quando tornassem de Frana, para lhes fazer seu resgate ; os ques se ,am|C;ebaram. na terra, onde morreram, sem se quererem tornar para a Frana, e viveram como gentios com muitas mulheres,- dos quaes, e dos que vinham todos os annos Bahia e ao rio de Segenpe em nos de Franca, se inou terra de mamelucos, que nasceram, Viveram, e morreram como gentios ;'dos quaes ha hoje muitos seus descendentes, que so louros, alvosesardos, e havidos por indios Tupinambs, e so mais.brbaros que elles. E no de espantar serem estes descendentes 4os Francezes alvos e IriSfris, pois que sahem a seus avs;
TOMO xiv 43

310 mas de maravilhar trazerem do serto, entre outros Tupinambs, um menino de idade de dez annos para doze, no nno de 1586, que er to alvo, que de o ser muito no podia olhar pra aclaridade ; e tinha os cabellos ria cabea, pestanas e sobrancelhas to aiva como algodo,cor o qual Vinha seu pi, Com quem era to natural, qu.toda a pessoa qe via, d julgava por esse ser o conhecer ; e no er 'muito preto, e a mi que vinha na companhia; era- muito prt; e plasinformas quese ento tomaram dos outros Tdpin ambas'da Corpa*nhia, achou-se que opai driste indid branco n' descendia dos Fraticezes, nem elles foram quellas partes, .drinde esta gente vinha, nunca; e ainda qu este menino era assim branCo, era muito feio. Nrista povoao onde este indio branco veio ter, q de Gabriel Soares, aconteceu ur caso estranho a uma ndia Tupinamb, qu havia pouco que viera do serto, qual ia para unia roa bser mandioca, levando urn filho de urn anno s costas, que ia chorando, do qual se en^ fado-a mi de maneira que lhe fez uma cova com um-po,. no"hho, e o enterrou vivo : e foi-se aindia com as outras roa, que seria d'alli distancia de um bom tiro de' bombarda ; 1 e arrancou a mandioca, que ia buscar; e tornou se com ella para casa, que seria drinde a criana: ficava enterrada, outro tiro de bombarda ; sobre o que*as outras ndias, que viram esta crueldade de mi, estando fazendo a farinha, se puzeram a praticar, maraviIhandoJse do caso acontecido, o que ouviram outras ndias da mesma casa ladinas, e foram-no contar sua senhora, que logo se informou do caso como acontecera, e sabendo verdade drille mandou a toda pressa desenterrar a criana, que ainda acharam viva, e por sr paga a fez bptisar* logo, a qual viveu depois seis rnzes. ' D'aqui por diante se vai continuando com a vida e costumes dos Tupinas outras castas de gentio da Bahia que vive pela. terra dentro de.seu serto, dos quaes diremos o que podemos alcanar d'elles ; e comeano logo nos Tupinas.
CAPITULO CLXXVIII.

Que trata de quem so os Tupinas. Tupinas uma gente do Brazil semelhante no parecer.; vida e costumes dos Tupinambs; e na linguagnvno ter

311 mais differena uns dqs outros, do que tem s moradores de JLisboa dos de entre Douro e Minho ; mas a dos Tupinambs a mais pulida ; e pelo nome to semelhante dristas duas pastas de gentio se parece bem claro que antigamente foi esta gente toda uma, como dizem os indios antigos drista nao ; mas tr-se por to contrrios uns dos outros que se comem aos bocados, e no canam de se matarem em guerras, que continuamente tem, e no to somente so inimigos os Tupiris dos Tupinambs, mas so-no de todas s outras.naes: do gentio do Brazil, e entre todas ellas lhe chamam Taburas, que quer dizer contrrios. Os quaes Tupinasnos tempos antigos viveram ao longe do mar, como fica dito no ttulo, .deri Tripinrbs, que os lanaram drille para o serto,, onde agora vivem; e tero occupado uma corda deterra de mais riduzeritas lguas; mas ficam entresachados com lles^em algumas partes, alguns Tapuias, com quem, tem tatobem contnua guerra. .So os Tnpinas mais trioados que os Tupinambs, e mais-' amigos de comer carne humana, em tanto, que se lhes nocha nunca escravo dos contrrios que cativara ; porque tpds matam comem, sem perdoarem a ningum. E quando as fmeas emprenham dos contrrios, em parindo lhe comem logo a criana, a que tambm chamam cunhembira; e a mesma mi ajuda logo a comer o filho que
pariu.
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CAPITULO CLXX1X.

Que trata de alguns costumes & trajes dos Tupinas. Costumam entre os Tupinas trazerem os hornens os cabellos "da<cabea compridos at lhe cobrirem as orelhas, muito aparado*s. sobre, ellas, e desaffogado por' diante; e qutros o trazem copado 'sobre as orelhas, -como crenchas ; ealguns tosquiam a dianteira at as orelhas sobre pentem, e por detraz o cabello comprido ; e a seu modo, de uma mar neira e outra fica muito affeicoado. ' N So os Tupinas mais fracos de animo que os Tupinambs, de menos trabaLho, de menos f e verdade ; somusicos de natureza, e grandes cantores de chacotas, quasi pelo modo dos Tupinambs; bailam, caam e pescam, como elles, e pelejam em saltos, como lles : mas no so pescadores no mar, como se acham nrille, pelo no haverem em costume,

^ 313 pgr ser gente do serto, i e esmorecerem; e no pesca* srio nos rios d'agua doce. i !: v . Estes Tupinas andaram antigamente Correndo toda a> costa do Brazilj. drinde foram sempre lanados do outro gentio, com quem ficavam visinhando, pr suas ruins condies; do que fiaram mui pdiados d todas as outras naes do gentio. Traz este gentio os beios furados, e pedras n'elles e ntr rosto, como os:Tupinambs; e ainda, se fazem, mais' furos nrille, e se fazem mais bizarros; e quando se enfeitam o fazem na frma dos Tupinambs, e trazem ao, pescoo eo lares de dentes dos contrrios como elles, e na guerra usam dos mesmos tambores, trombetas, buzinas que costumam trazer os-Tupinambs; os quaes so rnuito mais sujeitos ao peccado nefando, do que so os Tupinrbs, e os que servem de.rachps se prezam,muito disso, e o tratam, quando: se dizem seus louvores. Quando este gentio anda algum caminho, ou se acha em parte onde lhe falta fogo, esfregando um po rijo que para isso trazem, comflexas,fendidas, fazem acender, esfregando? muito com as mos at que levanta labareda, ri- qual fo|gq- ; pega nas flexas, e drista maneira se remedeam; do qe tambm se aproveitam os Tupinambs; quando tem necesr sidade de fogo. '. ' ' '" Estes Tupinas so os fronteiros dos Tupinambs, com "os quaes foram sempre apertando at qu os fizeram ir visinhar com os Tapuias, com quem tem sempre guerra sm entenderem em outra cousa, da qual sahem como lhe ordena afortuna. D'este gentio Tupinas haja muito pouco, em comparao do muito que houve, o qual se consumiu corafomes.e*guerras que tiveram com seus visinhos, de uma.parte e da outra. Costumam estes indios nos seus cantores tangerem com um canudo de uma canna de seis a: sete palmos de comprido, e to grosso que cabe um brao, por grosso que seja, por dentro drille; o qual canudo aberto pela banda de cima, e quando o tangem vo tocando com o fundo do canudo no cho, e toa tanto como os seus tambores, da maneira que os elles tangera.
CAPITULO CLXXX.

Em que se declara quem so os Amoipiras e onde vivem. Convm arrumarmos aqui os Amoipiras, porque desceu^

313

dem, dos Tupinambs, e por estarem, na fronteira dos Tupinas, alm do rio de S. Francisco : e passamos pelos Tapuias, que ficam em meio para umadas bandag,:por estarem espalhados ppr toda a terra, de quem temos ruito que dizer ao diante, rio cabo d'esta historia da vida e costumes do gentio. . Quando s Tupinas viviam ao longo do mar, residiam os Tupinambs no serto, onde certas aldas drilles foram fazendo guerra aos Tapuias que tinham por visinhos, a quem foram perseguindo por espao de.annoso rijamente que entraram -tanto pela terra dentro, que foram visinhar. com o rio de S. Francisco. E n'este tempo outros Tupinambs fizeram despejar aos Tupinas de junto do mar da Bahia, como j fica dito, os quaes os metteram tanto pela terra dentro, afastando-se dos Tupinambs, que tomaram os.caminhos quelles que iam seguindo os Tapuias, pelo que no puderam tornar para o mar por terem diante os Tupinas, que, como se sentiram desapressados dos Tupinambs, que os lanaram fora da ribeira do mar, e souberam .4s'est't.ros Tupinambs que seguiram.os Tapuias, deram-lhe nas costas e apertaram com elles rijamente, o que tambm fizeram da sua parte.os Tapuias fazendo-lhe crua ^guerra, ao que os Tupinambs no podiam resistir; efridp-seto apertados, de seus contrrios, assentaram de se passarem da outra banda do rio de S. Francisco,.onde se contentaram da ferra, e assentaram ali sua vivenda, chamando-se Amoipiras, por o seu principal se chamar Amoipira: onde esta gente multiplicou de maneira que tem senhoreado ao longo driste rio de S. Francisco, a que o gentio chama o Par, mais de cem lguas, onde agora vivem : e ficm-lhe em frontaria dristoutra parte do rio, de um lado os Tapuias, e do outro os Tupinas, que se fazem cruel guerra uns aos outros, passando com embarcaes ao seu modo outra banda, dando grandes assaltos nos contrrios, ps Amoipiras aos Tapuias, que atravessam o rio em almadias, que fazem da casta de arvores grandes, cujo feitio fica atraz declarado.
CAPITULO"

CLXXXI.

Que trata da vida e costumes dos Amoipiras. Tem os Amoipiras a mesma linguagem dos Tupinambs ; e a differena que tem em alguns nomes prprios,

314 qe n mais enten .em-se muito beiri ; ,e tem _ os mesmos' :costumes e gentilidade; ms so mais traioados e de rienhuma f, npin verdade. ' . . - . ' " Na terra onde este gentio vive esto mui faltos de ferramentas, por no terem ommercio com os'Portugueses''; e apertados da necessidade cortam as arvores om 'rimas ferramentas de pedra, que para isso f^zem ; com o que ainda que com muito trabalho roara o mato para fazerem suas roas; do qu tambm se aproveitava antigamente todori outro gentio,* antes que communicasse Com gntbranca. -E para plantarem na terra a su mandioca e legumes, cavam nrilla coni,uns pos tostados agudos, que lhes servem de enxadas. Os quaes Amoipiras trazem o cabello d cabea copado e aparado ao longo das orelhas, e as mulheres trazr os cabellos compridos como as Tupinarbs, Pesca ''este gentio com uns espinhos tortos que lhe servem de anzes, com qe matam muito peixe, e flxa, para o que so mui certeiros, e para matarem muita caa. Trazem os Amoipiras os ' beios furados e pedras n'ellgs como os Tupinambs ; pintamis de genipapo, e enfeitamr se como elles ; e usam na guerra tambores que fazem de um s po que cavam por dentro com fogo tanto at que ficam mui delgados, os quaes toam muito bem ; na mesma guerra usam de trombetas que fazem de uns bzios grandes furados, ou da canna da perna das alimarias que matam,"a qual lavram e engastam em ura po.. Em tudo o mais seguem os costumes dos Tupinambs, assim na guerra como na paz, dos quaeri fica dito largamente no seu titulo. Estes Amoipiras tem por visinhosno serto detraz-, de si outro gentio, a que chamam Ubirajaras, com quem tem guerra ordinariamente, e se matam e comem uns, aos outros com muita crueldade, ser perdoarem as vidas, quando se ca1 tivam.
',-
CAPITULO'

CLXXX1I.

Que trata brevemente da vivenda dos Ubirajaras e seus , costumes Pelo serto d Bahia alm do rio de S. Francisco, partindo com os Amoipiras da outra banda rio serto, vive uma certa paao de gente barbara, a que chamam Ubirajaras, que quer dizer senhores dos pos, os quaes seno entendem na linguagem com outra nenhuma nao d gentio : tem con-

815 tinti guerra com os'Amoipiras, e captivam-se, matam-se, e comem-se uns aos outros sem nenhuma piedade. ' * ' Estes Ubirajaras no virar nunca ghte branca, em tem noticia d'ella, e gente muito barbara, da' estatura e cr do outro gentio, e trazemos cabellos muito compridos assim ps machos corno as fmeas, e no consentem em seu Corpo nenhuns cabellos que, em lhes nascendo, no arranquem. Fazem estes Ubirajaras suas lavouras, como fica dito dos' Amoipiras, e pescam nos rios com os mesmos, espinhos, e' com outras armadilhas que fazem com hervas; e matar muita caa com certas armadilhas que fazem, emq ue lhe: facilmente cahe;-A peleja dos Ubirajaras a mais notvel do mundo, como fica dito, porque a fazem com 4uns pos tostados muito, agudos, de comprimento defres palmos, p-co^rais ou, menos cada um, e so agudos de ambas as pontas; com os quaes atiram a seus contrrios como com punhaes; e so to certos com elles que no erram tiro, com o que tem grande ehegada ; e drista maneira matam tambm a caa:, qe* se lhes espera o tiro, no lhe escapa, os quaes com estas armas se defendem de seus contrrios to valorosamente como seus visinhos com arcos e flexas; e quando vo guerra, leva cada um seu feixe dristes ps com que peleja, e comestas armas so muito temidos dos Amoipiras, ' cqm os quaes tem.sempre guerra por uma banda, pela outra com umas mulheres, qe dizem ter uma s teta, que pelejam cm ,arco e flexa, e se governam e regem sm maridos, como se: diz das Amazonas; dos quaes no podemos alcanar mais informaes, nem da vida e costumes dristas mulheres; Comea a vida e costumes dos Tapuias. Como a tenp com que nos occupamos nristes lembranas foi para mostrar bem o muito que ha que dizer da Bahia -d Todos os Santos, cabea do Estado do Brazil, necessrio que no fique por declarar a vida e costumes dos Tapuias, primeiros possuidores d'esta provincia da Bahia, de quem, comeamos a dizer o que se pde alcanar drilles, comeando no" capitulo que se segek

316
l

CAPITULO LXXXil.

Que trata a terra que os Tapuias possuiranie possuem hoje em dia, ./ : At agora tratmos de todas as castas d gentio que vivia ao largo do mar da psta do Brazil, ,e d algumas na-^ s qu vivem pelo" serto, dri que tivemos' noticia, e deixamos de fallar dos Tapuias,, que o mais antigo gentio que vive nrista co:st, do ql ella foi toda Snhoreada , desde a boca do rio da Prata^at do rio das AmazQrias;;Qm ' se v do qe est hoje pvrijio" sethofeado drilles; forque da banda do rio da Pratatnhorar aolori^ri d Cta mais de cento e cincoiita leguas,,e da parte do rordas Arnzrihas serihoream para contra o sul mais de duzenflf lguas, pelo serto vem povoando por t m a corda de te'fa f>f cima de todas as naes do gentio nomeadas, de3de o ri da Prata at o das Amazonas,e toda a mais Cesta sehhoreram nos tempos atraz, d'ond por espao de tempo foram lanados de' seus contrrios ; por se elles dividirem e inimizarem uns com. os outros, por onde se no .favoreceram, os contrrios tiveram foras para pouco a pouco os irem lanando da ribptfe domar de que ll.s eram possuidores. Atraz fica dita como foram lanados os Tapuias d Bahia e seu limite pelos Tupinas, os, q"uas se foram recolhendo para o serto por espao de tempo^ onde at agora vivem divididos em bandos,* no se acommodando "uns. com s putros, antes tem cada dia differens e brigas,-e^-mm nitas vezes em campo ; pr'onde se diminuem em podei;, ' para no poderem resistir a seus contrrios cr as ; foras riacessarias'; por se fiarem muito em seu esforo e animo, no entendendo o que est to entendido, que o esfpfri''do& poucos no pde resistir ao poder dos muitos. '-, ';
CAPITULO CLXXXIV. '

Que trata de quem so os Tapuias, que so os Marcs. Como os Tapuias so tantos e esto to divididos em bandos,costumes elinguagem,para spderdizer drilles muito, - era necessrio de propsito de vagar tomar grandes; informaes de suas divises, vidae costumes : ra pois ao presente no possivel, tratarrs de dizer dos que : visinham com* a Bahia, sobre quem se fundaram todas estas

317 informaes qe n'este Caderno esto -relatadas; comeando logo que os mais chegados Tapuias aos pvoadores d Bahia so ns quesechamam de alcunha os Mr, cs, os quaes so homens robustos e bem acondicionados, trazem o cabello crescido ate s orelhas copado, e asmuiheres os cabellos compridos atados detraz, o'qual gentio falia sempre de papo tremendo com a falia, e no se,entende com outro nenhum gentio que no"seja Tapuia. Quando estes Tapuias cantam, : no pronunciana hada, por ser tudo garganteado, mas a seu modo ; so entoados , e prezam-se d grandes msicos, a quem o outro gentio folga ruito de ouvir'cantar. So estes Tapuias grandes flexeiros, assim para, a caa como para seus contrrios, e so muito ligeiros e grandes corredores, e grandes homens de pelejarem em campo descoberto, mas pouco amigos dp abalroar Cercas ; e quando do em seus contrrios, se- se piles recolhem era algurna cerca, no se detm muito em os cercar, antes se recolhemlgo para suas casas, as.ques 'tem em aldas ordenadas, como costumam os Tupinambs. Estes Tapuias no omm carne humana, e se' tomam na . guerra alguns Contrrios, rio os matam; mas servem-se drilles como de seus escravos, e por taq|os vendem ^agora aos Portuguezes que com elles tratam bommunicam. > Saosfes Tapuias, muito folgazes, e no trabalham nas roas, como os Tupinarbs,,nem plantam mandioca, nem comem seno legumes, qe lh as mulheres'plantar, e grangeam emtrras ser mato grande, a que pem o fogo para fazerem suas sementeiras ; os homens occupam-se em caar, a"que so muito afeioados. Costuma este gentio no hatar a ningnem dentro em suas casas,e se seus contrrios, fugindo-lhe da briga, se colhem a ellas, ho os h de matar dentro, nem fazer-lhe nenhum aggravo,.por mais irados que estejam; e esperam que saiam para fora, ou se lhe passa a ira e aeitam-nos por escravos, ao que so mais afeioados que a matal-os, corno lhe
"ff*L7PTl L GllGS

So'os Tapuias contrrios de todas asoutras naes_ do gentio, por terem guerra-com elles ao tempo que viviam junto do mar, drinde por fora de 'armas-foram lanados: os quaes so homens d grandes foras, andam nus como o m;s gentio, e no consentem em si mais cabellos que os da cabea, etrzem os beios furados e pedras n'elles, como os Tupinambs.' *' "'.,/' , . Estes Tapuias so conquistados, pela banda do no de beTMO xiv
44

318 rgipe, dos Tupinambs que vivem por aquellas partes; e por outra parto os vem saltear os Tupinas, que vivem da banda d poente: e vigiam-se ordinariamente de uns e dos cftros; e est povoado driste gentio poi* est banda cincoenta ou sessenta lguas de terra ; entre os qu,aes ha uma serra, Onde ha muito salitree pedras verdes, de que elles fazem as que trazem metidas nos beios por bizarria.
CAPITULO CLXXXV.

Em- que se declara o sitio em que vivem outros Tapuias, e de parle de seus costumes. Pelo serto da mesma Bahia, para a banda do poente oitenta lguas, do mar, pouco mais ou menos, esto uras serras que se estendem por uma banda e para a outra, e para o serto mais de duzentos lguas, tudo povoado de Tapuias contrrios dristes de que at agora tratamos que se dizem os Maracs, mas todos faliam, cantam e bailam de iima mesma feio, e, tem os mesmos costumes n proceder da sa vida e gentilidades, cor muito pouca differena. Estes Tapuias tein guerra por uma banda cora ps Tupinas, que lhe ficam a ura lado muito visinhos, e por outra parte a tem com os Amoipiras, qe lhe ficam em fronteira da outra haod do'rio de S. Francisco, e matam-se~ uns aos outros cruelmente, dos quas se vigiam de continuo, contra quem pelejam com arcos e_flexas, o que sabem to bem manejar como todo o gentio do Brazil. So estes Tapuias grandes homens de fazer guerra a seus contrrios, e so mais, esforados que conquistadores, e mais fieis que ps Tupinas. Vivem estes Tapuias em suas aldas em casas bem tapadas pelas paredes, e armados de po a pique a seu modo, nxuito fortes, por amor dos contraries 'os no entrarem e tomrera de sbito, er as quaes dormem em redes, Como os Tupinambs, com fogo ilharga, como faz todo o gentio drista comarca. ^ . No costuma este genfio plantar mandioca, nem fazer lavouras seno de milhos outros legumes ; porque nd tem ferramentas com que roar o mato e cavar a terra, e por falta d'lla quebram o mato pequeno s mos, e s arvores grandes pem fogo ao p d'onde est lavrando*at que as derruba, cavam, a terra Com posagudos, para plantarem suas sementeiras, e o mais do tempo se mantm

319 com frutas silvestres e com caa, que so muito afeioados. " Costume d'este gentio Tapuia trazerem os machos s cabellos da cabea to compridos que lhe do pela cinta, e s vezes os trazem entranados ou ennastrdos com fitas de fio de algodo, que so como passamanes, mas ruito largas; e as fmeas andam tpsquiadas, e trazem cingidas "de redor de/si umas franjas de fio de algodo, que tem os cadilhos to compridos qrie bastam para lhe cobrirem suas vergonhas, o que no trazem nenhuras mulheres do gentio dristas partes.
CAPITULO CLXXXVI.

Em que s declaram alguns costumes dos Tapuias --.', d'estas parles.


k Estes Tapuias que vivem nrista cotorca so muito msicos, e cantara pela maneira dos primeiros; trazem os beios debaixo furados, e nrilles uttias pedras verdes rolias compridas," qrie lavrar de vagar, roando-as coto outras pedras tanto at que as aperfeioam sua vontade. No pescam estes indios nos rios linha, porque no tem anzes; mas para matarer peixe, colhem uns ramos de umas hervas como vides, mas mui compridos e brandos, e tecem-nos como rede,;os quaes deitam no rio, e tapam-no d uma parte outra ; e uns tem mo n'esta rede e outros batem a gua em cima, drinde o peixe foge e vem-se descendo, at dar nrilla, onde se ajunt ; e tomara s,mos o pequeno peixe, e o grande matam s flexadas sem errarem um. '. Costumam estes Tapuias, para fazerem sal, queimarem uma serra de salitre., que est entre elles,. drinde tomam aquella cinza; e a terra queimada, lanam-na n'agua do rio em vasilhas, a qual fica logo salgada, e poem-na o fogo onde a cozem e ferve tanto at que se coalha, e fica feito o sal em um po ; e com este sal temperam seus manjares ; mas o salitre torna logo-a crescer na serra para cirna,, mas no to alvo como o que no foi queimado. Entre estes Tapuias ha outros mais chegados ao rio de S. Francisco, que esto com elles desavindos, que so mais agrestes e no vivem eto casas, e fazem sua vivenda em furnas onde se recolhem; e tem uma dristas serras mui as-

T?.

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pera onde fazem sua habitao, s quaes tem os mesmos costumes que os de cima. Corre esta corda dos Tapuias toda esta, terra do Brazil pelas cabeceiras do outro gentio, e ha entre elles differentes castas, com mui differentes costumes, e so contrrios uns: dos outros; entre os quaes ha grandes discrdias, por onde se fazem guerra muitas, vezes e se matam, sem nenhuma, piedade. D''aqui por diante se declara o grande commodo que a Bahia: tem para se fortificar, e s metaes que se n'ell do. No parece despropsito arrumar .sornbra do que est dito da Bahia de Todis os Santos, s grandes apparelhose commodos que tem para se fortificar, como convm ao servio de EKRei Nosso Senhor e ao bem da terra,, para se poder resistir aqum a quizer offender ; o que comeamos a declarar pelo capitulo que se segue.
CAPITULO, OLXXXV1I.

Em que s declara,a pedra que tem a Bahia para se poder fortificar. A primeira cousa que convm para se fortificar a Bahia que tem pedra de alvenaria e cantaria-, d que ha em todo o seu circuito muita cpmmodidade, e,grande quantidade para se poder fazer grandes muros, fortalezas e outros edifcios ; porque de redor da, cidade ha muita pedra preta, assim o longo do mar, como, pela terra, ^a qual de pedreiras boas de quebrar, com a qual se faZer paredes mui" bem liadas ; e pelos limites drista cidade ha muita, pedra molr, como a de alvenaria de Lisboa, com que se faz boa obra: e ao longo do mar, meia lgua da cidade, e m muitos lugares mais afastados, ha-muitas lagoas "d pedra molle como tufo, de que se fazem cunhaes em obra de alvenaria, om os quaes se liam os edifcios que se ,n,a terra fazem, e seaffeioam os cunhaes dristas lages com pouco trabalho, por estarem cortados peja natureza conforme o para que so necessrios. ' Quando se edficou a cidade do Salvador, se aproveitaram os edificadores e pvoadores'd'ella de uma pedra cinzenta ta de lavrar, que iam buscar por mar ao porto de Itapibanga, que est sete lguas da cidade na toestoa Bahia, da

321 -qual fizeram, as columnas da S, portaes e cunhaes e outras obras de meio relevo, p muitas campas e outras obras ^proveitosas; mas depois se descobriu outra pedreira melhor, que se arranca dos arrecifes q'ue se cobrem com a preiamar da mar de guas vivas ao longo do mar, a qual pedra alva e dura, q o tempo nunca gasta, mas trabalhosa de lavrar, que gasta as ferramentas muito ;., de que se fazem obras mui primas e formosas, e campas de sepulturas mui grandes; e parece a quem isto tem attenfado que esta pedra se fez d ara congelada; porque ao longo dos mesmos arrecifes, bem chegado a elles, ' tudo rochedo de pedra preta, e esfoutra muito branca, depois de lavrada ; mas no muito macia, a qual quando a lavram faz, sempre uma g-r areent, e acham-se muitas vezes no mago d'estas pedras cascas de ostras e de outro marisco, e uns seixinhos de ara ; pelo quese tem que esta pedra se formou de ara e quese congelou com a frialdade da gua do mar,.o que facilde crer; porque se acham por estas praias limos enfarinhados de ara, que est congelada e dura como pdr, e alguns pos de ramos de arvores tambm cobertos drista massa to dura como se foram de pedra.
CAPITULO CLXXXVIII.

Em que se declara o commodo que tem a Bahia para se poder fazer muita cal, como se faz. Amor parte da cal que s faz na Bahia das cascas das ostras, de que ha tanta quantidade que se faz ririfla muita cal, a qual alvissima,e lisa tambm, como a de Alcntara; e fazem-se drilla guarnies de estuque mui alvas e primas; e a cal que se faz das ostras mais fcil de fazer que de pedras ; porque gasta pouca lenha e com lhe fazerem fogo que dure dez, drize,horas, fica muito bem cozida, e to forte que se quer caldeda, e ao caldear-forve em pulos como a cal de pedra de Irisboa. Quanto mais que, quando . no houvera este remdio t fcil, na ilha de Taparica que est defronte da cidade esto trs fornos de cal, onde se faz muita, que se vende a cruzado o moio ; a qual cal mui estranha, porque se faz de umas pedras que se criam no mar nriste sitio drista ilha e em outras partes, as quaes so muito crespas e artificiosas para outras curiosidades; e ,no nascem em pedreiras, masiacham-se soltasenLmulta quantidade. -Estas pedras so sobre o leve,-por-serem por-

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dentro organisadas com alfebas. Esta padra.se enfrna; em fornos de arcos, com os em que cozem a loua, com.sua abobada fechada por cima da mesma pedra, mas..sobre ps arcos est o Sorrio todo cheio de pedra, e o fogo. mttYelhe por baixo, dos arcos com lenha grossa, e coze em rima noite e um dia, e coze muito T).em ; cuja cal muita alva, e lia a obra que se drilla faz como a de Portugal, e caldeamna da mesma maneira ; mas no leva tanta aja como .a cal que s fazdas ostras e de outro qualquer rarisco, de que tambm se faz muito alva e boa para todas as. obras. Quanto mais.que, quando no houvera remdio to fcil para se fazer infinidade de cal como o que est dito, om pouco trabalho se podia fazer muita cal, porque.na Bahia," no rio de Jaguaripe, eem outras partes ha muito pedra lioz, como a de Alcntara, com umas veias, vermelhas, a qual pedra muito dura, de-que s far toda obra prima, quanto mais cal, para o que se tem j,experimentado e coze muitoher; e se se no vale drilla para fazerem cal porque acham st.riutro remdio muito perto muito fcil;,'e para ^ mesmas obras-e ediflcios que forem necessrios, tem a Bahia muito barro de qu se faz muita e boa telha, e muito tijolo de toda a sorte ; do;que ha m cada engenho rri forno de tijollo e telha, em os quaes se coze tambm muito boa loua e formas que se faz do mesmo barro.
CAPITULO CLXXXIX.

Em que se declaraos grandes apparelhos que ha na Bahia para se rtella fazerem grandes armadas. Pois sobejam apparelhos " Bahia para se poder fortificar, entenda-se que lhe no faltam para se poder fazer grandes armadas com que se possa defender e offender quem contra o sabor de S. Magestade se quizer apoderar drilla, para o que tem tantas e tq maravilhosas e formosas madeiras, paras fazerem muitas, nos, galees e gals, para quem no faltaro remos, corri que se elles possam remar,-muito estremados,- como j fica dito atraz; pois para se fazer muito.taboado ,para estas embarcaes sobeja comrnodo para isso, porque ha muitas castas d madeiras, que s ser-. ram muito bem, como em seu lugar fica dito ; para as qaes o que falta so serradores, de q'ue' ha tentos na Bahia escravos de diversas.pessoas, que convindo ao servio de S. Magestade trabalharem todos e fazer taboado, ajuntar*

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ge-ho pelo rdios quatrocentos serradoresesrrivos muMo destros, e duzentos escravos carpinteiros de rachadb;; e ajuntar-se-ho mais quarenta,carpinteiros da ribeira, Portuguezes emestios, para ajudarem a fazer as embarcaes, os quaes se occupara em fazer navios que na terra fazem, caravelles, barcas de engenho e barcos de toda a sorte. O que resta agora de madeira para fazerem estas nos e gals so mastros e vergas ; d'isto ha rais apparelho na Bahia que nas provncias de Flandres; porque ha muitos mastros inteiros para se emmastreremnosde toda a sorte, e muitas vergas,.,o que tudo mais forte do que os de pinho e de mais dura (mas So mais pesados), o que tudo se achar borda da gua. Bem sei que me esto j perguntando pela prgadura para essas armadas, ao qu respondo que na terra ha muito ferro de vas para se poder lavrar, mas que em quanto se no lavra ser necessrio ir dp outra parte;- mas s a necessidade for muita, ha tantas ferramentas na terra d trabalho, tantas ferragens dos engenhos que se ppdero jrintar mais de cem mil quintaes de ferro ; por que tarde j em lhe dr ferreiro, digo que m cada engenho ha um 'ferero om sua,tenda, e com os mais que.tem tenda na cidade" e em outras partes s pde juntar cincoenta tendas d ferreiros, com seus mestres obreiros.
CAPITULO cxc.

Em que se apontam os mais apparelhos que ha para se fazerem , ::: estas armadas. Parecer impossivel achar-se na Bahia apparelho de estopa para se calafetarem s nos, galees e gals que se podem fazer nrilla, para o que tem facillissimo remdio; porque ha nos matos drista provincia infinidade de arvores que do envira, como ternos dito, quando falamos da propriedade drillas, a qual envira lhe saheda casca que to grossa como'um dedo ; como est pisada muito branda, e drista envira se alafetam as nos que se fazem no Brazil, e todas as embarcaes ; de que ha tanta quantidade como j dissemos "atraz* a qual para debaixo da gua muito melhor que estopa, porque no apodrece tanto, e incha muito na aga, e as costuras quese alafetam com a envira ficam muito mais fixas do que 'a qu se alafetam com estopa,rio que ha muita quantidade na terra. E_se cuidar qrier ler estes apontamentos que no haver officles que

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.calafotem estas erbarcaes, affirm-lhe que ha estantes na .Bahia mais de duas dzias, e achar-se-ho nos navios, que sempre esto no porto, dez ou doze, que so calafates das mesmas nos, e-ha muitos escravos tambm na. terra que so calafates por si ss,- e sombra de quem,'o sabem bem fazer. : Breu para se brearern estas embarcaes no temos na terra, mas por falta de se no dar remdio isto ; porque ao lemgo d o m a r a m terras: baixas de ara, tudo povoado de umas arvores, que,se chamam, camaari, que entre a vcasca e o mago lanam infinidade de resinabranc, grossa como termentina de*Beta,-a qual to pegajosa, que se no tira das mos seno com azeite quente, a qual, se houver quem lhe saiba fazer algum cozimento, ser muito boa para brearer,cm.ella os navios,, e far-se-ha tanta quantidade .que podero carregar nos drista resina ; -e porque se -no podem brear.as nos sem.se misturar com a resina graxa, na Bahia se faz muita de tubares, lixa e outros peixes, com . qu se alumini os engenhos e se bream os barpps que ha n terra", e que bastante para se adubar o "breu para muitas nos, quanto mais que se Bahia forem1 Biscainhos . ou outros homens que saibam armar s balas, em nenhuma parte entram tantas como nria, onde residem seis1 mezes do anno e mais, de que se far tanta graxa que no haja erbarcaes que a possam trazer Hespanha.
CAPITULO CXCI.

Em que se apontam os mais apparelhos que faltam pata as -. >., . v, ',--' embarcaes. -:-"'Pois que temos apparelhos para lanar, as embarcaes quese podem fazer na Bahia ao mar, convm que lhe demos os apparelhos com que estas embarcaes possam navegar : edemos-lhe primeiro, as bombas,: que se fazem na,terra muito boas de duas peas, porque tem estremadas madeiras para ellas ; ,e para navios pequenos ha umas arvores que a natureza furou por dentro, que servem de bombas nqs navios da costa, as quaes so muito boas. Poisos poleames se fazem. ,de uma arvore que chamam genipapo, que multo bonvd lavrar, e nunca fende como est secco, de que se faro de toda a sorte. Ensrcea para as embarcaes tem, a- Bahia em, muita abastana, porque, se faz da.mesma'pnvir;..com, que alafetam, antes,de se

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amassar, aberta eto febres mo, a qual se fia to bem como o linho, mais durvel e mais rija que a de esparto e to boa como a do Cairo; e drista mesma envira se fazem amarras muito fortes e grossas e de muita dura; e ha na terra envira em abastana para se poder fazer muita quantidade de ehsrcea e amarras: e para amarras tem a terra putro remdio das barbas de umas palmeiras brabas que lhes nascem ao p; de comprimento de quinzee vinte palmos, de que se fazem amarras muito fortes e que nunca apodrecem, de qe ha muita quantidade pelos matos para se fazerem muitas quando cumprir. Pelo que no falta mais agora para estas armadas que as velas, para o que h facilissim remdio, quando as no houver de lonas e panno de treu ; poisem todos annos se fazem grandes carregaes de algodo, de que se, d muito na terra; do qual 'podem fazer grandes teaes d panno grosso, que muito bom para velas, de muita dura e,muito leves, de que andam velejados os navios e barcos da costa; e dentro ria Bahia trazem muitos barcos as velas de panno de algodo que se fia na torra, para o que ha muitas tecedeiras, quese occupam em tecer teaes de algodo, que s gastam m vestidos dos indios, escravos de Guin, e Outra muita gente branca de trabalho.
"CAPITULO cxcii.

Em que se aponta o apparelho qu a Bahia tem para se fazer plvora, e muita picaria e armas de algodo. Pois temos dito o apparelho que a Bahia tem para se fortificar e defender de corsrios, se a forem commeter, saibamos se tem alguns apparelhos naturaes da terra om que possam offender seus inimigos, no fallando nos arcos e flexas do gentio, com o que os escravos de Guin, mameIricos, e outros muitos homens bravos naturaes da terra sabem pelejar, do que ha tanta, quantidade nrist provncia,; mas digamos das maravilhosas.armas de algodo que se fazem na Bahia, geralmente por todas as casas dos moradores,.as quas no passa besta, nem flexa nenhuma ; do que se os Portuguezes querem antes armar que de cocolqteS) neto couraas; porque a flexada que d nristes armas resvala por "ellas efz damno aos companheiros ; e driste estofado de algodo armamos Portuguezes os corpos e fazem do mesmo estofado clladas para a cabea, e muito
TOMO xiv 45

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boas adargas. Fazem tambm na Bahia- pavezes e rodelasdp copaiba, de que fizemos meno quando falamos da natureza drista arvore, as quaes rridef Ias saoto boas como, as, lo adargoeiro, e davatagem por sereto mais leves e estopentas* d que se faro infinidade drillas muito grandes e boas. , iv ' , Do-se naBahia muitas hastes de lanas do comprimento que quizerem, as quaes so rais pezadas que asde faiay mas so muito mais fortes e formosas; e das arvores de que se estas hastes, tiram, ha muitas de que se pd fazer muita picaria,e infinidade de dardos de l,arrereo, queos Tupinambs, Sabem'muito'bem fazer. E chegando ao principal, que a plvora, era todo 0 mundo se no sabe que, haja to bom apparelho para ella como na Bahia, porque tem muitas serras que no tem outra cousa seno salitre, o qual est em pedra alvissima sobre a terra, to fino que assim pega p fogo drill comri de plvora mui refinada ; pelo que se pde fazer na Bahia tanto quantidade drilla que se possa drilla trazer tanta para Hespanha, com. que se,forneam todos os estados de que S. Magestade rei e senhor, sem esperar que lhe venha de llemanha, nem de outras partes, ; d'onde trazem este salitre com tanta despeza e trabalho, do que se deve de fazer muita conta. , -
CAPITULO CXCIII.
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Em que se declara o ferro, ao e cobre, que tem a Bahia. Bem por culpa d quem atem no/ha na Bahia muitos engenhos de ferro, pois o ella est mostrando Com o dedo em tantas partes, para o que Luiz de Brito levou apparelhos para'fazer urn engenho de ferro por conta de S. A. e,offi.ci,as driste mister; e o porque se no fez,' no serve.de nada dizer-se ; mas no se deixou de fazer,por falta, de ribeiras de gua, pois ri terra tem tantas e to capazes para tudo ; nem por falta de lenha e carvo, pois em qualquer parte onde se os engenhos de ferro assentarem, ha disto .muita abundncia. Tambm na Bahia, trinta lguas pela terra dentro, ha algumas minas descobertas sobre a terra de mais fino ao que, o de Milo; o qual est em pedra sem outra nenhuma mistura de terra nem pedra ; e no temque fazer mais que lavrar-se em. vergas para se poder fazer obra com ejle, do que ha muita quantidade que est perdido sem haver

- 327r quem ordene de aproveitar; e driste' pedra d co s servem os indios para amolarem as suas ferramentas com ella mo. ' , '. ' E cinooenta ou sessenta lguas pela terra dentro tem a Bahia uma serra muito grande escalvada que no ter outra cousa seno cobre, que est descoberto sobre a terra em pedaos, feitos em concavidades, crespo que no parece seno que foi j fundido, ou ao menos que andou fogopor esta serra, com que se fez este lavoi;-no cobre, do que ha tanta quantidade que seno- acabar nunca. E nesta serra estiveram por vezes alguns indios Tupinambs e muitos mamelucos, outros homens que vinham do resgate, os quaes trouxeram mostras driste cobre em pedaos, qu se no foram tantas as, pessoas que viram esta serra se no podia crer seno que o derreteram no caminho de algum pedao de caldeira .que levavam ; mas todos affirmram estareste cobre d'aquella maneira descoberto na serra. CAPITULO cxciv. , '

Em que se trata das pedras verdes- e 'autues que se acham no serto a Bahia.Deve-se tmbem notar que se acham tamhem no serto da Bahia umas pedras azues escuras- muito duras e de grande fineza, de que os indios fazem pedras que mettem nos beios, e fazem-nas muito rolias e de grande lustro, roando*-as com .outras pedras; das quaes se podem fazer pecas de muita estima e grande valor, as quaes se acham muito grandes; e entre ellas ha algumas que t<m umas veias leonadas que lhe do muita i graa. No mesmo serto ha muitas pedreiras de pedras verdes Coalhadas muito rijas,-da'que o gentio tambm faz pedras pra trazermos beios rolias e compridas, as quaes lavram como as de cima, com o qiie ficam muito lustrosas : do que "se podem lavrar peas muito ricas e pra se estimarem entre prncipes e grandes senhores, por terem a cr muito formosa ; e pdem-se tirar da pedreira pedaos de sete e oito palmos, e estaripedras tem grande virtude contra a dr ae
{"*'Ol f*f

Er muitas outras partes da Bahia, nos cayoucos que fazem as invernadas na terra, se acham pedaos de finssimo cristal, e de mistura algumas pontas oitavarias como diamante, lavradas pela natureza, que tem muita formosura

.'-/K

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e.resplandor. E no ha duvida seno que entrando befli pelo serto, d'esta terra h rirrrisde cristal friissimo,-que se enxerga o,resplandor d'llari de muito longe,..e affirmaram alguns Portuguezes que as viram que parecem de lpng as serras de Hespanha quando esto cobertas de neve, os quaes e muitos mamelucose indios <Iu viram ests serras dizem que est fo bem, criado e formoso este.cristal em grandeza, que se podem tirar pedaos inteiros de dez, doze palmos de comprido, de grande largura e fornimento, do qual cristal pde vir Hespanha muita, quantidade, para poderem fazer-drile obras mui notveis. " ' ;,CAPITULO

cxcv.

Em que se declara o nascimento das esmeraldas e safiras. Em algumas partes do serto da Bahia se achar esmeraldas mui limpas e de honesto tamanho, as quaes nascem dentro em cristal, e como ellas crescem muito, arrebenta o cristal; e os indios quando as achar dentro n'elle, pemlhe o fogo paraTri fazerem arrebentar, de maneira quelhe possam tirar as esmeraldas d dentro, com o que ellas perder a cr e muita parte do seu lustro, das quaes esmeraldas se servem os indios nos beios, mas no as podem lavrar como as pedras ordinrias que* trazem nos beios de qu j, falamos. E entende-s que assim como estas esmeraldas que se acham sobre a terra so fluas, que o sero muito as que se buscaram debaixo drilla, e de muito preo, porque a que a terra despede de si deye de ser escria das boas que ficam debaixo, as quaes se na buscaram at agora por quem lhe fizesse todas as/diligncis, nem Chegaram a ellas mais que mamelucos e indios, que se .contentavam de trazerem as; que acharam sobre aterra, e em uma das -partes onde.se acharn.estas esmeraldas, qe ao p de uma serra, onde . de notar muito o seu nascimento; porque ao p d'esta,serra, d banda do nascente se acham muitas esmeraldas dentro no cristal solto onde ellas nascem ; dbnde trouxeram, uns indios amostras, cousa muito para ver; porque, como o cristal mui transparente, trespassam as esmeraldas com seu resplandor da outra banda, s quaes lhe ficam as pon- , tas da banda de fora que parece que as metteram mo pelo cristal. E ao p da mesma serra da banda do poente se ; acham outras pedras muito escuras que tambm nascem no cristal, as qua^s mostram um roxo r de purpura muito

329 :;v-:

fino, e tem-se grande presrpa dristas pedras poderem ser muito finas e de muita estima. E perto drista serra est outra de quem o gentio conta que cria umas pedras muito vermelhas, pequenas e de grande resplandor. Afirmam os indios Tupinambs, os Tupinas, Tamoiose Tapuias e os indios que com elles tratam, nriste serto da Bahia e no da capitania de S. Vicente, que debaixo da terra se cria uma pedra do tamanho e redondeza de uma bola, a qual arrebenta debaixo da terra; e que d tamanho estouro como ura espingarda, ao que aodem os indios e cavam terra, onde tooti este estouro, ondeacham.aquella bola arrebentada em quartos como rom, e que lhe sahem de dentro muitas pontas cristalinas do tamanho de cerejas, as quaes so de uma banda oitavadas e lavradas mui sutilmente em ponta como diamante, e da outra banda onde pegavar da bola tinham uma cabea tosca, das quaes trouxeram do serto amostras drillas o governador Luiz de Brito, que quando as viu teve pensamento que seriam diamantes ; mas um diamante de um anel entrava por ellas, e a casca da bola era de pedra no muito alva e ruivaa por fora.
CAPITULO

cxcvi.

Em que se declara a muita quantidade d ouro prata que ha n comarca da Bahia. Ds metaes de que o mundo faz mais conta, que o ouro e prata, fazemos aqui to pouca, que os guardamos para o remate e fim drista historia, havendo-se de dizer drilles primeiro, pois,.esta terra da Bahia tem d'elle tanta parte quanto se pde"imaginar; do. que pde vir Hespanha cada anno maiores carregaes do que nunca vieram das ndias occidentaes, se S. Magestade for disso servido, o que se pde fazer sem se mettr nrista empreza muito cabedal de sua fazenda, de que no'tratamos miudamente por no haver para qrie, nem fazer ao caso da teno dristas lembranas, cujo fundamento mostrar as grandes qualidades do"Estado d Brazil, para se haver de fazer multa conta drillri, fortificandp-lhe os portos principaes, pois tem tanto commodo para isso como no,que toca Bahia est declarado ; o que se devia pr em effeito com muita instncia, pondo os olhos no perigo em qe est de chegar noticiados Lutteranos parte do contedo ;n'este tratado,. para fazerem suas armadas, e se irem povoar esta provin-

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cia, nderipn pouca fora que levem.de gente bm armada ge podem senhorear dos", portos principaes, porque no ho de achar nenhuma resistncia nrilles, pois no tem.nenhum modo de fortificao,1 drinde os moradores se' possam defender nem ffender quem os quizer entrar. Se Deus o permitiu - por nossos peccados, que seja isto, acharo fodris os, . commodos que temos, declarado e muita mais para ; se fortificarem, porque ho de fazer trabalhar os moradores nas , suas fortificaes com as suas pessoas? cor- sus escravos, barcos; bois, carros e tudo mais necessrio, e com todos os mantimentos que tiverem por suas fazendas, o que lhe ha de ser forado fazer para com isso resgatarem as vidas ; e com a fora da gente da terra se podero apoderar e fortificar d maneira que no haja poder humatio com quese possam tirar do Brazil estes inimigos, drinde podem aer grandes damnos a seu saivo em todas as terras martimas da coroa -de Portugal e Casfella, o que Deus no prirmittir ; de cuja bondade confiamos, que deixar estar estes inimigris da nossa santa f catholica com a cegueira que at rigora tiveram de no chegar sua noticia o contedo ririste tratado, para que lhe no faam, tantas offeosas estes infiis,, pomo lhe ficaro fazendo se se senhorearera drista ferrai que Deus deixe crescer em seu santo servio ; com que o seu santo nome seja exalado, para que Sua Magestade a possa possuir por muitos e felices annos com -grandes contentamentos. '" ', . . .

BREVES COMMENTARIOS

PRECEDENTE OBRA D E GABRIEL SOARES.

INTROBUCO, Quando em princpios de Maro d'este anno escrevamos em Madrid a dedicatria que precede a presente edio da obra de Gabriel, Soares,/ e lhe serve como de prefacio, no podamos imaginar que to cedo veramos em execuo a nossa proposta, e menos podamos adivinhar que concorre, riamos^;t:prira a realisar, sendo, ao chegar corte, chamado a desempenhar, as funces do cargo de primeiro secretario'do nosso Instituto Histrico, cargo a que, ( pelos novos estatutos, anda annexa a direco dosannaes que ha quatorze annos publica esta corporao. Animado pelo voto da maior parte de nossos consocios, entrpgmos ao prelo o manusripto da obra sobre que tanto finhams.trabalhado, e seguimos com igual voto su impresso, sem desfeiteba com interrupes. E dando-nos por incompetente para a reviso das provas de um livro que quasi sabemos decr, tivemos a fortuna de alcanar nrissa parte a coadjuvao do nosso amigo e consocio o Sr. Dr. Silva, que'.se prestou a esse enfadonho trabalho Comvo amor dp estudo que o distingue. Ainda assim, tal era a dificuldade da ,empreza,que ns escaparam ha edio algumas ligeiras irregularidades e imperfeies que s levantaro na folha das erratas, ou se advirtiro nristes commentarios que ora redigimos, com maior extenso do que os que havamos eseriptoem Madrid, e que mencionmos na dedicatria. E' mais diffiedo que parece a empreza .de restaurar'm cdice antigo do qual existem, em vez do

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original, uma infinidade,de cpias mais ou menos erradas em virtude d leituras erradas feitas por, quem no entendia do.que lia. O tempo far ainda descobrir algumas correces. mais que necessitar esta obra, j pelo que diz respeito a nomes de locaes que hoje s podero pelos habitantes drilles ser bem averiguados^ j por alguns nomes de pssaros, insectos, e principalmente de peixes no desCriptos nos livros, e s conhecidos dos caadores,, roceiros e pescadores. Nos presentes commentarios no repetiremos quanto dissemos nas Beflexes criticas, escriptas ainda nos bancos, das aulas com otempo que forrvamos depois de estudar a lio. Alto de havermos em alguns pontos melhorado nossas opinies, evitaremos aqui de consignar citaes qu pudessem julgar-se nascidas do desejo de ostentar erudio; desejo, que existiu em ns alguma vez, quando principiantes, por certo que j hoje nos no apoquenta.l Algum' quereria talvez que aproveitssemos para esta edio muitas noticias que, porventura deslocadas, se encontram nas Beflexes criticas. -Be propsito porm uo; quizemos sobrecarregar mais estes- commentarios : alm de que as noticias teis que exclumos sero unicamente' algumas, bibliographicas de obras inditas, cuja existncia queramos accsar aos litteratos, e esse servio j est feito. Muitos dos nossos actuaes QommentoS' versaro sobre as variantes dos textos, e sobre as differenas principaes que houver entre a nossa edio e a da academia das sciencias de Lisboa (Tom. 3. das Merorias Ultramarinas). No faltar talvez quem censure o no havermos dado melhor rnpthodo o escripto de Soares acompanhahd-o de notas que facilitassem mais a sua leitura. Repetimos que no ousmos ingerir nossa mesquinha penna er meio drissas paginas venerandas sobre que j pesam quasi trs sculos, Nem sequer n'ellas ousmos introduzir o titulo ^-TRATADO, DESCRIPTIVO DO BRAZIL qu adoptmos no rosto para melhor dar a conhecer o contedo da obra: plo contrario conservmos effectivmento em toda esta d titulo com que j ella conhecida e citada de RriTEtBO GERAL que alis s compete primeira parte. O que sim fizemos a beneficio dos leitores foi redigir um ndice lao-1 riico e claro, introduzindo nrille, por meio de vinte ttulos, a diviso philosophica da segunda parte, sem em nada alterar a ordem e numerao dos Captulos. Cremos com

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este ndice, qu ser publicado em seguida dristes CGhirentarios, ter feito ao livro de Soares um novo servio. O publico sabe j como este livro corria anonyro'; sendo que Oazal, Mrtius e outros o iam quasi fazendo passar por Obra de um tal Francisco da Cunha, quando as Reflexes criticas,para accusar drille o autor, idade e titulo,chmaram .a atteno dos litteratos sobre o que haviam consignado 1-.' a Bibliotheca-Lusitana (Tom. 2., p. 321); 2. a obra d Nicolo Antnio (Tom. 1.", p. 509 e Tom. 2., pag. 399)3. do addicionador do Americano Pinel, o Hespanho Barcia (Tom;, 2., col. 680 e Tom. 3., col. 1710) e 4. o prprio autor, qu;cdnsigrio;o seu nome na sua obra (Parte 1 ' a cap. 40 e Parte,2. , Caps. 29, 30, 127 e 177)., : Como sobre cada um dos. captulos de Soares temos alguma reflexo a fazer, para no introduzirmos nova numerao riadaptarmos melhor os commentarios obra a que se destinam, os numeraremos successi vmente segundo os captulos ; assim desde o 1. at o 74 sero elles referentes aos respectivos captulos da 1. parte; os 75,76, 77, etc. pertencero aosl., 2., 3., etc. da*2.a parte ; de modo qe a' numerao do Capitulo drista ultima a que se refere o commentario.ser conhecida logo que ao numero que tiver este s abater o :-mesmo 74. E vice-versa: addicionando-se .74 ao-numero' do capitulo da 2 / parte se ter o do cm- mentrio respectivo: Assim o ndice da obra, cm- os seus ttulos, e t c , poder tambm consultar-se como ndice dristes COMMENTARIOS. 1. O principio drista obra contm na partp histrica muitos, erros, nascidos de escrever o'autor, s talvez por tradio,, tantos annos depois dos successos que narra. A costa *d Brazil foi avistada por Cabral aos 22 d Abril, e no aos 24. A missadeposse teve lugar no dia 1. de Maio, e a 3 j a frota ia pelo mar fora. Coelho voltou , Europa logo depois, no quando j reinava D. Joo 3., o qrie eqivalia a dizer ns vinte annos "mais tarde. Christovar Jaques foi mandado por este ultimo rei como capito mr d costa; mas no foi o descobridor da Bahia, que estava ella descoberta mais de' vinte annos antes. Pero Lopes passou a primeira vez Brazil com seu' irmo Martim
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Affonso em 1530, e por conseguinte depois de Jaques, a respeito de quem se pde consultar a memria que escrevemos intitulada : As primeiras negociaes diplomticas respectivas do Brazil. \ 2. O texto da Academia de Lisboa nom erradamente Clemente VII como autor da bula.em favor dos reiscatholicos; o que deve ter procedido de nota marginal, de algum ignorante possuidor de cdice, que o copista aproveitasse. 3. Acerca das infprmaes que d p autor dos terrenos a norte do Amazonas, cumpre advertir que essa parte da cpst era ento pouco freqentada pelos nossos; e portanto. h'est% capitulo, como no que diz respeito a doutrina do 1., o nosso A. no pde servir para nada de authoridade. 4. O descobrimento do Amazonas por Orellana foi em 1541; a sua vinda de Hespanha em meado de 1545; e ar expedio de Luiz de Mello por 1554. A ida d'este cavalheiro ndia em 1557 e,seu naufrgio em 1573 Consulte-se Diogo do Couto, Dec. 7.", liv. 5.fl,: cap. 2. e^Dec. 9.a, Cap, 27 e Antnio Pinto Pereira, Parte 2.", pags. 7 e 58. . 5. vista da posio em s indicam os baixos, deduz-se qu o A- ,se refere bahi de S. Jos ; e portanto-a ilha em que nufagpu Ayrs da Cunha deve ser a de Santa Anna, que ter a extenso que lhe d Sprs,: quando a do Medo ou do Boqueiro no tem uma lgua. Mapareo o termo verdadeiramente portuguez para que ns chamamos, como na lngua dos idigenasi Pororoca. Eo phenomeno chamado Hyger, e Bore no Severn e Parati Em. Frana tambm o tem a Gronda com o nome cremos que de Mascaret. A. do Amazona^ descripta por Conda-mine, e tambm nos Jornaes de Coimbra ns. 30 e 8,7. 6. Este Rio Grande o actual Prnahyba. 7. O Monte d Li, talvez assim chamado/porque se parecia ao de igual nome na sia, ser o de Aracaty. Os Atlss dLazaroLiz e Fernam "Vaz Dourado outros antigos manuscriptos trazem aquelle nome. 8. Este nome de Cabo Corso aqui repetido, ver ra ruits cartas antigas modernas; o qu se no d respeito d.o outro do commento 3. 9. Nriste 'capitulo se conter a historia do castelhano feito botocudo qu se embarcou para Frana^ edeu talvez origem a unir-se este facto ao'noine de Diogo Alvares, o Carmur. Veja a nossa dissertao sobre esterissumpto que o Instituto se dignou premiar*. 10. E'hoje sabido, pelos documentos que encontrmos

335 - j na Torre do Tombo, como esta capitania de Barros ra mixta, sendo elle, donatrio ao mesmo tempo que Fernm Alvares d'Andrade e Ayres da Cunha de 225 lguas de costa e no de cincoenta separadas s para elle. A expedio teve lugar ppr Outubro de 1535. 11.,'BaerI, vulgarmente chamado Barleus, chama Ba. hia da traio Tebiracajutiba, o que corresponde talvez ao nosso, AcajutiUro, que Cazal leu (Tom. l. p. 197) cejulibir. 12. A respeito da coloniso da Parahiba deve cnsul tar-s a obra especial mandada escrever pelo P. Christovam de GouVa: drilla temos por autor o P Jeronymo Machado. , , .' 13. Pitagoares, diz aqui o nosso autor. Outros escrevem ' Pitagurqs < ; o qu quereria dizer que esses indios se sustentavam de camares. Tabajqras significa os habitantes das aldas, e era nome que se dava a todos os indgenas que viviam-aldeados. 14. Aramama deve ser o mesmo rio Giramame mericiocad na Razo do Estado doBrazil, obra citada por Moraes no Diccio-nario, e que hoje temos certeza de haver-sido escripta pelo prprio governador D. Diogo de Menezes. Abionabiaj h de ser a lgori Aviyaj citada na Conhecida Jprnda do Maranho. 15. Rio de Igaru ou de Igarau quer dizer rio da Canoa grande, u rio da No. Este nome denuncia que o sitio era frequantado por navios europeus. . 16. A doao de Duarte Coelho era de 60 lguas de costa e no de 50. * 17. Ponta de Pero Cavarim, P. Lopes (Dirio pag. 11) disse: Percaauri. Pimentel escreveu (p. 215) Pero Cabarigo; a mesma orthographia seguiu Antnio Mariz Carneiro. O nome era naturalmente de objcto indigeno, e degenerou em outro que se poderia crer de algum piloto europeu. 18. As notas que o texto acadmico admittiu a este^capitulo que trata do litoral da actal provincia das Alagoas, so evidenterente estranhas a elle ; pois uma at refere um facto de 1632. Aqui as daremos correctas para evitar ao leitor o trabalho de as ir ler ,onde esto : N'este-rio Formoso, por elle acima quatro lguas, esta o lugar de Serenhem. Foi sondl-o Andrs Marim, tenente d artilharia, com pilotos o anno de 1632, A melhor entrada da vbarra pela banda do sul, pela qual entra por

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sete, seis,braas, e pela banda do norte entra por cinco e quatro : e.n se, ha, de entrar pelo meio ; porque tem de fundo braa e meia. O porto est da banda do sul. . Tamanduar. uma enseada oito lguas apsul do cabo d Santo Agostinho, e ama lgua ao sul do. rio Formoso, e duas ao norte do rio Una; desemboca nrilla o rio das Ilhotas ou Mambucaba; est cercada da banda do, mar com arrecifes, ,e uma barra de sete braas de fnndo na boca, em baixamar d guas vivas; e logo mais dentro seis, na maior parte drilla cinco,; e bem junto a terra quatro : tem bom fundo ; cabem nrist enseada cem navios; e toais. ' 19. A serra Aquetiba sertalvez a que hoje se diz da Tiuba. ' ' ;.-.-,., : .. , -;-. 20, So curiosas 1s informaes que Soares, s por noes - dos indgenas, nos transmtt* ds gentios, d'alra do rio de S. Francisco que se ataviavam com jois, de ouro. Trata-se dos habitantes dt> Peru. .'.,'' . '21. A correco da palavra indgenamcm/iana para significarespia se collige da Diccionario Brazilco,' que na palavra vigia T traz o significado, manhane. 22. Do nomeRio do Perira-^-se faz rheno no famoso Atlas de Vaz Dourado,do qual existe na bibliotheca publica de Madrid um exemplar mais aprimorado ainda dp que. o que se guarda com tanto recato no archivo Chamado da Torre do Tombo de Lisboa. O-nome de Torre;, de Tombo-, para . que de uma vez satisfaamos em/assumpt sobre-que algumas pessoas nos tem por vezes pedido informaes, veio de que, otombo earchi.vos da coroa portqgueza se*guardavam antigamente em uma torre doCastello de Lisboa (onde estar vain tambm os; paos d'AlcacQva),e, por isso os, papeis se diziam guardados ria Torre d tombo. O terremoto de. 1755 destruiu a tal torre, e o archivo passou para ,as abobads; do (hoje extincto) mosteiro de S.,. Dento, onde. ainda est, com o, antigo nome, pelo habito., 23._N lugar onde se l:At onde chega o salgado, expresso esta mui freqente no nosso autor para designar o mar, diz o texto, acadmico, quanto ns .menos correcta-r mente, a algqda. 24. O rio Itapocur-. diz-se hoje lapicur. Vej. Tb. Perpet. Astron. p. >217 ; Paganino pag. 2 1 ; Mappa de Jos le,ixeira(de 1764), etc. Parece ter sido o quenos mappas deRuysch.'(1508), deLazaro Luiz e Vaz Dourado se chamou de b. Jeronymo. - ' 20. O texto da academia no mencionava o : nome. Real',

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onde na lin. 8.' se diz :porque toda esta costa do rio Real, etc. 26. Jacoipe se l nos cdices que vimos; temos porm por melhor orthographia o escrever Jacuhipe ou Jacuhype, com a Corographia Brazilica, porque o nome quer dizer o es-teiro ou igarap do jac. 27. Pimentel, Paganino e as Taboas Perptuas astronmicas escreveram Tqpo ; Mariz Carneiro Tapoam; porm mais conforme etymologia fora dizer-se e escrever-se lapuqm; lia, pedra; puam,^redonda. 28. No final driste capitulo 28 se encontra a noticia que melhor se desenvolve no capitulo 2. da 2.a parte (com. 76), -cra do facto que deu lugar a ser( Diogo Alvares apelli* dado de Caramur. Consulte-se a dissertao que citamos (com. 9), impresso no tom.-3. da 2.a serie da Revista do Instituto pag. 129.. 29. Boipebq, como, escreve Soares, nome mais correcto do que o de Boypda, usadopor Pimentel e seguido nos roteiros inglezes. Boirpeba significa cobra achatada. 30; Confirmamos no haver alterao na palavra Amemoo ao lermos Memoam ha viagem de Luiz Thomaz de Navarro (1808), e Mamam no mappa de Balthazar da Silva Lisboa. , . . - , - ' , , 31. Deixmos o nome Romeiro aportuguezado, por assim o acharmos nos melhores cdices ; mas o homem chamava-se Romero, que ainda hoje nome, de famlias castelhanas. ' L< -. 32. s..Aimors so.falvez os Puris de hoje, raaesta que,' pelas palavras, que se conhecem de sua lingua, ainda no podemos classificar entre as drista America Antrtica. Os antigos pronunciavam s vezes gaimurs, e quando faltavam com o acento na ultima syllaba, o nome se apresentava como muito differente de que , lendo-se Gaimres. 33. Patipe quer dizeresteiro do coqueiro (paty).Assim melhor se escrever, como faz Cazal (Tom. 2. p. 101) Patype-, O amanuense do exemplar que serviu edio anterior .escreveu na ultima syllaba um f em vez.de.p.Cremos piamente qe sem m inteno aranjou a;palavra que d'ahi resultou. 34. Sernambilibi ou Semambi-tiba, segundo,a etymologia, e o verdadeiro .nome do rio que de tantos modos se tem escripto, segundo dissemos nas Reflexes criticas (n. 26, p. 22). Cazal (ou o escripto que O guiou)! chegou a adulterar este nome, mo s em Simo deTyba (II , p. 71), como logo

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depois (II. p. 78) er Joo de Tyba /Estas e outras ho de. chegar a, convencer o nossos governos de que o conhecimento de um pouco da lingua indgena para ns pelo menos to importante, para' no escrevermos disparates, como o de um pouco de grego e latim-A lingua guarani j est reduzida a escripta, e salva de perecer de todo,, graas sobre tudo ao Thesouro e Arte e Vocabulrio de Mohtoya. E se no tratamos de reimprimir estes livros e de os estudar, um dia os vindouros o faro ; e nos chamaro a juizo prir muitos erros em que houvermos cahido por nossa ignorncia; e por ventura por um pouco de filaucia em termos por lnguas sabias e aristocrticas unicamente cgrego e o latim.;Veja-se a nossa dissertao sobre a necessidade do estudo e ensino das lnguas indgenas no Tom, 3." da Revista pag. 53. 35. Novo exemplo dos inconvenientes de ignorar inteiramente a lingua indgena .nos d O nome de um rio do' fim driste capifulo 35, que foi interpretado.InsUcoma, em vez de Juhuacma, que Luiz Thomaz Navarro escreveu Juassema. O prncipe Maximilino de Nuwied em sua viagem (Tom. l., pag, 295) diz Jassem ; e o Dr. Pontes na sua carta geographica poz JUacein. ,Juac quer dizer sede, e eyme, sem ; de modo qu o nome d rio significa, talvez Rio que no tem sede ;nome que est muito no gosto dos que davam os indgenas, que no,serto chamam : a outroo Igareyrio da sede", ou serri gua. 36. Driste captulo aproveitou Cazal no. Tom- 2. pp. 70 e 72. A mulher do donatrio chamava-se Ignez Fernandes, e seu filho Ferno do Campo. 37 ^ Por Jucur se noma o rio que no mappa 3." da Razo do Estado se diz Jocoruco, e n'uma grande carta do Deposito Hirographico de Mafirid Jucurucu. 38. Maripe quapto a ns um erro que se repetiu nos cdices. Deve,ler-se Mocuripe com Pimentel (pag. 239) e com Laet, n'uma das cartas do Novus Orbis impresso em 1633. Laet nrista obra, que depois se publicou'em irahcez, consultou sobre o Brazil os scriptos do paulista Manoel de Moraes. Esta edio latina foi a 3. a ; sendo as primeiras hollandezas, de 1625 e 1630, de Leyden. O rio mencionado diz-se hoje iMucury; e Newid (1,236) escreveu Mcur*, 39. Tupiniquim ou Tupin-iki quer dizer simplesmente o Tupi do lado ouvisinho-lateral-.Tupina significa<
Tupi maui -' ' ' -. -

40. Este capitulo 40 foi o que Vasconcellos transcreveu

339 quasi na integra nas; suas Noticias (51 a 55),; e \jue nos serviu para confirmar que elle tivera conhecimento da obra de : Soares., Aceci ha de ser oGuasisirda Razo do Estado, Aceci de Brito Freire..,.'".. 41. A doao,'d Ilha ayDuarte de Lemos teve lugar em Lisboa,, aos 20 d Agosto de-1540, pelos servios-que o mesmo Lms prestara ao Donatrio, na defensa*da Capitania. A confirmao regia datada de Almeirim aos 8 de Janirridel549 (Chanc. de D. J, IIJU foi. 108 V.) , 42. Nriste capitulo falfam rio texto acadmico umas cinco ' jinhas, alis .Importantes, que no *nosso(se encontram-no fim, do 2.q e principio* do, 3.',, ' - . . . :';-, ' 43. Deve ler-seaccentuado Goarapari, qe Vasconcelos ria Vida de Archieta (pag. 338) escreve Goaraparim, e a Razo do Estado, Goaraparig. O texto acadmico dizia Goarapira. Leritibe adulterao de LerXtiba, que em guarani significaA ostreira.. . 44. Tivemos occasio de consultar e de conservar em nossas mps uma carta autographa dePer de Ges para Marfim Ferreira, dequem se faz meno nriste capitulo 44; por ella conhecernos que de lettra*sua o texto do cdice dri Dirio de pero Lopes existente na Ajuda, quedemos luz; isso se" confirma com o asseverar aqui Soares que Ges acompanhara sempre o mesmo Pero Lopes, e com elle se perdera no Rio da Prata; isto , na ilha de Gorriti do porto de Montevido, segundo,sabemos. As emendas feitas nas primeiras paginas dq.dito texto do Dirio so de lettra de Martim Affonso, que hoje distinguimos perfeitamente. Fiquem estas advertncias aqui consignadas:, emquant ^rio temos para ellas melhor lugar. '".-. 45. O texto d'Academia diz Tapanazes, em vez de Papanzes. Este nome ou alcunha derivou, quanto-ans, daZygaena chamada pelos indgenas Papan, e pelos nossos antigos peixe martello.' 46. Ainda que autor no capitulo precedente havia dito,. que o gentio^galtac tem a linguagem difFerente dos seus; yisinhos Tupriiqriln, no podemos entender essa affirmativa muito em absoluto, vista do que assevera agorade qe s Papanazes se fazem entender do mesmo gentio guaitac e do tupiriinquim. Isto vai conforme com a ida sabida de que os invasores que dominavam o Brazil na poca da colonisao eram geralmente da mesma raa, havendo qe exceptuar os Aimors, que, depois apareceram ocados talvez do oeste. Remettemos a tal respeito o leitor

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para ao que dzems-em um' escripto impresso no Tomo 5. da 2. Srie da Revista do Instituto pags.373 e seg. 47. O texto da Academia d 22 3/4 ou 22 45' S. latitude da Ilha d Santa que em outros cdigos q achamos 22 1/3 ou 22' 20', o que mais se aproxima d a d 22 25' S. que hoje se lhe calcula. , :' 48. O Cabo-Frio ijaz segundo Rossiri em 23 1\'18" ,S.-, ;e segundo Livingston (1824).em 23 1' 2"' S., do que no .se estava longe rio tempo do nosso author,que o arruma em 23o 49.- Saquarema se diz#hoje, e no; Sacoferra. , 50. Conservmos palavra Viragalho dos cdices, pois seria adulteral-os o substitil-a pela'mais correcta Villegagnon, que alis* toenos euphonica para ns. O ilho de-/eribatuba, que quer dizer do Coqueiral (de Jeribs) o que j hoje se diz I. ds Coqueiros.. ,51. Por este capitulo se confirma.que primpir fundao de uma colnia n'esta bahia de Janeiro teve lugar na Praia Vermelha; e que o saic'0;.do Batafogcse chamava de Francisco Velho, por pertencerem essas terras ao talvez tronco 'primitivo da fmiliaVelho-^ no Brazil. ' v v As palavrasque se chama da Cariocano se lem no texto da Academia','mas sim no importante cdice umis antigo de vora, e em outros..:, , 5,2. Porto de Martim Affohs era o esteiro que vai'ter ao Aterrado. Charau-se, driquelle nome,-n, -quanto a ns, por via do celebre capito de igual,nome; mas sim da ald do principal Ararigboia, qe no, bptismo se chamou Martim Affonso. : A descripo da enseada drista nossa bahia no pde estar mais exacta. Os nomes Unhama, Sururuy, Baxindiba &' Macuc, so hoje qasi os mesmos. A ilha da Madeira a1 das Cobras. 53. Mem de S foi nomeado por proviso de 23 de Julho de 1^56. Partiu da Bahia para a conquista do forte'de Ville'gagnon em 16 de Janeiro de 1560..Chegou a Rio a 21 de Fevereiro: rendeu o inimigo a 15 de Maro. -54. Salvador Corra governou tanto, tempo o Rio de Janeiro que a sua ilha se ficou chamando at hoje do Gover.nador- Antes tinha-se denominado Parnapic, do Gato, dos ; Maracais e dos Engenhos. ' ' .55. Apezar de todas as diligencias ainda at hoje ns ho foi'possvel encontrar o manuscripto d e Antnio Salema sobre a Conquista do Cabo.Frio. ' ) ', 56. Do texto d Academia consta que Salvador Corra foi

341 nomeado' governador por proviso de 10 d Setembro de 1557. Isto parece verdade; mas ho cremos que fosse escripta. Nos melhores cdices no seencontraessa clusula. 57. O primeiro sesmeiro da Ilha Grande foi o Dr. Vicente da Fonseca por carta de 24 de Janeiro de 1569. ' A' ilha de S. Sebastio chamavam ris indgenas, sgtndo Hans Staden, Meyembipe; e dos Alctrazes Uraritan. O morro, ponta de Caruu chama-se hj vulgarmente deCairu, e j assim escreveram Vasconcellos (p. 286) e Fr. Gaspar da Madre de Deus (p. 17). , 58. Tamoio quer dizer av, ascendente, antepassado. Era o nome com que os indgenas de S. Vicente designavam os drista provincia fluminense, o que' comprova as nossas fortes conjecturas, de que a emigrao tupica marchou do norte para o sul. Os Tamis chamavam-se a si Tupinambs, segundo Staden ; e aos visinhos do sul pellidavam os Temimins, isto , ss-^netosr-ou descendentes. 59. A ilha da barrado porto de S. Vicente, que Soares diz parecer moela de gallinha, chama-se ainda hoje da Moela. OsEsquertes de Flandres--eram uma famlia flamenga que se estabeleceu em S. Vicente. Um dos indivduos chamava-se. Erasmo Esquert, segundo Pedro Taqqes. 60. Marti-rp Affonso recebeu eem lguas de costa por doao-, e no cincoenta; e ainda assim a sua capitania sahu uma das mais pequenas em braas quadradas. Esse grande capito no voltou a S. Vicente depois de ser donatrio ; mandou sim providencias, lugar-tenentes, etc. 61. To pouco nos eodsta que,PeroXopes voltasse mais ao Brazil depois de ser aqui donatrio, e temos quasi certeza' que no. 62. E'sem verdade que Spares afirtoa que np havia ririutro tempo formigas em S. Paulo. J Anchieta da drillas conta. E S. Paulo -desgraadamente terra proverbial quanta s tanajuras, s subas e s tocas dp copins. 63. Era vez de Goain ou^antes Guaian, escreve Stadn Wayganha. ,,, 64. Ilha Branca talvez adulterao d ilha do Abrigo, que a resma, fronteira aponta do padro, de que / n capitulo seguinte se trata. 65. O Cabo do Padro chama-se hoje Ponta de Itaquqru. 'Segundo o exame que hi fizemos pessoalmente em Janeiro de 1841 esse padro ou padres (pois existem trs. guaes) foram abi postos por ordem de Martim Affonso, cuja armada (segundo P. Lopes) se demorou 44. dias no visinho
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,.\

porto da Cananea. 0 leitor pde Consultar o que ponderamos a tal respeito no Tom. 5. da 2;a Serie da Revista do Instituto p a g . ; 3 7 5 . _ '-"" 66. A bahia das Seis Ilhas naturalmente-a enseada formada pelo rio Tajay. _ ,. 67. O nome de ilha de Santa. Catharina foi dado pelos castelhanos da arrda de Loaysa. Antes chamavam-lhe Ilha dos Patos, e j lemos qe os indgenas a denominavam Xrimerim: '.. . 68. Diz aqui Soares que a linguagem dos Carijs different da de seus visinhos ; mas isso no se deve entender mui restrictamente; porquanto no capitulo 63-assevera qu com elles se entendem os Guaians. 69. O nome de Porto de D. Rodrigo proveio de ahi,ter estado o infeliz D. Rodrigo da Cunha, que to tristes epi- sodios passou nrista costa. 70. Porto a- Alagoa & o da Laguna. No sabemos se a adulterao veio da penha do autor, ou se a causou algum copista qu no quiz admittir em sua cpia aquellas pala-, vras hespanholadas. 71. Chama-se aqui ri de Martim Affonso ao Mampitba; masehtenda-se que no foi nriste rio, ms.sim no pequeno Chuim que aqueile capito naufragou, o qu sp deduz da leitura attenta do Diario.de P. Lopes. A' lagoa dos Patos chamavam alguns antigos de Tibiquera ou dos cemitrios talvez em virtude de alguns dos indigeris que riinda hoje por ali s encontram, segundo nos assegura o Sr. conselheiro Baptista de Oliveira. ",," : 72. Nas ultimas linhas driste capitulo 72 confirma Soares a geral opinio de que s indgenas ; de toda esta costa, ainda quando vivendo a grandes distancias uns dos outros, so todos uqs e ter qusi um vida e costumes^ De ' expresses; quasi idnticas se serve o seu contemporneo Pedro de Magalhes Gandavo, o amigo de Cames. 73. Monte de Santo'Ovidio o conhecido cerro da bahia de Mntevidp, a que Pero Lopes quiz infructupsamente chamar monte1 de S. Pedro. 74. O texto ria Academia arruma, com manifesto erro,' ab das Correntes em 36 de latitude S.; outros textos que seguimos do 39; mas- cremos qe houve 'n'este numero tambm engano, e que Soares poria com os pilotos dtemp cabo em 38. / ,: 75'.;O texto da Academia pe a sabida de Thom de Souza de'Lisboa a 1 de Fevereiro e no -2, como os mais cdices.

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76. Volve Soares a occupar-se do celebre Caramur, a cujo assumpto- parece, que dedicava certa predileco. As notieias so ainda, mais minuciosas que as que chamaram nossa atteno no com. 28,, 77. O primeiro assento da povoao da cidade era prximo barra, e segundo a tradio onde hoje est o bairro da Victoria. ^ 78. A's sabias providencias' da metrpole em favor da colonisao da Bahia deveu talvez, Portugal a conservao de todo o Brazil, segundo melhor desenvolveremos m outro lugar. 79". No texto da Academia se do mais as seguintes informaes crca do governador D. Duarte: fidalgo muito illustre, filho, de D. lvaro da Costa, embaixador d'el-rei D. Manoel ao imperador Carlos V.. No as admittimos por no se acharem nos melhores cdices. 80. A explicao de Porto Seguro at o cabo Santo Agostinho com que conclue o 1. no se contm no texto acadmico. . ' 81. Ao lermos esta"parte da descripo da cidade, quando aportamos na Bahia em principio de Maio driste anno, quasi que acpmpanhavamos o autor passo a passo ; tanta verdade ha em sua descripo. 82. Quasi no fim do capitulo em vez de capelles d misericrdia ou QS engenhos diz incorretamente o texto da ; Academia capelles da misericrdia ou dos engeita-dos. . ', - 83. A.respeito do collegio dos padres da Companhia na -Bahia prece-nos que o leitor levar a bem que lhe demos aqui outra descripo ; ainda quando no seja seno para lhe fazer constar a*existencia de um curioso livrinho coro a obra do P. Ferno Cardim, que imprimimos, em 1847. Diz este escriptor em ,1585 : a Os padres tem aqui Collegio novo qasi acabado, urna. quadra formosa com boa capella, livraria e alguns treze cubculos,-os mais drilles teto s janellas para o mar ; ,o edifcio todo de pedra e cal destra^ que to boa como a d pedra de Portugal os cubculos so grandes, os portaes de pedra, as portas de anglim forradasd cedro ;das janellas descobrimos grande parte da Bahia, e vimos os cardumes dos peixes e balas andar saltando nrigua, os navios estarem to perto que quasi ficam falia ; a igreja capaz bm cheia de ricos ornamentos de damasco branco e rxo,veludo,verde carmesim,

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todos.com tela de ouro, tem uma cruz e thuribulo de prata, etc.. , ' A cerca mui grande, bate ornar nrilla, por dentro se. vo os padres embarcar, tem uma fonte perenne de boa gua com seu tanque, aonde se vo recrear ; est cheia de arvores, de espinhos, etc._... 84. Corrigimos hortas 'onde no fim d capitulo dizia outras o texto acadmico; etambm' segundo a lio dos melhores cdices dizemos vinte religiosos', em vez de doze. 85. Tambm aqui seguimos os mplhores cdices, escrevendo Sua Magestade duas vezes e no Sua Alteza. ,_ ~86. Este capitulo foi bastante retocado. vista da?.copias mais dignas de f, como o leitor pde deduzir pela confrontao. A observao de Soares de melhorarem de sabor e aroma os vinhos fortes que passam a linha hoje to admittida como verdade que da Europa se mandam - vinhos a viajar atravs da zona torrid, s para os beneficiar. / #7- Na ante-penultima linha do 1." do capitulo'13 dizia erradamente o primitivo texto por civilidade, em vez de possibilidade como escrevemos. 88. Chamamos a atteno do leitor sobre a relao d 1: : 2 : 3 : entre as classes dos defensores da Bahia em 1587; a 1 saber : dois mil colonos europeus, quatro'mil africanos, e seis mil indios civilisados , ,,', 89. O nosso autor que tanto enthsirismo ' predileo mostra, pelo Brazil, no contente com haver dito no premio que este estado era capaz para se edificar nrille um grande imprio repete esta sua aspirao nossa in-w dependncia e nacionalidade dizendo nriste,capitulo que j" 'D. Joo III, com mais algu annos de vida, pod(ra ter aqui edificado um dos mais notveis reinos do mundo. > x E sabida a ancdota referida pelo autor dos Dilogos das grandezas do Brazil (obra escripta no sriculo deseiscentos) da profecia do strologo, que, ao chegar , Lisboa nova do descobrimento da terra da Vera Cruz, vatiomou que havia ella de ser abrigo e amparo da metrpole. Depois da acclmao de D. Joo IV.tratou a Hespanha de lhe ceder o Brazil, e tornar a reunir a si Portugal"; o que se teria realisado se a Frana no se/metfesse de permeio.. .0 marquez de Pombal ideou trazer ao Par a sede da monarchia ; depois drille o poeta Alvarenga convocava para o Brazil a rainha Maria I ( Florilegio da poesia brazileira, T. 2., pag. .370;) e o alferes Lisboa (eml804)" desejava que em Minas

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o prncipe D. Joo fosse estabelecer seu imprio (Ftorilegi, pag. .574). Estes factos pelo menos so curiosos. 90: Na doao da ilha de Taparica, ou Itaparica cmp agora se diz, "se comprehndia..fie Tamarntba. Receberam ambas foral em 1556. 91. Onde se diz da parte do Padro parece-nos que houvesalto de ura palavra e se deve entender -r- da parte da ponta do Padro; > ] 92. A ilha de Mar dp que se faz aqui meno a mesma que inspirou o poeta bahian Manuel Botelho de Oliveira que to bellamente a descreveu na sua Musicado Parnaso (Lisboa 1705, pag, 127).Essa bonita composio foi reproduzida no 'Flqfilegi, Tom. l. pag. 34, 93. O texto da Academia contem depois da palavra Piraj do 3. d'ste capitulo,:as seguintes linhas que no encontramos nos melhores cdices, e devemos julgar introduzidas por curiosos : Esta enseada tem, ha barra de fundo duas braas de prPamar ; cabem at 80 navios de fora, os quaes entram descarregados^ hode sahir naresma*frm. Tem na boca.duas, fortifices, uma maior de uma banda, e outra.mais pequena da*outra. 9,4. Otexto a que nos1 temos referido traziaAltezaonde outra, vez admittimosMagestade. 95. Diz o mesmo texto Ponta do Toque em vez de P. do Toque-toque como sabemos que se chama. 96. Arat lemos ri'uin dos cdices, e admittimos a lio, ao; saber que havia por alli um engenho com tal nome ; o 'que se no d segundo ns asseveram vrios Bahianos entendidos com o nome-Utum do'texto acadmico. Otuim e Utuim se l porm m alguns manuscriptps^No texto mencionado l-se trbem Curnibo em vez de Carnaibu ou Carnaybu como lernris no J. de Coimbra n. 86 pag. 67. No'mesmo texto se l ainda erradamente Sacarecanga e Pitanga, em vez de Jacarecanga e Petinga. 97. A palavra Tayaupina a que puzemos um ponto de interrogao no nos foi possivel decifrar adequadamente. 98. Caipe ou Cahype quer dizer o esteiro do inato.-rTratando do engenho de: Antnio da Costa, l-se no texto d'Academia depois da frase que est muito bm acabado as seguintes palavras evidentemente anachronicas para o livro de Soares : que depois foi de Estevo de Brito Freire, que Deus perdoe, e fez outro engenho por nome S. Tiago, bem no fim de Pernamerim, para a banda da fre-

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guezia Tmarari de aguadas,, melhores que-hoje no Brazil ha.De Itapitanga volve a ocupar-se o.autor np cap. 87. 99, Notam-se grandes, variantes entre o rnosso texto e o d'Academia. Alm de linhas que l; faltam, leram-se errados os bem conhecidos nomes Paragua, Marap.,Acm, Cajiba, e Tamarar. Farreirey foi erro que escapou ainda no nosso texto: la-se Tareiry. 100. No resmo texto acadmico l-se Antnio- Penella e Rodrigo Muniz, em vez de s Aritohior Peneda e Rodrigues Martins, como encontrmos nos cdices mais dignos de credito-, s ' ' ' . , , 101. Aqui temos rim novo rio d Igaru, o que prova que habitualmente alli chegavam, como fica dito (com. 15), as nos dos Europeus. N" "',:< 102., Pujuca o nome que d o nosso texto ribeira que, entre outros, o da Academia escreveu Puinqua*-, 103. O rio Irajuhi o que hoje se diz Pirjuhia. No texto da Academia xencontram-se Irayaha, o que procedeu nafu-; ralmente de m leitura do copista. .-,,. - ;. s 104. Jiquri o nome que hoje se d ao rio que Soares designa por Jequeirijape. ' , .,-;-. .v,-- < ,* 105. Conclue Soares com a sua. minuciosa, descripo de todo'sps Recncavos da Bahia cuja extenso, sem relteros rios d'agua doce, avalia em 53 lguas ; enrissa extenso , conta 39 ilhas alm de 16 do interior dos rios. A topograplua do Recncavo ainda t hoje no teve melhor, nem.mais exacto alutono-. i 106. So curiosas as notas estatsticas da Bahia (era 1587), e permitta-se que as recapitulemos: 36 engenhos, que exportavam annualmente para cima de 120 mil arrobas d'assuear; 62, igrejas, entrando 16 freguezias, e 5 mosteiros e 1400 barcos de remo. 107. Algumas variaes 'encontrar leitor np moss texto, graas' confrontao detentos cdices. As primeiras guas valiam a Q0$ rs. e ficaram depois a, 12$; e hoeranv a 100 e ficaram a 20$ ; os cavallos que por negocip se levavam embarcados a Pernambuco eram l pagos a 200 e 300 cruzados, e ho a 20 e a 30, o qrie quasi eqivalia aos preos da Bahia, etc. 108. No exemplar da Academia diz-se (pag. 135) cerca das plantas de scca que so as que rebentam e brotam das primeiras cortadas'Foi por certo -explicao de algum copista animado de excesso de zelo. 109. No ultimo , tratando-se dos inhames trazidos das

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ilhas de frica,; vem no texto. d'Academia, em vez d'aquelle nome, ode taipbas, que nome indigno, e no se encon^. tra nos mais cdices.; mas sim inhames. 110, Hortaliasque j se culfivavanrna Bahia em tmpq de Soares, e por-este apontadas no capitulo 36 :Cucumis" sativusCuerirbita pepC. cltrullus Sinapis nigra Brassica>napus Rphanus sativus Brassica olerace rispaB. o. murcianaLactucasativaGoriandrum SativumAnethum graveolensA. foeniculumApium petroslinumMntha. sativaAllium cepaAllium.., sativumSlanum melorigenaPlantagoMentha pulegiura Sisymbrium hastrtiumOcimum minimumO. basilicumArharanthus blitumPortulaca oleraceCichoneiim endiviaLipidium sativumDaucus carotaBeta vulgaris^-Spinacea olerace, &c:.' 111. No respondemos ptel devida xctido na orthographia dos nomes das espcies, de mandioca apontados no capitulo 37.---Np,texto acadmico vem differentemente, e Marcgraf Vascpncellos trazem outras denominaes. O mesmo faz Jos Rodrigues de Mello, que escreveu em ver'so latino o melhor:tratado que conhecemos cerca d'esta raiz alimentcia ; este tratado em dois cantos foi traduzido pelo Sr. Santos Reis, e publicado na Bahia, com outras composies anlogas, em ura tomo com o adequado titulo . de Grgica Brasileira. ' 112. A tapioca de que' Soares trata era preparada um pouco differentemente da qe hoje se usa no cmmercio. Este nome e o da mandioca so puros guaranis; e foram ambos adoptados pela Europa, como tantos outros nossos indgenas, segundo iremos vendo- , 113, No deixou Rodrigues de Mello de escrever com elegncia acerca das propriedades venenosas do sumo da mandioca,cfua : , ' '. y :,. Fac procul hinc habeas.armenta, omnemque volucrum . ;'-' Atilium gentm, positos neque tang.ere suecos Permittas: namque illa quidem niveoqe colore Innatqup trahit pecudes dulcedine captas Potio ; mortiferum tame insidiosa vnenum Contnt-: et fbris ubi pestem hauser, furore -: Huc iliucactae pecudes per prfa feruhtur, - Et gyros' agifant crebros, &c. '

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114. A pronunciao tipeti ou aportuguesadamente tipi* tim, temol-a por mais conforme dos indgenas do que a de tapeti, tapelim, etc. Moraes adoptou aqella primeira; inas esta ultima parece-nos mais euphonica." Urupma (segundo., o Dicc. Braz., pag. 27). era qualquer crivo: a orthographia de Soares a seguida por Moraes.-1Ha porm quem escreva gurupema (Cunha Mattos), gurupemb .(Mem. 0 da Acad de Lisboa, Tom. I" )," goropema (Joo Daniel, P. 5.a, p. 24) e oropma (Antonil, p . 117 da l.a Ed.) 115. Qu.se sueco nocuitradxi, feret.ips salutem Jam prselo domita elicitoque innoxi sueco diz Rodrigues de Mello a respeito da carim. 116. As palavrasalgumas jornadasno principio- do capitulo faltam no texto acadmico. 117. E' curiosa a variedade de orthographia com qe se tem escripto o nome que adaptamos dos indgenas para a planta de raiz amylaoea que Pohl denominou Manihot Aypi, seguindo para esta denominao da espcie a orthographia de Lery (p. 135 da edio da*Rochelle de 1578), do- Tesoro Guarani, de Martinire (T. L, p. 120),' que adoptaram Denis e St. Hilaire ; Vasconcellos tambm uma vez assim escreve (not. 140), bem que em geral seja nisso irregular (V. liv- 1., not. 71, 73 e 74).Soares conii o seu- contemporneo Gandavo (fl. 16 da ed. 1576), parece ter preferido a mais aportuguesada de aipim, seguida por Antonil (pag. 69), por Vandelli, alteres Lisboa, Rebllo (pag. 110) e os viajantes Spix e Martius (T. 2., pag. 526)T Botelho de Oliveira escreveu aypim (Floril. pag.T42>), e Cazal (I, 115) igualmente ; Marcgraf aipi, e assim se l'n Coro das Musas (T. l., pag. 143), e nos diecionarios portuguezes, que tambm do impim. O autor do Cramur (C. 4., est. 19) escreveu aipi. Esperamos que o leitor,nos desculpe a digresso que fi"zmos spbre est palavra, acerca da qual desejvamos que se assentasse em uma orthographia. Apezar da preferencia que j a sciencia deu a aypi, ns em linguagem preferiramos, com ps clssicos Gandavo e\Soars\ cnpwl., 118. No capitulo 44 descreve Soares vrios Convolvulus, a Dioscoreq saliva, o Caladium'sagittifolium (Vent.), e talvez o C. Poecile de Schott. ' " 119. AoZeaJiaisL.se diz no texto que" chamvamos

349 indios ubatim : cremos que diria ^oares abatim ; pois abaty e avaty encontramos em muitos autores. 120. Abbeville (fl. 229) refere que os indgenas do Maranho chamavam s favas comanda, e o P. Luiz Figueira na suagrammatica da lingua geral (pag. 87 da 4. a ed.) d o mesmo significado. * 121. A' conhecidaplanta leguminosa Arachis hypogca L. chama Soares, prtugueza, mendo, como se proviesse de amndoa. O nome degenerado do mandubi ou mandu indgena. Abbeville escreveu (fl. 226 v.) mandouy. Em Hespanha chamam-lhe avejlanas (avels) americanas. 122. No capitulo 48 trata Soares das pimentas que do vrias solaneas capsiinas do Brazil, das quaes no se esqueceu de tratar Fingerhuth na sua ronographia imp. em 1832. Cremos que o nosso autor menciona succesSivamente o apsicum cerasiforme,, coriforme, baccatum, longum e frutescens. Montoya,(ire y Bocab. p. 141) chama pimenta qyi ; o Dicc. braz. kyynha ; Monteiro de,'Carvalho, com^Piso, quiya. Jukiray quqr dizer molho de sal jukyra sal (Dicc. braz. p. 70), e ay molho (id. p . 52).. No cdice da Bib. Portuense (1J^) l-se mais no fim driste capitulo Q seguinte : v Ha oufra casca de pimenta a que chamam Cuimerim, por ser mais pequena que todas ; da qual se usa como da demais e tem as mesraS qualidades, cuja arvore pequena. Ha outra pimenta a que chamam Cuiepi, q'ue na feio mais redonda e pequena da qual se sa como das mais e tem as mesmas qualidades, cuja arvore no grande. c c Ha outra pimenta a que chamam Cuiepupuna do tamanho de um gravano muito redondo. Esta em verde inuito preta e depois de madura faz-se vermelha, e queima a seis palmos,' e d fruta em todo o nno : .todas estas pimentas so cheias por, dentro de umas sementes brancas da feio da semente de mastrus, que queima mais que a casca, e drillas nascem as pimenteiras quando as semeam. '' E j que dissemos das pimentas que queimam, digamos agora das que O no fazem e que so muito doces, uma das quaes se chama Sarop que tamanha como uma avel, ;a qual como madura se faz vermelha, e de toda a maneira muito doce, cuja arvore de.ctn a seis palmos, e d todo o anno novidade : estas pimentas se fazem em conserva em assucar.
TOMO'xiv ' 4

350 A outracasta a que chamam Ayo, que da feio de uma bolota, e do seu; tamanho, a qual se fz vermelha como madura, e sempre muito doce, aqualse faz tambm em conserva em assucar e se faz arvore grande,, que em todo o ano d fruto. ->' , , No bem que se faa pouca conta da pimrinta do Brazil, porque muito boa e no tem outro mal. que queimar mais que a da ndia, equem muito a tem em costume folga mais cm ella, acha-lhe mais gosto que da ndia, da qual por esse respeito se gasta pouca no Brazil, ,onde os Francezes vo buscar a natural da terra, porque da casca vermelha se aproveitam nas tintas da mesma cr, e se quando v resgatar a esta costa achassem muita drilla, estimal-a-iam muito mais. que o po brazil; e das sementes de dentro se aproveitam, pisando-a bem e lanando por cima das pimentas da ndia, com o que a refinam e abatem : ainda quese fazrist beneficio a esta pimenta, poder entrar em Hespanha,muita somma, se S. Magestade dera licena para isso :xde tal massa esta ferra da" Bahia, quese lhe "lanarem a semente do cravo o dar, como,noz moscada, que tem o sabor d'ella, e d outras arvores qe do canella: se for terra quem a Saiba beneficiar ser como a de Ceilo, de que se dir adiante. 123- Soares d noticia de mais espcies de anacardios do qu as conhecidas dos naturalistas ; mas' no serto vimos, ns ainda uma espcie (talvez gnero) mas cuja planta rasteira. O caju oriental descripto pelo conhecido, botanicoportuguez Loureiro, na Flora Cochinchinensis (Ed, 1790 II, 248; e Berlim 1793 p. 304). A palavra calinga no sentido de mato, carrasquento,: ou charneca de moutas e matagaes de origem indgena e deriva de ca e tinga, mato brancacento. Catinga no sentido d mu cheiro, se .no derivou drista mesma accepo, deve ser voz africana. 124. Driste capitulo parece deduzir-se que j antes daintroduco no Brazil das bananas d frica e da sia, havia na terra pelo menos duas espcies de pacobas: grandes e pequenas. 125. Mamo (Carica Papaya L.) no fruct indgena do Brazil: porm outro tanto no succede papayacea jaracati a que o nosso Velloso chamou {Flora Flum.) Carica dodecaphylla. ' 126. As arvores fructiferas indgenas com que se occupa

351 Soares no capitulo 52 (*) esto hoje quasi todas conhecidas e descriptas pelos naturalistas. A mangaba a Hancrnia spciosa de Gomes ; os qrads,.pertencem, bem como'as guaiabas, ao gnero Psidim ; o aratic uma Anona : vem depois o abajer ( Abbeville foi. 224 escreve Ouagirou) que parece um Chrysobalanus ; segue talvez a rosacea Rubus iaeus ou occidentalis (Velloso V>. ,est. 81 e 82); notamos depois entre outras a Byrsonima Crisophylla de Kunth; a Vilex Tarum e ng eulis de Martius ; a Spondias myroblnus, de^elloso (Flora Flum. IV, est. 185); a. Moronobea esclenta d'Arruda ou Pltonia excelsa de Martius,,o Caryocar Pequi, etc. Tudo isto salvo engano. O amb, imb, omb ou umbu (que para todas as orthographis ha autoridades) a notvel planta que o nosso Arruda (Discurso dos jardins) denominou Spondias tuberosa. 128. Das frutas do serto da Bahia que Soares rene no cap. 54 ha menos conhecimento. Trata-se de um Lecythis, segue-se talvez uma planta rhisobolacea, outra apocynea (talvez outra ariocar), um^Genipa, e o conhecido oyty de que Arruda fez o novo gnero Pleragina: Cazal (II 60) escreve goyty, Vascpncellos (II, 87) gulti, Abbeville ouity. Este capitulo necessita mais estudo. 129. Para melhor se Identificar o leitor com a s^nonimia das palmeiras remettemo-lo ao exame da magnfica monographia drista famlia do celebre Martius, - precedendo a elle, se for possvel,- o conhecimento pratico das mesmas. Nas Reflexes criticas enganmo-nos a tal respeito em va,rias d nossas conjecturas, feitas sem fudamentori s qusi inspiradas, como em outros lugares da seco 4.a drisse escripto, pelo desejo de acertar. 130. Bem conhecida a passifiora maracuj-a', cm que se comea, o capitulo das hervas fructiferas :No nos acontece outro tanto com a planta de que se trata depois, e que nos parece alguma solanea. Segue um Cactus, com nome iridigen por ns desconhecido, logo depois um Asttrocanum e termina o capitulo em duas plantas bem conheci.(*) Na presente.edio deve attendeiyse desloca que por. descuido typograptiico padeceram alguns perodos que devendo ir n'esta capitulo depois do I o g ha pag. 182, passaram, para a? paginas 187, 188 e 189. Estes perodos perfazem quasi duas paginas e meia desdeOs araazeirosinclusive, atOambuc exclusivamente.Nestes commentariosnao, demos considerao a essa desloca accidtntal. Vej. a.errata.'

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das; utea bromeliaceae ra Piper, segundo cremos ; talvez ounguicultum de Ruiz e Pavon.No nosso texto se escrevem ellas caraul e nhamby. Esta.ultimapalavra escreve Piso e a Pharmacopea Tubalensi nhambi. Quanto quella, Vasconcellos (II, not. 70) diz carqgoat ; Antonil (p. 113) caravat ; Piso e Brotero caraguai ; Bluteau caragoat e tarbem carqat ; Fr. Antnio do Rosrio carut e Moraes carahuat;tnas hoje mais geralmente em quasi todas as nossas provncias se adoptou gravata. 131. O ananaz offerece exemplo de mais uma palavra indgena nossa que passou s lnguas da.Europa, e linguagem das sciencias, depois que Thunberg formou o gnero Ananassa. Vamos registando estes factos para decidir separans a lingua guarani ou no digna, a: parda, grega,'de ser cultivada como lingua sabia,necessria para;; dar esclarecimentos no s.na ethnographia e na botnica, como nos differentes ramos da zoologia. S na botanica,.( alm dp mencionado genf Ananassa, temos com nomes' brazileiros os gneros (no fallando.nas espcies), Andira,'. Apeiba, Jacarandd, Icicae* Ing. ' : 132. A cabureiba est hoje designada como Miroxyln Cabriuva. No sabemos qual espcie de copaifera mais geral na Bahia, qual se referia Soares. As virtudes do seu: leo foram j em 1694 apregoadas pelo Dr. Joo Ferreyra da Rosa no tratado da Constituio Pestilencial de Pernam-buo\ pags. 51 a 56. 133. Embaiba (ou segundo outras orthographiasemiww, imbaiba, ambaiba e ambayva) a conhecida Cecropia, arvore urticacea de cujas folhas se alimenta a preguia, (animal, se entende). Quanto s caraobas, os indgenas davam este nome a varias plantas bignoniaceas, e no nos fcil acertar quaes drillas so as duas de que se occupa Soares, bem que imaginemos a primeira a da estampa 50 da Flora de Velloso, e em tal caso a que Martius classificou como Cybistax antisyphilitica. 134. A arvore da almecega u icica [ygcyca no Dicc. Braz.) dp gnero que Aubet designou cm o prprio nome guianense (e qu tambm, nosso) de Icica. Corneiba a Schinus aroeira, de Velloso ; Genena uma-Cassi, no nos fcil saber qual; cuipena' parece * um Myrts ; seguem dous'cips leguminosos ; e o conhecido Rhizophor mangle, L., ou mangue vermelho. 135. As plantas descriptas no capitulo 61 so todas de uso commum e por isso mui conhecidas;- vem a ser: a

353 nicpciana, o ricino ou mamona,abatatarie purga ou jalap (jeticu) e a rubiacea ipecacuanha, que o nosso autor escreve pecacuem, e os;antigos jesutas ipecacoaya, d'onde derivou o nome poaya, que muitos lhe do. Ao tabaco chama Soares pelume ; segundo Mntoya (Voe. pag. 203), dizia-se em Guarani petyma, ou como traz o.Dicc. Braz. pylyma. Damio. de Ges (Chron. de D. Manuel P. 1. cap1. 56) e a com elle .Balthazar Telles (hron. da Comp. de Jesus P. 1 Liv. 3. cap. 3, pag. 442) chamam-lhe betum. Ochronista do rei D. Manuel narra oro essa planta foi levada Europa por seu irmo Luiz de Ges, que ao depois foi jesuta, e de quem nenhum, botnico tem feito caso at hoje, apezar do servio que fez, muito maior do que Nicot. As minuciosas informaes sobre o como se fumava so hoje.mui curiosa prolixidade, por isso mesmo que todos sabem o que beber fumo, cpmo Soares chama ao fumar. 136. Many deve entender-se o nome indgena d algodoeiro (Gossypium vilifolium de Lam.). O Dicc. Braz. diz amany, e Montoya (pag. 151) Amandiy: em Abbeville (foi. 226 v.) lemos amonyiou. A Lantana Camar, hoje conhecida por toda a parte: ub ou taboca o Ginerium sachuroides de Eunth: No sabemos se ha engano na palavra' jaborandi ou na .ultima jaborandiba, quando iras diz o autor, que o nome dado pelos indgenas s duas plantas era o mesmo : o ultimo evidentemente o Piper jaborandi de'Velloso: No afianamos a correco' orthographica em caapiam ; deveria talvez ler-se, com Piso, caaopid, planta do gnero que Vandelli denominou Vismia,. pm honra, do seu amigo Mr. de Visme. 137. Aos fdgsos (Cssia Sericea, Sw.) chamavam os jesutas tareroguy, drinde se pde vr que no haver erro no nosso texto em tararuc ; bem qu nos inclinemos mais desinencia em quy, e seriamos d opinio que a preferssemos para a nossa lingua em todos os casos idnticos ; pois at parece que os muitos uu tornam a linguagem tristonha. Para reduzir as outras plantas, apezar de terem algumas nomes conhecidos, atri na botnica, encontramos contrariedads, as quaes todas s poder aplanar algum naturalista que se ache na provncia em que o autor vivia. 138. O cedro chamado acayac pelos indgenas (Dicc. Braz. pag. 23) segundo se, nos assegurando gnero Cedrela. -, "\ 139. No respondemos pela correco do nome da segunda arvore que o nosso texto chama" Guaparaiva, e menos

354 ainda pela do da Academia quoapaij ; pois nem sabemos o que 'seja. Da jutaipeba propoz-se Balthazar Lisboa a fazer rim novo gnero- Com o nore de J^tahypehiyalen, dana. 140. Tambm qiz o mesmo, Balthazar crer um novo gnero cm o norne.de Massarndubj talvez sem saber se esta sapotacea, embora no Brazil scientificamente, desconhecida ento, no pertencia a algum! velho gnero.P^ra se classificar de novo na botnica .necessrio ter sobretudo muita erudio dos eseriptos da sciencia : muitos gneros se contam hoje que se ho pouco a pouco ir reduzindo a espcies de outros. ^Quanto s espcies, principalmente na Amrica, onde as physionomias naturaes ter tarifa semelhana umas com outras, apezar das distancias, estamos persuadido que mais de metade drillas se vero reduzidas simples Variedades, quando haja viajantes naturalistas que percorram todoeste continente, e tratem de harmonisar os trabalhos dispersos de tantos, cada qual a querer-se fazer celebre e aos seus protectores.Um classificador d' plantas deve ser exclusivamente botnico. Segundo o nosso texto' chamavam os ndios andurababq' pari o angelim, que Piso chama Andira Ibacariba, ' Martius reduziu sb o titulo de Andira 'rosa.. A palavra andira faz crer que alguma cousa tinham os mprcegos qu vr Com esta arvore. O cdice acadmico diz anurababaj.ari,e o coronel Carlos Julio (ult. num. do Patriota p. 98) o teria visto em manuscripto. No Dicc. Braz. (pag. 12) hama-se-lhe Pobra.r^ Arruda tinha denominado o angelim Skolemora pernambucensis. Lamarck havia j proposto o genro Andira, de que , syrionimo o Geoffroya de Jacquin. ,0 gequitib no sabemos que esteja reduzido, biraem ; naturalmente o burayn de Antonil (p. 57), que o Sr. Riedl classificou como Crysophyllum' Buranhem. Sepepira a sicopira (assim escreve Moraes) : talvez a mesrna qe Balthazar queria designar com ohomede Joanesia Magestas. Antonil (p. 51, 56 56) escreve sapupira, eo autor do poema Caramuru supopira. A Bowdichia major,d Martius uma sicopira ;' a\Urucurana, do Rip.de Janeiro foi reduzida pelo, Sr; D;r. Freire Alemo na gnero novo a que deu o nome de Hyeronima alchorneoides. No sabemos se a da Bahia differente. 141. Antonil (p. 57)- escreve Camassarl e Cazal camar., O autor pondera mais adiante (cap. 191) o valor drista'

355 arvore, da qual seria fcil extrahir alcatro.Guanand talvez uma clsiacea, e poder sr a mesma Moronobea coccinea que encontrou Aublet na Guiana franceza. 142. Das arvores que do embira mencionadas no capi-, tulo 68 mais conhecida a que Velloso IX est. 127) designou por Xylopia muricata. 143. Das madeiras de lei de que nriste commentario cabe tratar, s, nos consta que estejam classificadas a do po. ferro, e a que Soares diz ubirauna, se a brana vulgar (Melanoxylon Brauna de Schott). Ubira-una significa ma-< deira preta e ubira-piroca madeira cascuda ou escamosa. 144. Tatagiba ou antes Talajuba (juba significa amarello) a'Broussonetia tinctbria, Mart.; Sereba a Apioennia n>M.d, L.; e a terceira arvore, cujo nome no podemos ainda jtifiar,^ a Laguncularia racemosq de Gaertner. 145. A apeiba, com este mesmo nome, deu a sciencia um gnero, na ordem natural das Tiliaceas. Aqui trata-se da :0ngdeira ou arvore das jangadas, que Arruda appellidou : %. cimbqlaria.Sobre as oufras arvores no nos atrevemos a fazer reflexes sem mais conhecimento especial drillas : deixamos essa tarefa para os que forem botnicos de profisso ; o fim driste commentario outro, e ainda quando ,estudssemos toda-a vida as scincias que abrange hJ e o livro de Soares, em alguns pontos deixaramos de ser juizes competentes, O nome da arvore om que comea o capitulo deveria eymologicamentei talvez ser Catanimbca,,isto , po de cinza. , Up,irgra quer dizer arvore de canoas.Cremos que seja a figueira do mato u gameleira [Ficus doliaria, Mart..) Se soubermos algum dia a ling tupi Ou guarani,, e estudarmos bem os seus nomes de arvores, animaes, etc.L acharemos que todos elles tero como riste sa explicao das propriedades ,e usos dos^ respectivos objectos ; o que j advertimos com a palavra andira no com. 140. 146."tarnje parece-nos. palavra adulterada. Inhuibalan esreveljv, Andr Antonil (p. 57). Jacaran j um gnero botnico credo por Jussieu; no sabemos se a elle pertence o de Soares. ocetayb escreve o jesuta Vasconcellos (11,80), ersseiaba Antonil (p. 56 e 57j Ubiratayatalvez a ubiratahi -ou uratahi descripta por Jos Barbosa d S (foi. 361 ,v.), n'um extenso livrri manuseripto do sculo passado, obra feita no suto quasi com tantas informaes filhas da prpria observao do autor, como esta de Soares que ora commentamos. Tngapemas lemos em Vasconcellos

.356 (II, ri. .18). -Referimo-nos driste jesuita quasi sempre s Noticias Curiosas, que tiveram terceira edio, no Rio de Janeiro em 1824, em um, volume.de 183 paginas de 4. - 147. Ubiratinga quer dizer madeira branca. . .' 148. Anma.significa -cheirar mal (Dicc. (Braz. p. 40); de modo que ubirarema quer dizer - - madeira fedorenta. Guararema -se l no Patriota (III, 4., ); outros-dizem ibirarem.a. - . i .... 149. A legurhinosa de que primeiro se trata como nome comedoy naturalmente do gnero Ormosia.Ar&icnpna (como diz texto da Academia e vem era Moraes) a Annona palustris L.Anhangkybdba eria mais correntemente a traduco de:pente do diabo. Cui-yba, ou arvore das cuias a conhecida Crescentia Gujele L. Da jaiuaiba.cnvL jutuahiba trata tambm Barbosa de, S, foi: 365 V. - -"' 150. O timb-cip a Daullinia jpinnala de Linno ; o cip-mb o Philoendron Imb de Schott (Velloso, Flora Flum. IXest. 109). 151. Tocum, segundo , sabido, uma espcie de Astrocariurn. 152. A ave que Soares designa por guia Cabnra , pelos indcios que nos d, a Trachypetes Aquilus deSpix. Nhand ou ema a Struthia Rhea de'Linno..Abbeville (foi. 242) escreveu Yandou.O Tabui, que Baena (Grirogr. p. 100) diz Tambuiai, pela etymologia se julgaria um Anser, pois que ai que dizer pato ; mas descripo cohforma-se mais a que seja algurp Cassicus. 153. O Mcncago deseript'por Soares po o maCuco vulgar;: parece antes Perdix Capoeira.de Spix, epor conseguinte-no Tinamus : Abbeville escreve macoucaoUd, e Staden mackukawa (P. 2." cap. 28 ). O rnotum de Soares xactamente o Crax rubriroslris de Spix ( Av. II, Tab. '67'). O jac por elle dscripto no rios parece nenhum dos gallinacep classficado no gnero Penelope ; cujos nomes -brazilicospara-s espciesj a cupenia, jaculinga^ etc, a ornythor. logia j admittiu. ; , ,''",'' ' , Tuiui reconhecidamente o Tantalus loculaCor deLino. Em Cayen chamam porm Touyouyou Micteria americana. 154. O Canind d Soares urna variedade da Ar.alihga ,-iuteus de Spix. (Av. Tom. l.d Tab. 16). Confronte-se tambm ;a descripo dpBuffon,(H,ist. Nat. Tom.7:p. 154 e 155, dc.

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4.* gr.) A arra-etoanns so. bem conhecidos. Embagadura, entre s indgenas, er, o punho da espada, segundo melhor se explica no cptio 173. . ' l 155. Urat!uga(Oira-tin-de Abbevlle< foi. 241), a Ardea %gretta'de Lirio ; ZJpeca,Vpec d Abbeville (foL 242), Ipec ri Dic, Braz. (pagw59), ave do gnero Anas. Aguapeaoc ouPiassoca Palamedea comuta de Lino; Jabacalim a ribeirinha que Moraes (no voe, Papapeixe ) designou frjagmclij Os gariramas so do gnero Trmga. Jacua evidehterente a Ardea Scolopacea de Gmelin, para a qual Vieillot propoz o gnero Aramus, havendo sido por Spix den&minada Rqllus drdeoides. 156."O Nhaitnb corihecidamente o "Tinamus plumbeUs e,-Tmriink. Pica, parari, jurlt e piquepeba parecem as blumbinas griseola, strpitans, caboclo e campetris de Spix. 157. Papagaio voz africana; era o nome dado em Guin aos cinzentos, primeiros que se levaram Portugal. O nome brazilico ager ou ajur como-admifte Moraes (Dicc. Port.)-^ Abbeville (,-fol. 234) escreveu juruue. Assim ager-ass (que outros escrevera jur*u-ass) significapapagaio grande, e ager-l papagaio verdadeiro. O primeiro, bem como corica parecem antes do gnero Ara. Thevet ( foi. 93 das Singul.) escreveu Aiouroub. Tuim ser um dos PsitacuXus gregarius de Spix.Soares escreveu com Gandavo rracari ; outros porm dizem maracan. Consulte-se SMrgraf (pag. 20); Jobnston, Avi.'pag. 142 ; Willugby, Ornithol. pag. 74, eBrisson, Ornithol. Tom. 4., pag. 202.; 158. O capitulo 84 oecupa-sede varias aves ribeirinhas ; talvez da Ardea garzetta de Gmelin ; da Sterna magnifMtris de Spix; de' uma Prcellaria ; da Micteria americana; de alguns bis, Tringa, etc.Socory deve ser Scboy ou Ardea Gofioi de Lath. Em vez de margui lemos em uns cdices mrgusi,,e .talvez se devesse'ler maju% que o nome ddo"s andorinhas (Dicc. braz. p. 12).Pahua parece que se diz no Peregrino da America (p. 48) que era o bemtevi; ms a descripo de pitaoo no se conforma. , ;< 159. Urubu o Vultur Jota de C. Banaparte : carcardTo Polyborus vulgaris de Vieillot:- oacauoam o Astur cachin'nns d Spix (Tom. l., tab. 2-')Urubutinga, vista da descripo no pde deixar de ser o Cathartes Papa, e impropriamente chamou Linno uma guia negra Falco Wtbutinga quando esta ultima palavra quer dizer urubu branco.; masigual troca j s fez com a Ararana. Difficil

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ser reduzir a espcie de Falco ou Milvius de que trata o .atr corri to pouca explicao. , - 160. A primeira e terceira aves parecem Slrix. A se* , igrinda Cremos que ser o Trogon Curucui de Levaillapt. 'Desculpe-se Soares o occupar-se, a par d'estes, de um cheiroptero, seu companheiro de noite.Quanto Orthographia dos,nomes Souza Caldas escreveu (Cantorias Aves) Jaeorut, e Abbeville em francez Joucouroutou. 161. Uranhengat o passarinho do -Brazil que substitua no canto o canrio e oe spintasilgo. Gorinhat esprevem alguns ; e Nuno Mriu Pereira, no Peregrino: da America (Lisboa, 176;pag. 4.8), Guarinhata. Hoje diz se Grunhat (Cazal I, 84, e Rebello, Cor. da Bahia, 1829, pag. 56). Parece o Ictrus citrinUs de Spix. Sabiatinga (qe ainda hoje em algumas partes se chama sabi branco) o Turdu% Orpheus de Spix. Ti piranga o nosso mui conhecido tih {Tangaranigrogularis.de Spix)Gaindmbi o nome indi* geno dos beija-flores, que hoje constituem vrios gneros; e~Ayay> o da linda colheireira qe Vieillot designou como Platale aiaiu? Jaan, pelo,nome, deve ser do gnero Parra ; e nriste caso talvez a de. que trata Soares seria encarnada por retamorphose que essa espcie soffra, como aontec aos guars (bis ruber)Segue-se a Tangarq cmlestis de Spix, e mais duas aves que tambm podem ser do mesmo gnero, se alguma no antes Muscicapq ou Lanius. A ultima av da famlia psittacina. ' 162. Os pssaros que melhor conhecemos, alm do que primeiro tratou no cap. anterior, e torna occupar-se, so: o .sabicoca oxx sabi da praia, que Spix denomina Turdus rufiventer, e do qual diz (pag. 69 do texto) Ser cantu meldico uti philomela europsea insignis : e o Querejua. ou ' Crejo que a Ampelis Cotingq de Linno. 163. Nhapup o Tinamus rufescens de Temnink. A saracura pertence ao gnero Rallus : Spix descreve-a como Galinula Saracura. Or o Trogon sulphureus de Spix, e An (que'Moraes diz Anum) o Crotophaga Anl de Linno. Segue-se a,Ardea MagUari de Vieill, e talvez um Tinamus, vrios Turdus; e conclue-se capitulo com um trepador, picapu (Picus.), manifestamente o que Spix denominou P. albirostris, e qu, segundo Cuvier julga, tem \ analogia com o P. Martius de Linno. 164. Occupa-se o autor de dar noticia geral dos orthopteros e lepidopteros. No Dicc. Braz. (pag. 42) lemos tu-

359 cuna, e em Abbeville (foi. 255 e 255 v.) pananpanam e araraa. 165. Seguem vrios hymenopteros d familia mellifera. Da cdnajuba trata Baena (Corpg., pag. 121) e da. copueru Carvalho (cap. 351) e Piso (pag. 287), que tambm seoccupa d Taturama (pag. 289). 166. Os outros da familia diptoptera de Latreillee alguns dipteros, etc.Abbeville escreve (para ser lido por Francezes) Tururugoire e merou ou berou por ieriga e mer. ,167. Mais dipteros, um orthoptero ri um coleoptero da familia dos longicornos de Latreille, ou cerambycios de Lmk. 168. Tapir-et o\i simplesmente tapir era o nome que davam'os indgenas ao conhecido pachyderme Tapir qmericanus, que Buffon descreve no tomo undecimo de sua obra (Edic. de 4., pag. 444).Os1 Castelhanos lhe chamaram ante e danta-, e os Portuguezes anta, porque designavam a esse tempo com tal nome (derivado do arabigo que semelhante) o bufalo (Bos bub lus de Lin.) que havia na frica ,e no sul da Europa, e cujas pelles curtidas de cr amarella, que muito se empregavam nos vesturios e armaduras no sculo 16, poderam substituir pelas do nosso'tapir, com mais vantagem ao menos no prep. A resistncia das ouras de anta estocada era proverbial. , ... . / 169. Jagaret ou jaguar verdadeiro a Felis ona d Linno. 170. Ha talvez engano er suppor um animal Felis habitador dos rios ou amphibio; ho tamanho das prezas tambm deve haver engano ; pois no podem ser de um palmo. 171. Julgamos mais acertado no querer reduzir sem bastante segurana ' as trs espcies de cervos de que se occupa'Soares ; sebem que Uma nos parea o C rufus de Cuvier, e outra o C.tnuicornis de Spix. 172. Oc.cupa-se o autor do tamandu-a ou Myrmecophagajubala. Segue-se talvpz uma espcie aguarachal ou Canis Azarce; e depois coaty, espcie de Nasua, o maraeai ou Felis trigrinae o seriguou gamb, que no Rio da Prata chamam micur, espcie do Didelphis de Linno. Gandavo (fl. 22 v.) escreveu cerigos e Vasconcellos (Liv. 2., not. 101) arigu.-^- Ao bolso do abdmen chamavam os indgenas tambe. 173. Jaguarecaca (talvez antes jaguatecaca) diz Soares ter

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ido o nome do conhecido Mephitis fceda de 111.> que Cazal, (L, 64f designou por Jraticaca. 174. Os pachydermes que se descrevem todos sparcem dicotyles e nenhum sus. Deixemos a reduco das espcies aos que tenham k vista bons exemplares adquiridos nas immediaes da Bahia. Os nomes nos manscriptos no soffreram adulterao ; mas hoje alguns variam -mcaiit, tayatit e teririca. > - 175. Poucas palavras tero soffrido entre ns mais variedade na orthographia do que a da capivara, que -assim se pronuncia e escreve hoje quasi geralmente nome do Hydrochozrus Capibara de Cuvier. , _ . Os outros amphibios no , podemos determinar s pelos nomes: urn pde ser a Mustelalulra brasilensis ; os outros talvez. Vivrras. 176. Chama-se Tat-a, ao Tal-ai ou Dasypus Uniinctus: tt-bola o D. tricinctus; os dois ltimos parecem ambos da espcie D. novempinclus,. 177. As pacs e cri tias bem conhecidas so, assim do vulgo, como dos naturalistas. Cotimerim ou antes Coatimerim o estimado Caximguenguel, espcie do gnero
Sciurus. , ''

178. O capitulo 104 d razo de cinco animaes da ordem dos quadrumanos, cada um de seu generp. O guig CalliiHx'; a guariba Mycetes; os saguins da Bahia, Jacchus ; os do Rio, Midas; e os'anhngsou diabos so evidentemente Nocthora."' 179-. Se o autor andou to systematico no capitulo que acabamos de commentar, no succedeu assim no immedito, onde ajuntou vrios animaes mui differentes : Svi (ou talvez Saui) e seus. compostos S. tinga e S. coca, so espcies dos gneros Mus e dp Kerodon de Neuwied. Aperis so.os Pres ou Ancema Cobaia L.: Tapolim a Lepus brasiliensis de Gmelin-'; e Jupati um marsupial, provvel-, mente a denominada marrota {DLdelphis rnurina)-,. 180. Para no interrompermos o pouco que falta da classe-, dos mammiferos, no nos deteremos com largo exame no capitulo em que Soares d noticia de alguns reptis do, gnero-Emys, e talvez de mais algum da familia chelonida. O nome brazilico jabuti j est tambm Consiga nado nos tratados da sciencia zoolgica, e nos museus do Universo. ; 181. .A preguia (gnero Bradypus de.Lin.) pelo jesuta

361 Vasconcellos denominada (Liv. 2., n. 100) Aig.Hal dizia Thevet. ,. 182. No sabemos como entende" Soares que JupaV ou antes Jurupar' queira dizer noite. Jur significa boca, e noite ou escuro traduz-se por pytuna. Sabemos que existe ainda nas nossas provncias do norte um-animal d'aquele nome, que se caa de noite, quando, vem comer fruta em certas arvores, e que em algumas terras lhe chamamjirepary.Este nome quasi eqivalia entre os indgenas ao de anhangd. Assim talvez o aimal seja algum do gnero Nethora (com. 178). O cuan, cuime queiro sov espcies de ystrix. r - x '-.. 183. Enceta-se uma das ordens ds reptis com agiboia mui propriamente chamada Boa Constrictor.. Actualmente ha duas d'elas vivas no nosso museu. Veja-se a dissertao sobre Ophiologia do Sr. Burlamaque na Bibliotheca Guariabarense, que publica os trabalhos da Sociedade Vellosiana (Agosto de 1851). 184; So conhecidos os ophidios de que trata o capitulo. Ao ultimo chamou Abbeville Tarehuboy, e Baena (Cor. do Par p. 114) Tarahiraboia. 185. Hoje diz-se vulgarmente jararaca {Trigonocephahis jararaca, .Cuv.) A ububaow coral, pelo nome deve ser a Elaps arcgravii de Spix.' 186. O nome de Botcininga ahiu em desuso e, s ficou o de cascavel (Crotalus Cascavella.) Os Chiriganos chamavam-lhe emboicin o boiquir ; assim como, segundo J. Jolis,;(Saggip, dei Chaco p. 350), chamavam boitiap que Soares diz Boitiapoia, mais conhecida por cobra de cip, taVez~pelo uso dos indgenas de aoutarem com ella, pelas cadeiras, a suas mulheres quando hes no.davam filhos. Ubojara naturalmente a Ccecilia Ibiara, Daud, pag. 63 64:' " ' 187. jrigonochephalus Surucucu chama Cuvier ao ophidio que em vulgar designamos.com este ultimo nome.O ubiracvparece a iV'arixfunctatissima de Spix. Os outros so talvez espcies de Xiphosoma. Urapiagdra ou Guiraupiagra quer dizer comedora dos ovos dos pssaros. 188. Na ordem dos saurios menciona Soares um jacar, que como se sabe gnero da familia dos crocodilos. Sanambs e Tijs (ou Teys) soTguanas. Anijuacangatalvez seja^adulterco de Teju-acanga. 189. Trata-se de-alguns amphibios da familia Ranim. O sap' o PipaCurur de Spix. Jui giqnev dizer ra

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do gemido, e por este nome hoje Conhecido em algumas provncias este batrachio. 190. No sabemos individuar os apteros myriapodes, que Soares descreve nriste capitulo, por nossa mingua de conhecimentos entomologicos, e falta de cplleces que nos sirvam de guia. Piso,(p. 287) escreve mbu, 191. Outro tanto dizemos acerca dos pyrilampos ou vagalumes que devem naturalmente pertencer, como os que conhecemos, ordem dos Coleopterds. Piso (p, 291) disse Memo. 192. Da classe arachnidea trata-se no capitulo 118, bem como dos articulados d,o gpnero Scorpio, Mygala, etc. 193. No nos foi possvel encontrar colleces contendo ps Hymeriopteros tratados nos quatro, captulos que seguem. ( Abbeville (foi. 255 v.) chama Ussa-ouue formiga, sba utocanteira. \* 194. A palavra goajugoaj parce-ns no ter soffrido adulterao : uma Formica destructr.ix. 195. O Diccionario de Moraes anda falto de um ccento na segunda syllabaa palavra Is. 1,96. Ta.cyba em.-geral a palavra para dizer formiga na lngua, guarani. . 197. Copi ou Cupim e o conhecido Termes felale de Lin. (Cuver T. 3. p. 443). Nriste capitulo,ha,no nosso texto melhoramentos de variantes importantes. 198. Abbeville (foi. 256) chama tou ao que Soares e o Padre Luiz Figueira (Gram. p. 48) dizem tunga, e Allun Hans Stadri. E' nigua dosHespanhoes, e chique dos Francezes (Labat, Viag. J724 ; T. 1,. p. 52 e 53)., ^199. O nome pirapu dado pelos indgenas ao cetceo bala pde tradzir-se por peixe redondo ou peixe ilha. 200. Segundo nos informa o Sr. Maia no consta que o espadarte freqente hoje a nossa costa. E senunca a freqentou elle de opinio que ode qe Soares trata seja antes o Ilistiophorns americanus deCuv... O peixe-monstro de que se faz meno eria' naturalmente algum cachalote de extraordinrio-tamanho: ' 201. A ida de homens marinhos era familiar aos ndios.. Gandavo (foi. SI) d noticia drilles, com o mesmo nome quri Soares, apenas diversamente escripto, Hipupira. O P. Joo Daniel no Thesonro do Amazonas (P.. 1. cap. 11) tambm se-mostra em tal assumpto crdulo.Soares no poude ser superior ao que terminantemente ouvia afirmar,eao seu

363 sculo; pois que era ida antiga tambm na Europa, om asseras, etc. Bem conhecida a passagem'de Dante tantas vezes citada:
Ohe sotto Tacqua ha gente che sospira, E fanno pullular quest' acqua ai summo.

As assaltadas de que se faz merio seriam talvez obra de tubares ou de jacars, uma vez* que por alli no consta haver phocas. 202. Trata o cap. 128 de peixes dos gneros Pristis, Squalus, etc. Romeiro o Echeneis Beniora de Lid. Abbeville (foi. ,245 v.) escreveu Araoaoua,, e Thevet {Singul. foi. 133 e osmogr. foi. 967 v.yuperou,o que comprova a exactido nos termos Aragoagoqy e Uperu de Soares, attendidanriquelles a orthographia franceza. ' 203. GoargU ou Guarab, (Dicc. Braz. p. 60) o conhecido cetceo do gnero Trichechus. 204. O beijupir, sem questo o mais estimado pexe do Brazil-co.mo assevera Soares, o scomberoide antes denominado Centronotus, e hoje classificado como Elacate americana (Cuv.e Vl. Hist. desPois. 8,334). Olho de boi (que dveser algum Thinnus) diz-s.e em guarani Tapir-si. Do Camoropi tratam Laet (p. 570), Lago (p. 62), Abbeville (foi. 244), Gandavo e Pitta (p. 42). 205. Ainda que sejam mui nomeados os peixes que Soares reuniu no capitulo 131, confessamos que s drilles conhecemos a cavalla, scomberoide do gnero Cybium (Cuv. e Vai., Hist. es Pois., tom. 8. pag. 181). 206. Melhor acertamos acerca dos peixes cartilaginosos. Panapan (nome que tambm nos transmittem Thevet e Abbeville) a Zygenamalleus de Valenciennes, gnero da *familia dos Squalidai, ber como os caes. Os bagres so Silurioi talvez do gnero Galeichthys e Pimelodus. Piso trata drilles cora nomes anlogos Curui e Urutu. Caramur um cyclostomo, talvez P.etromyzon. As raias do Brazil so de vrios gneros: Raia, Pastinaca e Rhinoptera: e os nossos pescadores drista parte da costa as distinguem com as denominaes de Santa, Barboleta e Manteiga,1 Ticonha, Boi (anegra), Treme-treme, etc. Jabybyra significado que se oonfirmno Diccionario Brazilico, pag. 66. 207 Preparemo-nos para encontrar em um capitulo peixes muito dissemilhantes entre si. Vereis ao lado de algum Lobotes (?) um Thynns, uma Coryphena, um Scomber, um

364 Serranus, um Elops. Julgamos o rncador dos Scienidas, as agulhas ds Esocids, o peixe porco dos Blistdas e este ultimo mui provavelmente -'Monocanthus. Quanto aos. nomes indgenas temos por exactos todos osdo riossq texto. ,Guaibi-cara, explica a denominao que menciona Piso (pag. 56); porquanto guaibi ou gaiinirn (segundo escreveu o autor do Diccionario Brazilico) quer; dizer velha. Jurucu , segundo Piso, o, nome das tartarugas, que Soares teve a lembrana pouco feliz de arrumar nriste-capitule. ': 208. De novo attende Soares a1 outros peixes, pomp se juntos tivessem sahido de um lano de rede. Trata-se primeiro daMugil Albula de Linno, que dos mais abundantes da nossa costa. , O peixe gllo em questo do gnero Argyreyosuso dp Blepharis, ou de algum dos outros que constituam Zeus deLin., os quaes se pdm cmprehender na familia dos. Scomberoides., Pror o nome que significa enxada; porm a enxada peixe, ou o peixe enxada da 'famlia chetodontida, e d gnero Ephippus, quanto alcanam nogsos exames. A coirim ou coriman, pertence ao citado gnero Mugil.,, Arobori deve ser dos Clupidas, e carapeba do gnero Sciena. / 209. Jaguari naturalmente da familia dos Cyprinidas;pirasaqu do gnero Conger. O bodio peixe dfferente,' segundo os paizes. O nome Atucup verifica-se. pelo derOatucup, que d e Dicc. Braz. (pag. 62) para a pescada. A palavra Goaybi-coatitem o,,que quer-que, seja que, vr com velha (com. 2Q7). ,'.,210. Urama ou aramac, segundo os que leguem,, Marcgraf,do gnero - Pleufonectes. Aimor parece um' Lophius. O baiac um Tretradon e o pira-^quiro um Diodon. Estes dous peixes da familia gymnodontid servem de confirmar a propriedade que guardavam os Guaranis em suas denominaes : ao baiac que ainda hoje serve deprbverbial comparao para os que imitam-a- r da fbula, designaram elles por sapo ; e pira-quiro traduzido ao p da letra quer dizer peixe-ourico ou peixe porco-espinho, nome dado,pelos pescadores. Concluiremos o que temos a dizer sobre o cap. 136, depois de parar algum tempo admirando Soares a descrever a Malthea Vespertilio, que'to freqente em nossas guas, com o nome de morcego do mar. Foi com um exemplar preparado, que tem o nosso museu, ao Rio de Janeiro, e depois com outro que se acabava de

365 - pescar, avista, que tivemos benroccasio dp admirar o gnio observador e taljerito descrip.ti.vo de Soares. Vacupu, seguramente adulterao de Baiac pu. . 211. Deixamos.para ps.que venham a fazer, ex-professo, estudos sobre a nossa Ichtyologia, to pouco estudada at* agora, os exames que ho nos possvel ultimar acerca da doutrina d!este capitulo, alm do muito que deixamos nos captulos j commentados. O de que tratamos,conclue com um crustceo ber conhecido. .212. Seguem outros crustceos.-^Uss o Cncer uca de L. ou Ocypode fossor de Latr. 213.' Mais crustceos do gnero Cncer, Grapsus, e t c O uso j admittiu a pronuncia e orthographia de Serl cm preferencia a todas as outras. O nosso autor dva-lhe novo cunho de autoridade. -' , 214: Lerl o nome genrico da o^r, e ainda nosiembramos da graa qe os Tamoios acharam ao francez Lery de ter um nome como ;o drilles. abbeville (foi. 204) diz Rery, e drista. maneira de pronunciar (mais exacta visto que segundo Soares os indgenas no tinham-o^ 1 de Lei) veio Rriritygba (Vasconc. not. 59). 215. Os testaceos de que trata Soares so conhcidamente Anodon, Unio, Mytilus. ' ,216.. Descreve-se a Amplaria Gigas de Spix, alguns Bulimus, Helix,etc. Nos nomes indgenas notam-se varin-. tes dos do texto academio que traz o Papesi, Oatapesi e Jateto.asu differentes. 211. Oomprehende o capitulo variOs Echinodermes, Parenchymtosos, Polypos, etc. 218. So-nos mui familiares os nomes e o gostodos peixes lembrados no cap. 144, os quaes se encontram nos rios do serto : mas sem exemplares vista n quereros; arriscar opinio sobre o lugar qu elles occupam na Ichtyologia, sendo mui natural que pela maior parte estejam por classificar : ainda assim conservmos lembrana da frma petromyzonida dos mus ; da cyprinida das trahiras ; da silure dos tamots ; da percida dos ocaris, etc. . 219. Vem de novo alguns testaceos e crustceos: so Anodon, Hellx, Unio, e t c , de aga doce. 220. O texto, da'Academia nomeava Goachamoi o que em' outros cdices lemos Guoanham .-. hoje dizemos Ganham. 221. No havia, e insistimos ainda n'e?ta ida, no Brazilnao Tapuia. Esta palavra quer dizer contrario, e os indgenas a.applicavam f. aos Francezes, contrrios dos
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nossos, chamando-ihes\ Tapy-iinga,. isto Tapuia branco (Veja-se o Dicc Braz!, Lisb., 1795, pag. 48)% Antigamente no Brazil, como ctualmente ainda no Par, chamava-se ^Tapuia ao gentio bravo ; e tapuia s iam chamando uns aos outros, os mais aos menos civilisados. Quando os Tupis invadiram o-Brazll do norte para o spl (e no.do sul para o norte corno prteadeu Hervas e com elle Martius), Chamaram/ Tapuias- s raas que elles expulsaram.->0s Tupis, que a st se chamavam'Tupinambs ou Tupis abalisadoS, foram logo s*guidris'de outros de sua mesma raa, quriVse chamavam tambm a si Tupinambs e deram aos vencidos, que empurraram para o sul e para o serto,'.o nome de Tupi-ikis e de Tupin-aem,.isto Tupis latraes e Tupis ms, Corno j dissemos; (com. 39). . \ . s '; 222. O fraccionaraento crescente na raa tupica, que se estendia por quasi todo, o Brazil na poca do descobrimento, era tal j que no exagermos que crm que a no ter lugar acoloni&ao europea, a.mesma raa devia perecer-assas>siuada por suas prprias mos .;" como quasi vai succedendo n'esses mattos virgens em , que temos ndios bravos,'fazendo se- uns a outros crua, guerra. Sem a desunio 'da raa tupica nunca houvera uma nao pequena corno Por-* triga! cqlonisado extenso de terra to grande crim que vai do Amazonas ao Prata. Os primeiros colonos segura-' vm-se- na terra,1 custa drista desunio-, protegendo.sempre ura dos partidos, que com essa superioridade fiav vencedor, e.se unia aos da nova colnia, mesclando-secom ella em interesses, e t ,eiri relaes de parentesco', e't. A's vezes chegavam fomentar a desunio.'politica, o qu no deve admirar quando vemos que isto ainda hoje seguido,,e que naes,'alis poderosas, no conquistariam muitas vezes naes fracas, s dentro dristas no achassem, partidos discordes em quem pudesse encontrar ponto de apoio sua alavanca terrvel. '. -- ' , 223. O nomeindigen d termo da Bahia deve estar certo, porquanto ps-Jesuitas o repetem, escreve,ndo-o porm1 Quigrigmur.Crem&ser-a mesma Bahia loca! a qe.sequiz referir Thevet (fl. 129) com o nome de Point de Crouestmourou. No andaria porm j n!este nome a ida da .residncia do Caramur ? / 224. Nriste capitulo confirma-Soares qu o nome dos indgenas, antes de,se dividirem, rir o de Tupinambs : que fallavam geralmente a mesmia lingua por toda a Costa, e tinham os mesmos costumes, etc.

r 367 - 225. O principal ou cacique dos Tupinambs tinha (etem ainda) entre elles o nomp de morubixaba. No nosso museu ha o retrato de um de Mato-Grosso-todo vestido de gala, e .que n baptismri s chamou, (como o governador) Jos Saturnino. ; " ' . . ' ' , . "'. . . . ; . - ' 226. A respeito da condio >a mulher entre os Tupinambs cohsulte-se o que diz o P. Anchieta (Tom. Io da 2." ,{3.- da Rev. do Insf., pag. 254). Esse escripto de Anchieta devemos bondade do nosso amigo o Sr. Dr. Cunha Rivara, bibliothecario.de vora, e que tantos outros# servios tem prestado sdettras^brazileiras, [ %2% Asiaxorcas usadas pelas mulheres eram denomina:dascp:mo diz o nosso autor ; pois qe o confirma Abbeville escrevendo (fl. 274) Tabqponr. >'.' "" ,,' \ 228. Osprimeiros apellidPs derivavam entre os Tupis, secundo Soares, l.^de animaes, 2." de peixes, 3, de arvores, 4.?. de mantimentos, 5. de peas de armas, etc. ' o que succede por toda 4 parte com a raa humana. Nos nossos mesmos nomes no aconteceisso ? Vejamos : 1. Lees, Lobos, Coelhos, Cordeiros, Carneiros, Pacas, etc; 2. Sardinhas, Lampras, Romeiros, etc.; 3. Pinheiros, Pe.,reiras,Titara,.etC. ; 4. Leites, Farinhas, Trigos, Cajus,etc; 5. Lanas, Couraas, etc. O que dizemos dos n_osso,s. nomes pde applicr-se aosinglezes, francezes, allemaes, etc. 229. Melara era o nome indigeno-dos botoques da cara : s vezes tinham a. frma de uma bolota grande ; outras vezes eram comg uma muleta eniminiatura.-E' claro que, 'com taes corpo? estranhos na boca e nas faces, a falia -dos .gentios;, se difficutava ou antes era mais difficil entendel-os, nem que trfessqrri a boca cheia, como diz-Thevet. Quando tiravam o btoque sahiaa saliva pelo buraco, e por graa deitavam elles s vezes por ali: lingua de. fora. Temos visto botoques de mrmore, de mbar e de cristal de
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. 230".' O bicho em questo d pelle peonhenta descripto por Soares no riap. 66,.sob b nome de Socaima. 231. O " parentesco mais prezado driste gentio depois dod pai a filho, era o de tiopaterno-a-sebrinho. Pelo sangue d mi no havia parentesco, o que tambm era admittido entre os antigos gypcios. Os-Romanos tambm aziam grande differena entre o parentesco dos tios paternos e maternos distinguindo patruus-de avunculus,'e senclo aqueile, o segundo pai, padrinho^oupreceptor nato. Assim-a idea da fraternidade de que o Evangelho se serviu, e se servem

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hojevos philantropos como prototypa ds sentimentos da-: piedade e caridade, no era a que grassava entre essas raas : na verdade j desde aim e Abel, os, irmos por via de rivalidades quotidianas, nem sempre so modelo dos sentimentos puros, caridosos p pios, que o christianism quiz symbplisrcom-a fraternidade, Os Tupis davam preferencia rio parentesco do palruismo, e diziam-se por ventura uns aos outros tios, como ns hoje - em crmunho social nos dizemos irmos. Em Hespanha >e Portugal, e mesmo entre, ns no serto, ainda se chama lio a qualquer homem' do campo ou do mato a quem se no sabe o nome ; irmo diz-se s aos; pobres, quando se lhes ho d esmola, e pai ou paisinho' aos pretos ; sobretudo quando velhos. Temos ida de haver lido que o uso antigo de chamar-se a g.nte por tios, procede do tempo dos Phenicios e ds Egypcios.Sendo assim teramos nristes factos mais urn ponto de pontacto para apossibillidade de relaes de ouWrira-' entre o Egypto e,a America, cerca do que Lord Kingsborough apresentou tantas- probabilidades. E' certo que a mesma:expresso Tupi' quer, dizer tio, segundo Mntoya, e pde muito bem ser que o nome que hoje damos raa no signfique.-seno tios ; assim Tupi-mb significaria s tios boa.gente;' Tupi-aem os, tios' mos ; Tupi-ikis.: os tios contguos, etc. Os nossos africanos ainda se tratar mutua1-,, , mente,por tios,e talvez que no s em virtude do uso' europeu, como do dos Tupis, e quem sabe smesm' drilles africanos.. No faltar quem ache estas nossas opinies1 demasiado metaphysicas^; mas so filhas de duvidas qu temos, e publicando-as no fazemos mais que levl-as ao' terreiro da discusso, s.,-. , , ' , , , . . 232. Segundo.Thevet (fi. 114 v.) para fazer p sal ferviam; a agqa do mar at engr,ossal-a e ficar ella em metade, e unham entae uma substancia com que faziam oristalisai\ esta calda salitrosa. 233^. O limbo e lngui so o trovisco do Brazil.Quanto criaaode animaes; e pssaros- domsticos er ella anterior coonisao ; por quanto j da carta d Pero Vaz de Caminha se v que com isso se occripavam os das aldas visi. nhas.a Porto Seguro. 234. Recommerdamos leitura d'este -capitulo 160 .aos qu sustentam o pouco prestimo do nosso gentio, -que' por phanlropia estamos deixando nos-matos tragando-se uns aos outros, e caando os nossos, africanos (a que chamam; macacos do cho)-s para os comer ! v

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;235. O SO de .comer- terra e de mascai-barro cousa ainda hoje vista entre alguns caboclos e moleques. 236. Tambm chamamos a atteno sobre este capitulo. Tal a magia da musica e da poesia qup a apreciam at os povos sepultados n maior brutalidade. 237. Quanto aqui se relata confirmado por Lery, Thevet, Ferno Cardim e mais viajantes antigos. Ereiup era o Salamalah da raa, tpu , 238. Gahgoeira de fumo era nem mais nem menos do que um cigarro-monstro, cuja capa exterior se fazia de folha de palmeira, ern lugar de.ser de papel, ou de folha de milho ou d mesmo tabaco. 239. .0 uso de curar feridas com fogo debaixo de si foi advertido por Pero Lopes, quando diz que se curavar ao fumo. , . .( O ultimo driste capitulo no se encontra no texto da Academia. . 240;. O apuro dos sentidos entre os indgenas -proverbial; e ainda nos tempos modernos se v confirmado por todos os viajantes que tem visitado as cabi-ldas errantes em nossas matas. ' ", 241. Em vz de tajupares escreveu o autor do Dicc. Braz. (p..21) tjupaba.e Abbeville (foi. 63 v. e 121) aiupaive. '242.,aiera o nome do tapgo, tapume silvado ou sebe;, que'-fazia a, Cntracerca ou circumvalao das tranqueiras ou palancas. E' palavra que se, encontra trs vezes na Relao ,dq jornada da Parahyba d o P . Jronymo Machado.. Caz,ia diz O texto acadmico. 243/ Como typo da eloqncia guerreira,indgena, eram consideradas as declamaes do celebre principal Quoniambebe, dp quem trataremos em outra occasiaol 244. O appelido de nascena-, de que tratamos (cm. 228), s servia aos indgenas em," quanto por alguma _ faanha no conquistavam outro,mais honroso. Pde-se dizer que com este segundo nome ficavam titulares. Para memria dos novos ttulos-sarjavam o corpo d riscos indelveis;. o que era honra de,que s usava quem a conquistava. Eram os riscos como uma farda ou condecorao, que promoveriam o riso, quando trzidospor quem nao as houvesse de direi to. - 245.- Mazaraca dizia aqui, em vez de muurana, o texto Acadmico.As relaes dos prisioneiros om as gentias, que lhes davami por companheiras, poderia talvez explicar

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a salvao de alguns. Driste, modo encaramos o assumpto do Caramur como romance histrico. 246. Era para o gentio reputado vil cobrdia.do prisio : neiro o no afroritar a morte Com arrogncia, e o no exhalar o ultimo suspiro com alguma afronta contra osivence*dores;. Assim os indigenas: deviam fazer triste ida dos christos-quando elles pediain a Deus misericrdia n hora da morte, ou faziam alguma outra-supplic-'i Foi por isso que a cmara da Bahia, representando o-rei contra a infficacia das ordens regiasde se levarem os mesmos ini digerias por irieios d braridura, disse que ellpf np agra* deciarn esses meios brandos, antes s enfa-tuavam mais com elles, imaginando que provinham de'medo. S V. A* quizer tomar informaes por pessoas que -bem conheam a'qualidade do gentio drista terra aharqu^ por mal e no por bern se ho de sujeitar e trazer -f ; porqu, tudo o que por amor lhe fazem attribuem com medo,; se danam com isso':-* O mesmo assegura Thevet na su CosInogr. foi. 9t)9, fallando dos antigris.;Tupirin|bs-o Tamoios do Rio de Janeiro'. Et, estiment celuy iapltrpn, ei lasche de cceur, lequel a y a n t l e dessus de.sri nnemy, le laiss aller sans se venger, et sans le massacrei^ ' O que ainda sccede com os dos. nossos sertes. Os brigr^^ec^bm, presentes de fef rinhos- que no nno seguintririyrri contra o bemfeitor, mui aguados, nas-pontas de suas.frechas,;' ou-assassinam aquelles que, depois de lhes fazer presentes,nriliesxmnfiani. Ainda temos na ida o horror que nos, causou o assassinato do sertanista Barboza'., e seus doiis companheiros, descripto emum numero anterior (n. ,19) da Revista do'Instituto. ' '.-,' -' -; ' . 247. Embagadura o-nome do punho da espada tanga? peina;, acha-se repetido nriste,tratado no capitulo 80.' 248. Moquem (drinde derivou o nosso verbo moquear) a mesma expresso que na America do Norte se converteu em boucan, drinde veiu bucaneiro. 249-. Por este capitulo 175,vemos que entre os Tupinanv bs da Bahia s os moos iam cova dentro de talhas piritadas_ {iguaabas ou camucins): falta pois examinar-se essas mmias acocoradas quese tem encontrado em talhas.,contm' cadveres qu se possam julgar- de pessoas adultas., 250. Algumas particularidadesnarradas por Sprs tem analogia com o que praticava-a antigidade, tanto no que respeita ao carpir os mortos, como ao desamparar o matar os doentes m perigo, '

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251..O pequeno mui alvo de que d noticia Soares quanto a ns, o caso de ur albino na raa, tupinamb' No temos noticia de outros fatosou exames*a tal respeito. A freqncia e familiridde corn que Soares se serve j em seu tempo da palavra mameluco faz: nps crer que ella foi doptada no< Brazil, cm analogia ao que se passava na Eufripa. Sem nos occuprmosda etymologia drissa palavra ' (que rabe, lingua qe po conhecemos), nem das accepes differentes ern que foi tomada, sabemos que no sculo XV e XVI chamavam vulgarmente na Hespanha, e talvez tambm era Portugal, mamelucos os flihos de christo e moura o de mouro ehrist. O nome brasilico para mestio era Cafioea,'que hoje se emprega- nriutra aricepco. 252. Tabudras dizem algumas copias, em vez de Tapuras, o que pouco1 dista de Tapuias. Abbeville (foi. 261 v.) de parecer que Tabdiares quer dizer grandes inimigos ; assim ser : ma;no se confunda com Tabajaras que quer dizer Os dasAlSas^pn Os Aldees. Talvez onome em' questo se devesse antes ler Tapur, e nriste-caso seria quasi o mesmo queTubiron Timbir qne ainda hoje se d a uma nao do serto : Timhir nome injurioso como patife. 253., Pelo que nos releva Soares a invasodos Tupinns devia serriuito numerosa ; por quanto diz qup elles andadavam correndo toda a costa do Brazil. antes da vinda dos Tupinambs. 254/. "Amoipiras quer dizer os Parentes cruis Am$ig -r- parente {Tesoro de Montoya foi. 32. v.) e Pira, cruel foi. 297 v. Merece pois quanto a ns menos^credito a etymologia de Soares de um chefe chamado Amoipira. " 25S. 0 que Soares conta da industria ,dos Amoipiras applicavel em tudo aoque praticava o mais gentio antes de communicar om os Europeus. Nopossomiuseu da Corte e n do Instituto Histrico se guardam vrios utensis em tudo primitivos. As,folhas dos machados eram umas Cunhas de pedra esverdeada como de syenito ou diorito, bem que pela dureza se deviam julgar de porfido. De pedra usavam tambm grandes bordes, como as alavancas ordinrias, que lhes serviriam de ama ffensiva, e a perfeio como so feitas basta para caracte-* risar apaciencia dos artistas, que no, usavam de metaes, nem de ms. 256. Vasconcellos (p. 146e 148) d noticia de outra nao e\Ibfr:.yrs a que os nossos chamavam bilreiros, no sul dQiBrazii. -r, -"' L, '

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-Temos de noyo quelastimar a credulidade, dsecul: agora so mulheres de uma s teta, que pelejavam' como Amazonas. ' ' T .. ''257. , Soar-s com su espirito penetrante,"explica a verdadeira causa da victoria dos estr.ngriis.jTiipis contra as antigas raas que habitavam.o nosso territrio pela desunio, drillas entre'si: Por onde s,e diminuem'em podei* para no poderem resistir a seus contrrios, com, toras necessrias,' por s fiarem muito em su esforo e animo,' ho entendendo *que est to entendido qe o esforo dos .poucos np pde resistir; ao poder ds muitos. A ,*''' 258. O nome deMaracs procedeu talvez, segundo, muito bem nos lembra o nosso erudito amigo o Sr. Joaquim Caetano da Silva, de tremerem elles com a falia e imitarem, com isso a bulha dos maracs. , , , -'' 259. Allude Soares, e s por informaes geraes, todo gentio qe habitava as terras ds hoje pr vinciastle Goyaz, Mtto Grosso e Par. , ... , , . jr\. M, 260. Os habitantes das.serras d serto,Ae viviam como troglodits seriam natural mente; os Precis* 261. A rocha que tanta admirao causa o; autor talvez alguma de formao secundaria ou terciara abundante, de. incrustaes. , -- \ , . -r-.; 262. As pedras d'alfebas so naturalmente productos zoophitos. Com as frmas, feitas de barro, sem ser loua nem telha e tijollo (se no houve erro dos copists^"'queria, talvez Soares desigmarris potes, cntaros, etc. , , ; "^ 263. D uma ida da prosperidade da Bahia^em.1587 o haver abi 240 carpinteirose 50 tendas de ferreiros, coraleus /Obr-eiros. - v ' :, ,,.( , ,, ' - ;,'. 264. Da arvore camaari tratou, sufficientemente Soares no cap. 67. Oremos que at hoje no se- ter nihgUem aproveitado de sua lembrana para fabricai drilla alcatro e mais productos resinss, como1 a therebentina, breu e o competente cido pyrolnhoso ' gua. rifssa., 285. A palmeira de cujas barbas diz Soares qu se faziam amm.rras.era a conhecida Piassaba, nome que em-Portugal se adoptou prnunciando-o pia. "' 266. jAdargoeiro talvez a arvore africana que hoje s diz dragoeiro que d o sangue de Drago ; e o nore dragoeiro anda corrompido s, acaso a ; madeira da rvore serviu alguma vez para adargas. ${' ' - .; ' .,-, ,-' ' 267. Soares levado de bons desejos acreditou ria exis-

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tencia de minas de ao, e imaginou por ventura que o aco se tirava em Milo da rocha, j prmpto. Quanto ao que diz d cobre nativo ho tardou que os factos o confirmassem, aponto que de junto da Caxoeira sahiu um dos maiores /pedaos de cobre nativo conhecidos, qual o 4ue se guarda na Historia Natural de Lisboa. s 268. J d Soares noticia qe no seu tempo vinham do serto de mistura com o cristal pontas oitavadas como diamantes lavradas pela natureza de muita forrusura e resplandor. .No teremos aqui a primeira noticia de diarantes no serto d Bahia ? Quanto s pedras verdes dos beios, que se tiravam de montanhas, j d'ellas faz meno Thevet (foi. 121) em 1557. Cabral,viu jdrissaspedras em 1500, segundo Caminha. L -.-,,'-, "-,' , ; 269. As esmeraldas descobertas no sculo 16 seriam naturalmente as trmalinas. Thevet (France Antarctique foi. 63) diz ter visto pedras qe se podiam julgar verdadeiras esmeraldas . ' ; As rochas eram evidentemente de amethista ou quartzo hyalino violeta,, cuja abundncia em nossos sertes tl que foi causa de que baixassem de preo no mercado taes pedras. ' ,<? ,"-..- ' .270. Soares no contente com ter inculcado a um valido de Fippe II grande importncia do Brazil (no livro que por vezes elle denomina francamente Traado), receipso que essa corte, onde s ;s attendia s riquezas do. Peru e guerra aoshereges, no se-eommvesse seno por alicientes anlogos,'conclue sua obra com asseverar :-!.' que das minas do Brazil. poderiam quasi, sem trabalhos nem des-> pezas, tirar mais riquezas do que das ndias Occidentaes ; 2., quese no cuidavam do Brazil e os-Liitheranos viessem a saber o que por c havia, no tardariam em se assenhorer da Bahia, e se o chegassem effctuar muito custaria a botal-osfra. . Estas duas verdades* profticas fariam s por si -a reputao de um homem, ajnda quando elle no houvesse escripto, como Soares, um Tratado verdadeiramente encyclopedico do Brazil.Os Holandezes vieram na America vingar-se deFilippelL do seu Duque de Alba,-e as minas de Minas inundaram 0 Universo, do sulo passado^para, ca,- de oiro e diamantes.Do homem superior que tinha entregue grande parte do seu. tempo a observar, a meditar e a escrever nenhum caso naturalmente se fez. O seu livro esteve
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quasi dous sculos .ineio sem publicar-se, e o autor naturalmente depois da dilao (como ellediz) d seus requerimentos em Madrid, veiu a passar vida tp obscura que nem sabido quando, nem onde morreu. Assim aconteceu tambm,.e ainda outro, dia, ao homem qu depois: de Soares jnais noticias deu acerca do Brazil: ao modesto autor da Corogrphia Brazilic., Rio de Jpeiro, 15 de Setembro' de 1851.

F.

ADOLPHO DE VARNH^GEN.

NDICE
D OBRA. E DOS COMMENT^RIOS DE GABRIEL SOARES
ARRANJADO PELO COMMENTDOR
DEDICATRIA ADDITAMENTO.

Pag-. Com. Pag. d COmi .., v Noticia biographica acerca 'd'Gabriel '" Soares.. xm

PARTE PRIMEIRA
ROTEIRO GERAL DA COSTA BRZILICA. Proemio
CAPTULOS: /, ' '

,.. \

1 \ 2, 3 4 5 6 7 8. 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28
1

,. 1. Primeiros descobridores da provncia do Brazil, e como est arrumada. , 3 2. Repartio que fizeram s reis catholicos com El-Rei D. Joo II d Portugal 5 . 3. D'onde-comea a-correr a costa do Brazil....... 6 4. Do rio. Amazonas 7 5. Gostado 'Maznas- at o M a r a n h o . . . . . . . . . . . . . 8 6. Da Maranho; at o" Rio Grande 10 7.'Do'Ri Grande at o de Jagoarive 11 8. Do Jagoarive at o Cabo de S. Roque : '. 12 9. Do Gabo de S.-Roque at o porto dos Bzios..... 13 10. Do porto jlos Bzios at bahia da Traio, e' como Joa de Barros mandou povoar a sua capitania./.. 14 11.;Da,bania da Traio at a Parahiba ; .. 15 12. Como se tornou a commetter a povoao da Parahiba......... .........'....:..,.. 17 13. Vida ecostumes do gentio Pitiguar 1 ..,. 19 14; D -rio d Parhba at Tamarac., quem foi o primeiro capito; . . . . . . . . . . . . . 20 15. Do rio de Igaru at Pernambuco 21 16. Da; vill de Olinda, e da grandeza de seu termo, e quem foi o primeiro pvodor d'ella 22 17. Do porto de Olinda at o cabo de S. Agostinho... 24 18. Do abo e rio de Ipojuca at rio de S. Francisco. 25 19. Quem so os Caits ; , i 27 20. 'Da grandeza do rio de S, Francisco 29 21. D rio de S. Francisco at o de Seregipe '. 32 ,22. Do rio Seregipe at o Rio-'Real 33 23. Do Rio Real, e de seus merecimentos 34 24. Do Rio Real at o riode Tapocur. 36 25. Do Itapocur .at TatuaparK. 37 , 26. De Tatuaparat o rio de Jones 38 ' 27. Do Rio- de Joanes at Bahia.., 39 28. Como Francisco Pereira Coutinho foi povoar a Bahia, e os trabalhos que n'isso teve... 41

333 334 ib. ib. ib. ib.

'ib.

ib. ib. ib. 335


ib.,

ib. ib. ib.


ib.

ib. ib. 336 ib. ib. ib. ib. ib. ib. 337 ib. ib.

376
Pag-. Com. Pag. d -., , Com. 29 Da ponta do Padro t o rio Camam 43 - 29 3T 30.' Do rio de Camam at os Ilhos.. -..,., 44 30 ib. 31. Como se comeou de povoar a capitania dos Ilhos.. , 45 31 ib, 32." Quem so os Aimors.., , ; . . \ . . . ' . ' 47,; 32 ib. 33'. Do Rio do&.lhos at Rio Grande......... 49 /38- . ib, 34 Do Rio, Grande at o de Santa C r u z . . . . . . . . . . . : . 51, ~ 34 ib.. 35/Do Rio de Santa Cruz at o de Porto Seguro 52 35 338. 36T Quem povoouNa capitania de Porto Seguro.......' 53 36 ib. 37. De Porto-Seguro at o Rio das Caravellas .55; 37 ib. 38. Do.Rio das Caravellas at o Oricar... -56,..' 38 ib. 39."Quem so os Tupiniquins...... 5 7 , 39. ib. 40^D Oricar at o-rio Doce ;..'.'..-.; 5 9 - 4 0 - ib. 41. D ri d Doce at.o do,Espirito Santo. 61, 41 ., 339 42; Capitania do Esprito'. Santos, Vasco Fernandes Coutinho, que a foi povoar em, pessav..; 62 42 ib. 43. Do Espirito Santo'at o cabo de S. Thom...... -65 43 ib. 44. Como Pedro, de Ges foi .povoar-a suvcpitahia',''*,., . da Parahiba ou de S. T h o m . . . . . . , . . . . . . ' . , . . . 66 ^ 44 ib' ,45. Quem so os Goitacazes ? . . - . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67 :,45 : ib. 46. Quem so os Papanazes?-. L,.;-.-, .68 ' 4.6 ib." 47. Do cabo de S, Thom at,o Cabo Frio... 69 47 :34048. Recncavo'do Cabo Frio ..... 70 48 ib. 49. Do Gb.Frio at. Ri de J a n e i r o . . . . . . . . . . . . . . 71 4 9 ' ib.50. Entrada do Rio de Janeiro, .e ilhas que-tem defronte .... ^.. ,-' 72 5Q\ ib. 51. Bahia do Rio de Janeiro, da ponta .do Pao de As-' I. sucar para dentro. .^..'.... 73 51> ib. 52. Ditada ponta dacidade para dentro 74 ,52 ib. 53- Governador Mein de S no.Rio de Janeiro ,76 . 5 3 - ib.' 54. Pvoco d'esta cidade.. 78 '" 54 ib. ? 55. Como'foi-,, governador do Rio de Janeiro Antnio , ,, Salema.;..., ...... , 80: ,, 55\ ib-. 56. Conclue-se com Rio de Janeiro com a tornada -de-Salvador Corra.-....' ;8i--- 56 ib. 57., Costa'do Rio-at S., Vicente ............'.. :82;,i," 57 34153..Quem o gentio Tanoio. 83' 58" ib. 59. Barra e povoaes da capitania de S.1 Vicente.... B4 59' ib. 60. Dequm-, capitania de S. Vicente? 85 60 ib., 61. Capitania de Santo Amaro , 87" 61-1. ib. 62. F-ertlidade da terra de. S.Vicente -...' 89'). 62v ib. 63. Quem,so s Goaianazes?. ,......;. 90,,' -63 ib.' 64. Costa do rio de Santo Amaro at Cananea...... 91 ' 64 ib. 65. Da Cananea at o Rio ,de S. Francisco 91 65- ib. 66. Do Rio de S. Francisco at o de Itapocur...... 92 - 66 342 67. De Itapocur at o Rio dos Patos."......"". 93 - 67 ib. 68. Costumes ds Carijs ..,.....; .94 68 ib. 69,. Costa do Rio dos Patos at o da Alagnna';; i.... 95 69 _. ib. 70. Do porto da Alaguna at o Rio de Martim Affonso. 96, 70 ib.' -71. Do ..Rio de Martim Affonso at o porto de.S. Pedro.- < . 96- -71 .-- ib,., 72. Como corre a costa do Rio de S. Pedro at o cabo de Santa Maria '.9 7 . 72. ib. 73. Do cabo de Santa Maria at ao Rio da-Prta.... ' 9 8 73 ib. 74. Ponta d Rio da Prata, da banda do Sul, at alm - da bahia de S. Mathias .'. -.', .-...... 99- 74 - ib.

-_; S77 - ^
Pag. Com. Pag. do Com.

PARTE SEGUNDA;
. MEMORIAL E DECLARAO DAS GRANDEZAS DA BAHIA.

TITULO 1 . R s l p r i a d a Colonisaco da Bahia.


1. Armada d Thom de Souza. ....;;..; 2.-Quem foi Thom de Souza. ... .3. Edificao daCidde do Salvador,; 4. Nova armada'em favor da clonisao .' 5.,,Governo de Duarte d a ^ C o s t a . . . . . . . . . . . . . . . 101/ 02 103' ; 104 105 75 76 77 ,78 79 34& 343 ib. ib. ib.

TITULO 2.Descripo Topgraphica da Bahia.

6. Clima d Bahia: curso dos ventos na costa, e das gas nas mones.. 107 80 343 -7.'Cidade do Salvador.....;; 108 81 r ib.8. Sitio da c i d a d e . . . . . . . . . . . ..<, 110 82 ib.. 9. -Como -corre esta: da S por d i a n t e . . . . . . . . . . . . . . . 111 83 ib. 10 v Como sg-ue -por este rumo..." ,v, ...., 1,112'. 84 ,344 11. Como corre a mesma < da banda da praa para a banda o Sul ' . . . . - 113 85 ib. 12. Outras partes;que;.;cidade tm r para se notar... 114 , 8 6 ib. 13. Como,,se;tratam s:mprdores:;;do Salvador e-algumas, .qualidades.- suas..'.'...'.''.-.: 115 87 ib. 14. Como se pde defender a Bahia com mais facilidade ...,...'.-.: 116 ' 8 8 - ib

TITULO 3.Da enseada da Bahia, suas ilhas, recncavos, " ribeiros e engenhos.
'15*. Grandes qualidades que tem a Bahia 117 16. Barras que tem, e como est arrumada a ilha de Taparica , 118 17. Como, se [fiv.ga-, para entrar na B a h i a . . . ; . . : ll9- ' 18. Tamanho-d'mar da Bahia, ,e de algumas ilhas. -120, 19. Terra da Bahia da cidade at ponta de Tapar gipe, e suas ilhas 121 20. Engenhos de. assucar.de Piraj.: .,.: 122 21. Fazendas que ha da barra de Piraj at o Rio de'M-toim .'.' 123 ,22. Tamanho ,do Rio de. Matoime'engenhos que tem. ,124 23.- Feio, da terra da boca de Matoim at o. esteiro de Mataripe, e mais engenhos. . . i 12624. Da terra da boca" do esteiro do .Mataripe at a ponta de Marap, e dos .engenhos que em Bi tem.... : . . . - . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ; : . ' . . . / 128 25. Rio de Seregipe e terra d'elle boca; do Para- goa"..,..?.., ..'.;. ?.. .130 26. Grandeza do Rio Paragoa, e os seus engenhos. -131 37. Terra do Rio de Paragoa tocante capitania de D . l v a r o . . r . . . .....133 28. Como corre a terra do Rio de Paragoa ao longo do mar da. Bahia at a boca de Jagoaripe, e por ; este rio acima ." 135 , 89 90 9 1 92 93 .94, 344 345 ib. ib. ib. ib.

^95- ib. . .96 ' i b . 97 98 ib. ib.

99 . 346 100 ib. 101


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ib. > ib.

102

378
. i *

"..','"' ' Pag. Com. Pag-, do -., v , :..,..' , Com. .29. Tamanho e formosura do rio Irajuhi, 6 seus fe, concavos.. . ....* ' 136 \ 103 4o 30. Da boca da barra de Joaguaripe, at Juquirijape, ' * e d'ahi at o rio U n a . . . . . .." 138 104 ib. 31. Do ri Lfn at;Tinhar, e da ilha de Taparica, , com outras ilhas. ;:'...',..... . . . . . , . . , . , . . . 139 1G5:' ib. 32. Quantas igrejas^ ehgenhos e embarcaes tem a ,. ,, "' B a h i a . . . : . . . . . . , . ' . : , , ;-.:'. '.,..>...., 142 ., 106 ib, 33. Fertilidade da Bahia, ecpmo.se n^lla, db.gado,, 143 107 ib. TITULO 4.Da Agricultura d a Bahia., j 34. Algumas arvores de Hespanha, e como s,criam. 145 : 108 346 35. D'outros fructos estranhas; . . . . . . . . . . . . . . . . 149 109: -.>&>-.. 36. ;Das sementes de.Hespanha, que ;e do ha Bahia, 150 110 "347 37.. Da.mandioca.. ,..;,;;,....,.'..-.,...\.........:..:.... 153 l l l '-;; ib:. 38. Das raizes da mandioca, e;, d para qe servem.. 154 112 ib. 39. Quo terrvel 'gua da mandioca... \ 155 113 ib.. 40. Da farinha fresca que se faz da mandioca.....*'. 156' ,114 ,.' 318 41. Do muito pra qe prestam as raizes da carim.:. 157 115 N ib,. 42. D'a farinha de guerra, e como-se faz da carim.... 158 ! 116 ib. 43. Dos aipins.... i , . . . . . . . . . . . i . . . . . . . . . . . . . . . . ,159 117 ib. 44. Alguns mantimentos de raizes que se criam de,, ; -.' baixo da terra.:.. ..';'. , . 160' 118 ib. 45. Do m i l h o . . . : . . . . . . . . . . . . . . 162 119 ib. 46. Legumes..... ......:.-, 163 ,120 '349 47. Dos amendoins (mandobins)... '.< 164' 121 ib. 48. Quantas-castas, de pimenta h a : . . . . . . . . , , , . . , . . . . ,165 , 122 ib. 49. Dos cajus e cajuins,..:,.. ..-,.... . . . . . 16(5 123 350 50. Das Pacbeiras" e B a n a n e i r a s , . . . : . . . . . . . . . . . 168 121 , ' i b . 51. Dos mames e jaracates................ 169 125 '" ib. TITULO 5.Das arvores e plantas indgenas que se come. 52. De algumas arvores que do fructos ........ 53. Da arvore ds ambs ,..,;,;.;.,,'.;........ 54. De algumas arvores de fructo afastadas, do mar : sj, pucaia, piqui, macug, genipapo, etc 55., Em que se contm muitas castas; de palmeiras, que do fructo ;........... 56, Hervas que dp fructo ; . . . : . .. 57, Dos nanazes. . . . i ,.'.,.,.,. que do fructo 170 172 T72 , 177 179' 181 126. 127 , ' . < 128 -,. 129 "130 131 132133 134 135 136 137 350 351 ', ib. ib. ib. 352 352 ib. ib. , ib. 353 ib.

TITULO 6.-Das rvores medicinaes. 58, Das arvores de virtude...,.,.., 182 59- Da embaiba. e caraobu, e oaraba merim...... 183 60. Da arvore da almecega, e de outras arvores de virtude;.......:. , 184 % .,:".-,..,.., TITULO 7, Das hervas medicinaes. 61. Das hervas,de virtude: tabaco, etc . . . . . . . . . . . 186 62. Como se cria o algodo, e de sua virtude, e de . outros arbustos 188 63. Virtudes de outras hervas menores.. 190

3 7 ?.
Pag. 'Com, Pag. d ' ' Cm. TITULO 8 . D a s a r v o r e s r e a e s e p a u s de l e i . 61. Do vinhatico e c e d r o . . . . . . . . . . . . . . ' ; . . . ' ... 192 138 353 65. Do pequihi, e d'#jitrs madeiras reaes. 193 139 ib.; 66. Em que se acaba a informao ds rvores 'reaes. 194 140354 TITULO 9.Das a r v o r e s m e a n s com differentes p r o p r i e d a d e s , dos c i p s e f o l h a s t e i s . 67. Damaari e - g u a n a n d i . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 196 141 354 68. Das arvores que-do a e n v i r a . . . . . . J 197 142 355 69. De algumas;rvpres muito : duras 198 143,, ib'. 70. Arvores qu se do o 1 jugo d mar ". 199 144 ib .$ 7. D algumas arvores m o l e s . . ; . . , . . , ; . . . , . . . . . . . . . 200 145 ib. 72. Algumas arvores de. c h e i r o . . . . : . . . , . . . . . . . ..- 201 146' ib. 73. Arvores de que se fazm remos, e hastes de lanas. 202 147 356 74. Algumas arvores'qu tem ruim eheiro.......-.-...i 203 148 ib,' 75. Arvores que do fructps silvestres, que se no c o m e m ; . . ; . . . ; . ; . , . . . . . . . , . . . . , . . . . . . : . . . . - . , . . ; 203 149' ib.' 76; Dos cips, e p a r a o q e . s e r v e m . . . . . . . . - 204 1 5 0 ' ib. 77. Folhas proveitosa^ qu se criam no mato ,.-, 20,5 1 5 1 ' i b . TITULO 10. D a s a v e s . 78. Da guia, e m a s , : e t . , . . . . . . . . . . . . , . > . . . . .206 152 ' 356 79. D. macuagu, mutum, gallinhas do mato, etc.,;. 207 153 ib. 80. Dos caninds, araras e t u c a n o s , : , . . . . : . . , - . . . , . . . ' : . 208 154 ib. 81. Das aves que se criam taos rios, e lagoas d a a g u a ( doce .....,......;.., .209 155 357 82. Das aves que se parecem com perdizes, rolas e pombas..:....,..,.., ':,... 210 ,156 ib. 83. Diversidade d.ppagaios que h a . . . . . , 211 157 ib. 84. Algumas aves daagua,salgada .212 158 ib. * . Avesderpina..:..,.. , . 213 159 ib. 86. Algumas aves n o t u r n a s . . , 214 160 358 87., Alguns pssaros d diversas crs e costumes.... - 215', 161 ib. . 88. 'De;.algun.s passarinhos que cantam: '217 162 ib. 89. De putrs. pssaros diversos :.-.-,......, 217 163 ib. 1 TTULO 11. Da entomologia brazilica. ' ; 90.. Algunsinsectoseomazs'.;.:.., ,'.'." ...219 164 4 358 91. Das abelhas...,, V,..: 220 165 359 92. Das vspas'e liscas,., ". 221 166'- ib.. 93. Dos mosquitos*, grillos, bizouros e b r o c a . . . . . . . . . . 222 167, ib; TITULO 1 2 . D o s m a m m i f e r o s t e r r e s t r e s e a m p h i b i o s . 94. Das a n t a s , . . ......'223 168 35995. Do jagret.-. , 224 169 ib. 96. Tigres e alimarias daninhas225 170 ' ib. ' 97.. Dos veados .......... ,. 226 .171 ,ib. , 98. Alimarias qe se mantm d rapina 227 172 ib. -99. Entranheza do jaguarecaca 228 173 ib. 100. Dos porcos do%atb, ; ;.;., i 223 171 360 101.. Dos porcos e outros -bichos que se ; criam na gua doce. . '. - . ' .: 330 175 360 102. Dos tatus 231 176 ib. 103. Das pacas e c o t i a s . . . . . . . . '.. 232 177 ib. 104. Dos bogios...-...'...: ....' 233' ; 17S ib.

. . . / Pag. Com. Pag. de Com. > 105. Diversidade dos^ratos que se comem...., ..,.234 179, 360 r 106. Dos kagados .''.285 180 ib. 107. Do bicho que se chama preguia, 236 - , 181 ib. 108. , De outros animaes d i v e r s o s . . . . . . . . . . . . . . . . ' . . . . . . 236 182 361 TITULO 3.Daherpeto$raphia e dos batrachios e vrios " * , ... outros 109;, Da cobra gibpia.,,..,,....... . . . , . * . . , . . . . , 237 183., 361 110. Cobras grandes qu s criamnps rios . , , . . . : 239 184 ib. 111. Das cobras de coral das gereracas , ., 24Q 185 ib. 112,. Qu^e cobras s s de cascavel, e as dos formigueiros 241 .186 ib. 113. Cobras diversas, .' 242, -187 ib, 114. Doslagartose'amelees...:,..;.,,.....,:..'..;.... ;24, 188 ib. 115. Diversidade das is e sapos....!,,., 244 189 : ib. 116. Das lagartas...,' 245 :190:' 362 117. Ds lucernas e de outro bicho e s t r a n h o . . . . . . . . . . . 246 291 ib. 118. Das aranhas e l a c r s . . , , . . ' . . . , . . , . . , 247 192 ib. /; TITULO 14.De vrios hymenoiterostc, \ 119. Das formigas qu mais damno fazem 248 193 362 120. Ds: formigas de passagem,;,...... ,-..249 194 ib. 121. De certas formigas grandes,,.'. 50 -95 ib. ,122. Diversas castas de formigas.' , . . 251 196-; ib." 123i.. Do copime dos-carrapats..... ,-.'. , 251 197 ib. 121., De vaiiqs.insectos sevandijas.......:,,..., , 252. 198, ib. TITULO 15. Dos "mammiferos marinhos e dos peixes do , mar, camaresi, etc. 125. Das balas....'..'....'./.. ,.. 254 , 199- , 362, 126. Do espadarte, e de',o.tro,peixe nao conhecido que . ' deu costa............. >.'..- 255 ' 200",'-' 'ib. 127. Do que o autor julgava homens marinhos....... -256 201 , ib. 12S'., Do peixe serra, tubares,- tuninhas ,e lixas 256**,. 202 363 129. Do pixe-boi'.,..,.,.... : 257 , 203 ' ib. 130. Dos-peixes-pezdos e grandes . . . . . . 58 ' .204- ib. 131. Dos.mros, cavalls pescadas e xaros - 259'-.. 205 ib. ,132. Dos peixes de couro....,.,...'.' 261 206 ib. ,133. Das albacras, .bonitos, douradas, curvinas, etc. 262 '207 ib.' 134. Peixes que se tomam em redes....263- "<'' 20o " 364 135. Algumas-castas de peixe'medicinal ". -'...-, 264'--209'- ib. 136. Dlguns peixes que se criam na lama, e'andam sempre no fundo...:. "..".,.-. '265- 20 ib. 137. Da qualidade, de alguns peixinhos, e dos cama'- " roes 266 ; '311 365 TITULO 1 6 D o s crustceos^ mollusco, 'zoopbitos, chini dernes, etc. e dos peixes d'gua doce. \ !'-f>ps lagostins, e ucs. ......... 267 212 365" 1- Diversas castas de caranguejos 268 '213 ib. 140. Das ostras. -. . 309 214 ib ti" S e ,?-tros mariscos. ...'.'..'.'.'.'..'.'.'.'.'.'.'. 270 215 ib! 14^. Da diversidade de bzios 271 216 ib. 143. Estranhezas que o mar cria na Bahia . . . . . ' . 272 217 ib

3yu

381
,.-!' ' Pag, Com. Pag-, do . Com, 274. 218 365 .275- 219 ib. . . 276 -, 220 ib. Tupinamb

144. Dos peixes dgua doce.. 145. Do marisco que se cria h g a doce 146. Dos carahguejos/do. mato

TITULO 1 7 . N o t i c i a e t h n o g r a p h i c a do g e n t i o que povoava a B a h i a .

147 i Que trata de qaes foram os primeiros pvoadores da B a h i a . . . , . . ; . . . . . . . . , . . . : . . . . / . . . 277 221 365 148. Proporo e feio dos Tupinambs, e como se dividiram logo....... 278 222 36 149. Como s idividiram os. Tubinambs , . 279 223 ib. 150. Linguagem dos Tupinairbs 28 224 ib. 151. Das:'aldas e s s p r i n c i p a e s . . . . / . ^81 225 367 152. Maneira dos. casamentos;dos Tupinambs seus . amores.....,}..:......... ..' 282 226 ib. 253., Ds^enfeites d;ste gentio ,.', . . , , . . 283 227 ib, 154. Da criao que os Tubinambs do a o s filhos, e o que fazem quando;ihes nascem... ...'284 228 ib. 155. O com,qe os Tupinambs se fazem bizarros 285 229 ib. 156. Da luxuria d'estes brbaros. 286 230 , \\>'. 167. Das ceremonias que usam os Tupinambs nos seus . "parentescos./ 287 231. ib. 158. Do modo de comer e beber dos Tupinambs 288 - '232 368 159. Mpdo da grangearia ds-Tupinambs, e de suas "/ ' habilidades..., 290 233 ib. 160. D algumas habilidades -e cpstumes dos, Tupi-, . nambs . r . . , ; . . . . ; . . . ;....,.. 291 234 - i b . 161. Dos feiticeiros edos que comem terra para se matarem..,.. -.. ;.. 292 235 369 162. Das saudades dos Tupinambs, e como choram e cantam.,'..: '. , 293' 236 ib. 163. Como os Tupinambs agazalham os hospedes 294 237 ib. 164. Do uso que s Tupinambs tem em seus concelhos, e das ceremonias que u'estes usam 295 338 ib. 165.'D como se este gentio cura, em suas enfermidades...: .' 296 239 ib. 166. Do grande conhecimento que os Tupinambs tem "datra..;.... 297 240 ib. 167. Como os Tupinambs se apercebem para irem , guerra......... :..., 29 241' ib. 168. Como os, Tupinambs'do em seus contrrios . . 299 242 ib. 169. Como os contrrios dos -Tupinambs dao sobre elles, quando se r e c o l h e m . . . . . . . . . ,.. 300 243 ib. 170. Como o, Tupinamb que. matou o contrario toma logo nome,, e as ceremonias que n'isto fazem... 301 244 'ib, 171. Do tratamento que s Tupinambs fazem s - ;' que captivam, e mulher qe lhes dao.. ,303 .245 , i b . 172. Da festa e apparato, que os Tupinambs fazem para. matarem eni terreiro a seus contrrios... 304 - 246 370 173. De como ,se enfeita e apparata o m a t a d o r . . . . . . 305 247' ib. 174. O qu os Tupinambs fazem do contrario que : mataram... 306 '248 ib. 175.' Das ceremonias qu-os Tupinambs fazem quandomorre algum, e como o enterram,.. 307 249 ib, J TOMO XIV 52

382
Pag. Com.' Pag. do Com. 176. Successor ao principal que morreu, e das ceremonias que faz sua mulher, e as que se fazem por morte d'ella t a m b m . . . . . , , . . . , , , : , , ; . . 308 177. De como entre os Tupinambs ha muitos-iname-" luos que descendeu! dos Francezes, e de um ndio que se achou, muito a l v o . . . . . . . . . . . . . . . . 309 250 ' ,370 251 371

TITULO 18.Informaes thnogFphicas acerca de outras naes visihas da Bahia, como Tupina; Aimors, Amoipira, Ubirajara, etc. 178. DoTupinas , ,...:......, . 310 252,\ 371 179; Costumes, e trages ds Tupinas,.... . . ' 311 < - 253,,. -Ib'. 180. Quem so s Amoipiras, e onde vivem. 312-V, 25 , ib. 181. Vida e costumes dos Amoipiras 3J.3 255 ib. 182. Da vivenda dos Ubirajaras, ,e seus costumes 314 256 iby 183. Da terra que os Tapuias possuram, 316 -^257- 372. 184/Dequemsoos Maracs ......... <.. 316 258 ib. 185. Sitio em que vivem outros TapuaSye parte de.seus , t costumes..,......; 318 :, 259 ib.'. 186. Alguns outros costumes.... ". 319 7260 ib. TITULO 19.Recursos da B a h i a para'defender-se. 87". -Pedra para forticaes.,.....;.' .', , . , . 3 2 0 261 188. ,'Commod para se poder fazer cal, e como se faz... 321 262. 189. Dos aparelhos, para se'fazerem grandes armadas. 322, 263' 190. Mais aparelhos paras.fazerem armadas.. 323 ,264:.,', 191. Aparelhos que. faltam para as-embarcaes '324 265 192. Dito para se. fazer plvora, picaria, e armas.,..,. 325' 266,;, TITULO 20. Metes e pedras preciosas. 193. Do ferro, ao, e cobre., . : . , , ; / . . . , , 326 267 ,' ,194. Das pedras verdes e zues do serto:.......'.,., .. 327 268 195. Ds esmeraldas,eoutras pedras, ,;: . 328 269 . 196. Da quantidade de ouroe-prata......329 270,' 372 ib. ib.", ib. ib. ib. 372 373 ib. ib.

ERRATAS.

PAG.

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EBEO

EMENDA

, 53

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135 140 151 155 157 162 169


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37 4 37 7' 1 ao; 34/ ' 28 6 38 3 7 , 10
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,'332

334 341 82 348 351

:..- Capital e como corre * ,' lguas da costa' ' roca , -, . tapiti-m aipis roa jacaate copaubu ''{". "raiicrhai , jubutmirim pesados, , araticurana 1 de locaes commento eScript, Loysa radxi ; , ,,; 0 amb ,

Capitania. o como corre. lguas, de costa; rota.


tapet. aipins. rota. jaracate. copnibuca. Araticupana. jabuti merim. prezados. .;, aritucupana. de lugares. capitulo. escrito por G. Soares, seno ,. erudio de alguni copista, Gabot'-ml526. ,radx.. 127. O amb.

&

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